Anotação em 2011: Ao rever A Malvada/All About Eve agora, depois de muitos anos, não consegui deixar de pensar que a cotação máxima de quatro estrelas é pouco para o filme. Se a cotação máxima fosse cinco, ou dez, não importa o número, seria pouco.
A Malvada pertence àquela categoria singular e exclusivíssima dos melhores filmes que já foram feitos na História.
Me ocorreu também, enquanto me deliciava com cada diálogo, com cada seqüência, com cada gesto, cada olhar dos estupendos atores, e não conseguia deixar de dar rewind para ver de novo, ouvir de novo, que Joseph L. Mankiewicz é um dos melhores – se não o melhor – escritor do cinema.
Cinema é imagem, e imagem em movimento, e há muita gente boa que acha que os grandes filmes prescindem de palavras. Billy Wilder, por exemplo, costumava dizer que o advento do cinema falado fez mal a Charles Chaplin: seus filmes mudos eram melhores que os falados, porque, com os falados, o velho gênio inglês começou a fazer discurso, e mensagens são para ser enviadas pelo correio (ainda não havia internet quando Wilder dizia essas coisas), e não através dos filmes.
Era um frasista, o velho gênio austríaco – na vida e nos seus filmes. Fazia brilhantes frases de efeito, até mesmo para falar mal das palavras – como os sujeitos que profetizam o fim dos livros publicando suas teses em livros.
Billy Wilder é um grande escritor de diálogos brilhantes. Mas Mankiewicz é ainda melhor.
A Condessa Descalça, que Mankiewicz dirigiu em 1954, um dos melhores filmes sobre os bastidores do cinema que já foram feitos, tem alguns dos diálogos mais extraordinariamente inteligentes, ferinos, amargos da história. Tem poucos rivais nesse quesito. O maior deles é A Malvada, que o mesmo Mankiewicz fez quatro anos antes, em 1950.
A Malvada é um dos melhores filmes sobre os bastidores do teatro que já foram feitos – mas é bem mais que isso. Seu universo é o universo do teatro, mas seu tema, o mesmo de A Condessa Descalça, está presente em boa parte das atividades humanas. O tema é a vaidade, a ambição, a competição, a capacidade que as pessoas têm de mentir, trair, fingir, fazer qualquer coisa para atingir seu objetivo de vencer na profissão – de preferência pisando na garganta de quem no passado deu a elas alguma ajuda.
No cinema, como o diretor mostra em A Condessa Descalça, ou no teatro, como mostra em A Malvada, os egos talvez sejam um pouco maiores – mas vaidade, ambição e mau-caratismo, todos sabemos, não são privilégio de atores, diretores, escritores. Os vendedores de seguros que o digam. Ou os bancários, os jogadores de futebol, os professores, os jornalistas – para não falar dos políticos.
Os papéis sociais, a pessoa e o posto que ela ocupa na profissão
Como A Condessa Descalça, A Malvada trata também da coisa dos papéis sociais das pessoas; o que a pessoa faz na vida profissional é apenas um dos muitos papéis que cada um tem, mas acaba sendo o preponderante, o mais importante, o único. Da forma como estruturamos nossa sociedade, as pessoas importam não pelo que elas são, pelo que elas pensam, sentem – e sim pelo que exercem na profissão. Assim, se você é um jornalista que está num determinado momento em uma posição importante, a tendência que as pessoas à sua volta bajulem você; se você perder o emprego, continua sendo a mesma pessoa, mas a forma como você é enxergado pelos outros muda completamente.
Margo Channing, o papel de Bette Davis, é uma grande atriz, a mais respeitada daquela ilhota, Manhattan, que é o umbigo do mundo, o umbigo do universo teatral, o umbigo do capitalismo. Mas ela já passou dos 40 anos, e, naquele universo, ela corre o risco de perder a importância imensa que tem hoje, porque muitos papéis já não caberão mais para ela; com a idade, ela corre o risco de virar uma has been, uma que já foi – e o termo has been, quando usado como adjetivo, é um dos piores insultos que se pode fazer a uma pessoa ali.
Em vários diálogos, vai aparecer essa luta de Margo Channing a pessoa versus Margo Channing a estrela de hoje que poderá não ser tão estrela amanhã.
Vários personagens contam suas versões dos fatos
É interessante notar que os roteiros desses dois filmes, A Malvada e A Condessa Descalça, os dois de autoria de Mankiewicz, usam o mesmo tipo de estrutura narrativa. É o que chamo de narrativa-laço: abre com um fato forte, importante, impactante, ocorrido há pouco, para em seguida haver um flashback; volta-se atrás no tempo, e então vamos vindo para mais perto daquele ponto mostrado na abertura, e daí para a frente no tempo, até a conclusão.
Esse tipo de recurso tem sido cada vez mais usado. Seis décadas atrás, Mankiewicz já se aproveitava dele com maestria. Mas não é só nisso que os roteiros se aproximam. Nos dois filmes, a história a ser apresentada, os acontecimentos do passado que levaram até aquele fato da abertura do filme, são passados para o espectador de acordo com a ótica de mais de um personagem.
A Condessa Descalça começa no enterro da personagem central, Maria (Ava Gardner); sua história, sua fantástica ascensão de dançarina em uma boate espanhola a estrela de Hollywood é contada pelo diretor de seus filmes, pelo relações públicas-faz tudo do produtor e pelo nobre italiano que a transformaria em condessa.
A Malvada começa na cerimônia de entrega do mais importante prêmio para os melhores do teatro de Nova York – e, portanto, na cabeça daquelas pessoas, umbigocêntricas todas elas, o prêmio mais importante do universo para os melhores do teatro. Ali, na sede austera de um augusto clube, estão reunidos todos os personagens da trama.
O primeiro a narrar a história, com a voz em off, mas ele aparecendo na tela, assistindo à cerimônia, é um crítico de teatro famoso, respeitado, temido, Addison DeWitt (George Sanders). DeWitt é um tipo esnobe, rei na barriga; sabe que sua coluna pode arrasar reputações, ou criar novas estrelas. George Sanders, extraordinário ator, é o tipo perfeito para encarnar aquela pessoa elegante, de frases sempre bem construídas, dicção perfeita, uma pessoa repelente, nojenta.
Aliás, o Addison DeWitt que Sanders criou faz lembrar demais um tipo parecido, ele também colunista de jornal e possuidor de imenso rei na barriga – o Waldo Lydecker (Clifton Webb) de Laura, de Otto Preminger.
É DeWitt que apresenta para o espectador os personagens da história. Margo Channing, a grande estrela da Broadway; seu marido, o diretor Bill Simpson (Gary Merrill); o dramaturgo Lloyd Richards (Hugh Marlowe), o escritor mais cultuado do momento; a mulher dele, Karen (Celeste Holm), rica, educada, elegante; Max Fabian (Gregory Ratoff), o produtor das peças escritas por Lloyd, dirigidas por Bill e interpretadas por Margo. E, finalmente, Eve (Anne Baxter), a jovem atriz que naquela noite está recebendo o maior prêmio da noite, o prêmio de melhor atriz – Eve, a personagem do título original, All About Eve.
A primeira coisa que vemos de Eve são suas mãos – mãos jovens
A primeira tomada em que Eve aparece mostra apenas suas mãos sobre uma das mesas da grande sala em que se realiza a cerimônia. Mãos jovens – as mãos que vão receber o troféu máximo.
No momento em que o mestre de cerimônias – o ator mais veterano ali presente – termina finalmente o seu discurso, e chama Eve para fazer a entrega do prêmio, e Eve segura a estatueta, Mankiewicz paralisa o quadro, congela a imagem.
(Me lembrei que, com poucos minutos de filme, o veterano Frank Capra havia usado o mesmo recurso de congelar a imagem, em A Felicidade Não se Compra, de 1946 – quatro anos, portanto, antes de A Malvada. Se a gente procurar um pouquinho, sempre vai achar alguém que já usou determinado recurso antes.)
E é nesse momento – a imagem de Eve recebendo o prêmio congelada na tela – que há a primeira troca de narrador. Deixamos de ouvir a versão do insuportável, nauseabundamente esnobe DeWitt, e passamos a ouvir e ver a história contada por Karen, a bela esposa do dramaturgo da vez.
E vemos o dia em que pela primeira vez Karen falou com Eve. Todos os dias Karen a via no beco por onde entram e saem os atores do teatro em que Margo Channing fazia o papel principal na peça Aged in Wood; naquela determinada noite, Karen tomou a iniciativa de se dirigir a Eve. Eve conta para ela rapidamente a sua história: é fascinada pelo teatro, mas, sobretudo, é fascinada por Margo Channing; vê todas as apresentações da peça, nos lugares mais baratos, mas vê; e depois vai ali para o beco, para olhar a mulher que é seu ídolo, mesmo que seja por breves instantes.
Com simpatia por aquela jovem de aparência humilde que idolatra sua amiga Margo, com simpatia e bastante pena, piedade, Karen toma a decisão: convida Eve para entrar com ela, ir até o camarim, conhecer pessoalmente Margo Channing.
A voz em off de Karen havia informado ao espectador quanto tempo havia se passado entre aquela primeira conversa no beco e o momento presente, o momento em que a mesma Eve está ali gloriosamente recebendo o prêmio de melhor atuação:
– “Estamos em junho. Foi no começo de outubro. Outubro passado, apenas.”
O filme que está começando mostrará, então, a trajetória de Eve de pobre, humilde admiradora fanática de Margo, até o momento de glória de receber o troféu mais cobiçado do mundo do teatro. De outubro a junho. Menos de um ano.
Beleza de trama, atores maravilhosos
É uma belíssima trama.
A história original chama-se The Wisdom of Eve, a sabedoria de Eve, e foi escrita por Mary Orr. Não sei o quanto da trama do filme já estava na história original, o quanto foi criado e acrescido por Mankiewicz em seu roteiro, mas o roteiro é um absoluto brilho.
Cada sequência é memorável, cada sequência é repleta de diálogos maravilhosos. Todo o elenco é perfeito – mas, naturalmente, o brilho maior é de Bette Davis e Anne Baxter.
Imagino que daria um belíssimo livro a gênese e a feitura de All About Eve. Quanto terá havido, na vida real, no por trás das câmaras, de guerra, de disputa de egos entre Bette Davis e Anne Baxter?
Imagino que tenha sido um duelo de titãs.
Porque todos os indicativos são de que Bette Davis não era fácil. E Bette Davis tinha muito de Margo Channing: era uma das maiores estrelas do cinema, se não a maior de todas, em 1950, quando o filme foi feito. E tinha um ego gigantesco, avassalador. E estava ficando velha. Tinha 42 anos – praticamente a mesma idade de Margo, seu personagem.
E aqui é absolutamente necessário falar de idade, e de idade naquela época.
É chover no molhado, mas é fundamental lembrar: impressionante como, 60 anos atrás, as pessoas pareciam mais velhas do que hoje. Uma mulher de 42 anos hoje é uma jovem, está no auge da forma, da atividade física, mental, profissional. Em 1950 as mulheres de 42 anos pareciam ter muito mais. E os homens também – talvez não tanto, mas também. Se a gente pensar em pessoas do nosso meio, nossos amigos, conhecidos, é fácil perceber: mulheres de 60 anos são hoje jovens. Para não ir longe: minha sogra tem 77 e é lépida, fagueira, ágil – parece ter a idade que Bette Davis tinha quando interpretou Margo Channing.
Têm cerca de 40, 40 e pouquinhos anos hoje Cate Blanchett, Catherine Zeta-Jones, Jennifer Aniston, Jennifer Lopez, Claudia Abreu, Jennifer Connelly. São todas elas jovens, gatinhas.
Bette Davis e Margo Channing tinham 40 e pouquinhos e pareciam ter 60.
Anne Baxter tinha 27. Diante de Bette Davis, era uma jovem – embora 15 anos não seja uma diferença grande.
A questão da idade, da aparência, é fundamental em toda a trama de A Malvada.
No rosto de Anne Baxter, as mais diferentes expressões
Interessante o título que os exibidores brasileiros escolheram para o filme. Mas vejo agora que não foi uma idéia unicamente brasileira – foi latino-americana. Em Portugal, o título foi Eva; na França, Ève; na Espanha, Eva al Desnudo. Mas, na Argentina e no México, virou La Malvada. Parece título de tango, ou de bolero, de samba-canção.
Bette Davis fez muitos papéis de mulheres fortes, e vários também de mulheres malvadas. Será que foi por isso que escolheram esse título dramático como a letra de um tango – mesmo a malvada não sendo a personagem de Bette Davis?
Bette Davis brilha em cada tomada em que aparece. Bette Davis é uma das atrizes que têm presença mais forte diante de uma câmara de cinema, e aqui, num papel brilhante, cheio de matizes, ela brilha.
Na cena em que ela diz aquela fala, uma das mais famosas da história do cinema, o talento de Bette Davis solta faíscas:
– “Apertem os cintos de segurança. Vai ser uma noite turbulenta.”
Mas é impressionante como Anne Baxter brilha mais. Um pouco depois do aviso de Margo sobre a turbulência, na mesma festa para receber Bill, que voltava para Nova York depois de alguns meses em Hollywood, diversos dos personagens centrais estão sentados na escada que leva aos aposentos íntimos do apartamento duplex de Margo. Num degrau mais alto está Karen, casaco de pele nos ombros, quase pronta para sair. Dividindo o mesmo degrau, abaixo dela, estão Bill e o crítico DeWitt. No degrau abaixo estão Eve e a srta. Caswell, uma bela e jovem starlet à procura de uma oportunidade para mostrar seus talentos. Estão falando sobre o teatro, naturalmente. Eve, que Margo havia acolhido, e que trabalhava para a estrela como sua secretária, sua faz-tudo, fala longas frases a respeito de como deve ser maravilhoso estar num palco sendo adorada por aquelas centenas de pessoas na platéia.
No rosto de Eve-Anne Baxter há encantamento, deleite. Ela flutua no Nirvana. Aí percebe que falou muito, e mostra uma expressão humilde, de quem pede desculpas àquelas pessoas muito mais importantes que ela. Mas de repente ela olha em frente – o espectador ainda não vê, mas ela vê que Margo se aproxima, e seu rosto demonstra susto, um pouco de pavor, para em seguida transmutá-lo numa expressão de absoluta servilidade.
É um estupor.
Assim como é um estupor a cena em que ela, após sua primeira apresentação, conversa com Bill no camarim, e não percebe que DeWitt está observando pela fresta aberta da porta. Os olhos de Eve-Anne Baxter brilham – é um brilho coisa de doido, um brilho ofuscante, feroz.
A jovem bela aspirante a atriz que interpreta a jovem bela aspirante a atriz
É preciso – não tem jeito – falar sobre a jovem atriz que interpreta a srta. Caswell, a bela starlet levada à festa por DeWitt. Claro, não é dito, mas está mais do que na cara que DeWitt não está tentando arranjar alguma coisa para a moça à toa, por ser bonzinho. Está na cara que o esnobe velhaco está comendo a moça – a quem ele apresenta da seguinte maneira:
– “Miss Caswell é atriz. Formou-se pela Escola de Arte Dramática Copacabana.”
Copacabana, ou Copa, era, como se sabe, um famosíssimo night club de Manhattan.
É bela, a jovem atriz que faz a srta. Caswell, aquela moça sem talento algum a não ser a beleza e a juventude. Não chega a ser propriamente belíssima, acachapantemente linda, mas é bela, sim, e gostosa. Como atriz, não é surpreendente, mas é boa – passa o que tem que ser passado, o jeito da loura quase burra, pouco educada, mas bonita e gostosa, que está tentando ser atriz.
Naquele ano de 1950, Marilyn Monroe fez papéis pequenos em dois grandes filmes – O Segredo das Jóias/The Alphalt Jungle, de John Huston, e este A Malvada, no papel de Miss Caswell. Já havia aparecido como extra em alguns outros filmes, a partir de 1947.
Nos doze anos seguintes – 12 anos, coisa pouca, que passam depressa demais –, ela se tornaria muito maior do que todos os atores deste filme extraordinário. A jovem atriz que interpreta a starlet Miss Caswell engoliria tudo, viraria um dos maiores ícones do cinema, um dos maiores símbolos do século.
É muito impressionante.
Eram tempos melhores, aqueles, antes do culto à Deusa Aneroxia
E aqui é necessária uma outra observação a respeito de como tudo, em 1950, era diferente dos tempos que vieram depois.
Em 1950, não se cultivava a Deusa Anorexia.
Anne Baxter era uma mulher cheia. Marilyn Monroe era uma mulher cheia: tinha uma bunda que hoje seria julgada grande, e peitos que hoje seriam julgados grandes. Claro: Marilyn era 200 bilhões de vezes mais gostosa do que Anne Baxter – duas mulheres cheias, gostosas, uma mais que a outra.
Se tivesse tido a infelicidade de começar a carreira em 2010, em vez de em 1950, Marilyn Monroe não teria começado a carreira. Seria considerada grande demais.
Tristes tempos, os anoréxicos anos 2000.
Uma penúltima observação minha, antes de dar uma olhada em outras opiniões: que final brilhante, siô! Que maravilha de solução dramática Mankiewicz encontrou. É absolutamente espetacular.
Quatro das atrizes do filme tiveram indicações ao Oscar
Diz o livro 1001 Filmes para Ver Antes de Morrer: “Evitado durante quatro anos por outros estúdios, a combinação do roteiro cínico e espirituoso de Mankiewicz com um elenco de alto calibre transformou a história em um enorme sucesso cinematográfico. Recebendo 14 indicações ao Oscar, um recorde para a época, A Malvada ganhou seis estatuetas, incluindo as de melhor filme e melhor ator coadjuvante (George Sanders), assim como as de melhor direção e melhor roteiro para Mankiewicz. Bette Davis, Anne Baxter, Celeste Holm e Thelma Ritter foram indicadas, tornando-o o recordista de indicações femininas.”
A atriz que levou o Oscar naquele ano – vencendo tanto Bette Davis quanto Anne Baxter – foi Judy Holliday, por Nascida Ontem.
Diz o livro 501 Must-See Movies: “Mankiewicz obteve sucesso na recriação de um mundo dentro do mundo, habitado por personagens tão mordazes e memoráveis que é fácil ser transportado para as luzes e os rostos maquiados do palco cintilante.”
A crítica de Pauline Kael: “Ersatz de arte de nível muito alto, e um dos filmes mais saborosos já feitos. Jovem aspirante a atriz, Eve Harrington (Anne Baxter) faz intrigas para tomar o lugar de uma estrela que envelhece, Margo Channing (Bette Davis), no palco e na cama, e a batalha se trava com unhas, dentes e uma bateria de epigramas. O sintético tem suas qualidades próprias – volúvel, superexplícito, presunçoso, o estilo literário tipo ‘Você é traiçoeira e corrupta, mas eu também sou – pertencemos uma à outra, querida’. O mau-gosto do roteirista-diretor Joseph L. Mankiewicz, exibido com verve, é mais engraçado que o bom gosto cauteloso, discreto e desidratado. Sua bobagem sobre ‘teatro’ é salva por uma interpretação que é o produto autêntico: Bette Davis no auge do instinto e da segurança. A atriz que ela interpreta – vaidosa, apavorada, uma mulher que vai longe demais em suas reações e emoções – faz a coisa toda vibrar (embora seja difícil acreditar que Anne Baxter algum dia pudesse ameaçar Bette Davis).”
Pois eu repito: A Malvada é um dos melhores filmes da História.
A Malvada/All About Eve
De Joseph L. Mankiewicz, EUA, 1950.
Com Bette Davis (Margo), Anne Baxter (Eve), George Sanders (Addison DeWitt), Celeste Holm (Karen), Gary Merrill (Bill Simpson), Hugh Marlowe (Lloyd Richards), Gregory Ratoff (Max Fabian), Barbara Bates (Phoebe), Thelma Ritter (Birdie), Marilyn Monroe (Miss Casswell)
Roteiro Joseph L. Mankiewicz
Baseado na história The Wisdom of Eve
Fitigrafua Milton Krasner
Música Alfred Newman
Produção Daryl F. Zanuck, 20th Century Fox. DVD Fox.
P&B, 138 min
R, ****
Olá, Sergio!
Nesse ano o Oscar foi disputado entre A Malvada e Crepusculo dos Deuses!
Decisao difícil, hein?
Abraço!
Oi, Sérgio,
fiquei aqui pensando no título do filme e sua tradução. É viagem minha ou poderia ter a ver, “All About Evil”? E assim o título em português ter sua pertinência? Pergunto porque a tradução dos títulos geralmente apenas apelam para o aspecto comercial. Enfim, como você fez um brilhante ensaio, como semppre, restou-me apenas este ou esse aspecto.
Um grande abraço e dê uma olhadinha carinhosa no meu comentário sobre “Les Mistons”
Glória, querida, é muito interessante, acho, você pensar em All About Evil, o que abriria a possibilidade de se partir’ para o título em português falando de maldade. Não dá, é claro, para saber se o realizador pensou na proximidade entre Eve e evil. Mas acho que os distribuidores brasileiros quiseram mesmo foi buscar um título atrativo, apelativo.
Sobre o Truffaut. Legal que eu tenha chamado sua atenção para a paixão dele para as pernas das mulheres. E, sim, eu ainda estou devendo um texto sobre Jules et Jim. Ainda não tive coragem…. Mas um dia escrevo.
Um abraço!
Sérgio
Rafael, de fato era uma disputa dura, né? Bons tempos…
Chegando atrasada pra dizer absolutamente nada, apenas juntar minha voz ao coro de “um dos melhores filmes da História”. Sou completamente fascinada por Bette Davis, nem sei explicar, basta ela aparecer e parece que o mundo se organiza e tudo passa a ter mais sentido e intensidade (até Jezebel).
Não lembro a primeira vez que vi A Malvada, mas lembro a mais recente, vi com uma amiga que nunca tinha visto um filme de antes de 1980 e poucos. Em sequencia vimos Casablanca, este e Butch Cassidy. Ela olhou-me e disse: nunca pensei que pudessem existir diálogos assim no cinema.
É tão bom vir aqui Sérgio e ler seus ensaios como também os comentários que seguem. Para Rafael, eu digo, o que seria de Crepúsculo dos Deuses se não tivesse a espetacular, esplendorosa Glória Swanson, e para Luciana, concordo em gênero, número e grau, Bette Davis tem uma presença tão marcante que torna-se quase impossível não gostar de qualquer filme atuado por ela. Sua amiga teve uma ótima iniciação através de Casablanca e Butch Cassidy. Espero que ela continue interessada em ver filmes bons do passado, que por sua qualidade, continuam atemporais. Eu sempre digo, “quanto mais assisto a filmes novos, mais eu gosto dos antigos.” Claro que é uma posição bem questionável, já que há muitos bons filmes atuais, a prova disso é vir aqui, ler Sérgio e conferir depois. Mas eu sou nostálgica, sobretudo quando trata-se de cinema.
Esse filme é maravilhoso, assisto sempre
Lindo, e a Bette Davis é maravilhosa….
Muito embora só esteja escrevendo agora, vi este filme as 14HS de ontém,no canal TCM da NET,versão dublada. Mais um maravilhoso exemplo do cinema de verdade. Cinema da mais pura qualidade. Eu me sinto gratificado após assistir um filme deste gabarito.
Meu Deus !! Bette Davis !! Como essa mulher era linda (ao menos para mim). Que olhar !!
Aliás, falando nisto, me fez lembrar a música
“Bette Davis Eyes” que Kim Carnes fez em homenagem à ela (Bette)e, que fez muito sucesso. De fato, os olhos da Bette,aquele olhar era penetrante. Já vi alguns filmes com Bette,onde ela era “a malvada”,”a forte”
“a cruel”.Neste aqui,fiquei surpreso porque a malvada não era ela. Mas,logo depois, já dá
para se perceber quem é a “dita”.
Me fez lembrar também que a nossa Maravilhosa
(falecida),Ida Gomes,dublou a Bette em muitos
filmes. Eu diría que ela era a dubladora oficial da Bette.
O final do filme, tu não disseste,Sergio e, não serei eu que vou fazê-lo mas, de fato, foi um final maravilhoso.
MARAVILHA DE FILME !!!!
Puxa vida ! ! Eu esqueci um detalhe.Não quero
aparecer nem nada parecido, não tenho cacife para isso. Realmente a Bette não ganhou o Oscar com este filme mas,como não vi nenhum comentário a respeito,eu li que ela ganhou o premio de melhor atriz no festival de cannes com este mesmo filme.
Obrigado.
Assistia sempre na Sessão Classe A da Globo e no TCM, quando este passava filmes bons. O fime também me lembra muito a excelente Ida Gomes que dublava Bette com perfeição.
Este é um dos meus filmes favoritos! E eu amo Bette Davis, que atriz esplendorosa! Ela salta da tela, parece que vai estapear a gente. Já a Anne Baxter, que foi ótima em O Fio da Navalha, aqui não gosto tanto, ela entrega as intenções de Eve logo nas primeira cenas no camarim, não me convence. Todo o resto do elenco é bárbaro em especial a sempre injustiçada Thelma Ritter.
Você disse que gostaria de saber dos bastidores do filme, no youtube tem um mini documentário sobre All About Eve:
Backstory – All About Eve (Behind the Scenes Documentary)
https://www.youtube.com/watch?v=a98Bcu55nAM
Já vi tantos filmes, inclusive um anterior a esse, que não me lembro o nome, com uma história parecida. Sinceramente, o filme só tem dois atrativos: Margot/Bette Davis, com seu visual de diva decadente e humor ácido, e Marilyn Monroe, jovem e assustada no meio do serpentário. A história, em si, não reproduz o mundo do teatro. Para começar, ninguém roubaria o personagem de Margot sem ter, no mínimo, uma enorme bagagem teatral. O ofício exige anos de treino, leitura, preparação, sem falar nos incansáveis ensaios e no trabalho de direção de atores, ocupação do espaço cênico etc. Claro que se trata de ficção, mas esse trabalho de Joseph L. Mankiewicz não é algo genial, revelador, original e muito menos real. Por sorte, teve a felicidade de conseguir Bette Davis, com anos de estrada. Com certeza nem precisou dirigi-la. Aliás, Mankiewicz, era um diretor de altos e baixos. Depois desse clássico, rodou o tolo People Will Talk/Dizem que é pecado. Ele não gostava de Marilyn. Alguns anos depois, não a aceitou como estrela, talvez porque visse nela a própria dificuldade de se manter no topo como realizador. O grande filme do Oscar, de 1950, chama-se Crepúsculo dos Deuses. Esse, sim, retrata o que acontece nos bastidores e como artistas são descartados.