4.0 out of 5.0 stars
Neste ano de 2008, alguns meses atrás, a jornalista Cora Ronai fez em sua coluna no jornal O Globo uma lista dos piores filmes de todos os tempos, e incluiu Les Parapluies de Cherbourg, a pérola com que Jacques Demy presenteou o mundo em 1964 – 44 antes da lista de Cora Ronai, portanto.
A área específica de trabalho de Cora Ronai atualmente é informática. Ou seja: nisso é ela como eu – ela escreve sobre cinema por gosto, paixão, e não obrigação, dever, profissão. O que, eu acho, é uma dádiva.
Bem. Uma semana depois, ou duas, não me lembro exatamente, em nova coluna, ela comentou sobre os e-mails que havia recebido depois de publicar sua lista dos piores. Claro que qualquer pessoa que publica uma lista de piores tem que estar absolutamente consciente de que está mexendo num gigantesco vespeiro – mas o que mais espantou Cora Ronai, segundo ela contou na nova coluna, foi a paixão e entusiasmo dos muitos e muitos apaixonados por Parapluies. Ela prometeu que veria o filme de novo.
Há filmes que prescrevem, sem dúvida alguma. Há filmes datados. E aí há um elemento evidentemente pessoal e intransferível, de cada pessoa. Ao rever esses filmes, alguns podem se desmilinguir feito castelos de cartas. Outros, porque gostamos demais deles, podem ainda transmitir emoções, sensações – embora conscientemente saibamos que eles ficaram velhos. E há os que se mantêm intactos com a passagem do tempo, não perdem o brilho, continuam faiscantes como nos pareceram anos, décadas atrás.
Para mim, Parapluies sempre foi deste último – e raro, e abençoado tipo.
Anotação em 5/12/1998: Acabo de ouvir a íntegra do Parapluies de Cherbourg, que a Mary trouxe pra mim de Paris. É um CD duplo, lançado em 1996. O encarte diz que é a primeira vez que sai em disco a versão integral da trilha sonora – 83 minutos de música. Tem um texto do Jacques Demy de 1963-64, e um testemunho do Michel Legrand feito para o lançamento do CD em 1996.
Como faixas bônus, traz três preciosidades inéditas: gravações piloto feitas pelo Legrand (todas as vozes masculinas e piano) e pela irmã dele, Christiane (todas as vozes femininas), em 1962. Ela, Christiane, seria a voz de Madame Emery, a mãe de Geneviève, no filme. (Chistiane Legrand é uma das vocalistas do conjunto Swingle Singers.) Ainda como faixas bônus, há uma versão de 1964 do Tony Bennett para o tema de Roland Cassard, e duas versões do tema principal, uma para trio jazz, com Legrand ao piano, e uma para big band.
Deu vontade de fazer uma pequena cronologia do Parapluies, com base nas informações do CD:
– 1961, novembro – Michel Legrand, então com 29 anos, começa a trabalhar na elaboração das músicas, juntamente com Jacques Demy, então também com 29 anos. Demy aparentemente já tinha as letras prontas. O trabalho, claro, incluiu o ajuste de todas as letras para que se encaixassem nas músicas. Tudo foi feito sempre a dois: “Nous n’avons jamais rien creé l’un sans l’autre”, diz Legrand no encarte.
– 1962, primeiro semestre – Gravações piloto com Michel e Christiane Legrand. Música e letra já estavam prontinhas, não haveria mudança até as filmagens, pelo que se vê pelos exemplos. A partir daí, Demy e Legrand começam a procurar produtores – uma via sacra difícil.
– 1963, primeiro semestre – Gravações com orquestra no Studio Charcot. Os atores acompanham a gravação do que vão depois, durante as filmagens, dublar.
– 1963, julho e agosto – Oito semanas de filmagem em Cherbourg. A ação se passa em Cherbourg de dezembro de 1957 a dezembro de 1963.
– 1964, dia 19 de fevereiro – Estréia em Paris.
– 1964 – Prêmio Louis Delluc e Palma de Ouro em Cannes.
– 1966, dia 16 de fevereiro – Vejo o filme pela primeira vez, em um cinema da Rua Augusta que já não existe há muitos anos; chamava-se Cine St. Tropez, e, acho, mais tarde virou Auditório Augusta; depois sei lá o que foi feito do lugar. Saio do cinema zonzo de prazer; em casa, anoto no diário algo adolescente do tipo: “Obrigado, Demy, seu filho da puta, por mostrar que o amor acaba”.
– 1992 – Restauração do filme a partir dos negativos originais, sob supervisão de Agnès Varda, viúva de Demy, morto em 1990.
– 1996 – Nova mixagem da trilha sonora para o lançamento em CD da versão integral, mais seis faixas bônus.
– 1998, dia 24 de julho – Revejo o filme, 32 anos depois da primeira vez, na cópia restaurada, no Unibanco da Rua Augusta; é a primeira vez que Mary vê.
– 1998, novembro – Mary compra o CD da versão integral em Paris.
Os Guarda-Chuvas do Amor/Les Parapluies de Cherbourg
De Jacques Demy, França-Alemanha, 1964.
Com Catherine Deneuve, Nino Castelnuovo, Anne Vernon, Marc Michel
Argumento e roteiro Jacques Demy
Música Michel Legrand
Fotografia Jean Rabier
Produção Mag Bodard
Cor, 91 min.
Filme Lembranças de um verão é uma forma de releitura e/ou regravação do filme Houve uma vez um verão/Verão de 42? O primeiro foi reprisado em 21 janeiro de 2012 no Warner Channel.
Haroldo, Lembranças de um Verão não tem absolutamente nada a ver com Houve uma Vez um Verão. São histórias absolutamente diferentes, distintas. Nada a ver, conforme dá para verificar nos posts sobre eles:
Lembranças de um Verão – https://50anosdefilmes.com.br/2002/lembrancas-de-um-verao-hearts-in-atlantis/
Houve uma Vez um Verão – https://50anosdefilmes.com.br/2009/houve-uma-vez-um-verao-verao-de-42-summer-of-42/
Um abraço.
Sérgio