(Disponível no YouTube em 8/2023.)
Um dos cartazes originais para o lançamento de Golden Boy, no Brasil Conflito de Duas Almas, em outubro de 1939, tinha uma imagem que é a mais perfeita propaganda enganosa, e uma frase que até era em parte verdadeira. Não há nada, absolutamente nada no filme parecido com a figura de uma mulher deitada de braços abertos para um homem que se aproxima dela para – cráu!
A frase é: “O romântico sucesso dos palcos que capturou uma nação…” Bem, a peça em que o filme se baseia não é exatamente romântica. Escrita por Clifford Odets – saudado já à época como um nome importantíssimo da dramaturgia americana, um autor que influenciou gente como Arthur Miller, Paddy Chayefsky, Neil Simon e David Mamet –, a peça Golden Boy era, como quase tudo o que o escritor fez, um drama com tons sociais.
O garoto de ouro do título, um filho de imigrantes italianos, de 21 anos de idade, tinha talento para a música, tocava violino – mas abandona o gosto pela arte pela tentação de ganhar muito dinheiro com o boxe.
A peça foi, de fato, um imenso sucesso, com 250 apresentações no Belasco Theatre de Nova York, encenada pelo respeitadíssimo e influente The Group Theatre e, se não chegou a capturar a nação inteira, dá para dizer com toda certeza que causou imenso impacto na crítica e no público. (Teve reapresentações anos e anos mais tarde, e foi até transformada em musical.)
A peça estreou em novembro de 1937, e o filme veio logo em seguida – foi lançado em outubro de 1939. Era uma produção bem cuidada da Columbia Pictures, com direção do prestigiado, respeitado, premiado Rouben Mamoulian, e estrelado pelo veterano Adolphe Menjou e pela já então grande estrela Barbara Stanwyck – linda de morrer, uma figura magnética, esplendorosa.
Para o papel do garoto de ouro do título, foram entrevistados 5 mil pretendentes; mais de 80 foram selecionados para fazer testes de tela. O escolhido, um rapaz que em 1939 tinha 21 anos de idade, exatamente como Joe Bonaparte, o personagem-título, não foi do agrado de Harry Cohn, o todo-poderoso chefão da Columbia – e teria sido demitido após a primeira semana de filmagens se não tivesse sido defendido vigorosamente não apenas pelo diretor Mamoulian mas também por Barbara Stanwyck.
O estreante com que Harry Cohn não foi com a cara viria a ser um dos mais famosos e adorados atores do cinema americano. E, 15 anos depois de Golden Boy, em 1954, Barbara Stanwyck e William Holden atuariam juntos de novo, em Um Homem e Dez Destinos/Executive Suite, de Robert Wise.
Na cerimônia do Oscar de 1978, puseram os dois juntos no palco para entregar o prêmio de melhor som. Holden – que, consta, mandava entregar flores na casa de Barbara a cada ano, no aniversário do primeiro dia das filmagens de Golden Boy – fez um discurso agradecendo mais uma vez à estrela. Ela conseguiu dizer um “Ah, Bill.,..” – e começou a chorar.
Barbara Stanwyckj fez 107 filmes e ou séries, foi indicada quatro vezes ao Oscar, mas não ganhou nenhum. Aí, em 1982, finalmente recebeu um prêmio honorário, pelo conjunto da obra, “pela criatividade superlativa e contribuição única à arte de atuação na tela”. William Holden havia morrido quatro meses antes, e ela discursou: “Ele sempre desejou que eu ganhasse um Oscar e então, esta noite, meu Golden Boy, você realizou seu desejo!”
O rapaz se apaixona pela namorada de seu agente
Quando o filme foi lançado, o dramaturgo Clifford Odets já havia sido convidado para atravessar o país de Nova York para Los Angeles, e trabalhar nos grandes estúdios. Hollywood sempre importou talentos de todas as partes dos Estados Unidos e do mundo; grandes nomes da literatura como F. Scott Fitzgerald, John Steinbeck, Raymond Chandler, Dashiell Hammett foram convidados para escrever roteiros.
Haveria absoluta lógica se Odets fizesse ele próprio a adaptação de sua peça para o cinema – mas não foi isso que aconteceu. O roteiro do filme foi escrito por quatro pessoas, trabalhando juntas, a oito mãos – algo que é extremamente comum no cinema italiano, mas não tanto no americano. Assinam o roteiro de Golden Boy Lewis Meltzer, Daniel Taradash, Sarah Y. Mason & Victor Heerman.
Há versões para explicar por que o próprio dramaturgo não adaptou sua obra, e há opiniões bem díspares sobre o resultado da transformação da peça em filme – mas antes creio que é necessário apresentar um resumo, uma sinopse da peça. A Wikipedia tem uma boa, bem detalhada. Vou usá-la como base:
Joe Bonaparte, um jovem de ascendência italiana, violinista talentoso, sonhava em ser músico profissional, para imensa felicidade de seu pai, que havia se estabelecido em Nova York como dono de um mercadinho de bairro, e investe uma pequena fortuna para comprar um bom violino de presente para o filho no dia de seus 21 anos. Joe, no entanto, também tinha talento para o boxe, e fica conhecendo Tom Moody, um agente de boxeadores que já havia tido clientes importantes mas, naquele momento, não ia lá muito bem. Joe vence uma luta, e passa a treinar sob a orientação de Tom Moody.
Passam-se os meses, e Joe vai acumulando vitórias nos ringues e ganhando muito dinheiro, para alegria de Moody e sua secretária e namorada Lorna Moon, e para a profunda tristeza de Bonaparte pai.
O avanço de Joe no mundo do boxe chama a atenção de Eddie Fuseli, um conhecido gângster, que intima Tom Moody para que divida com ele o agenciamento de Joe, as tomadas de decisão sobre a carreira do rapaz.
Moody já havia percebido que Joe se dava bem com Lorna – e então pede à namorada que converse com o rapaz, tente convencê-lo de que trabalhar com o gângster não trará nada de bom para ele.
Joe, na verdade, estava apaixonado pela namorada de seu agente. E Lorna também se descobrira apaixonada pelo rapaz.
Hum… Acho que já está bom. Dá uma boa idéia da trama da peça. Não é necessário avançar para mais adiante.
Pauline Kael diz que a peça foi “amaciada”
Sim: o roteiro não é a reprodução fiel da peça. Isso é claro, é óbvio – e, diabo, reprodução fiel do que é apresentado no palco não é exatamente cinema.
Pelo que li após ver o filme (e li até que um tantinho), pelo que pude perceber, o roteiro escrito pelos quatro profissionais é bastante fiel ao espírito da peça – com exceção do final, que é completamente diferente.
Harry Cohn não admitiria um final trágico como o da peça, dizem várias fontes. O quê? As pessoas saírem de casa, irem ao cinema, pagarem seu dinheirinho – e ver um final infeliz? Sair do cinema frustrados, tristes? Ah, mas nem f…, deve ter esbravejado o chefão da Columbia. E então temos que, ali pelos 44 minutos do segundo tempo, o que na peça ia para a direita, ou para o Norte, no filme vai para a esquerda, ou para o Sul. Sem que esquerda ou direita, Sul e Norte, aí, tenham qualquer conotação ideológica, tá?
Mas, tirando a mudança absoluta do final, penso, sinto que o filme foi bem fiel ao espírito da peça – mesmo com as alterações que foram feitas.
Pauline Kael diz que “o papel de Lorna Moon foi ampliado para ser suficiente para Barbara Stanwyck, e a peça foi amaciada, rearranjada e distorcida para prover um happy ending”. “Ainda assim” – diz Dame Kael – o material de Odets ainda tem sua força dramática”.
A crítica do New York Times na época do lançamento faz rasgados elogios a pontos do roteiro – e mais adiante vou transcrever boa parte do texto, uma maravilha. Só quis registrar isso aqui logo depois de Pauline Kael dizer que a peça teria sido “amaciada, rearranjada e distorcida”. Acho que a prima donna da crítica americana deu aí uma bela exagerada.
Agora, que a peça foi mexida, isso é evidente – e Dame Kael seguramente acerta quando diz que o personagem de Lorna Moon foi amplificado no filme, já que, diabo, a mulher era representada por Barbara Stanwick.
Duas pessoas vivendo dúvidas, conflitos internos
Pelo que mostra o detalhado resumo da peça feito pela Wikipedia, e pelo que se pode deduzir com a simples ajuda da lógica, o centro condutor da peça, evidentemente, é o personagem título, o Golden Boy. Só que, no cinema, o garoto de ouro era interpretado por um novato, um desconhecido – e eram os astros que fazia as pessoas saírem de casa para gastar seus dólares na bilheteria dos cinemas.
Assim, de maneira esperta, o roteiro aumentou a importância dos personagens interpretados por Adolphe Menjou e Barbara Stanwyck, o casal Tom Moody e Lorna Moon. O filme abre no escritório do agente de esportistas – ele está recebendo um telefonema da esposa, de quem quer se divorciar. Para conceder o divórcio, a mulher pede uma fortuna.
O fato de Tom Moody querer se divorciar para oficializar a união com a namorada torna a existência de Lorna mais palatável para os moralistas de plantão – e, em especial, para os censores que exigiam o cumprimento do Código Hays, o conjunto de regras de autocensura aceita pelos estúdios.
Só um pouco mais tarde aparece na história o jovem Joe Bonaparte. O rapaz procura Tom Moody na esperança de que ele aceite ser seu agente. Tom a princípio não vai nada com a cara do rapaz – mas a sorte ajuda Joe. O boxeador que Tom tinha sob contrato tem um acidente, é impedido de continuar lutando. Já que o rapaz estava por lá, pedindo uma chance, Tom arranja uma luta para ele – e Joe vence, a primeira de muitas.
Não acho que aumentar a importância no roteiro dos personagens dos dois grandes astros atrapalhe a história. De maneira alguma.
O cerne da trama é – exatamente como na peça – o fato de que o rapaz Joe precisará fazer a opção entre a música, a arte, sua inclinação natural, e o boxe, esse esporte brutal, violento, que daria para ele muito mais dinheiro do que o violino.
Não sei como a peça trata disso, mas o filme tem, em segundo plano, em segundo lugar, uma outra dúvida, uma outra indecisão – a de Lorna, essa “dama de Newark”, como ela se define. Lorna se verá dividida entre Tom Moody, o homem mais velho que a ajudou quando ela estava na miséria, e por quem sentia grande afeto e gratidão, e o garoto de ouro, bem mais novo que ela, que surge de repente na vida do casal.
Duas pessoas em conflito interno. O título brasileiro, Duas Almas em Conflito, tem o tom melodramático que era muito comum nos títulos dps anos 30 e 40, e mesmo bem depois – ou não são melodramáticos títulos que nada têm a ver com os originais, tipo Os Brutos Também Amam, Amor, Sublime Amor, Depois Daquele Beijo, O Pecado de Todos Nós? Sim, Duas Almas em Conflito tem um tom melodramático – mas não é absurdo, fora de propósito.
Hollywood era fascinadíssima pelo boxe
O boxe. Hollywood tinha imensa fascinação pelo boxe – seguramente porque é imenso o número de norte-americanos que tem fascinação pelas lutas. Há belos, respeitáveis filmes sobre o mundo do boxe.
Marcado pela Sarjeta/Somebody Up There Likes Me (1956), a biografia de Rocky Graziano, com Paul Newman e Pier Angeli, de Robert Wise.
Punhos de Campeão/The Set-Up (1949), também de Robert Wise, com Robert Ryan, sobre agente que recebe suborno de um gângster.
Réquiem para um Lutador/Requiem for a Heavyweight (1962), de Ralph Nelson, com Anthony Quinn e, em participação especial, interpretando a si mesmo, Cassius Clay, que ainda não era Muhammad Ali, também sobre corrupção no mundo do boxe.
A Trágica Farsa/The Harder They Fall (1956), de Mark Robson, com Humphrey Bogart, em seu último filme.
Os vários filmes com o personagem Rocky, interpretado por Sylvester Stallone.
O maravilhoso Menina de Ouro/Million Dollar Baby (2004), de e com Clint Eastwood, ele no papel do veterano treinador que aceita trabalhar com uma moça, interpretada por Hilary Swank.
Touro Indomável/Raging Bull (1980), de Martin Scorsese, com Robert DeNiro, para muita gente o melhor filme sobre boxe que já foi feito. Isso, claro, para lembrar só alguns.
Bem, este Golden Boy, é bom enfatizar, não é propriamente um filme sobre boxe. É um drama sobre um jovem que tem que optar entre aquilo de que realmente gosta e aquilo que pode lhe dar rios de dinheiro. Mas o filme tem, já quase no final da narrativa, uma sequência de boxe absolutamente marcante, fortíssima, belíssima – a luta mais importante da vida do jovem Joe Bonaparte, no gigantesco Madison Square Garden, contra um grande campeão, conhecido como Chocolate Drop, gota de chocolate (o papel de James ‘Cannonball’ Green).
A sequência da luta de boxe no Madison Square Garden lotado é um dos pontos altos de Golden Boy – e é também o momento em que mais ousadamente o filme se distancia da peça teatral, ao lado do final, que passou de trágico para feliz. No teatro, o espectador não vê nada da luta. A luta acontece – mas dela se ouvem apenas alguns ruídos, e comentários dos personagens sobre ela.
E os admiradores do boxe, quem vibra com as lutas, esses seguramente não vão gostar nada, nada, nada da sequência impressionante e maravilhosa. Rouben Mamoulian fez ali uma crítica dura, feroz a essa violência que chamam de esporte, das mais virulentas que o cinema já fez.
“É o tipo de filme que podemos recomendar de coração”
A crítica publicada no New York Times assim que o filme estreou fala bastante dessa sequência. É assinada por Frank S. Nugent, saiu na edição de 8 de setembro de 1939 (meu Deus! Sete dias após o início da Segunda Guerra Mundial), e me pareceu excelente. É longa, mas vou transcrever; vale a pena.
“Golden Boy de Clifford Odets foi levado à tela do Music Hall como um filme interessante, agradável, dramático, mas dificilmente de primeira linha. Embora tenha mudado o final da alegoria de Odets, permanece, como um todo, uma tradução sincera, adulta e fiel do seu trabalho. Talvez essa fidelidade seja a principal falha do filme. (…) Há um excesso de diálogos, muitos deles repetitivos. Há uma tendência para a histeria quando o drama poderia ter sido mais bem servido pela intensidade dos atenuantes. Não pretendemos fazer qualquer tipo de crítica ao sr. Odets quando opinamos que o melhor do filme é quando ele se distancia de sua peça e insere uma ou duas sequências que a Broadway jamais viu.
“A sequência da luta, que a Broadway conhecia apenas como um barulho fora do palco e algo sobre o que os atores comentam depois, é um selvagemente eloquente exemplo de comentário social em linguagem cinematográfica. Naquela breve sequência, possivelmente não mais do que um centésimo de seu filme…”
Ahnn… Aí creio que o crítico exagerou. A sequência não é tão breve assim, de forma alguma. Dura bem uns cinco dos 99 minutos do filme. Mas vamos em frente.
“Naquela breve sequência, possivelmente não mais do que um centésimo de seu filme, Rouben Mamoulian usou sua câmara como um bisturi para dissecar uma multidão que vê uma luta no Madison Square Garden. Tudo o que qualquer pessoa precisa saber sobre uma arena de luta está ali, na tela: as caretas, os jogadores, as pessoas na última moda, os grupos raciais, os sádicos, os vagabundos quebrados virando suas cabeças com os golpes. O sr. Odets estava escrevendo sobre um lutador, mas ele não poderia ter escrito, em uma dúzia de peças, as coisas que a câmara conta nesta única cena. Não havia nada na peça sobre a visita do Golden Boy ao vestiário de seu oponente (…), onde há três negros…”
(Aqui, o crítico usa a palavra Negroes – “three Negroes”. Era 1939, ainda não havia o politicamente correto que proíbe algumas palavras. A palavra mais duramente proibida é nigger, mas negro também é tida como incorreta.)
“Não havia nada na peça sobre a visita do Golden Boy ao vestiário de seu oponente (…), onde há três negros e um par de luvas de boxe parece desolado em um banco no canto. Na tela, essa cena, também, é bela, e está além do poder de um dramaturgo. E esses são os pontos memoráveis do filme, os pontos realmente cinemáticos, enquanto todo o resto é nada mais que a repetição de uma peça. E isso não deve ser inteiramente deixado de lado, porque era uma boa peça, uma que você gostaria de ver.”
A partir daí o crítico fala um pouco sobre a trama, e comenta sobre os fatos que acontecem no final da luta no Madison Square Garden e nas sequências finais. Explica o que foi mudado para que o filme tivesse um happy ending, e assegura: “The change does no harm”.
“A mudança não faz mal. Como um todo, o filme tem boas interpretações, embora William Holden, o novato no papel-título, tenha sido culpado, em algumas cenas, por recuos exagerados, mordeduras de lábios e apertos de mãos que associamos à escola melodramática antiga. No total, no entanto, foi uma boa interpretação de um papel pouco usual. Como ‘a dama de Newark’, Barbara Stanwyck empregou a nota correta de cinismo e franqueza. Adolphe Manjou como o agente, Sam Levene como Siggie, Lee Cobb (enfaticamente) como o Bonaparte mais velho, Joseph Calleia como o gângster Fuseli (não exatamente o mesmo Fuseli que o sr. Odets conheceu) e os outros estão plenamente bem em seus papéis e fazem o melhor pelo espetáculo. É o tipo de filme que podemos recomendar de coração, apesar de suas deficiências.”
Que atriz fantástica era Barbara Stanwyck
Uma beleza de crítica, essa de Frank S. Nugent no New York Times. Não dá para dizer o mesmo do verbete de Leonard Maltin sobre o filme. Maltin deu 2.5 estrelas em 4: “A história de Clifford Odets sobre um rapaz com gosto pela música que se transforma em pugilista envelheceu mal; Holden, em sua estréia, ainda é bom, mas Cobb estraga tudo com sua imitação de Henry Armetta.”
Sei lá quem é Henry Armetta, mas, diacho, gostei demais da interpretação do velho e bom Lee J. Cobb, com um grande bigodão e muita maquiagem para parecer bem mais velho. Sim, há um certo exagero, ou bastante exagero, vá lá, em seus gestos largos, suas caretas de dor e tristeza, mas, diabo, ele interpreta um italiano emotivo, emocionado!
Ah, sim, Henry Armetta (1888-1945) nasceu na Sicília; adolescente ainda, embarcou clandestinamente em um navio rumo aos Estados Unidos. Tem 168 títulos em sua filmografia e, em vários deles, interpretou o papel de um italiano exuberante.
Lee J. Cobb, que faz o Bonaparte pai, de fato era bem pouco mais velho que William Holden, que faz o filho. Tinha 28 anos em 1939, quando o filme foi lançado, e Holden, 21.
Barbara Stanwyck tinha 32 anos. Na época, a diferença de idade – 11 anos! – entre os dois atores que na tela fazem um casal apaixonado deve ter causado espanto na audiência. Hoje em dia, nem tanto, mas nos anos 1930…
Um pouquinho sobre quem eram, em 1939, os dois atores mais famosos do elenco na época do lançamento do filme.
Adolphe Menjou (1890-1963) havia começado a carreira em 1914, um quarto de século antes, portanto. Havia feito o galã em diversos filmes. Em 1931, havia sido indicado ao Oscar de melhor ator, por Última Hora/The Front Page. Em 1932 já havia trabalhado ao lado de Barbara Stanwyck em A Mulher Proibida. Em 1950, trabalhariam juntos mais uma vez em Agora Sou Tua.
Era o primeiro filme de Barbara Stanwyck (1907-1990) na Columbia Pictures desde O Último Chá do General Yen (1932), seguramente o filme mais estranho, esquisito, inesperado do mestre Frank Capra, a história de um absolutamente improvável amor de um assassino cruel, um senhor da guerra da China, com a noiva de um missionário americano. O Último Chá tinha uma certa atmosfera de amor louco, folie à deux, uma coisa de atração sexual da sequestrada pelo sequestrador muito antes de surgir a teoria sobre a síndrome de Estocolmo. E Barbara – meu deus, mas que Barbara, aquela… – era a atriz perfeita para o papel, porque ela se especializou em papéis ousados, avançados, um tanto transgressores.
Isso, aliás, explicaria a mentira acintosa daquele cartaz do filme – o departamento de marketing da Columbia se aproveitou da imagem de atriz-que-faz-papéis-sensuais-ousados para botar a mulher deitada esperando o homem que chega pra cráu nela. Ih – pensaria o espectador -, é a Barbara Stanwick, e, pelo jeito, tem cena de sacanagem!
Tem nada – mas há, sim, uma tomada em que a câmara focaliza as pernas de Barbara Stanwyck. As pernas, não as coxas – que ela mostraria fartamente, por exemplo, no delicioso Bola de Fogo/Ball of Fire, dois anos depois, 1941. As pernas – a primeira parte do corpo de Phyllis Dietrichson que o vendedor Walter Neff-Fred MacMurray vê quando entra na casa dos potenciais clientes, na obra-prima do cinema noir Pacto de Sangue/Double Indemnity.
Que atriz fantástica era Barbara Stanwyck, meu Deus…
Anotação em agosto de 2023
Conflito de Duas Almas/Golden Boy
De Rouben Mamoulian, EUA, 1939
Com Barbara Stanwyck (Lorna Moon),
Adolphe Menjou (Tom Moody),
William Holden (Joe Bonaparte),
Lee J. Cobb (Mr. Bonaparte),
e Joseph Calleia (Eddie Fuseli, o gângster), Sam Levene (Siggie, o marido de Anna), Edward Brophy (Roxy Lewis, o sócio de Tom Moody), Beatrice Blinn (Anna, a irmã de Joe), William H. Strauss (Mr. Carp, o amigo de Bonaparte pai), Don Beddoe (Borneo, o treinadoir de Joe), James ‘Cannonball’ Green (Chocolate Drop, o boxeador), Clinton Rosemond (o pai de Chocolate Drop)
Roteiro Lewis Meltzer & Daniel Taradash & Sarah Y. Mason & Victor Heerman
Baseado na peça teatral de Clifford Odets
Fotografia Karl Freund. Nicholas Musuraca
Música Victor Young
Montagem Otto Meyer
Direçãso de arte Lionel Banks
Figurinos Robertt Kalloch
No YouTube. Produção William Pelberg, Columbia Pictures.
P&B, 99 min (1h39)
25/8/2023 (Marynha trabalhando).
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A amizade dessa dupla me emociona até hoje. Também queria ser amiga do William Holden.