(Disponível na HBO Max em julho de 2023.)
Esta série Perry Mason, produção caprichadíssima da HBO, com o galês Matthew Rhys no papel do detetive-advogado criado nos anos 1930 por Erle Stanley Gardner, é uma das melhores que já vi – e, diacho, já vi muitas.
É brilhante demais. A série excede, e em todos, absolutamente todos os quesitos. Neste universo atual de séries muitíssimo bem produzidas, ela consegue ser ainda melhor do que o melhor padrão. É tudo um show – fotografia, direção de arte, iluminação, figurinos, movimentos de câmara. Os personagens são construídos com perfeição, talento saindo pelo ladrão – e as interpretações são extraordinárias.
E o principal, a trama… Meu Deus do céu e também da Terra, que brilho!
Erle Stanley Gardner deve ter babado, literalmente babado, lá da sua nuvem. E, no fundo, deve ter sentido até uma certa inveja desses criadores da série, que usaram os personagens criados pelo escritor com o maior respeito às suas personalidades –, mas, a partir deles, criou histórias que jamais foram vividas por Perry Mason e Della Street nos livros do sujeito que os inventou.
A trama da segunda temporada inclui o incêndio de um navio, no meio de uma disputa comercial; um assassinato; a revelação, pouco a pouco, de um gigantesco esquema de corrupção e crime com implicações internacionais. Aprofunda-se na questão do racismo, da xenofobia intensa, imensa, nojenta, contra os imigrantes mexicanos. Passa – e não assim de leve, como quem não quer nada, apenas en passant, mas com toda calma, com atenção e zelo – pelo tema de como a homossexualidade precisava ser escondida no armário, nos Estados Unidos campeão da liberdade.
É uma bela, envolvente história policial – mas é também, e sobretudo, acho eu, um amplo painel, um afresco, sobre o ambiente, os modos, os costumes da Los Angeles dos anos 1930.
É um retrato visualmente deslumbrante – mas feio, danado de feio, e aparentemente sem saída. É a desesperança absoluta, um mundo podre, corrupto até a raiz.
A série Perry Mason dos anos 2020 é noir em cada detalhe, em cada filigrana. Como os melhores noir dos anos 1940.
Uma nova história policial – mas é bom ter visto a primeira
Esta segunda temporada da nova série Perry Mason da HBO se passa em 1933 – exatamente o ano em Perry Mason veio ao mundo, no romance The Case of the Velvet Claws, o primeiro dos 82 que Erle Stanley Gardner escreveria com o personagem.
São, como na primeira temporada, oito episódios, com cerca de 50 minutos cada. Os realizadores optaram por não usar – ao contrário do que é o comum em todas as séries – o esquema de “Temporada 2, Episódio 1”. Aqui, o primeiro episódio desta segunda temporada é identificado como “1. Capítulo 9”.
Realçam, reforçam, acentuam, assim, a continuidade: é uma história só, que prossegue aquela iniciada com oito episódios – perdão, capítulos – lançados em 2020.
A rigor, a rigor, esta segunda temporada conta uma história nova, independente do caso policial que foi o tema da primeira. O caso policial de agora é completamente diferente, e tem princípio, meio e fim nesta segunda temporada – mas é claro que é a sequência da história de Perry Mason.
Quando esta temporada começa, Perry já havia se formado em Direito, já passara no exame da California State Bar, o correspondente de lá ao Exame da Ordem brasileiro, sem o qual o bacharel em Direito não pode advogar. E tem seu próprio escritório, que divide com a grande amiga Della Street, uma pessoa fascinante (interpretada por uma atriz que me parece igualmente fascinante, Juliet Rylance, na foto abaixo). Della ainda não prestou o exame da associação de advogados – mas já é uma profissional brilhante, muitas vezes melhor, mais desenvolta, mais preparada que o próprio Perry.
Haverá, ao longo dos oito episódios desta temporada, diversas referências a fatos do passado de Perry e de Della. Desta forma, embora conte uma nova trama policial, com começo, meio e fim, não é aconselhável ver a segunda temporada sem ter visto a primeira.
É necessário, portanto, fazer um registro, ainda que rápido, sobre fatos básicos da primeira temporada. Perry Mason (Matthew Rhys, como já foi dito) era um detetive particular, duro, sem grana, sem eira nem beira, o casamento indo para o vinagre, as lembranças do front na França na Primeira Guerra sempre presentes. Trabalhava às vezes com dois parceiros, Paul Drake (Chris Chalk) e Pete Strickland (Shea Whigham). Um advogado experiente, respeitadíssimo, Elias Birchard Jonathan, conhecido por todos como E.B. (o papel de John Lithgow), o contrata para investigar o caso complexo do sequestro de um bebê, que envolvia uma famosa pastora evangélica. Della Street era a secretária de E.B.
Perry estudava Direito, mirava-se no exemplo de E.B. e queria ser um advogado como ele. Acaba defendendo no tribunal a mãe da criança sequestrada, Emily Dodson (Gayle Rankin) – e conseguindo sua absolvição. Emocionalmente abalada, destruída, Emily acaba se matando, o que transforma o que seria uma primeira grande vitória nos tribunais em um pesadelo para Perry Mason.
Um filho de milionário desonesto, bandido
As lembranças de Emily Dodson perseguem Perry nesta segunda temporada, e há referências a E.B. – mas, como já foi dito e redito, a trama policial desta segunda temporada é toda nova, e tem princípio, meio e fim. E é fundamental registrar um pouco da trama, fazer uma sinopse dela, um resumo. O duro é que quando o Senhor distribuiu o talento de fazer sinopses, resumos, sínteses, eu estava do outro lado do universo… Assim sendo, apresento os pontos básicos da trama da maneira mais compacta que conseguir – ou seja, ao longo de muitas, mas muitas, mas muitas linhas.
O ponto de partida da temporada é um ato de sabotagem em um belíssimo, lotado navio-cassino navegando pertinho de Los Angeles – e a abertura é um longo plano-sequência em que o sabotador, um sujeito que se empregou ali como garçom, caminha por várias áreas do navio, primeiro nos imensos salões de jogatina, depois na ampla cozinha, depois através de escadas para compartimentos inferiores, onde lança uma espécie de coquetel molotov – para em seguida descer por uma escadinha que lança junto do casco, até uma lancha que o aguarda.
A série não se preocupa em nos dizer se houve mortos, se o navio naufragou, mas fica muito claro que o ato de sabotagem, o incêndio – à noite, no momento em que os salões estavam absolutamente tomados por jogadores – foi muito mais bárbaro do que o mandante queria. O mandante se chama Brooks McCutcheon (Tommy Dewey), que tem um navio-cassino concorrente daquele que foi sabotado, em sociedade com um policial corrupto que já havia aparecido na primeira temporada, Holcomb (Eric Lange). Brooks é filho de um empresário milionário, Lydell McCutcheon (o papel de Paul Raci, um ator tão horrorosamente feio quanto os crimes que seu personagem pratica).
Lydell quer que o filho se especialize em caridade, que fique famoso como um incentivador das artes, um homem que ajude Los Angeles a se tornar uma grande metrópole respeitada, invejada.
Brooks também quer ajudar Los Angeles a ser uma metrópole de primeiríssima grandeza, mas prefere usar o esporte, e não as artes, como mola propulsora da importância da cidade. Planeja criar não apenas um time de beisebol capaz de competir na liga nacional quanto um estádio gigantesco para rivalizar com os de Nova York e Chicago. Esses são seus planos maiores. Ao mesmo tempo, assim no dia a dia, vai administrando seu navio-cassino que se recusa a atrair tanta freguesia quanto os concorrentes, e a pagar por sexo sádico: tem a mania de apertar o pescoço das mulheres com seu cinto, até elas quase sufocarem.
Pai e filho McCutcheon não se dão nada bem. Muito antes pelo contrário.
Ali pelo fim do primeiro episódio desta segunda temporada, ou do capítulo 9, segundo está escrito na tela, Brooks McCutcheon é assassinado com um tiro à queima-roupa.
Entra em cena o promotor Hamilton Burger (o papel de Justin Kirk). Como 99,9% dos district attorneys mostrados pelos filmes de Hollywood, Hamilton Burger é um sujeito ambicioso, não muito escrupuloso, e precisa desesperadamente de agradar aos cidadãos. (O cargo, como se sabe, é eletivo, assim como o de juiz, e então os promotores costumam ficar mais de olho na eleição para o período seguinte do que propriamente na Justiça.)
É preciso prender logo algum suspeito, levá-lo a julgamento, e obter uma condenação à pena de morte.
Logo são presos dois irmãos mexicanos, Matteo e Rafael Gallardo (os papéis de Peter Mendoza e Fabrizio Guido). Sopa no mel para quem quer agradar a cidadãos racistas, supremacistas: dois imigrantes latinos, que invadiram este nosso grande país, e assassinaram um grande homem, um benfeitor, um mecenas, um filantropo.
Um detalhe engraçado – talvez a única coisa engraçada desta série noir – é ver como a língua dos atores anglo-saxões se enrola para tentar falar Matteo e Rafael Gallardo.
Milionários envolvidos em crimes gigantescos
Após o trauma de ver a cliente inocentada decidir tirar a própria vida, Perry e Della haviam decidido deixar de lado o direito criminal e se dedicar ao cível. Na verdade – isso fica bem claro –, a decisão havia sido de Della. Della é que pensa, formula, tem idéias. Perry, enrolado em seus problemas, vai seguindo o que a amiga e sócia decide.
Quando a segunda temporada começa, os dois estão defendendo o dono de uma pequena cadeia de supermercados, um tal Sunny Gryce (Sean Astin), que foi acionado na Justiça por um ex-funcionário que havia criado seu próprio negócio.
O tal Sunny se revela um mau-caráter, e Perry demonstra profundo desconforto por estar defendendo uma figura daquele naipe.
A existência de um dono de supermercado na trama, no entanto, não é, de forma alguma, à toa, sem sentido. Muito antes ao contrário. Será por causa de artigos do varejo, hortifrutigranjeiros, especificamente, que Perry e Della chegarão à questão da disputa comercial do McCutcheon filho com o outro navio-cassino e, mais importante ainda, com o crime que vai sendo cometido pelo McCutcheon pai e também por outros milionários da cidade, em especial Camilla Nygaard, uma self made woman de uma época em que não havia outras self made women, só men.
Camilla Nygaard é interpretada por Hope Davis (à direita na foto abaixo), aquela atriz linda, simpática, que a gente viu duas décadas atrás em bons filmes como O Mito das Digitais (1997) e Próxima Parada, Wonderland (1998). Para mim, foi uma delícia reencontrar Hope Davis – embora fosse claro que sua personagem, sendo milionária demais, não poderia ser gente boa. Na tradição do noir (e em várias outras tradições, como, por exemplo, todo o cinema francês, todo o cinema italiano), se é milionário, não tem jeito – é corrupto e fdp.
Camilla era exatamente o que Lydell McCutcheon queria que seu filho Brooks fosse: uma filantropa, uma mecenas. Ela mesma uma pianista clássica muitíssimo bem treinada, Camilla pretendia que a cidade de Los Angeles tivesse a sua própria filarmônica, lutava por isso, e patrocinava talentos musicais. A uma das apresentações de protegée dela, em cerimônia beneficente, comparece o promotor Hamilton Burger, acompanhado por uma bela jovem mulher – Dalla Street.
É a forma escolhida pelos realizadores para começar a falar de homossexualidade na Los Angeles de 1933.
O promotor Hamilton é homossexual – mas, obviamente, não assumia a homossexualidade, algo fora de cogitação nos Estados Unidos, e em boa parte do mundo, naquela época. Muita gente de cinema, ali mesmo em Los Angeles, por exemplo, escondia a opção sexual e eram extremamente comuns os casamentos de fechada, como por exemplo o de Rock Hudson e sua secretária Phyllis Gates – e isso já nos anos 50.
Hamilton, como tantas outras figuras públicas, gostava de frequentar locais badalados em companhia de alguma bela mulher, e a jovem e bela Della Street era um par perfeito. Ninguém – fora os absolutamente mais chegados, como Perry Mason – imaginava que Della também era gay.
É num concerto beneficente ao qual o promotor Hamilton vai com Della que a sócia de Perry Mason fica conhecendo pessoalmente a milionária Camilla – e Camilla fica impressionada, fascinada por ela. A relação entre as duas mulheres terá importância grande no desenvolvimento da trama.
Bem mais tarde, o espectador verá que o promotor é vítima de chantagem por ter sido fotografado com outro homem.
E verá também uma bela história de amor que rola entre Della e uma mulher rica fina e chique, Anita St. Pierre (Jen Tullock).
Perry Mason esteve na TV dos EUA por vários, vários anos
Della Street lésbica, e Paul Drake, o grande amigo e colaborador de Perry, investigador da mais alta qualidade, negro. Essas são duas imensas liberalidades que os autores destas duas temporadas Perry Mason anos 2020 ousaram tomar, fugindo completamente do que está nos 82 romances escritos por Erle Stanley Gardner. Nos livros, Paul Drake é branco, e Della não é lésbica.
Os admiradores mais fiéis do advogado criado pelo escritor seguramente ficarão chocados com essa blasfêmia, esse pecado mortal contra o que está no cânone de Perry Mason. Exatamente como os sherlockianos ficam com os atentados contra os textos originais sobre o detetive londrino por seu amigo, o dr. John Watson, e publicados por Arthur Conan Doyle…
A menção a Sherlock Holmes não é descabida. Perry Mason com certeza não é um fenômeno tão extraordinariamente gigantesco quanto a criação do escocês Conan Doyle, mas seguramente tem uma multidão de admiradores. Foram vencidos mais de 300 milhões de exemplares dos 140 livros escritos por Erle Stanley Gardner.
Hollywood levou para as telas o detetive-advogado ainda nos anos 30. O ator Warren William, que interpretou Dave the Dude em Dama por um Dia (1933) de Frank Capra, foi Perry Mason em quatro filmes – O Caso do Cão Uivador (1934), A Noiva Curiosa (1935), O Caso das Pernas Bonitas (1935) e Garras de Veludo (1936).
A rede de televisão CBS lançou em 1957 a série Perry Mason, com o grandalhão Raymond Burr no papel-título, Barbara Hale como Della Street e William Hopper como Paul Drake, o outro grande colaborador do detetive-advogado. Foi um tremendo sucesso: a série teve nada menos de nove temporadas, um total de 271 episódios.
Não foi só. Em 1985, 19 anos, portanto, depois da nona e última temporada da série da CBS, exibida em 1966, foi lançado O Retorno de Perry Mason, um telefilme exibido pela rede NBC – com o mesmo Raymond Burr no papel do detetive-advogado. Deve ter sido um grande sucesso, porque em seguida foram feitos mais 25 telefilmes com Raymond Burr no papel de Perry Mason, o último deles em 1993.
Ou seja: Perry Mason frequentou as telas dos televisores americanos de 1957 até 1966 e depois de 1985 até 1993!
Se fugiu muito das histórias originais ao mostrar uma Della Street lésbica e um Paul Drake negro, a nova série, no entanto, parece ser bastante fiel ao espírito das obras de Erle Stanley Gardner. Que, aparentemente, fez como tantos outros autores antes e depois dele: criou um personagem bem parecido com ele próprio.
Assim como sua criatura, Erle Stanley Gardner (1889-1970) não estudou Direito em uma das mais respeitadas universidades americanas. Nascido em Massachusetts mas radicado ainda garoto na Califórnia, começou o curso em uma universidade de Indiana, e foi suspenso por não demonstrar interesse nas aulas, em um período em que ficou fascinado com o boxe. Quando finalmente passou no exame da California State Bar, trabalhou defendendo – exatamente como Perry Mason faz nesta segunda temporada da série aqui – trabalhadores pobres, tornados ainda mais pobres nos anos 30, os anos da Grande Depressão após a quebra da Bolsa de Nova York em 1929, inclusive imigrantes chineses e mexicanos.
Fiquei muito impressionado com esse detalhe: como advogado, Gardner defendeu os abandonados pelo Sonho Americano – exatamente como Perry defende aqui nesta série os imigrantes mexicanos que tiveram suas pequenas terras invadidas e griladas a mando do ricaço-bandido Brooks McCutcheon.
Noir até a medula – apesar das cores deslumbrantes
Os pobres, os destituídos, os pequenos agricultores que perderam suas terras, os trabalhadores que ficaram sem emprego na Grande Depressão. Isso tudo está extremamente presente na série da HBO. É o pano de fundo de toda a trama – o contexto histórico, e as mudanças por que passava Los Angeles naqueles primeiros anos da Grande Depressão.
A cidade crescia – e a corrupção era imensa. A série insiste muito nisso.
Fui checar uns números, e eles são interessantes – ajudam a gente a entender melhor a série e a gostar ainda mais dela. Segundo o Censo de 1930, Los Angeles tinha 1,2 milhão de habitantes. Nova York tinha 6,9 milhões, e depois dela vinham Chicago, Filadélfia, Detroit e só então Los Angeles.
De lá para cá, Nova York passou de 6,9 para 8,8 milhões. Los Angeles pulou de 1,2 para 3,8 milhões, e é hoje a segunda maior cidade do país.
É também fascinante ver que Perry Mason veio ao mundo exatamente na mesma época e no mesmo Estado, a Califórnia, que os detetives durões, hard-boiled, criados por Dashiell Hammett e Raymond Chandler.
Sam Spade surgiu em 1930, no romance The Maltese Falcon (um ano depois do aparecimento de Miss Jane Marple no romance Murder at the Vicarage, mas aí a coincidência é só a época, porque há um oceano e uns milhares de anos-luz entre as histórias de Agatha Christie e as de seus contemporâneos dos Estados Unidos).
Perry Mason, como já foi dito e repetido, surgiu em 1933 – exatamente o ano em que se passa esta segunda temporada da série da HBO.
E Philip Marlowe apareceu em 1939, no romance The Big Sleep.
Detetives durões. Nada, mas nada cerebrais, como os ingleses Sherlock Holmes e Jane Marple e o belga radicado na Inglaterra Hercule Poirot. Detetives durões, que bebem demais, acordam sempre de ressaca, um tanto desentendidos, apanham, levam surras homéricas de bandidos.
É impossível não lembrar deles quando vemos nesta segunda temporada a fantástica luta de Perry e Pete Strickland no meio da rua, que só termina quando os dois não têm mais força alguma para continuar e desabam no asfalto lado a lado.
Os romances policiais com esses detetives durões – e com o ex-detetive agora advogado durão – nasceram na mesma época e no mesmo lugar, vindos exatamente do mesmo contexto de um país que começava a sair da Grande Depressão em que se afundara, e de uma economia que se recuperava enquanto empresários e políticos se enriqueciam com a corrução.
Os personagens inventados por esses escritores, Dashiell Hammett, Erle Stanley Gardner, Raymond Chandler e (é obrigatório registrá-lo também) James M. Cain, estão na base de uma das maiores criações da arte dos Estados Unidos, o filme noir, surgido bem no início dos anos 40.
Se formos simplificar demais, falar bem a grosso modo, o filme noir é o resultado da junção desses personagens dos romances policiais hard-boiled – e o que eles trazem do contexto histórico, social de sua época – com a estética levada para Los Angeles pelos cineastas europeus que fugiam do nazismo, Fritz Lang, Billy Wilder, Otto Preminger, Robert Siodmak, bastante influenciada pelo expressionismo alemão.
E aí é que está. Na minha opinião, esta série Perry Mason da HBO vai fundo na coisa do filme noir. É ao mesmo tempo uma elegia, uma homenagem aos grandes filmes noir e uma cópia deles – com a única diferença de que ela vem em cores.
Esta série Perry Mason, para mim, é do nível dos dois melhores filmes noir feitos em cores, bem depois da época dos originais – Chinatown (1974), de Roman Polanski, e Corpos Ardentes/Body Heat (1981), de Lawrence Kasdan.
Corrupção, podridão moral. Desencanto total.
Noir até a medula – apesar das cores maravilhosas.
Anotação em junho de 2023
Perry Mason – A Segunda Temporada
De Ron Fitzgerald e Rolin Jones, criadores, EUA, 2023
Direção Fernando Coimbra, Nina Lopez-Corrado, Jessica Lowrey, Marialy Rivas (dois episódios cada)
Com Matthew Rhys (Perry Mason),
Juliet Rylance (Della Street)
e Chris Chalk (Paul Drake, o fotógrafo e investigador), Diarra Kilpatrick (Clara Drake), Justin Kirk (Hamilton Burger, o promotor), Eric Lange (detetive Holcomb, o corrupto), Katherine Waterston (Ginny Aimes, a professora do filho de Perry), Shea Whigham (Pete Strickland), Hope Davis (Camilla Nygaard, a empresária milionária), Paul Raci (Lydell McCutcheon, o empresário milionário), Jen Tullock (Anita St. Pierre, a nova namorada de Della), Sean Astin (Sunny Gryce, o dono dos supermercados), Tommy Dewey (Brooks McCutcheon, o filho do milionário Lydell), Jee Young Han (Marion Kang, a secretária do escritório de Perry e Della), Peter Mendoza (Mateo Gallardo, o acusado do assassinato), Fabrizio Guido (Rafael Gallardo, o irmão mais novo de Mateo), Onahoua Rodriguez (Luisa Gallardo, a tia de Mateo e Rafael), Stephanie Hoston (Sofia Gallardo, a mulher de Mateo), Tom Amandes (juiz Durkin), Gretchen Mol (Linda, a ex-mulher de Perry), Veronica Falcón (Lupe Gibbs, a ex-namorada de Perry), Jon Chaffin (Morris), Gayle Rankin (Emily Dodson, a moça da temporada anterior), Molly Ephraim (Hazel Prystock), John Prosky (Walter Crippen), Robert Curtis Brown (juiz Carlisle), Tyler Jacob Moore (Bake Matthews), Alexandra Grossi (Lina Falcone), Nate Mooney (Mr. Kellard), Leo Marks (Harold Hudlin), Matt Bush (Ed Purtell), Blaire Chandler (Mrs. Hunt), Kersti Bryan (Elizabeth McCutcheon), Sean Convery (Charles McCutcheon), Amber Friendly (Pearl), Terrence Hardy (Ozzie Jackson)
Roteiro Elizabeth Baxa, Niko Gutierrez-Kovner, Michael Begler, Jack Amiel, Mauricio Katz, Pedro Peirano
Argumento Ron Fitzgerald e Rolin Jones
Baseado nos personagens criados por Erle Stanley Gardner
Fotografia Darran Tiernan, Eliot Rockett, John Grillo
Música Terence Blanchard
Montagem Meg Reticker , Blake Maniquis, Martin Zaharinov, Lisa Bromwell, John Caldwell, Howard Leder
Casting Sharon Bialy, Sherry Thomas, Rebecca Mangieri
Desenho de produção Keith P. Cunningham
Figurinos Catherine Adair, David Matwijkow
Produção Ronald Cosmo Vecchiarelli, Reuben Lim, Home Box Office (HBO), Team Downey.
Cor, cerca de 400 min (6h40)
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