Acima de Qualquer Suspeita / Presumed Innocent

Nota: ★★★★

Acima de Qualquer Suspeita, que Alan J. Pakula dirigiu em 1990, com base no primeiro romance de Scott Turow, é um dos melhores thrillers de tribunal que há. Tive certeza disso ao rever o filme novamente agora, 30  anos depois do lançamento.

Continua tão forte, tão bem elaborado, tão impactante quanto me pareceu três décadas atrás.

A história criada por Scott Turow e publicada em 1987, quando ele era um jovem advogado de sucesso em sua cidade natal, Chicago, aos 38 anos de idade, é um absoluto brilho, coisa de gênio. O sucesso foi imediato e fantástico, em especial para um autor estreante: a primeira edição em capa dura vendeu 1 milhão de exemplares; o livro ficou 44 semanas na lista dos mais vendidos do New York Times.

Não foi nada à toa, assim, que diversos produtores entraram numa disputa pelos direitos de filmagem do romance antes mesmo que ele fosse lançado:

“O manuscrito do romance tenso de Turow foi visto pela primeira vez por executivos de Hollywood e agentes nove meses antes de sua publicação em 15 de julho de 1987”, diz um texto com informações sobre a produção no DVD do filme, lançado pela Warner Bros., o estúdio que produziu Presumed Innocent. “Virou imediatamente objeto de uma guerra de ofertas. Turow eventualmente fechou com os produtores Sydney Pollack e Mark Rosenberg. Embora Pollack tivesse já afirmado que sua intenção era produzir, e não dirigir o filme, Turow sabia que estaria nas boas mãos do diretor Alan J. Pakula.”

Alan J. Pakula (1928-1998) é um grande diretor. Talvez seja um dos diretores americanos da segunda metade do século XX mais subestimados pela critica – embora tenha feito filmes importantes, marcantes, como, para citar só alguns, Klute, O Passado Condena (1971), Oscar de melhor atriz para Jane Fonda, Todos os Homens do Presidente (1976), oito indicações ao Oscar, quatro estatuetas, e A Escolha de Sofia (1982), Oscar de melhor atriz para Meryl Streep.

Esses aí foram alguns dos 16 filmes que Pakula dirigiu, entre 1969 e 1997. Mesmo antes de estrear na direção, no entanto, Pakula já havia contribuído para o cinema como produtor da obra-prima O Sol é Para Todos/To Kill a Mockinbird (1962) e de belos filmes como O Preço de um Prazer/Love with the Proper Stranger (1963) e O Gênio do Mal/Baby the Rain Must Fall (1965 – todos os três dirigidos por Robert Mulligan, outro dos grandes diretores de Hollywood que não têm o respeito amplo da crítica que merece.

Além de realizador e produtor de ótimos filmes, Pakula tinha ainda uma outra qualidade para fazer uma bela adaptação do romance de Turow para o cinema: ele sabia muito bem tratar em seus filmes de taras, obsessões sexuais, manias sexuais. Esse havia sido o tema central de Klute, e ele voltaria ao assunto em Jogos de Adultos/Consenting Adults (1992).

Obsessão sexual é uma característica importante da trama de Acima de Qualquer Suspeita.

Muitas vezes o julgamento não mostra a verdade

“Sou o promotor. Represento o Estado. Aqui estou para lhes apresentar as provas de um crime. Juntos, vocês vão avaliar essas provas. Vão deliberar a respeito. E decidirão se confirmam a culpa do réu.”

É assim que começa Acima de Qualquer Suspeita, o livro. Quem está falando é Rusty Sabich, promotor do Condado de Kindle – ele está contando para o leitor como começa seu discurso inicial num julgamento.

Acima de Qualquer Suspeita, o filme – seguindo o roteiro escrito por Frank Pierson e Alan J. Pakula, com tratamento final do realizador –, começa com uma tomada de um salão de tribunal vazio, as cadeiras reservadas para os jurados bem à vista. A câmara vai fazendo um suavíssimo zoom em direção ao local onde se senta o júri, enquanto ouvimos em off a voz inconfundível de Harrison Ford, o ator que faz Rusty Sabach:

“Sou um promotor. Sou parte do negócio de acusar, julgar e punir. Eu exploro as provas de um crime e determino quem deve ser acusado, quem deve ser trazido a esta sala para ser julgado perante seus pares. Eu apresento minhas evidências ao júri e ele delibera sobre elas. Os jurados devem determinar o que de fato aconteceu. Se eles não conseguem, não saberemos se o acusado merece ser libertado ou ser punido. Se eles não conseguem encontrar a verdade, o que será de nossa esperança por justiça?”

Mais tarde, em 1996, em seu quarto romance, As Leis de Nossos Pais, Scott Turow demonstraria, tintim por tintim, aquilo que muitos de nós sabemos, mas essas alegações iniciais de Rusty Sabach fingem ignorar: muitas vezes, o que é mostrado durante um julgamento passa bem longe da verdade dos fatos. Muitas vezes – muitas, muitas vezes nunca se descobre o que realmente aconteceu na cena do crime, e o que se vê no tribunal do júri não passa de uma pecinha de teatro mal escrita e mal encenada.

Mas voltemos ao início de Acima de Qualquer Suspeita.

Cabe a Rusty investigar a morte da ex-amante

Quando a ação começa, estamos a poucos dias da eleição para o cargo de promotor de Justiça do Condado de Kindle. O atual ocupante do cargo, Raymond Horgan (o papel do grande, no sentido mais literal possível, Brian Dennehy, na foto abaixo), é candidato à reeleição, mas ele está sendo ameaçado pelo outro candidato, seu antigo rival, Nico Della Guardia (Tom Mardirosian), um tipinho – o espectador logo verá – bem desagradável, nojento mesmo.

O braço direito de Della Guardia é tão nojento quanto ele mesmo. Chama-se Tommy Molto (Joe Grifasi). Nós veremos os dois em atuação no tribunal, quando começar o julgamento que ocupa boa parte dos 127 minutos do filme.

O braço direito do promotor Horgan, o segundo homem na promotoria, é Rusty Sabich.

Rusty nos é mostrado como um sujeito sério, honesto, competente, trabalhar. É casado com Barbara, uma mulher atraente (talvez o melhor papel da carreira de Bonnie Bedelia, na foto acima), tem um filho aí de uns 10, 12 anos, simpático, inteligente. Moram numa bela, confortável casa, um tanto distante do prédio da procuradoria de Justiça. Barbara costuma levá-lo de carro até a estação de ferry-boat, que ele usa para atravessar o grande rio que atravessa o Condado de Kindle, rumo ao centro da cidade, onde fica a procuradoria.

Ao chegar à sua sala de trabalho, pela manhã, no dia em que começa a ação, Rusty recebe da secretária um envelope e a informação de que o chefe quer vê-lo imediatamente. Ele abre o envelope de tal forma que a câmara do diretor de fotografia Gordon Willis (o grande Gordon Willis, 1931-2014, Oscar honorário “por insuperável maestria de luz, sombra, cor e movimento”) possa exibir para o espectador a mensagem contida ali. O papel tem o timbre do “escritório de Carolyn Polhemus”, e ali está escrito, em letras maiúsculas: “Pare. Eu sei que é você!”

Rusty põe o papel de volta no envelope e o envelope dentro do bolso do paletó, e vai até a sala de Raymond Horgan. Raymond dá a notícia: – “Carolyn Polhemus foi assassinada ontem à noite.”

Um assistente de Horgan em seguida passa para Rusty as informações que a promotoria já havia recebido a respeito do assassinato. Horgan pede a seu auxiliar direto que tome conta do caso pessoalmente. Que deixe de lado tudo o que está fazendo e se concentre na investigação da morte da colega deles da promotoria. – “Você é o único cara aqui em que eu posso confiar. Pegue o bandido”.

O filme está chegando aos 8 minutos, neste momento.

Dali a pouco vemos Rusty Sabich queimando o bilhete que recebeu de Carolyn Polhemus.

Quando ele chega em casa, Barbara está deitada na cama do casal, sobre as cobertas, um tanto despenteada, um tanto suada. Ele pergunta se ela estava malhando, ela responde que estava se masturbando – “o refúgio da esposa solitária”. Falam um pouco das coisas dela: após muitos anos afastada de tudo para cuidar da casa e do filho, Barbara está naquele momento tocando sua tese de pós-gradução em Matemática, tentando retomar a carreira acadêmica.

Na TV ligada, fala-se da morte da assistente da promotoria Carolyn Polhemus. Quando Rusty conta para a mulher que é ele que vai cuidar pessoalmente da investigação da morte da colega, por ordem do chefe, Barbara reage com a seguinte frase:

– “São 150 advogados na promotoria, e não acharam um que não tivesse trepado com ela para investigar?”

O filme está chegando aos 14 minutos.

Quando o filme está com 16 minutos, Rusty está diante do caixão de Carolyn Polhemus, na cerimônia religiosa que precede o enterro.

Ele está olhando para o caixão – e aí, pela primeira vez, a câmara mostra Carolyn Polhemus viva. É um close-up – ela está deitada de bruços, seu rosto está virado para a câmara. Só vemos o rosto e o ombro direito dela, em primeiro plano – ela está nua, e é uma mulher lindérrima, absurdamente bela.

Greta Scacchi estava com 30 anos, e nunca esteve tão esplendorosamente bela quanto no papel dessa Carolyn Polhemus, uma mulher que enlouquecia os homens que passavam à sua frente.

“A mulher era coisa ruim”, diz dela o detetive Lipranzer (John Spencer), o amigo mais próximo de Rusty no seu trabalho. “The lady was bad news”, é o que ele diz no original – e diz isso mais de uma vez.

“The destroyer”, dirá bem mais tarde alguém. A destruidora.

Quando o filme está com 50 minutos, pouco menos da metade de seus 127 de duração, Tommy Molto, o nojento sabujo do não menos nojento Nico Drella Guardia, anuncia para Rusty que tem provas de que ele foi o assassino de Carolyn Polhemus.

Scott Turow criou todo um mundo

Não adianta tentar achar no mapa o Condado de Kindle. onde se passa toda a história do livro e do filme. Localizado no Meio Oeste americano, no ponto em que se encontram as fronteiras de três estados, banhado por um grande rio, e fartamente descrito pelo autor, o Condado de Kindle é um mundo criado por Scott Turow,

O sujeito não criou apenas um grupo de personagens – inventou também todo um mundo em que eles vivem. Algo talvez como o mundo inventada por J. R. R. Tolkien em seus livros – com a diferença de que o Condado de Kindle é exatamente igual às metrópoles americanas, e tudo o que acontece lá é exatamente igual à vida real.

Tive uma profunda paixão pelos livros de Scott Turow, nos anos 90 e também na primeira década do novo século. Apenas três anos após Acima de Qualquer Suspeita, em 1990, ele lançou The Burden of Proof, aqui O Ônus da Prova, em que o protagonista é o advogado Sandy Stern – o excelente profissional que, no primeiro livro, Rusty Sabach contrata para fazer sua defesa.

Personagens dos dois primeiros livros voltam a aparecer depois, nos romances seguintes do escritor. É uma realização impressionante, um conjunto de obras que tem uma grandiosidade fenomenal.

Tenho imenso respeito e admiração por autores que conseguem essa maravilha que é criar um personagem que atravessa várias obras – como por exemplo o grande Jacques Demy fez com sua Lola, seu Roland Cassard, que está em Lola, a Flor Proibida, de 1961, e reaparece em Os Guarda-Chuvas do Amor, de 1964.

The Burden of Proof deu origem a um telefilme em 1992, que foi exibido na TV brasileira; eu vi na época. O ótimo Hector Elizondo interpreta o advogado Sandy Stern, e o mesmo Brian Dennehy de Acima de Qualquer Suspeita faz o segundo personagem mais importante, um cliente de Sandy acusado de crimes financeiros.

Scott Turow é uma absoluta maravilha.

“Vinte e um anos depois de se sentar no banco dos réus acusado de ter assassinado Carolyn Polhemus, sua colega e amante, Rusty Sabich, ex-promotor, agora juiz-presidente do Tribunal de Recursos Estadual, torna-se suspeito de assassinar sua própria mulher, Barbara.”

Isso aí é o primeiro parágrafo – o lead, no jargão dos jornalistas – de um texto que escrevi em outubro de 2011, completamente embevecido com a leitura do romance número 9 de Turow, O Inocente/Innocent, publicado naquele mesmo ano.

O Inocente é uma beleza.

Houve um telefilme baseado no livro, no mesmo ano de 2011, Inocente/Innocent, dirigido por um tal Mike Robe. Não vi o filme, nunca me passou pela frente. Bons atores fizeram os personagens principais: Bill Pullman fez Rusty Sabich, Marcia Gay Harden fez Barbara Sabich e Alfred Molina fez Sandy Stern.

Um personagem sensacional, um grande e belo ator

Sandy Stern é um personagem riquíssimo, extraordinário, sensacional. Nasceu na Argentina – é um imigrante latino-americano que, devido ao grande esforço, ao estudo, e ao talento, conseguiu chegar a uma alta posição no mundo jurídico do Condado de Kindle, em que era considerado um dos melhores advogados de defesa da região.

Interessante que tenha sido interpretado por ótimos atores, todos eles de alguma forma ligados à América Latina – Hector Elizondo em The Burden of Proof, Alfred Molina nesse Innocent que eu não vi, e o grande, magistral Raul Julia neste Acima de Qualquer Suspeita aqui.

A figura bela, elegante, imponente de Raul Julia no papel de Sandy Stern só aparece na tela quando metade do filme já se foi.

Pouco antes, Rusty havia comentado com Barbara que precisaria de um bom advogado, um advogado caro – e Barbara, esposa solidária, apesar de traída, diz que eles poderiam hipotecar a casa, ou mesmo vender, para pagar os honorários de um bom advogado.

Sandy Stern se demonstra até envaidecido quando Rusty o procura: afinal, haviam duelado diversas vezes nos tribunais, Rusty como promotor, Sandy como advogado de defesa dos réus.

Não me lembrava de que Raul Rafael Carlos Julia y Arcelay viveu tão pouco. Vejo agora que, nascido em Porto Rico em 1940, morreu em 1994, portanto com apenas 54 anos de idade. Grande ator, Raul Julia talvez seja mais lembrado como o Gomez Adams dos dois A Família Addams, de 1991 e 1993, ao lado de Anjelica Huston e Christina Ricci. Mas um de seus melhores papéis, creio, foi o do ativista político Valentin Arregui em O Beijo da Mulher Aranha (1984), de Hector Babenco. E aí vale o registro: O Beijo não foi o único filme em que Raul Julia teve contato com o Brasil: em Luar Sobre Parador (1988), de Paul Mazursky, ele voltou a contracenar com Sônia Braga.

Para o espectador não identificar onde o filme foi rodado

Há dezenas, centenas de filmes americanos que fazem questão de não identificar em que cidade se passa a ação. É a melhor maneira de dizer que aquela história não é específica de uma cidade, que poderia ter acontecido em qualquer cidade do país.

No caso de Presumed Innocent, a situação é diferente. A ação se passa em um lugar que tem nome, um nome que é dito e repetido – só que é um lugar fictício. Tudo bem, é uma grande cidade, e, como dizia um dos personagens coadjuvantes de Sem Destino/Easy Rider (1969), todas as cidades grandes são iguais.

No entanto, os realizadores do filme, em respeito à idéia do autor do romance, fizeram questão de, nas tomadas gerais, as tomadas amplas, não focalizar nada que pudesse levar o espectador a identificar uma cidade específica. Ou seja: não poderia, de forma alguma, haver uma tomada da Ponte do Brooklyn, ou da Golden Gate, por exemplo. Não poderia haver uma tomada de skyline que fizesse o espectador identificar uma determinada cidade.

Não tinha reparado nisso, quando vi o filme na época do lançamento. Reparei agora: há muitas tomadas gerais da grande cidade que é o centro do Condado Kindle, algumas de dia, outras de noite. Mas não há nada que a gente possa dizer ah, isso aí é Nova York, isso aí é Chicago, isso aí é qualquer outra cidade.

As informações sobre a produção que estão no DVD lançado pela Warner falam desse assunto. Achei isso bem interessante.

“Fãs do romance juram que o filme foi rodado em Chicago”, diz o texto no DVD. “No entanto, o autor Scott Turow nunca menciona nada específico a não ser um fictício Condado Kindle. Nada menos de 11 cidades do Meio-Oeste foram examinas antes que os realizadores se definissem por Detroit. Já que Detroit era uma cidade pouco familiar

para a maioria dos americanos, era uma boa opção para fazer o papel de uma Cidade Qualquer do Meio-Oeste.”

Gostaria de fazer mais um registro, que tem a ver com o título escolhido pelos exibidores brasileiros.

O original, como já foi dito várias vezes, é Presumed Innocent – e em Portugal os exibidores foram literais: Presumível Inocente. Não foi só a Terrinha, no entanto: na França, o filme é Présumé Innocent; na Itália, Presunto Innocente; na Espanha, a mesma coisa, com uma letra a menos, Presunto Inocente.

Sim, é isso. A história que Scott Turow escreveu e Alan J. Pakula filmou trata de um homem que é presumivelmente inocente. Dele dá para se presumir que seja inocente, já que é um homem honrado, uma importante figura na Promotoria da grande cidade.

Acima de Qualquer Suspeita, o título brasileiro, remete inevitavelmente a um filme importante, marcante, Investigação Sobre um Cidadão Acima de Qualquer Suspeita, no original Indagine su un Cittadino al di Sopra di Ogni Sospetto, a obra-prima de Elio Petri em que o personagem interpretado por Gian Maria Volontè, um chefe de polícia, mata sua amante, interpretada pela bela, fascinante cearense Florinda Bulcão (ou Bolkan, para estrangeiro ver), apenas pelo gosto de exercer seu poder e demonstrar que nenhum dos seus investigadores terá coragem de acusá-lo pelo crime.

São dois homens acima de qualquer suspeita, o chefe de polícia italiano feito por Volontè, e este promotor Rusty Sabich, o segundo homem na promotoria de Justiça do fictício Kindle County. Mas é só isso que têm em comum. Nada mais.

Já houve outro filme que no Brasil teve exatamente esse mesmo título, Acima de Qualquer Suspeita – e é um bom filme, no original Beyond a Reasonable Doubt, de 2009, dirigido por Peter Hyams. Esse aí, por sua vez, era a refilmagem de Beyond a Reasonable Doubt de 1956, do grande Fritz Lang, que no Brasil se chamou Suplício de uma Alma. Fica até confuso…

Um dos maiores medos que há: ser acusado injustamente

Leonard Maltin deu 3 estrelas em 4 para o filme: “Versão sólida, com atores bem escolhidos, do crepitante best-seller de Scott Turow sobre um promotor incumbido de investigar o assassinato de uma sexy promotora assistente com a qual ele tinha tido um caso. Logo ele próprio é acusado do assassinato! Às vezes lento, o filme não alcança seu potencial para a grandeza, mas ainda assim tem muitos momentos poderosos.”.

Que coisa!

Quando neguinho faz um guia com sinopses de quase 16 mil filmes, é duro, né não? Mesmo se a gente considerar que ele tinha uma boa equipe. O último Movie Guide de Leonard Maltin editado em papel – aquela coisa antiga, paquidérmica, dinossáurica… papel, ai, que horror! – trazia o nome de 11 colaboradores. Mas, em última instância, o cara que assina o guia é o  responsável pela obra.

“Às vezes lento, o filme não alcança seu potencial para a grandeza.” O que raios quer dizer isso?

Roger Ebert, o mais maravilhoso crítico de filmes, na minha opinião, deu 3.5 estrelas no total de 4. Transcrevo trechos de seu longo texto:

Presumed Innocent tem em sua base um dos mais fundamentais medos do homem civilizado – o medo de ser acusado de um crime que não cometeu. Esse medo está no cerne de mais da metade dos filmes de Hitchcock, e é uma razão pela qual eles funcionam para todos os tipos de audiências. Todo mundo conhece esse medo. O filme é baseado em um romance best-seller de Scott Turow que ficou famoso por seu conteúdo sexual explícito – por causa do detalhe em que se examinam provas ginecológicas chocantes – e no entanto o sexo não teria vendido tantos exemplares sem o medo.”

Mais adiante ele diz: “Pakula já fez versões cinematográficas de livros difíceis: A Escolha de Sofia e Todos os Homens do Presidente estão entre seus filmes. Desta vez, seu desafio era evitar cair nos detalhes das provas circunstanciais e forenses, que dão boa leitura mas podem se estender em intermináveis diálogos em um filme. A adaptação da novela de Turow fez um bom trabalho ao apresentar as provas quando necessárias, e não mais do que quando necessárias, enquanto permitia que os personagens se mostrassem ao público.”

O Guide des Films de Jean Tulard diz sobre Presumé Innocent: “Filme policial muito bom, mesmo que o culpado seja descoberto logo. O desenrolar do processo, com seus golpes de teatro, é particularmente fascinante, enganando o espectador com pistas falsas.”

Esquisito: não se descobre logo o culpado, de jeito algum. Bem ao contrário: é só na última sequência.

Acima de Qualquer Suspeita é uma beleza de filme.

 Anotação em fevereiro de 2021

Acima de Qualquer Suspeita/Presumed Innocent

De Alan J. Pakula, EUA, 1990

Com Harrison Ford (Rusty Sabich, o segundo da promotoria)

e Brian Dennehy (Raymond Horgan, o promotor), Raul Julia (Sandy Stern, o advogado), Bonnie Bedelia (Barbara Sabich), Paul Winfield (juiz Larren Lyttle), Greta Scacchi (Carolyn Polhemus, promotora assistente), John Spencer (detetive Lipranzer), Joe Grifasi (Tommy Molto), Tom Mardirosian (Nico Della Guardia), Anna Maria Horsford (Eugenia), Sab Shimono (Kumagai, o legista), Bradley Whitford (Jamie Kemp), Christine Estabrook (Mac, da promotoria), Michael Tolan (Mr. Polhemus), Madison Arnold (sargento Lionel Kenneally), Ron Frazier (Stew Dubinsky), Jesse Bradford (Nat Sabich, o filho de Rusty e Barbara)

Roteiro Frank Pierson e Alan J. Pakula

Baseado no romance de Scott Turow

Fotografia Gordon Willis

Música John Williams

Montagem Evan Lottman

Direção de arte George Jenkins

Figurinos John Boxer

Produção Sydney Pollack, Mark Rosenberg, Warner Bros. DVD Warner Bros.

Cor, 127 min (2h07)

Disponível em DVD.

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