Perry Mason

Nota: ★★★★

Perry Mason, esmeradíssima produção da HBO de 2020, de oito episódios, tem o gosto amargo, pesado, apavorante de um tempo e lugar tomados pela desesperança, pela pobreza – em todos os sentidos –, pelo crime, pela corrupção. Em vários pontos, assemelha-se demais a duas obras-primas: Chinatown (1974), de Roman Polanski, e Los Angeles: Cidade Proibida (1997), de Curtis Hanson.

A série Perry Mason de 2020 se passa na Los Angeles dos anos 1930, como o filme de Polanski. Os anos da Grande Depressão, o período de maior desemprego, fome, privação da história americana.

Exatamente como aqueles dois filmes, Perry Mason é noir, o gênero de filmes criado ali em Los Angeles nos anos 40, em parte por influência de realizadores europeus fugidos do nazismo, que levaram as lições do expressionismo alemão dos anos 20, em parte por influência de uma geração de escritores de novelas policiais – Raymond Chandler, Dashiell Hammett, James M. Cain, Cornell Woolrich – em que os protagonistas eram detetives particulares solitários, problemáticos, duros, sem dinheiro no banco, que mais apanhavam dos bandidos do que raciocinavam à la Sherlock Holmes para chegar aos culpados.

Ao contrário das obras-primas do cinema noir, todas em preto-e-branco, a série Perry Mason de 2020 é em cores – e, meu, que maravilha de cores. Exatamente como os dois grandes filmes citados aí. Em cores – mas noir até a medula.

Estão lá, muitíssimo bem colocados, todos os elementos essenciais do gênero. O investigador, o detetive particular que começa indo atrás das pistas do que parece ser um caso até simples, embora violentíssimo – um bebê é sequestrado e acaba morto, mesmo tendo sido pago um milionário resgate – e a cada momento a história se torna algo muitíssimo maior, muitíssimo mais complexa do que parecia inicialmente.

Não há uma femme fatale, esse elemento fundamental do filme noir – mas há uma loura quase platinum, de um louro plantinum obviamente falso, que tem imenso poder e grande importância na trama.

E a atmosfera geral é de podridão moral, de corrupção endêmica, sistêmica.

Ao longo dos oito episódios de cerca de 60 minutos cada de Perry Mason, vemos várias vezes um envelope cheio de dinheiro vivo sendo passado de um corruptor para um corrupto.

“Everybody knows that the good guys lost”, canta Leonard Cohen, um músico cujas composições têm muito de noir. Nos filmes noir, os bons, os mocinhos, estão fadados a perder. O mal vence.

O mal vence.

Perry Mason – belíssima trama, magnífico roteiro, excelentes atores, ótima trilha sonora, uma direção de arte, fotografia, reconstituição de época de aplaudir freneticamente, de pé, como ao final de show de rock – é uma série extraordinária. Obra-prima. Merece estar num panteão ao lado de Chinatown, L.A. Confidential e os melhores filmes noir dos anos 40 e 50.

Um Perry Mason bem mais dark que o original

Perry Mason – o detetive que vira advogado na Los Angeles dos anos 30, criado em 1933 por Erle Stanley Gardner – com certeza não é um fenômeno tão gigantesco quanto Sherlock Holmes, mas seguramente tem uma multidão de admiradores. Erle Stanley Gardner (1889-1970) era um escritor prolífico, impressionantemente prolífico; escreveu mais de 140 romances, que venderam um total de mais de 300 milhões de exemplares; 82 desses livros eram histórias de Perry Mason.

Hollywood levou para as telas o detetive-advogado ainda nos anos 30. O ator Warren William, que interpretou Dave the Dude em Dama por um Dia (1933) de Frank Capra, foi Perry Mason em quatro filmes – O Caso do Cão Uivador (1934), A Noiva Curiosa (1935), O Caso das Pernas Bonitas (1935) e Garras de Veludo (1936).

A rede de televisão CBS lançou em 1957 a série Perry Mason, com o grandalhão Raymond Burr no papel-título, Barbara Hale como a sua amiga e colaboradora Della Street e William Hopper como Paul Drake. Foi um tremendo sucesso: a série teve nada menos de nove temporadas, um total de 271 episódios.

Não foi só. Em 1985, 19 anos, portanto, depois da nona e última temporada da série da CBS, exibida em 1966, foi lançado O Retorno de Perry Mason, um telefilme exibido pela rede NBC – com o mesmo Raymond Burr no papel do detetive-advogado. Deve ter sido um grande sucesso, porque em seguida foram feitos mais 25 telefilmes com Raymond Burr no papel de Perry Mason, o último deles em 1993.

Ou seja: Perry Mason frequentou as telas dos televisores americanos de 1957 até 1966 e depois de 1985 até 1993!

Para os aficionados pela figura de Perry Mason, a nova série da HBO pode eventualmente parecer uma blasfêmia. Os aficionados por Perry Mason possivelmente têm tantos motivos para renegar a série quanto os sherlockianos xiitas, radicais, renegam obras que não têm nada a ver com o cânone – as histórias relatadas pelo dr. John Watson nos 4 romances e 56 contos publicados com o nome de Arthur Conan Doyle.

É uma história inteiramente nova – não se baseia em nenhum dos 82 romances escritos por Eric Stanley Gardner com o personagem. Mostra Perry Mason antes de se tornar advogado, ainda apenas como um investigador, um detetive particular pobre de marré deci, que nem mesmo uma saleta de escritório tinha – ao contrário de seus contemporâneos Philip Marlowe ou Sam Spade, os fantásticos personagens criados respectivamente por Raymond Chandler e Dashiell Hammett.

Na primeira sequência em que o vemos – interpretado, brilhantemente, pelo galês Matthew Rhys, na foto acima –, ele está seguindo, com seu grande amigo Pete Strickland (Shea Whigham, na foto abaixo), um gordão ator de cinema, em busca de uma foto comprometedora, para vender para o estúdio que tem o sujeito sob contrato.

Pobre demais da conta, sempre duro, investigando casos mixurucas, carregando trauma pesado pela sua experiência nas trincheiras da França durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), usando roupas velhas, amarfanhadas, sujas, esse Perry Mason, pelo que tudo indica, é bastante diferente daquele dos livros de seu criador, dos filmes e da série de TV feitos anteriormente.

Esse Perry Mason de agora, assim como a história contada nestes oito episódios, é uma criação de Ron Fitzgerald e Rolin Jones. O próprio Ron Fitzgerald fez questão de dizer, em entrevistas, que este Perry Mason não se baseia naquele da série estrelada por Raymond Burr, e que o personagem, aqui, é muito mais dark do que o original.

“Much darker”, diz o IMDb – e não tem como traduzir bem a expressão. Mais escuro, mais negro – isso não tem, em Português, o mesmo peso da expressão “much darker”. Seria mais noir – o que remete da mesma forma a outra língua que não a nossa.

Mais pesado, mais sombrio, mais tenebroso que o Perry Mason original.

Os aficionados pelo personagem das histórias de Erle Stanley Gardner poderão não gostar.

Della Street aqui é lésbica e Paul Drake é negro

A competente, trabalhadora, engenhosa Della Street de agora é competente, trabalhadora e engenhosa como a original – mas há algumas diferenças imensas entre a interpretada em 2020 pela inglesa Juliet Rylance (na foto abaixo) e aquela feita por Barbara Hale e Claire Dodd nos quatro filmes dos anos 30. “O contido romance de Mason com a secretária Della Street culmina em casamento no último filme dos quatro”, informa o livro The Detective in Film, de William K. Everson.

Na série de agora, não há romance entre o Perry Mason de Matthew Rhys e a Della Street de Juliet Rylance – até porque Della é lésbica, e tem uma namorada firme, Hazel (o papel de Molly Ephraim).

Perry Mason tem um caso é com uma mexicana muito doidona, loucamente apaixonada por sexo & drogas, em especial aquela droga gostosa absolutamente legal, vendida em garrafas. Lupe Gibbs (Veronica Falcón) é aviadora, ganha a vida levando turistas para vôos panorâmicos, e está estabelecida num hangar em um aeródromo nas cercanias de Los Angeles, junto da pequena fazenda que Perry Mason herdou do pai. Ela enche a cara com Perry, trepa barulhentamente com ele – e insiste em comprar dele aquele pedaço de terra que impede que o local se transforme de fato em um aeroporto rentável.

Lupe, assim como toda a trama do filme, é invenção pura e simples da dupla Ron Fitzgerald e Rolin Jones; certamente não existe nos livros de Erle Stanley Gardner.

Um personagem que existe nos livros, que está na série original de 1957-1966 e também na série da HBO é Paul Drake. Paul Drake tem grande importância na trama, e é interpretado por Chris Chalk, um ótimo ator que eu não conhecia. Nos livros e na série original Paul Drake é branco; aqui, é negro.

Della Street lésbica, Paul Drake negro. É, os aficionados pelo velho Perry Mason poderão não gostar muito desse novo Perry Mason, much darker.

Mas a série está sendo bem recebida. No site Rotten Tomatoes, que faz uma média com a avaliação de críticos, a série está com 76% de aprovação – tanto dos críticos quanto dos leitores do site. O resumo da opinião dos críticos é o seguinte: “Cheio de performances de alto nível e com muito estilo, o mistério convincente de Perry Mason mais do que compensa sua história um tanto confusa.”

Um único caso policial – uma trama bem complexa

Não achei a história confusa, de forma alguma. Claro, é uma trama complexa – como eram complexas, em geral, as tramas dos filmes noir das décadas de 40 e 50. Mas não é confusa.

Quando sugeri à Mary que víssemos a série, imaginava que ela teria vários casos policiais que seriam investigados pelo detetive-advogado – um caso a cada episódio, como por exemplo em Law & Order: SVU. Estava completamente enganado: os oito episódios de 60 minutos cada giram em torno de um único caso policial. Mas é de fato um caso muito complexo, que acaba envolvendo um grande número de pessoas. E os dois criadores da série e da trama, mais os diversos roteiristas que trabalharam sob a coordenação deles, souberam tecer maravilhosamente a teia de subtramas, e criar um bando de personagens bem delineados – que são bem interpretados por um elenco impecável.

O caso policial é, como já foi dito bastante en passant, o sequestro de um bebê de menos de um ano de idade, Charlie. O primeiro dos oito episódios abre no momento crucial da história: o pai e a mãe recebem um telefonema dizendo que Charlie está no Angel Flight – um bonde funicular na área central de Los Angeles. Os dois – Emily e Matthew Dodson, interpretados por Gayle Rankin e Nate Corddry – correm para o local, entram no bonde, encontram o bebê enrolado em fraldas e cobertor. Haviam deixado uma mala com o dinheiro do resgate em local combinado com os sequestradores – mas não levam mais de dois minutos para perceber que o bebê está morto. Veremos depois que haviam costurado os olhos da criaturinha.

Depois de algum tempo, ficaremos sabendo que Emily e Mathew, os pais do bebê, são fiéis da Assembléia Radiante de Deus, a igreja evangélica liderada pela Irmã Alice McKeegan (Tatiana Maslany, uma atriz que me impressionou muito). Um dos grandes apoiadores da igreja é um milionário, Herman Baggerly (Robert Patrick). O milionário pede o aconselhamento e a ajuda do advogado Elias Birchard Jonathan, que todos chamam de E.B. (o papel do grande John Lithgow, na foto abaixo) – e é aí que Perry Mason entra no caso.

E.B. era um velho amigo de Perry, desde o tempo em que este era um rapazola e seu pai havia procurado o advogado para ajudá-la numa questão sobre a propriedade daquela fazenda dele nos arredores de Los Angeles. Volta e meia E.B. encomendava a Perry algum trabalho de investigação a respeito do caso de algum cliente. Quando é procurado pelo milionário Baggerly sobre o casal que havia tido o filho sequestrado e morto pelos bandidos, E.B. chama Perry para investigar a história, paralelamente ao trabalho da polícia. Perry e seu amigo Pete vão trabalhar juntos no caso.

E.B. havia sido um grande advogado; estava agora velho, perdera os associados, tocava seu escritório com a ajuda apenas da secretária competentíssima – Della Street.

A série vai fundo nesses dois personagens fascinantes, E.B. e Della.

Uma pregadora, policiais corruptos, prostituição, drogas…

As investigações de Perry e Pete vão levá-los à Assembléia Radiante de Deus, já que o casal que havia perdido o filho é muito ligado à igreja, assim como o milionário Baggerly, que havia se disposto a ajudar os pais do bebê Charlie. Lá mais para a frente haverá a explicação de por que Baggerly se dispusera a ajudar Matthew e Emily Dodson.

A Irmã Alice, sua mãe e conselheira, Birdy McKeegan (Lili Taylor), os diáconos mais próximos a elas – vários personagens ligados à igreja terão papéis importantes na trama. A igreja Assembléia Radiante de Deus será uma peça fundamental de tudo.

Assim como a série mergulha no personagem do advogado E.B., mergulha também no dessa mulher aí de uns 30 e poucos anos de idade que conseguiu atrair um imenso número de fiéis com suas pregações apaixonadas, teatrais, de grande impacto entre as pessoas mais pobres, mais necessitadas, mais desesperançadas – e os Estados Unidos da Grande Depressão eram o terreno mais fértil possível para uma pregadora do tipo dessa Irmã Alice.

Ficaremos conhecendo a dupla de policiais encarregada de investigar o caso do bebê sequestrado e morto, os detetives Ennis e seu superior Holcomb (respectivamente Andrew Howard e Eric Lange). Esses policiais têm todo o jeito de bandidos – e veremos que são absolutamente corruptos.

Outra figura asquerosa que o espectador conhecerá é o promotor de Justiça de Los Angeles, Maynard Barnes (o papel de Stephen Root, com o physique du rôle perfeito), um sujeitinho sem caráter e com imensa ambição, que quer ser candidato a prefeito e precisa encontrar um culpado para o sequestro e morte do bebê que está nas primeiras páginas dos jornais e condená-lo à morte.

En passant, haverá espaço também para a série dar uma mostradinha no submundo das casas de prostituição mantidas por chineses, e mais referências ao tráfico e uso de heroína.

E muita demonstração de racismo. Todo racismo é nojento, abjeto

– mas esta série mostra como o racismo era nojentamente, abjetamente aberto, escancarado, na Los Angeles dos anos 30.

É tudo dark, muito dark. Noir. Barra pesada.

A Irmã Alice se inspira em uma pregadora dos anos 20 e 30

Ron Fitzgerald e Rolin Jones souberam criar com maestria tanto a trama como os personagens. Grandes personagens – o próprio Perry Mason, é claro; a maravilhosa Della Street; o policial Paul Drake; o advogado E.B., a Irmã Alice. Belos personagens, belos atores, belas interpretações.

Essa Irmã Alice é uma personagem absolutamente fascinante.

Ela parece de fato acreditar profundamente em tudo o que diz, em tudo o que faz. Diz a seus fiéis que recebe mensagens de Deus; no passado, já havia até curado doentes. Vai prometer realizar um milagre que, como ela mesma diz, a humanidade só havia visto 2 mil anos atrás. (Não vou dizer qual é o milagre; creio que seria spoiler.)

Construiu um pequeno império a partir de sua capacidade de atrair e seduzir fiéis.

Ou seja: tem tudo para ser uma grande impostora, uma charlatã. Como Elmer Gantry, do livro de Sinclair Lewis, o primeiro americano a vencer o Nobel de Literatura, e do filme baseado nele, no Brasil Entre Deus e o Pecado (1960), de Richard Brooks. Como tantos “bispos” das igrejas evangélicas que pululam Brasil afora.

Mas, de maneira fascinante, a Irmã Alice parece acreditar profundamente em tudo o que diz.

O flashback que mostra um momento fundamental de sua vida, quando ela era uma adolescente, é impressionante. E é mostrado numa sequência estupidamente bem encenada. O flashback só aparece em um dos últimos episódios; relatar algo sobre ele seria spoiler.

É dito algumas vezes, ao longo da série, que a Irmã Alice e sua mãe são canadenses, que haviam emigrado para os Estados Unidos muitos anos antes. Isso é interessante, porque a atriz que faz a Irmã Alice, essa impressionante Tatiana Maslany (na foto acima), é canadense, da cidade de Regina, Saskatchewan; nascida em 1985, com mais de 70 títulos na filmografia, 31 prêmios e outras 46 indicações, inclusive uma ao Globo de Ouro como melhor atriz em série, por Orphan Black (2014).

Mas o fato de ser dito e repetido que Irmã Alice é natural do Canadá é interessante também porque era canadense a pessoa real que com toda certeza inspirou os criadores da série a compor esse personagem: Aimee Semple McPherson.

Aimee Semple McPherson (1890-1944) foi uma pregadora evangélica nascida no Canadá e radicada nos Estados Unidos, que teve imensa fama nos anos 1920 e 1930. Era conhecida como Irmã Aimee; fundou uma igreja à qual deu o nome de Quadrangular e foi uma pioneira no uso dos meios de comunicação de massa para ganhar dinheiro explorando a fé dos pobres de espírito: seu programa de rádio era extremamente popular. Segundo o IMDb, na página de Trivia sobre o filme The Miracle Woman, no Brasil A Mulher Miraculosa, que Frank Capra lançou em 1931, ela foi conhecida exatamente como “The Miracle Woman”, por causa de supostos poderes de cura – mas foi denunciada como uma fraude, que usava vigaristas que se passavam por doentes ou aleijados. Como no filme de Capra.

Depois que vi A Mulher Miraculosa, meses atrás, li, num verbete sobre Aimee Semple McPherson, que o escritor Sinclair Lewis se inspirou exatamente nessa evangelista para criar a personagem da Irmã Sharon Falconer, que em Entre Deus e o Pecado é interpretada pela maravilhosa Jean Simmons. O livro Elmer Gantry foi lançado em 1926, quando Aimee Semple McPherson estava no auge da fama.

Não vi referência a Aimee na página de trivia do IMDB sobre Perry Mason, mas é bastante óbvio que a Irmã Alice foi baseada nela. Assim como a personagem central do filme de Frank Capra de 1931, assim como a irmã Sharon Falconer de Elmer Gantry.

(Na foto abaixo, Chris Chalk que faz o policial Paul Drake.)

Um visual absolutamente deslumbrante

Trama e personagens criados com maestria. Belos personagens, belos atores, belas interpretações.

E tudo embrulhado majestosamente para presente.

A trilha sonora envolvente, elegante, foi composta pelo trompetista Terence Blanchard. Ela ajuda – e muito – a criar o clima noir que perpassa toda a série.

A produção é de fato esmeradíssima, luxuosa, cintilante. Fotografia, direção de arte, decoração de interiores, figurinos – é tudo magistral. Diabo, parece que houve uma viagem no tempo e o filme foi rodado na Los Angeles dos anos 30!

É de babar.

A HBO não economizou. Muito antes ao contrário. Só para se ter uma idéia de como não foi poupado dinheiro: foi preparada toda uma grande encenação de sequências passadas na Primeira Guerra Mundial, nas trincheiras da França. Dezenas e dezenas de extras foram usadas ali – para aparecer na tela durante no máximo uns cinco minutos, em flashbacks que mostram as lembranças que perseguem Perry Mason.

A série foi dirigida por dois profissionais: Timothy Van Patten dirigiu cinco dos oito episódios, e Deniz Gamze Ergüven, os outros três. O nome Timothy Van Patten não me dizia nada, mas o IMDb informa que ele é um velho colaborador da HBO, tendo dirigido diversos episódios de Família Soprano e Boardwalk Empire, além de episódios de outras séries famosas e elogiadíssimas – Game of Thrones, O Pacífico, A Escuta. Uau! Que bela filmografia tem o cara.

Já do nome Deniz Gamze Ergüven eu me lembrava. Nascida em Ancara, Turquia, em 1978, essa moça me deixou encantado com seu filme Cinco Graças, no original Mustang (2015), uma co-produção Turquia-França-Alemanha que, ao mostrar a vida de cinco jovens irmãs, faz um retrato do país, que até ali por volta de 2000 era laico, com amplas liberdades políticas e comportamentais, em processo de modernização, aggiornamento, cada vez mais próximo da Europa Ocidental – e, num movimento que parece ter começado de repente, foi se afundando cada vez mais num ambiente de rigor religioso, em que as liberdades são reprimidas em nome da fé muçulmana.

Vejo agora que, dois anos depois de Cinco Graças, em 2017, Deniz Gamze Ergüven lançou Kings: Los Angeles em Chamas, com Halle Berry e Daniel Craig. E em 2019 dirigiu dois episódios de O Conto da Aia/The Handmaid’s Tale, a série de sucesso passada num futuro distópico.

Deniz Gamze Ergüven, portanto, radicou-se em Hollywood. Muito bom para Hollywood. Uma grande perda para o cinema da Turquia.

Só mais dois registros.

Essa série extraordinária foi esnobada pelos jurados das grandes premiações. Recebeu apenas e tão somente uma indicação para o Globo de Ouro de 2021 – de melhor ator para Matthew Rhys. E não levou o prêmio.

Apesar de esnobada pelo Globo de Ouro, pelo Emmy, parece que a série foi mesmo sucesso de público. Teve 1,7 milhão de espectadores em todas as plataformas, mais do que Watchmen e The Outsider. Foi a série da HBO mais vista nos últimos dois anos. Assim, a HBO deu sinal verde para uma nova temporada.

Não vou perder.

 Anotação em fevereiro de 2021

Perry Mason

De Ron Fitzgerald e Rolin Jones, criadores, EUA, 2020

Direção Timothy Van Patten, Deniz Gamze Ergüven

Com Matthew Rhys (Perry Mason)

e Juliet Rylance (Della Street), Chris Chalk (policial Paul Drake), Shea Whigham (Pete Strickland, o investigador amigo de Perry), John Lithgow (Elias Birchard Jonathan, o E.B.), Tatiana Maslany (Irmã Alice McKeegan),

Lili Taylor (Birdy McKeegan, a mãe de Alice), Gayle Rankin (Emily Dodson, a mãe do bebê sequestrado), Nate Corddry (Matthew Dodson, o pai do bebê sequestrado), Andrew Howard (detetive Ennis), Eric Lange (detetive Holcomb), Stephen Root (Maynard Barnes, o promotor), Robert Patrick (Herman Baggerly, o milionário), David Wilson Barnes (diácono Brown), Taylor Nichols (diácono Seidel), Veronica Falcón (Lupe Gibbs, a namorada de Perry Mason), Jefferson Mays (Virgil Sheets), Molly Ephraim (Hazel Prystock, a namorada de Della), Matt Frewer (juiz Fred Wright), Diarra Kilpatrick (Clara Drake, a mulher do policial Paul Drake),

Carlos Barbouth (diácono), Charles Baker (Stanislaw Nowak), Aaron Stanford (George Gannon), Matt Lasky (Marcin Sarecki), Karl Makinen (comandante Joe Morton)

Argumento Ron Fitzgerald e Rolin Jones

Roteiro Ron Fitzgerald, Rolin Jones, Eleanor Burgess, Steven Hanna,

Sarah Kelly Kaplan, Kevin J. Hynes, Howard Korder

Baseado em personagens criados por Erle Stanley Gardner      …

Fotografia Darran Tiernan e David Franco

Música Terence Blanchard

Montagem Mako Kamitsuna, Ron Rosen, Meg Reticker

Casting Sharon Bialy, Sherry Thomas

Direção de arte John P. Goldsmith

Na TV a cabo, Now, HBO. Produção HBO, Team Downey

Cor, cerca de 480 min (8h)

Disponível no Now, HBO, em fevereiro de 2021.

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