Asas do Desejo / Der Himmel über Berlin

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4.0 out of 5.0 stars

Se o cinema é a verdade 24 quadros por segundo, como Godard definiu num momento de brilho, Asas do Desejo é poesia 24 quadros por segundo, durante 128 minutos de absoluta beleza.

Ao rever agora Asas do Desejo, diversas coisas me impressionaram, é claro. Duas delas, no entanto, foram mais fortes: os movimentos de câmara e Berlim.

Depois, naturalmente, da própria idéia original do filme, o tema básico, a existência dos anjos, e o desejo de alguns deles de deixar a imortalidade para experimentar a vida das criaturas que têm o dever de proteger.

Me impressionou demais – eu não me lembrava disso – a extraordinária beleza dos movimentos da câmara.

Os movimentos da câmara levam o escriba a um viajandão

Movimento de câmara é uma das cláusulas pétreas do cinema. É uma das razões de ser desse troço a que acostumamos chamar de sétima arte.

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Quando os irmãos Lumière fizeram os primeiros filmes da História, a câmara não se movimentava; ficava fixa, paradona, em cima de um tripé. O que se movimentava eram as pessoas e os objetos diante da câmara fixa.

A câmara estava lá, paradona, quietinha, em cima do tripé, na estação de trem de La Ciotat. O trem avançava para perto da câmara.

Conta-se que na primeira platéia que pagou para ver um filme, L’arrivée d’un train à La Ciotat, em 1896 – o fato que é tido como o marco do nascimento do cinema – muitos espectadores assustaram-se ao ver as imagens em movimento. Temiam que o trem que se aproximava fosse invadir a sala, saltar sobre eles.

Esse troço que começou em 1896 foi chamado na língua inglesa de film, que significa película, ou moving pictures, imagens em movimento. Como o inglês tem uma especial facilidade em criar novas palavras a partir das já existentes, as moving pictures logo viraram movies.

Na França, a nova invenção foi chamada de cinéma, a partir da palavra grega que significa movimento.

Há pouquíssimos momentos no filme em que a câmara fica parada

Muito rapidamente, com o desenvolvimento tecnológico, as câmaras passaram a se movimentar. Não mais captavam apenas as imagens em movimento, mas elas próprias se movimentavam.

A câmara em movimento é uma especificidade do cinema. É algo que só existe nesta arte, e em nenhuma outra.

Ao longo destes cento e tantos anos de imagens em movimento, nós, os assistidores de filmes, nos apaixonamos pelos movimentos da câmara. E muitos de nós admiramos, em especial, a câmara de mestre Alfred Hitchcock – a câmara do cara era de fato absolutamente especial.

zzasas3aBrian De Palma, um maníaco por Hitchcock, fez sua carreira em boa parte porque seguiu as lições do mestre, e até mesmo foi além dele.

Pois bem: a câmara de Wim Wenders em Asas do Desejo faz alguns dos mais belos movimentos que já houve em cento e tantos anos desta arte.

Há pouquíssimos momentos no filme em que a câmara fica parada.

Nos primeiros minutos de Asas do Desejo, a câmara está no alto, vendo lá embaixo a cidade em que se passa a história, Berlim.

E ela se movimenta – docemente, suavemente, ternamente, mas incessantemente.

O que o espectador vê na tela é que os anjos estão vendo. É a tal da câmara subjetiva: a câmara como se fosse os olhos dos personagens.

O que vemos é o que os anjos vêem.

Numa sacada suplementar de gênio, o filme – lançado em 1987, quando os filmes em preto-e-branco já eram raríssimos – vem daquele jeito com que o cinema começou, e antes dele a fotografia havia começado: sem cores. Em preto-e-branco e aquela enormidade de tonalidades cinzas que existem entre o preto e o branco.

No princípio da fotografia e do cinema era o preto-e-branco – e então os anjos enxergam o mundo assim.

A câmara em permanente travelling é magistral

Os anjos de Wim Wenders (assim como muito provavelmente os anjos de verdade) não ficam apenas no alto. Eles descem à Terra, caminham como nós, os mortais a quem eles estão aqui para proteger. Andam de carro, de ônibus, de trem.

zzasas4Quando a câmara de Wim Wenders está no chão, observando os mortais em suas vidas duras, difíceis, pesadas, ela não pára quieta um minuto sequer, assim como não parava quando mostravam a belíssima cidade vista lá do alto.

Dá-se uma concentração de anjos, e de mortais, numa gigantesca, monumental biblioteca pública de Berlim – e a câmara caminha pela biblioteca, assim como caminha durante toda a narrativa.

As sequências na biblioteca pública, em que a câmara não pára um minuto sequer, está sempre caminhando, andando, viajando (afinal, isso se chama travelling), são espetaculares.

A câmara em permanente travelling na biblioteca pública de Berlim em Asas do Desejo é tão magistral, genial, brilhante, quanto a de mestre Hitchcock em Um Corpo Que Cai/Vertigo (1958), quanto a do maravilhoso aprendiz Brian de Palma no museu em que um homem cujo rosto não vemos vai atrás daquela mulher gostosa e doida para dar em Vestida Para Matar (1980).

Em suma: a câmara de Wim Wenders em Asas do Desejo é uma das câmaras mais belas, mais extraordinárias da História do Cinema.

Para os anjos, a cidade dividida em duas era uma só

A segunda característica que me impressionou demais ao rever o filme agora é Berlim. É o fato de Wim Wenders ter feito seu filme sobre anjos tendo Berlim como, muito mais do que cenário, um personagem fundamental.

Evidentemente, Wenders não sabia disso, quando fez o filme, mas agora sabemos que, ao usar Berlim como cenário e personagem de seu filme, o realizador fez um gigantesco bem à humanidade. Ele gravou para a posteridade maravilhosas, fantásticas, sensacionais imagens da cidade que pouquíssimo tempo depois se modificaria complemente.

Wenders filmou Berlim – e filmou de uma maneira absolutamente, exponencialmente maravilhosa – apenas dois anos antes da queda do Muro.

zzasas9A Berlim sobre a qual velam, entre muitos outros, os anjos Damiel (Bruno Ganz) e Cassiel (Otto Sander) é a Berlim do pós-guerra, a Berlim da guerra fria, a Berlim dividida em duas partes, a comunista e a capitalista.

Creio que nunca houve, na História, outra cidade dividida artificialmente em duas por dois regimes econômicos e políticos diferentes. Berlim é única.

Asas do Desejo não é propriamente um filme político. A Wim Wenders não parecia importar muito a questão econômica, política, ideológica. Ele queria falar sobre seres humanos – e anjos. Os anjos de Wim Wenders estão em Berlim porque Berlim era a maior metrópole do país do cineasta. O fato de haver um Muro dividindo a cidade em dois não importa muito na narrativa.

Ou talvez importe, sim. Damiel e Cassiel são anjos destacados para olhar sobre Berlim – a cidade como um todo. Para anjos que estavam protegendo seres humanos desde o início da História, o fato de que a cidade que havia sido a capital do III Reich tinha sido dividido em duas não importava. O Muro que os comunistas construíram, para eles, não significava nada – e eles atravessam o Muro quando bem entendem. Para os anjos Damiel e Cassiel, o Muro era blá, bleargh, besteira.

Mas talvez, ao fazer o filme, em 1987, Wenders estivesse tendo uma postura política, sim. Talvez ele estivesse defendendo a reunificação da Alemanha. Reafirmando o fato de que Berlim é a capital histórica da Alemanha, e que os invasores, vencedores da Segunda Guerra, deveriam cascar fora e deixar que os alemães cuidassem do destino da Alemanha.

Pode ser.

Até porque Wim Wenders faz questão de trazer a política à tona ao mostrar cenas de Berlim logo após o final da Segunda Guerra. E ao mostrar uma equipe fazendo um filme sobre a Guerra – o filme em que Peter Falk terá um papel importante.

A ênfase do filme, de qualquer maneira, é sobre seres humanos e anjos, e não sobre política.

Ou eu estou errado?

Pode perfeitamente ser. Todo mundo erra; eu erro demais.

No resto do mundo, Asas do Desejo. Na própria Alemanha, O Céu Sobre Berlim

Havia me esquecido – ou talvez nunca tenha sabido, o que dá na mesma – de que o título original do filme é diferente daquele que seria o adotado num grande número de países.

Em inglês foi Wings of Desire, em francês Les Ailes du Désir, na Argentina e no Chile Las Alas del Deseo.

zzasas5Asas do Desejo é sem dúvida alguma uma beleza de título. É poético, é forte, exprime o que o filme diz – anjos que desejam ser humanos.

O título original é no entanto outro. Der Himmel über Berlin. O Céu Sobre Berlim.

A velhíssima coisa: se você quer ser universal, fale sobre sua aldeia.

Para o mundo, Asas do Desejo, Wings of Desire, Les Ailes du Désir, Las Alas deo Deseo.

Para o seu país dividido em dois após a derrota do nazismo, para seu país que era um só e virou dois porque do Leste veio o Exército Vermelho do Império Comunista do camarada Stálin e do Oeste vieram os aliados capitalistas, Wim Wenders deu a seu o filme o título de O Céu Sobre Berlim.

É sem dúvida menos poético e universal do que Asas do Desejo.

Mas talvez Wim Wenders tenha feito o filme que ganharia o respeito mundial querendo que seu país o entendesse também, ou especificamente, como um panfleto pela reunião da Alemanha.

Imagens de uma cidade literalmente em ruínas, de fazer chorar um frade de pedra

Um filme que para os cidadãos do país do cineasta pode ser visto como uma coisa, e para todas as pessoas do resto do mundo como outra, é algo para ser respeitado. Aplaudido de pé como na ópera.

Como poucos outros povos, os alemães são capazes de reconstruir.

A Alemanha de 1945 era um país literalmente em ruínas. As imagens que a gente vê de Hiroshima depois da bomba atômica lançada pelos americanos são tão impressionantes quanto as que podemos ver das cidades alemãs no final da Segunda Guerra. Billy Wilder mostrou imagens da Berlim destruída pelos bombardeios dos aliados em A Mundana/A Foreign Affair que são de fazer chorar qualquer frade de pedra.

Wim Wenders foi aos arquivos, e mostrou imagens semelhantes às que vemos em A Mundana.

São chocantes, apavorantes.

Por motivações “raciais”, religiosas, e sobretudo ideológicas, tendemos a enxergar a tragédia que atinge os outros com menos indignação com que vemos a tragédia que atinge nosso próprio grupo.

zzasas6aO sionismo é talvez o exemplo mais bem acabado de um grupo que industrializa sua própria tragédia. É tão forte o trabalho deles, tão poderoso, que fica parecendo que o nazismo só foi contra os judeus. Os nazistas perseguiram, aprisionaram e mataram judeus, mas também perseguiram, aprisionaram e mataram ciganos, homossexuais, pessoas com os mais diferentes tipos de deficiência. A loucura absoluta da raça pura, da eugênia, não foi apenas contra os judeus – mas o sionismo luta, e vence a luta, há mais de meio século, para dizer que o nazismo perseguiu os judeus.

As imagens da cidade dividida pelo Muro vão ficar para a História

O nazismo foi uma das maiores manchas, das maiores chagas da humanidade. É fato. Mas também é fato que, para combater e vencer o nazismo, os aliados praticamente destruíram toda a Alemanha.

E Wim Wenders mostra, usando imagens feitas logo após o fim da guerra, o horror de um país destruído por bombardeios incessantes.

Dois anos depois que Wim Wenders filmou Berlim de um e de outro lado do Muro, o Muro ruiu.

As imagens que Der Himmel über Berlin mostra são históricas, inesquecíveis. Tinham-se passado 42 anos desde o fim da guerra – e Berlim era uma cidade dividida pelo Muro, mas reconstruída, inteira, rija, belíssima.

Todos os que a conhecem dizem que Berlim hoje é uma cidade maravilhosa, linda, poderosa. A Alemanha Ocidental botou milhões e milhões de marcos para reconstruir a cidade (assim como botou para reconstruir toda Alemanha Oriental) após a reunificação, e a capital é uma das cidades mais fascinantes do mundo, como já havia sido no passado.

Para os historiadores do futuro, haverá sempre as imagens que Wim Wenders e seu diretor de fotografia Henri Alekan captaram em 1987, dois anos antes que o Muro que aparece em tantas cenas fosse abaixo.

A câmara de Wim Wenders se perde de amores quando focaliza Marion

Me estendi muito mais do que devia no lado político de um filme que, mesmo sendo político, não dá tanta importância à política. Peço perdão.

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O cerne do filme é, de fato, o desejo. A inveja do outro, que tem aquilo que você não tem e deseja ter.

Minha mãe costuma repetir os versos finais de “Felicidade”, de Vicente Machado: “Existe, sim : mas nós não a alcançamos / Porque está sempre apenas onde a pomos / E nunca a pomos onde nós estamos”.

Maior verdade dos fatos.

Em inglês se diz o gramado do vizinho é sempre mais verde.

Billie Wilder nos mostrou em Beije-me, Idiota que donas de casa querem ser putas, e putas querem ser donas de casa.

Wim Wenders nos mostra neste filme-poema que, enquanto muitos de nós, mortais, finitos, queremos viver muito mais do que o tempo que nos deram para viver, alguns anjos, cansados de sua eternidade, gostariam mesmo era de provar o gosto de um café, um cigarro, um aperto de mão, um abraço.

E, claro, a experiência de uma paixão.

A idéia, a sacada de que um anjo pode ter vontade de ter uma paixão é uma coisa espetacular, maravilhosa, excelsa.

E Wim Wenders a transportou para a tela em um filme emocionantemente belo.

A câmara do cineasta, apaixonada pelo movimento, pelas paisagens de Berlim – tantas as belíssimas quanto as de lugares um tanto degradados, em especial os próximos ao Muro –, pelos rostos das pessoas (passam pela tela dezenas e dezenas de pessoas, gente simples, normal, gente humilde da cidade), se perde de amores quando focaliza Marion, a trapezista do circo mambembe que faz o anjo Damiel desejar as dores humanas.

A câmara se fixa em Marion em profundo deleite.

zzasas8Tem tudo a ver: Wim Wenders estava casado com Solveig Dommartin, a atriz que interpreta Marion.

Por algum motivo, eu tinha certeza de que Wenders e a atriz tinham sido casados. Essa informação não é confirmada pelo IMDb, que dá o nome de cinco esposas do cineasta. Mas a Variety, a veterana e respeitada revista americana sobre cinema, confirma que diretor e atriz viveram juntos, sim, embora não casados no papel.

Wenders dirigiu todas as suas cinco esposas em pelo menos um filme. Com Solveig Dommartin, fez três: este Asas do Desejo, a continuação dele, Tão Longe, Tão Perto (1993) e Até o Fim do Mundo (1991).

Pela paixão da câmara por Solveig Dommartin, dá para imaginar que Wenders foi muito apaixonado por essa moça nascida na França e que morreria jovem demais, em 2007, aos 45 anos, de um ataque cardíaco.

O cineasta deu a Peter Falk um papel delicioso: o de Peter Falk

São fortíssimas as ligações de Wenders com o rock, o pop, a música de maneira geral. Em Asas do Desejo, vemos uma apresentação de Nick Cave.

Como tantos outros realizadores europeus, Wim Wenders tem grande admiração pelo cinema americano – e muitas conexões com ele. Fez filmes nos Estados Unidos (Hammett – Mistério em Chinatown, de 1982, Paris, Texas, de 1984, O Fim da Violência, de 1997, O Hotel de um Milhão de Dólares, de 2000, Medo e Obsessão/Land of Plenty, de 2004, Estrela Solitária, de 2005), filmou com atores americanos. Ainda em 1980, fez um documentário sobre Nicholas Ray, um de seus grandes ídolos, Um Filme para Nick.

zzasaspeterAssim, não é de se estranhar que tenha chamado Peter Falk para um dos papéis mais importantes de Asas do Desejo.

Peter Falk (1927-2011) é uma figuraça, um sujeito de uma imensa simpatia. Tendo trabalhado longos anos – entre 1968 e 2003 – fazendo o papel de Columbo, o tenente da polícia de Los Angeles da longeva série de TV, ator e personagem acabaram se confundindo.

Ele faz o papel dele mesmo: bem no início da narrativa, vemos Peter Falk num avião que se aproxima de Berlim, onde vai fazer um filme passado na época da Segunda Guerra. Peter Falk aparece, ao longo de toda a narrativa, vestido de Columbo, com sua capa surrada e seus modos simples, sem nenhuma afetação. As crianças o olham na rua e o identificam: olha lá o Columbo!

Quando Marion se encontra com ele, junto de um desses trailers que vendem sanduíches e café, ela se dirige a ele como “tenente”.

Tinha me esquecido do que se revela sobre Peter Falk quando Asas do Desejo se aproxima do fim. É absolutamente delicioso – mas revelar aqui o segredo seria spoiler bravo para o eventual leitor que ainda não tenha visto o filme.

O realizador termina seu filme como esta dedicatória, nos créditos finais: “Dedicado a todos aqueles que já foram anjos, mas especialmente a Yasujiro, François e Andrej”. Yasujiro só pode o cineasta Yasujiro Ozu (1903-1963), realizador, entre outros, de Era uma Vez em Tóquio e Também Fomos Felizes; Wenders fez um filme em homenagem ao realizador japonês, Tokyo-Ga. Dá para imaginar que François seja Truffaut, mas não encontrei qualquer confirmação disso. E Andrej parece ser Andrej Tarkovski, de Solaris, O Sacrifício, O Espelho.

Por Asas do Desejo, Wim Wenders foi premiado em Cannes como melhor diretor. O filme teve no total 18 prêmios internacionais – inclusive o de melhor diretor segundo o júri popular da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo de 1988.

Foi o maior sucesso de bilheteria do grande realizador alemão. Os americanos fariam em 1998 um filme inspirado nele, Cidade dos Anjos/City of Angels, de Brad Silberling, com Nicolas Cage no papel que no original é de Bruno Ganz e Meg Ryan no que é de Solveig Dommartin. Não é um filme ruim, não – se o espectador não se lembrar em momento algum do original, não fizer qualquer tipo de comparação.

Diz o livro 1001 Filmes Para Ver Antes de Morrer:

“Escrito em parceria com Peter Handke, Asas do Desejo, suntuosa fantasia de Wim Wenders, abarca a divisão de Berlim, os efeitos do Holocausto e a beleza suprema da vida, a de ousar escolher entre dois mundos – o dos humanos e o de seus anjos da guarda invisíveis mas palpáveis – por meio de Damiel (Bruno Ganz), um anjo que se apaixona por uma mortal. Atmosférico, elegíaco e de andamento compassado, o filme foi aclamado pela crítica e ganhou honrarias em muitos festivais de cinema, incluindo o prêmio de melhor diretor em Cannes.”

zzasasfimLeonard Maltin dá 3.5 estrelas em 4: “Assombrosa, lírica, totalmente fascinante meditação/conto de fadas sobre uma dupla de anjos que vagueia pelas ruas de Berlim Oriental. Eles observam a vida ao redor e ponderam como seria se eles fossem humanos. Roteiro de Wenders e Peter Handke e inspirado em parte por alguns poemas de Rainer Maria Rilke. Imperdível.”

Acho que Maltin comete um pequeno equívoco. Boa parte do filme se passa de fato em Berlim Oriental – mas não apenas. Os anjos andam pelas ruas de Berlim – tanto a Ocidental quanto a Oriental. Nós os vemos atravessar o Muro – eles simplesmente atravessam o Muro, já que, afinal, são anjos, não são feitos de matéria.

Roger Ebert deu a cotação máxima de 4 estrelas. Ele termina assim seu longo, apaixonado e apaixonante texto:

“Este é o tipo de filme que tem que ser visto num estado meditativo. Não importa muito o que acontece na história, mas interessa quão bem somos capazes de nos empatizarmos com ela, como somos capazes de entrar no estado de espírito de um anjo. Ao sair do filme, refleti que às vezes ficamos chateados pela vida, e sentimos que nada de excitante está acontecendo. Mas se tivéssemos passado a eternidade como um anjo, observando a vida sem senti-la, e então fôssemos lançados num corpo humano com os sentidos físicos, imagine a quantidade, a inundação de sensações que sentiríamos! Seria quase coisa demais para suportar. Seria a vida de todos os dias.”

Wim Wenders é um realizador do tipo incansável, prolífico, do tipo Woody Allen, François Ozon. Faz um filme por ano, às vezes até dois. Para mim, ele não precisaria ter feito mais nada na vida além de Paris, Texas e Asas do Desejo, e já seria um dos grandes realizadores da História.

Anotação em dezembro de 2013

Asas do Desejo/Der Himmel über Berlin

De Wim Wenders, Alemanha Ocidental-França, 1987

Com Bruno Ganz (Damiel), Solveig Dommartin (Marion), Otto Sander (Cassiel), Curt Bois (Homer), Peter Falk (ele mesmo)

Argumento e roteiro Wim Wenders e Peter Handke

Fotografia henri Alekan

Música Jurgen Knieper

Montagem Peter Przygodda

Figurinos Monika Jacobs

No DVD. Produção Road Movies Filmproduktion, Argos Films,

Westdeutscher Rundfunk (WDR). DVD Europa Filmes.

P&B e Cor, 128 min

R, ****

14 Comentários para “Asas do Desejo / Der Himmel über Berlin”

  1. Peter Falk, meu muso…
    Você alegrou meu domingo de forma incontestável com esse texto sobre o filme MARAVILHOSO.

    PS: “entre 1990 e 2003” ainda é pouco. Peter já fazia Columbo bem antes de 1990 🙂

  2. Três comentários, Senhorita:
    1) Obrigado pelo toque. Já corrigi: Columbo durou entre 1968 e 2003;
    2) Acho que esse foi o comentário mais comprido que você já mandou para o site;
    3) Agradeço pelo elogio!
    Um abraço!
    Sérgio

  3. É que eu sou APAIXONADA pelo Peter Falk… E ADORO encontrá-lo assim, de surpresa XD
    Eternamente agradecida =]

  4. Quanto tempo não voltava aqui, e que grata surpresa esse texto profundo e preciso sobre esse filme belíssimo. Se bem que não deveria ser surpresa, assim são sempre seus textos. Obrigada!

  5. Uma maravilha absoluta, o melhor que Wim Wenders fez, quanto a mim.
    Ah! e o Peter Falk! Que ideia extraordinária!

  6. A cada vez que vejo um filme apaixonante, venho para cá para ver se o senhor escreveu algo a respeito dele. Foi o que ocorreu comigo ao assistir a esta obra-prima de Wim Wenders.
    Ontem eu “descobri” outra joia do cineasta alemão, o tão falado “Paris, Texas”. É igualmente genial! Só faltou um belo texto seu para que eu prolongasse o meu encantamento com o filme. Quem sabe um dia, né?
    Mas não é preciso, este é “o” site de textos sobre cinema!
    Abraço!

  7. Uma pena seu desconhecimento de uma dos maiores poetas da língua portuguesa, Vicente de Carvalho. É interessante o senhor saber tanto sobre Wim Wenders e desconhecer a bela poesia “Velho Tema”.

  8. Cara Janete, mereço a bronca que você me deu. Mas aprendi com ela, e consertei o trecho do texto, dando o devido crédito ao poeta Vicente de Carvalho.
    Obrigado pela mensagem, e pela lição.
    Um abraço.
    Sérgio

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