Zuzu Angel

3.5 out of 5.0 stars

(Disponível na GloboPlay em agosto de 2022.)

Zuzu Angel era uma mulher que representava perigo para a ditadura militar que dominou o Brasil entre 1964 e 1985. Um perigo muito maior do que o de seu filho, Stuart Edgar Angel Jones, ativista da luta armada que foi torturado até a morte em quartel do Rio de Janeiro, em junho de 1971.

O filme de Sérgio Rezende de 2006 que leva o nome da figurinista mineira de fama internacional mostra isso em uma sequência especialmente importante, emblemática.

Zuzu Angel (interpretada por Patricia Pillar, linda de morrer) ainda está começando sua desesperada procura pelo filho, percorrendo dependências militares. Naquele momento, está num quartel da Aeronáutica, e um capitão de nome Mota (Flávio Bauraqui) responde às perguntas dela com outras perguntas, tentando fazer com que a mulher admita que o filho é um comunista, um subversivo, um inimigo do Brasil, essas coisas.

Depois que Zuzu deixa o quartel, o capitão Mota comenta com seu superior, um brigadeiro interpretado pelo grande Othon Bastos: – “Essa mulher é louca”. O brigadeiro, muito mais sagaz, sentencia: – “Não, ela não é louca. É perigosa”.

Zuleika de Souza Netto, Zuzu Angel como ficou conhecida, com o sobrenome do marido americano com quem teve três filhos, duas mulheres, Hildegard e Ana, e um homem, Stuart, obteve grande reputação como estilista. Suas criações foram mostradas em desfiles nos Estados Unidos, vendidas em lojas de grife como Bergdorf Goodman, Saks, Lord & Taylor, Henry Bendell e Neiman Marcus. Entre personalidades que foram suas clientes estão as atrizes Joan Crawford (beijando Zuzu na foto abaixo), Liza Minnelli e Kim Novak. Não é pouca coisa, não, senhor.

Mais do que como uma grande figurinista, no entanto, Zuzu Angel passou para a História – tragicamente, infelizmente – pela fantástica, impressionante, fabulosa coragem com que enfrentou a ditadura militar, exigindo respostas sobre o que havia acontecido com seu filho.

Por ter sido uma pessoa perigosa para a ditadura.

É o que mostra esplendidamente o filme de Sergio Rezende, esse competente realizador que se especializou em obras que reconstituem eventos e vidas de personalidades importantes da História do Brasil.

Nada é gratuito neste belo filme

Há sequências em Zuzu Angel que mais parecem coisa de cinema, de ficção, de roteirista de grande, solta, feérica imaginação. Dois exemplos:

* O avião vindo de Nova York se aproxima do Rio de Janeiro – pelas janelinhas se vê aquele cenário deslumbrante, sem igual, ele também de cinema. Num gesto repentino, rápido, infalível, à la Indiana Jones, à la Mulher Maravilha, Zuzu toma da aeromoça espantada o microfone e faz um discurso contra a ditadura, a tortura dos presos políticos;

* Grande esquema de segurança no Sheraton de Copacabana, onde está hospedado o secretário de Estado americano Henry Kissinger. Zuzu, à la Garrincha, dribla todo mundo e, no corredor do vigésimo e tal andar, grita para o sujeito que, entre otras cositas, mudou a geopolítica mundial ao promover a inédita aproximação dos Estados Unidos com a China comunista: – “Mr. Kissinger, meu filho foi torturado e morto pela ditadura brasileira”. E, na mão, expõe um envelope com documentos que comprovam o que ela está dizendo. Stuart tinha dupla nacionalidade, brasileira e norte-americana, por causa do pai, Norman Angel Jones (o papel de Isio Ghelman).

Coisa de cinema – e, no entanto, esses dois fatos aconteceram mesmo. Há registros de ambas as atitudes de imensa coragem dessa mulher admirável.

Há registros de diversos fatos e conversas que o filme nos apresenta. Há, por exemplo, uma sequência de uma regata na Lagoa Rodrigo de Freitas – uma sequência que envolve ação e um número grande de extras na platéia, ao redor de Zuzu Angel-Patrícia Pillar, que torce loucamente pela equipe do Flamengo, a do garotão Stuart (interpretado por Daniel de Oliveira). Uma sequência bem realizadíssima, com esplêndida fotografia, montagem precisa, cuidadosa reconstituição de época nas roupas. Fica parecendo algo meio gratuito, só para o diretor demonstrar seu domínio artesenal. Nada é gratuito neste filme: Stuart Angel chegou a ser campeão duas vezes na equipe de remo do Flamengo.

Estudante de Economia na UFRJ, Stuart começou na política estudantil, e logo foi parar na luta armada; foi membro do MR-8, e participou de assalto a banco ao lado do ex-capitão Carlos Lamarca. Há, no início do filme, uma sequência de assalto, em que uma guerrilheira é baleada – outra sequência muitíssimo bem encenada. Lamarca aparece rapidamente, interpretado por Paulo Betti. A namorada e depois esposa de Stuart, Sonia Morais (o papel de Leandra Leal), também militou na luta armada, e, como ele, foi presa, torturada e morta pelos órgãos de repressão da ditadura.

É impressionante ler sobre Zuzu e Stuart na Wikipedia ou em outros textos disponíveis na rede depois de ver o filme. É impressionante como o roteiro foi fiel aos fatos.

O roteiro – escrito com competência e talento, além de cuidado com a verdade história – é de autoria do próprio Sérgio Rezende e de Marcos Bernstein.

“É preciso inventar mentiras para falar a verdade”

Em um interessante, rico, bem feito making of do filme lançado no DVD da Warner Bros., o produtor Joaquim Vaz de Carvalho diz que a história de Zuzu Angel era uma paixão antiga – ele foi vizinho e amigo de Stuart na adolescência. Como havia feito um filme com o diretor Sérgio Rezende – Mauá, o Imperador e o Rei, de 1999, com Paulo Betti no papel de Mauá Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá –, e os dois haviam se dado muito bem, nada mais natural, diz o produtor, do que propor a ele filmar a vida de Zuzu Angel.

– “Eu tive que pesquisar muito, ler muito”, diz o diretor e co-autor do roteiro. – “Felizmente havia um livro, escrito pela Virgínia Vale, Eu, Zuzu Angel, Procuro Meu Filho. Com um depoimento grande da Zuzu, em que ela conta os incidentes da prisão do Stuart. Depois, evidente, (havia) a Hildegard e a Ana, as filhas da Zuzu. E chegamos depois dessa pesquisa ao momento de fazer o roteiro. Consideramos que o Marcos Bernstein era a pessoa ideal pra desenvolver comigo o roteiro do filme.”

– “A gente sabe que tem que ser fiel ao personagem, tem que ser fiel à sua trajetória”, explica Sérgio Rezende, um sujeito que fala em tom calmo, tranquilo, com um jeito talvez mais mineiro do que o da sua terra – ele nasceu no Rio de Janeiro, em 1951, um ano depois de mim. – “Mas sabe que é preciso condensar personagens. Aquilo que eu digo sempre, até um pouco brincando: é preciso inventar mentiras para falar a verdade. Mentiras no sentido de que você tem que realmente recriar dramaticamente situações.”

Que beleza de síntese sobre o que o é o trabalho de um roteirista que trabalha que histórias reais! Que maravilha! É preciso inventar mentiras para falar a verdade…

E Marcos Bernstein complementa: – “Foi curioso porque, pouco tempo depois, a gente conversando com outras pessoas que participaram da vida da Zuzu, do Stuart, muitas das coisas que parecia que estavam no limite da liberdade dramatúrgica eram verdade. Eram coisas que existiram.”

São essenciais as pessoas que oferecem perigo às ditaduras

Um roteiro inteligente, bem elaborado, que sabe fazer belo uso da desconstrução da cronologia, de uma forma tal que não deixa o espectador confuso hora nenhuma. Com belos achados – como o momento em que Stuart, depois de morto, reaparece no quarto da mãe e a leva para passear, para reconfortá-la, e depois depositá-la de volta na cama. Ou o detalhinho de, bem no início da narrativa, vermos Zuzu depositando um envelope numa caixa de correio de uma casa, tarde da noite – e a câmara mostrar, em close-up, que a carta está endereçada a Chico Buarque.

O detalhinho referente ao grande artista vem no comecinho – e, no final, Chico Buarque reaparece em dose dupla. No texto do letreiro que conta para os espectadores – como é usual nos filmes baseados em histórias reais – eventos ocorridos após o que é mostrado na tela, e também com sua voz, cantando a música que ele fez para a amiga em parceria com Miltinho, do MPB-4, e lançou no álbum Almanaque, de 1981, cinco anos após a morte dela.

Roteiro inteligente, bem elaborado – e extremamente fiel aos fatos, como já tentei demonstrar aqui.

A carta a Chico Buarque não é uma licença poética, uma liberdade dramatúrgica. Ela existiu mesmo. “Se eu aparecer morta, por acidente ou outro meio, terá sido obra dos assassinos do meu amado filho”, escreveu ela, pedindo que suas palavras fossem publicadas se eventualmente ela viesse a morrer em circunstâncias suspeitas. Cinco dias depois que Zuzu deixou a carta na caixa de correio de Chico Buarque, seu corpo foi encontrado junto a seu carro capotado na Autoestrada Lagoa-Barra.

Nos letreiros finais, o filme informa que Chico Buarque entregou 50 cópias do documento a personalidades e a jornalistas. E afirma que nenhum jornal publicou o que a estilista havia escrito. O filme não explica, mas não é difícil saber por que nenhum jornal publicou a informação. Não publicou porque, em 1976, havia rígida censura prévia nos meios de comunicação. Censores examinavam o que era escrito nas redações de O Estado de S. Paulo, Veja, Jornal da Tarde, e determinavam o que podia ser impresso e o que não podia. Nos outros órgãos de imprensa, obedecia-se às ordens da ditadura, sem necessidade de colocar censores em suas instalações.

As ditaduras funcionam assim – e é por isso que é preciso haver pessoas perigosas que tenham a coragem de enfrentá-las.

São absolutamente essenciais as pessoas que, como Zuzu Angel, oferecem perigo às ditaduras.

Uma personagem ímpar, que sintetiza tudo

No making of do filme, a atriz Patricia Pillar aborda um ponto interessante: Zuzu Angel tinha muito a perder, quando resolveu enfrentar a ditadura:

– “Ela estava num momento profissional maravilhoso. Quer dizer, era uma mulher que tinha muito a perder. E ela não pensou nisso em nenhum momento, e foi fazer justiça. Era uma mulher que precisava que a justiça fosse feita.”

A atriz, modelo e apresentadora Elke Maravilha, que foi amiga de Zuzu, e está no filme também em dose dupla, a define como uma pessoa “aguerrida”: – “Ela nunca arregou. Ela ia pro avião, pegava o microfone, dizia assim: ‘Mataram meu filho assim, assim’. Na rua ela se vestia de preto: ‘Olhe, sabe que a ditadura matou meu filho?’ Era uma coisa assim… Ela queria enterrar o filho dela, né? Me lembra muito Antígona, que queria enterrar o irmão, né? Ela queria enterrar o filho.”

“Só queria embalar meu filho / que mora na escuridão do mar”, diz a canção “Angélica”, de Chico e Miltinho, com a qual Sérgio Rezende fecha seu filme.

– “Sem querer ser pretensiosa, eu acho que a personagem Zuzu Angel é uma personagem ímpar”, depõe a jornalista Hildegard Angel, que no filme é interpretada por Regiane Alves. “É uma personagem que sintetiza tudo isso, a luta feminina, sintetiza a coragem, a maternidade, a beleza, a situação do Brasil. A Zuzu sintetiza isso tudo.”

Nos créditos, um desfile de grandes nomes

Os créditos iniciais de Zuzu Angel são belíssimos, visualmente, com desenhos e grafismos fascinantes, ao som de uma versão fantástica da canção “Dê um rolê” – e apresentam um conjunto de nomes que é de babar.

É impressionante a quantidade de nomes importantes que o produtor Joaquim Vaz de Carvalho e o diretor Sérgio Rezende conseguiram reunir. Thomas Farkas na direção de fotografia. O premiado cenógrafo de teatro e cinema Marcos Flaksman na direção de arte.

Cristóvão Bastos autor da trilha sonora – que inclui, como já foi dito, a voz e a canção do artista para quem Cristóvão costuma fazer seus belos arranjos, Chico Buarque.

Não aparecem nos créditos iniciais os nomes de quem canta essa versão de “Dê um rolê”. A música de Moraes Moreira e Galvão foi gravada por Gal Costa no seu álbum histórico Fatal – Gal a Todo Vapor, de 1971, exatamente a época em que se passam os acontecimentos retratados no filme. Confesso que não reconheci quem cantava a versão apresentada no filme, e só nos créditos finais vi que são Roberta Sá e Pedro Luís, de A Parede. Sou fã de Roberta Sá desde que a ouvi pela primeira vez, mas, interessante – achei que ela havia começado mais recentemente. Não imaginei que em 2006 ela já estava na praça. Vejo que é falta de informação minha: o primeiro disco dela é exatamente de 2005.

E, no elenco, há um monte, mas um monte de nomes importantes. É incrível como tanta gente se dispôs a participar de Zuzu Angel em papéis pequenos, às vezes mínimos. Uma prova cabal da imensa consideração que mereciam os realizadores e o projeto. Aí vão os nomes e os papéis – para não falar, é claro, da própria Patrícia Pillar:

* Leandra Leal faz, como já foi dito, Sônia, a namorada de Stuart; já era uma veterana, mas tinha apenas 24 aninhos;

* Ângela Leal, a mãe de Leandra, faz Elaine, uma amiga de Zuzu;

* Othon Bastos, também como já foi dito, faz o brigadeiro que enxerga que Zuzu seria um perigo para o regime. No filme, o nome do brigadeiro não é citado, mas o personagem – tudo indica – foi calcado em cima de João Paulo Burnier, um militar que ficou famoso por seu desprezo pelo regime democrático desde a revolta de Aragarças, em 1956, e que seria o principal nome do chamado Caso Para-Sar – uma planejada série de ataques terroristas a alvos como o gasômetro do Rio de Janeiro, que seriam atribuídos aos “comunistas”;

* Paulo Betti aparece em uma rápida sequência (como também já foi dito) no papel do terrorista-guerrilheiro Carlos Lamarca – papel que ele interpretou no filme Lamarca, que Sérgio Rezende lançou em 1994;

* Nélson Dantas aparece em uma única sequência, como o sapateiro pai de Lamarca, que Zuzu Angel faz questão de conhecer – ela havia ouvido dizer que uma das coisas que os torturadores queriam extrair de Stuart eram informações sobre Lamarca. Foi a última aparição do veterano ator, que morreria naquele ano de 2006, aos 78 anos;

* Foi também o último filme de outro veterano, Ivan Cândido, que interpreta um capelão a quem Zuzu vai pedir ajuda para localizar seu filho. O capelão é um reacionário horroroso, que defende os crimes da ditadura, deixando Zuzu absolutamente chocada. Ivan Cândido morreu em 2006, aos 84 anos:

* O grande Antonio Pitanga, essa figura lendária do cinema brasileiro, que trabalhou em filmes fundamentais do cinema novo – A Grande Feira (1960), Barravento (1962), Ganga Zumba (1963) – faz um policial.

* Luana Piovani, bela, impressionante, faz o papel de Elke Maravilha – e a própria Elke, aos 61 anos, interpreta uma cantora de cabaré que canta uma música alemã que fala de soldados, caserna, na linha de “Lili Marleen”, chamada “In the Casern”. É uma apresentação fantástica, aquela – Elke parece obviamente se inspirar em Marlene Dietrich, talvez também na magnífica Ute Lemper. (Na foto, Patrícia Pillar entre Elke Maravilha e Luana Piovani.)

Uma obra “de grande coerência estilística e temática”

Muitos grandes nomes, muita gente importante – e ainda é preciso fazer, é claro, um registro sobre a obra de Sérgio Rezende. Me aproprio de trechos do verbete sobre o diretor na Enciclopédia do Cinema Brasileiro, de Fernão Ramos e Luiz Felipe Miranda, organizadores, e assinado por HH – Hernani Heffner:

“Exibindo obra de grande coerência estilística e temática, explora aspectos da história brasileira, retrabalhando-os quase sempre pela ótica de personagens reais com forte espírito de liderança e capacidade empreendedora. Adepto da narrativa clássica, procura filmar com a mesma equipe e atores, preocupando-se ainda com a repercussão pública dos filmes. Interessa-se por cinema a partir do hábito paterno de registrar acontecimentos familiares com uma câmera de 16 mm e a partir de um curso ministrado por um padre jesuíta no Colégio Santo Inácio, onde estudava. Mesmo assim tenta ser músico, escolhendo a bateria como instrumento. Demonstra pouca vocação e passa ao curso universitário de Direito, que abandona no terceiro ano. Retoma os exercícios de filmagem, matriculando-se no início dos anos 70 nas aulas de cinema, dadas por Vicente de Paiva. Compra uma nova câmera de 16 mm e torna-se curta-metragista, escrevendo e dirigindo, entre outros, Pra não dizer que competi (1974), Leila Para Sempre Diniz (1975) e P. S.: Te Amo (1977), O segundo é co-realizado pela esposa e produtora Mariza Leão e possibilita a fundação da empresa familiar Morena Filmes. No final da década lança-se a projetos mais ousados, dirigindo o documentário-denúncia Até a Última Gota, que enfoca o comércio de sangue na América Latina. O substrato político prosseguiria pelo resto da carreira, quase sempre associado a determinada personagem. A exceção fica por conta do projeto seguinte, O Sonho Não Acabou, em que o retrato social e histórico é traçado a partir de um grupo de jovens moradores da capital da República. O prêmio especial do Júri no Festival de Gramado granjeia-lhe prestígio e permite a produção de uma cinebiografia polêmica, O Homem da Capa Preta, sobre o político reacionário Tenório Cavalcanti. Construído com grande vigor narrativo, transforma-se em sucesso de bilheteria, ultrapassando a marca de 1 milhão de espectadores. Filma em seguida Doida Demais, trabalho desigual e mal recebido por crítica e público. A partir de indicação do fotógrafo António Luis Mendes, é convidado por um produtor inglês para dirigir Children is Waiting, drama político rodado em Moçambique.”

Há um duplo erro aí. Children are Waiting, seria a forma correta; e o filme, na verdade, se chama A Child from the South. Vamos em frente.

“Retornando ao país filma a vida do guerrilheiro Carlos Lamarca, em Lamarca, Coração em Chamas. O tom épico presente em mais essa cinebiografia se acentua no projeto seguinte, o ambicioso Guerra de Canudos. Uma das produções mais caras da história do cinema brasileiro, conta com sua habitual competência dramática e narrativa. Concebido tanto como obra cinematográfica quanto minissérie de televisão, aborda o conflito a partir de uma ótica feminina e situa o papel da mídia na cobertura da campanha militar. Convidado pelo produtor Joaquim Vaz de Carvalho, empreende outra cinebiografia sobre a figura do Barão de Mauá, empresário-símbolo das tentativas de modernização do país no século XIX.”

Depois de Mauá – O Imperador e o Rei, vieram Quase Nada (2000), três histórias passadas no interiorzão do Brasil, Onde Anda Você (2004), sobre um velho comediante que viaja de São Paulo para uma cidadezinha do interior à procura da alegria de viver que havia perdido, e este Zuzu Angel aqui.

Em 2018 Sérgio Rezende voltou aos personagens e fatos reais com O Paciente: O Caso Tancredo Neves, em que Othon Bastos interpretava Tancredo e Estér Góes, Dona Risoleta. Seu mais recente trabalho foi O Jardim Secreto de Mariana, de 2021, um drama curto – apenas 70 minutos – sobre as mudanças no relacionamento de um casal ao longo de muitos anos.

“Morte violenta causada pelo Estado brasileiro”

O corpo de Stuart Edgar Angel Jones jamais foi encontrado. Através de depoimentos de várias pessoas, ao longo dos anos, surgiram duas versões. Segundo uma delas, o corpo teria sido levado por um helicóptero e jogado ao mar. É a razão pela qual Chico Buarque escreveu aqueles versos: “Só queria embalar meu filho / Que mora na escuridão do mar”. Outra versão dá conta de que seus restos teriam sido enterrados como indigente num cemitério do Rio de Janeiro – motivo pelo qual há uma sequência que fica um tanto solta na narrativa em que Zuzu vai a um cemitério, senta-se diante de um túmulo sem qualquer identificação e chora.

Em 2014 – oito anos após o lançamento do filme portanto, que mostra com todos os pixels que Zuzu Angel foi assassinada por militares da ditadura, em 14 de abril de 1976 –, a Comissão Nacional da Verdade recebeu de Cláudio Antônio Guerra, ex-agente da repressão que operou como delegado do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) do Espírito Santo, a confirmação da participação dos agentes da repressão na morte da estilista. Essa informação está na Wikipedia, assim como esta aqui:

“Em 2019, sua filha Hildegard Angel se dirigiu ao 8.º Cartório do Registro Civil da Tijuca, na Zona Norte do Rio de Janeiro, com um mandado judicial, e conseguiu finalmente emitir as certidões de óbito de sua mãe, Zuleika, e de seu irmão, Stuart. As causas das mortes foram atestadas como ‘morte não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro, no contexto da perseguição sistêmica e generalizada à população identificada como opositora política ao regime ditatorial de 1964 a 1985’.”

Anotação em agosto de 2022

Zuzu Angel

De Sérgio Rezende, Brasil, 2006

Com Patrícia Pillar (Zuzu Angel)

e Daniel de Oliveira (Stuart Angel, o filho), Regiane Alves (Hildegard Angel, filha), Fernanda de Freitas (Ana Angel, filha), Leandra Leal (Sônia, a namorada de Stuart), Luana Piovani (Elke Maravilha), Alexandre Borges (Fraga, o advogado), Ângela Vieira (Lúcia, a grande amiga), Ângela Leal (Elaine), Flávio Bauraqui (capitão Mota), Othon Bastos (brigadeiro João Paulo Burnier), Caio Junqueira (Alberto), Isio Ghelman (Norman Angel Jones, o ex-marido), João Vitor Silva (Stuart Angel criança), Aramis Trindade (tenente), Rhana Abreu (a aeromoça), Sérgio Abreu (repórter), Alexandre Ackerman (agente no aeroporto), Ricardo Alegre (coveiro), Camila Almeida (cliente da loja de Zuzu), Ana Luisa Alves (funcionária da loja de Zuzu), Marcos Bavuso (soldado), Camilo Bevilácqua (policial agressivo), Márcio Cândido (almirante), Marco Antônio Cicinello (sargento), Chico Expedito (general Bosco), Rodrigo Fagundes (funcionário do Sheraton). Tobias Volkmann (agente no Sheraton), Márcia Falabella (empregada), Marcelo Gaio (capitão), Sarita Hauck (ativista), David Herman (Ray Bunker, da Anistia Internacional), Samir Huauji (policial), Ricardo Kosovski (jornalista), Jaime Leibovitch (senador Church), Matheus Malone (amigo), Márcia Nunes (moça no Copa), Rafael Ponzi (banqueiro), Tião D’Ávila (juiz militar), Joana Seibel (modelo), Otto Zarro (amigo)

(e, em participações especiais) Paulo Betti (Carlos Lamarca), Nélson Dantas (sapateiro, pai de Lamarca), Antônio Pitanga (policial), Elke Maravilha (cantora do cabaré), Ivan Cândido (o capelão reacionário)

Roteiro Marcos Bernstein & Sergio Rezende

Fotografia Pedro Farkas

Música Cristóvão Bastos

Montagem Marcelo Moraes

Desenho de produção Marcos Flaksman

Direção de arte Daniel Flaksman e Marcos Flaksman

Figurinos Kika Lopes

Produção Joaquim Vaz de Carvalho, Globo Filmes, Lereby Productions, Toscana Audiovisual, Warner Bros. DVD Warner Bros.

Cor, 108 min (1h48)

***1/2

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