Anotação em 2010: Roman Polanski faz extraordinariamente bem qualquer tipo de filme que resolva fazer, seja de que gênero for. Em 2009, para lançamento em 2010, decidiu fazer um thriller político. O Escritor Fantasma/The Ghost Writer é um thriller político magnífico, soberbo.
Vamos lá: fez, sempre com brilho, terror sério, aterrorizante, apavorante (O Bebê de Rosemary), terror cômico (A Dança dos Vampiros), drama psicológico de suspense (A Faca na Água, O Inquilino, Repulsa ao Sexo), drama de época, baseado em romance clássico (Tess, Oliver Twist), drama de época, baseado em peça de Shakespeare (MacBeth), guerra (O Pianista), policial noir (Chinatown), comédia (Piratas), drama psicológico político (A Morte e a Donzela).
Se algum dia se meter a fazer ficção científica, ou filme sobre esportes, ou aventura capa-e-espada, ou comédia romântica, ou western, fará com brilho.
Aqui, filmou – com brilho – uma trama atualíssima, fascinante, envolvendo um ghost writer que, mesmo sem conhecer nada de política, é contratado para reescrever o livro de memórias de um ex-primeiro-ministro britânico, e se mete em uma emaranhada teia de interesses que envolve as recentes guerras do Iraque e do Afeganistão, o governo americano, a CIA, o governo britânico, acusações de tortura, terrorismo, o Tribunal Internacional de Haia, grandes corporações, protestos populares, complôs, o trabalho da imprensa, assassinos de aluguel, traições políticas e conjugais.
Sua narrativa é eletrizante do começo ao fim – e o fim, 128 minutos depois da primeira tomada, vem cedo demais. É daquele tipo de filme que você fica querendo que não acabe, que se prolongue o mais que for possível.
A narrativa já começa a 180 por hora
Não tem crédito inicial algum, nem mesmo o nome do filme, ou a apresentação dos logotipos das companhias produtoras (pelo menos na versão lançada em DVD no Brasil, pela Paris Filmes). Já começa acelerado, a 180 por hora. Um ferry-boat se aproxima do cais; é noite, chove, e, desde o primeiro momento, ouvimos uma melodia forte, densa, uma massa de violinos, com toques pesados de percussão marcando o ritmo, criando um clima de que algo grave está acontecendo. (A excelente trilha sonora é de Alexandre Desplat.) Os carros vão saindo do ferry-boat, funcionários fazem gestos para acelerar a saída – um carro, um BMW, está parado. Um funcionário se aproxima dele, tenta ver o motorista lá dentro, chama um colega. O BMW fica sozinho no ferry-boat, um guincho chega para retirá-lo; já junto ao cais, policiais examinam o carro.
São todas tomadas rápidas – não frenéticas, mas rápidas. Corta, plano geral de uma praia, já de dia, um corpo foi lançado na areia pelo mar. Ainda estamos vendo um segundo plano geral da mesma praia e a voz de uma pessoa que aparecerá na seqüência seguinte invade aquele plano geral:
– “Você está ciente de que eu não sei nada de política, certo?”
Estamos agora em um sushi bar; dois homens de gravata conversam enquanto almoçam.
– “Você votou nele, não?” – pergunta o segundo homem, que saberemos em seguida chamar-se Rick.
– “Adam Lang?” – diz o primeiro homem, interpretado por Ewan McGregor, ótimo ator, sujeito incansável, dois ou três filmes a cada ano, todo ano. – “É claro que votei. Todo mundo votou nele. Não era um político, era uma febre (craze, febre no sentido de mania, moda, novidade, fissura).
– “Pois então?” – diz Rick. – “Ele precisa de um novo ghost writer, não de outro maldito político. Está pagando US$ 10 milhões por essas memórias, mas dizem que o manuscrito é uma bela porcaria. A Rhineheart emprestou a casa de veraneio para que consertem o texto. McAra deve ter sucumbido à pressão. Os patologistas disseram que um terço do sangue dele era álcool.”
– “Quer dizer que ele se afogou por acidente?”
– “Acidente, suicídio, que diferença faz? Foi o livro que o matou.”
Claro, já deu para perceber: Rick é o agente do outro sujeito, que está sendo incentivado a aceitar o trabalho de ghost writer, de continuar o trabalho de McAra, o homem cujo corpo foi dar na praia. E o escritor diz então para Rick, com uma ironia inglesa:
– “Isso é encorajador.”
O agente literário Rick (Jon Bernthal) e o escritor interpretado por Ewan McGregor vão em seguida a uma reunião na Rhineheart, a grande editora que deverá publicar as memórias do ex-primeiro-ministro britânico Adam Lang. Cinco outros escritores já haviam sido chamados para reuniões semelhantes, e haviam sido recusados. O escritor chamado agora, o herói da narrativa, é pra lá de bom de serviço, tem currículo excelente, já foi ghost writer de outros livros de memória. Sai da reunião aprovado, com ordem de embarcar naquele mesmo dia para os Estados Unidos, onde Adam Lang está fazendo uma turnê de palestras.
E sai carregando um manuscrito que lhe entregaram durante a reunião, de um livro que não tem nada a ver com o ex-primeiro-ministro. Mas os dois homens que seguem numa moto o táxi que ele toma até sua casa provavelmente não sabem disso. Assim que ele desce do táxi, leva uma porrada dura no estômago, e os dois sujeitos fogem velozmente na moto, carregando o manuscrito.
Nosso herói pensa em desistir da tarefa, mas Rick, o agente, por telefone, faz com que ele desista de desistir: acaba de fechar negócio, e o escritor receberá a fortuna de US$ 250 mil por um mês de trabalho.
Ainda no aeroporto de Heathrow, aguardando a hora de embarcar para o encontro com Adam Lang nos Estados Unidos, nosso herói ouve o noticiário da TV informando que, segundo denúncia apresentada agora, cinco anos atrás o então primeiro-ministro Adam Lang teria autorizado o uso ilegal das Forças Especiais Britânicas para capturar supostos terroristas da Al-Qaeda no Paquistão, e em seguida teria entregado os homens à CIA para interrogatório; todos foram brutalmente torturados, um deles morreu.
Tudo isso (e mais algumas coisas que deixei de fora) é apresentado nos primeiros 10, no máximo 15 minutos de filme.
O personagem central não tem nome – é O Fantasma
“O Escritor Fantasma”. Parece título de um filme de terror sobrenatural – o fantasma de um escritor vem à Terra para infernizar a vida de alguém.
Há expressões da língua inglesa que não têm tradução literal para o português, sabemos todos. Tudo bem, literalmente ghost writer é escritor fantasma – mas a expressão já está em bons dicionários de Português. Está aqui no meu Dicionário Unesp do Português Contemporâneo. Puseram um til: “Ghost-writer (ing) S pessoa que, mediante pagamento, escreve uma obra que é assinada por outro”.
São tantas informações por minuto na bela trama do filme que deixei de reparar que o personagem central da história, o ghost writer interpretado (com a competência de sempre) por Ewan McGregor, não tem um nome. Só me dei conta disso nos créditos finais, no Cast of Characters, aquela relação dos atores ao lado do nome dos personagens que interpretam. Ao lado do nome de McGregor está apenas The Ghost. O Fantasma.
Nosso herói, o protagonista da história, que escreve em primeira pessoa as memórias de quem quer que seja (sempre com competência), é tão cinzento como os copy-desks, os redatores dos jornais, que reescrevem o que os repórteres escreveram mal escrito, mas jamais têm seus nomes publicados.
(É uma profissão danada de cinzenta; sei disso porque foi a minha profissão na imensa maior parte dos meus 37 anos de jornalismo. A gente reescreve, melhora o texto dos repórteres, torna o texto mais atraente, mais consistente, mais claro, mas o nome que aparece é o deles. A gente dá os títulos, dá a forma final às páginas, mas nosso nome nunca aparece. Para o público, somos insignificantes.)
Nosso herói é tão cinzento que sequer nome tem.
Em dois diálogos marcantes, o filme vai tratar dessa coisa do cinzento, da insignificância, do fantasmagórico do ghost writer. Num deles, Ruth Lang (Olivia Williams), a mulher do ex-primeiro-ministro, dirá ao Fantasma: “Bem, você não é propriamente um escritor”. Depois, o próprio Fantasma dirá para Amelia Bly (Kim Cattrall, na foto com Ewan McGregor-O Fantasma), a super-secretária e eventual amante de Adam Lang, que os ghost writers não costumam ser convidados para o lançamento dos livros que escrevem – “é mais ou menos como convidar a amante para ir ao casamento”.
Pequenos brilhos num filme brilhante.
Tudo a ver com Tony Blair, o premier amado, depois odiado
O ex-primeiro-ministro britânico Adam Lang é interpretado pelo irlandês Pierce Brosnan, ator correto, ex-007, bonitão. Pierce Brosnan não é um sujeito propriamente velho – nasceu em 1953. Como seu personagem foi primeiro-ministro vários anos antes do momento em que se passa a ação, foi então chefe do governo britânico quando era bem jovem.
Bonitão, bem jovem, um sujeito em que todo mundo votou, que era mais que um político, era uma mania, e agora é acusado de ter entregue prisioneiros aos americanos. Bingo! É uma série de referências explícitas a Tony Blair!
(Mais uma. O primeiro-ministro interpretado por Hugh Grant em Simplesmente Amor também é um Tony Blair escarrado. Tão escarrado que o próprio Tony Blair veio a público comentar sobre o personagem.)
Lembrando: Tony Blair nasceu em 1953, o mesmo ano de Pierce Brosnan, por uma incrível coincidência – ou não. Líder do Partido Trabalhista, assumiu a chefia de governo do Império de Sua Majestade a Rainha Elizabeth II em 1997, aos 43 anos de idade. Foi o mais jovem político a morar no número 10 da Downing Street desde o longínguo ano de 1812.
No mesmo ano em que assumiu, teve que enfrentar uma dura crise, quando a família real se expôs ao ódio de seus vassalos por demorar a dar as honras devidas à pessoa mais amada da realeza, Diana, Princesa de Gales, após sua trágica morte em Paris. (O episódio foi reconstituído com brilho por Stephen Frears em A Rainha; o ator Michael Sheen tem grande semelhança física com o premier trabalhista, assim como Helen Mirren com Elizabeth II.)
De primeiro-ministro amado, respeitado, admirado por todos, por sua energia, por sua juventude, pelo sopro de vigor depois dos duros anos do thatcherismo, Blair passaria em seguida a ser alvo de críticas pesadas em seu país, por ter seguido – sem contestar – George W. Bush em sua aventura contra o Iraque, pouco depois dos ataques terroristas do 11 de setembro de 2001.
Embora seja uma história de ficção, embora o personagem Adam Lang seja um personagem fictício, The Ghost Writer faz referência clara, inegável, a Tony Blair.
Considerações sobre a vida de um político que volta à planície
Adam Lang, o personagem, e The Ghost, o livro em que se baseia o filme, são produtos da imaginação de Robert Harris, um ex-jornalista, ex-repórter televisivo da BBC, que escreve tanto quanto Ewan McGregor trabalha em filmes. Se um trabalha em dois ou três filmes por ano, o outro parece escrever um livro a cada ano. Não tiram férias, os caras.
Harris tem mais de uma dúzia de livros publicados, tanto de ficção – romances baseados em fatos históricos, após grande pesquisa – quanto de não-ficção.
Num making of de The Ghost Writer que está no DVD, ele conta que a idéia do livro surgiu uns 15 anos atrás. Queria falar sobre o pós-poder – o que sente, como vive um político depois que deixa o poder, que sai de um cargo importante, no qual influenciava a vida de milhões de pessoas. A solidão após o poder, o voltar à planície.
(Meto aqui minha colherzinha para lembrar que de fato deve ser necessário um caráter forte, bem formado, uma visão ampla de mundo para voltar à planíce e seguir vivendo bem, como fizeram, por exemplo, Fernando Henrique Cardoso, Jimmy Carter, Bill Clinton. Já Richard Nixon, o Tricky Dickie, é o típico caso de quem não consegue voltar bem à planície, conforme mostram dois belos filmes, Honra Secreta e Frost/Nixon – por coincidência estrelado pelo mesmo Michael Sheen que interpretou Tony Blair em A Rainha. E há outros casos bem conhecidos de quem não consegue voltar à vida na planície, é claro.)
Mas então Robert Harris tinha em mente escrever um livro sobre um importante político em sua vida de volta à planície, pós-poder. Aí então, em 2005, ou 2006, surgiram acusações contra Tony Blair, de ter permitido que muçulmanos suspeitos de terrorismo fosem entregues à CIA. O livro The Ghost foi publicado em 2007.
Para sorte do escritor, e de todos nós, Roman Polanski resolveu transformar o livro em filme. Trabalharam juntos, os dois, no roteiro, durante meses. Harris diz que nunca soube de um diretor que procurasse respeitar tanto o livro original quanto Polanski.
O filme estava ainda em fase de pós-produção quando Polanski foi preso na Suíça, por causa de velho mandado de prisão emitido pela Justiça americana devido a crimes sexuais contra uma menor de idade dos quais é acusado desde os anos 60. O cineasta supervisiou a pós-produção do local suíço em foi mantido em prisão domiciliar. O filme havia sido rodado em 2009 em estúdios em Berlim e na ilha de Sylt, no Mar do Norte, que fez as vezes de Martha Vineyard, a ilha junto ao litoral de Massachussets focalizada na história. The Ghost Writer teve estréia mundial no Festival de Berlim de 2010; Polanski levou o Urso de Prata de melhor direção.
Beleza de filme. Dá vontade de que não termine. Quando termina – após um extraordinário, fantástico plano-seqüência que segue um bilhete passando de mão em mão, e após uma última tomada que é de um brilho faiscante –, dá vontade de rever.
O Escritor Fantasma/The Ghost Writer
De Roman Polanski, França-Alemanha-Inglaterra, 2010
Com Ewan McGregor (O Fantasma), Pierce Brosnan (Adam Lang), Kim Cattrall (Amelia Bly), Olivia Williams (Ruth Lang), Tom Wilkinson (Paul Emmett), Jim Belushi (James Maddox), Eli Wallach (o velho), Timothy Hutton (Sidney Kroll), Robert Pugh (Robert Rycart), Jon Bernthal (Rick Richardelli)
Roteiro Robert Harris e Roman Polanski
Baseado no romance The Ghost, de Robert Harris
Fotografia Pawel Edelman
Música Alexandre Desplat
Montagem Hervé de Luze
Produção Elfte Babelsburg Film, France 2 Cinéma, R.P. Films, Runteam III, Summit International. DVD Paris Filmes.
Cor, 128 min
***1/2
Polanski é um grande diretor, mas cometeu muitos filmes inferiores (basta citar Lua de fel, Busca frenética, O nono portal…) e acho que você está sendo muito complacente com este filme.
É um thriller morno. Em nenhum momento, senti aquela opressão, aquela ameaça ubíqua e aterrorizante que envolve os personagens em certos filmes do Polanski, e atribuo isso à fraqueza de Ewan McGregor como intérprete: ele tem um ar para galã de filmes românticos ou para personagem cômico (que, aliás, faz muito bem como namorado de Jim Carrey em “O golpista do ano”). Não passa a angústia necessária.
Li o romance que deu origem ao filme, e é apenas uma trama de suspense e corrupção política feita com aquela competência anódina dos autores de best-sellers (o escritor é Robert Harris). O mesmo Harris se meteu no roteiro deste filme e acho que não foi bom, isso.
Algumas frases são realmente excelentes, sobre essa cinzenta profissão de ghost-writer (também já fui um, e sei o que é, acredite)e vi em Olivia Wiliams, mulher de Lang, a melhor interpretação do filme. Pierce Brosnan tenta, mas não consegue convencer muito em nenhum papel que não seja o de 007. A fotografia é ótima, com seus tons de cinza e seu mar misteriosamente denso e cinzento também, a música é excelente, mas o filme, no conjunto, me parece mediano e não merecia tantos prêmios.
Poxa, Busca Frenética um filme menor?! Meu Deus! Só se o senhor só ver Jean Vigo, Renoir, Fellini… E ainda é discutível.
Caros Paulo e Francisco, obrigado por enviar as mensagens. É com outras opiniões, diferentes das expressas por mim, discordantes, que este site passa a ter algum valor.
Um abraço.
Sérgio
Sérgio,
Vendo o filme hoje, fui logo buscar informações na internet sobre ele e caí em seu site.
Tenho opiniões muito parecidas com as suas, sobre Ewan McGregor, o próprio Polanksi e até o plano-sequência do papel, ao final do filme, que, realmente, foi fantástico, assim como a cena final.
Coisa de gênio, independente de seus problemas com a justiça.
Parabéns pelo blog: seu texto flui muito bem, fácil de ler e informativo.
Continue. Acompanharei seu trabalho.
Até mais.
Abraço.
Mesmo num mundo onde George W. Bush, Fernando Collor, Silvio Berlusconi e assemelhados podem ser presidentes de um país, a prisão de Roman Polanski na Suíça, a pedido dos americanos, onde ainda se encontra, por ter supostamente, há quase 40 atrás, cedido aos encantos de uma Lolita, que hoje, casada e mãe de filhos, tudo que deseja, em suas próprias palavras, é que esqueçam do assunto, soava como um absurdo além dos generosos padrões de surrealismo do mundo atual e pedia explicação mais convincente. E a ninfeta nem era mais virgem ao tempo dos eventos libidinosos.
Agora, pelo preço de um ingresso de cinema pode-se ter essa explicação de modo mais que satisfatório, bastando para isso que se vá assistir ao filme que diretor terminou já na prisão – O Escritor Fantasma – e que contém, em seu enredo, de modo explicito, a tese que o ex primeiro ministro britânico Tony Blair, também conhecido na imprensa inglesa como “o cachorrinho de Bush”, e senhora, não passavam de funcionários da “Companhia”, na folha de pagamento do governo americano como agentes “undercover”, infiltrados, no governo da reino unido para servir aos propósitos imperiais da única superpotência remanescente no mundo, fazendo o serviço sujo na guerra do Iraque principalmente. Como qualquer “gauleiter”, fantoche, nos governos de republiquetas sul americanas, africanas ou asiáticas.
O Tony Blair do filme se chama Adam Lang, e é feito por um Pierce Brosnan sob medida, numa escolha de fina ironia, por ter sido um dos últimos 007 do cinema, o agente secreto de sua majestade que personificava o ultimo motivo de orgulho viril do desdentado Leão Britânico, em sua sanha de varão hiperativo, talvez para compensar, no imaginário universal, a crença no escasso interesse dos ingleses pelas atividades da alcova. Ao menos quando essas atividades envolvem membros do sexo oposto.
Qualquer um que já viu o Pet de Bush, no papel de primeiro ministro, na TV, não tem dúvida que ele precisava de orientação externa para amarrar o sapato ou qualquer outra tarefa de igual complexidade. Enfim, isso – o filme – deve ter soado aos ouvidos – e olhos- dos súditos de sua majestade, como um insulto intolerável, e os americanos apesar, de certamente terem achado uma piada divertida, não podiam se omitir de ajudar o aliado de primeira hora, em todas suas estripulias bélicas, cobrando do governo Suíço o encarceramento do famigerado cineasta. Com quem, convenientemente, já tinham contas a acertar por sua independência, ousadia, pouca vergonha e safadeza.
Isso só reforça a tese que o governo e mídia americanos nunca toleraram a trinca de realizadores, integrada por judeus, baixinhos e abusados, subversivos, provocadores, e muito talentosos, formado por Chaplin, Woody Allen e Roman Polanski. Além do gênio mais que evidente, e empatia com um certo publico letrado – em geral não americano – dividiam também a incontida preferência por mulheres muito jovens, o que na sociedade puritana e hipócrita, que construíram na América do Norte, onde quase sempre a violência exacerbada e nauseante nos filmes substituiu o sexo, e o único instrumento fálico que admitem na tela é uma arma fumegante.
De modo que, sem metáforas, essa violência se reflete de modo simétrico no mundo real, e é imperdoável quem prefere o amor à morte, fornecendo o pretexto mais que suficiente para a retaliação que tarda mas não falha. Woody Allen quase teve a carreira arruinada quando se casou com a jovem enteada vietnamita de sua ex-mulher, Mia Farrow, há alguns anos, e Charles Chaplin, o grande e imortal Carlitos, foi impedido de desembarcar em solo americano – sob pretexto idêntico – depois de uma viagem a Europa, e acabou, findando seus dias no exílio…onde? Na Suíça, claro.
Dos três, o único que ainda não sentiu o peso do braço vingativo de Tio Sam em toda sua fúria – até por ser o menos explicitamente político dos três – foi Woody Allen, mas já sentiu, sem duvida, a rarefação da atmosfera de trabalho, na dificuldade de financiar seus projetos em solo americano, na justa medida que aumenta seu prestigio no exterior, onde tem filmado intensamente, a convite de governos e produtores independentes. Mas tem de ficar esperto para não dar pretexto para uma ação mais enérgica, com a CIA, o FBI, os “county sheriffs”,e os Marines em seu encalço por qualquer infração de transito, ou atraso no pagamento da conta de luz.
Talvez por gostar muito (demasiado) do cinema de Roman Polanski, este “Ghost Writer” foi um dos meus maiores desapontamentos dos últimos anos. E não há como compará-lo a um “Frantic” ou “Lua de Mel, Lua de Fel” ou mesmo “The Ninth Gate” (para não falar dos mais antigos), qualquer dos três muito superior.
Não desgostei totalmente, é claro, mas chateou-me imenso…
Gostei mas estava à espera de melhor.
Está muito bem executado e não dá tréguas ao espectador.
Mas depois de acabar fiquei um tanto desconsolado.
Quando o rever pode ser que me sinta mais contente.
Já o revi ontem e lamento dizer que fiquei mesmo desapontado.
Concordo com o Rato.
Quem criticou tão fortemente não passa de alguém blasé! eu adorei e vi ”n” vezes. A direção é magistral, o elenco idem, sendo que tive uma alegria imensa em ver Eli Wallak… escrevi errado, mas……. é a paixão!
Alguem notou o empoderamento da mulher do primeiro ministro? A Ruth…ao final, ela foi a responsável pelo vida e morte do marido…