Los Angeles: Cidade Proibida/L.A. Confidential é uma obra-prima, uma maravilha, um estupor, um filmaço.
Sou um sujeito bastante chegado a um superlativo, admito. É um defeito que tenho. Mas insisto: este filme que Curtis Hanson lançou em 1997 merece todos os superlativos que há.
Em 2009, ao rever A Mão Que Balança o Berço, o filme de Curtis Hanson de 1992, escrevi o seguinte: Este aqui é, na minha opinião, um dos melhores filmes de suspense que já foram feitos. Melhora a cada nova revisão. Mesmo conhecendo bem toda a história, fiquei mais uma vez completamente envolvido pelo clima de tensão e medo que o diretor Curtis Hanson consegue criar.
Impressionante: de L.A. Confidential pode-se dizer exatamente a mesma coisa. E digo:
Este aqui é, na minha opinião, um dos melhores thrillers que já foram feitos. Melhora a cada nova revisão. Mesmo conhecendo bem toda a história, fiquei mais uma vez completamente envolvido pelo clima de tensão e medo que o diretor Curtis Hanson consegue criar.
Que elenco: Kevin Spacey, Russel Crowe, Kim Basinger…
Nem sei bem por onde começar o sublead, a segunda parte desta anotação.
Poderia ser, talvez, pelo elenco. Meu Deus do céu e também da terra, mas que elenco extraordinário! É esquisito rever agora, no final de 2014, o filme de 1997 – os atores estão tão mais jovens!
E quantos grandes atores! (Esta foto não reproduz uma cena do filme – é só pose, para publicidade, como se fazia antigamente.)
Fiquei imaginando que, na época, 1997, eles ainda não eram tão grandes assim, tão reconhecidos, tão festejados.
São três protagonistas, três papéis principais, que são apresentados ao espectador muito rapidamente, logo após a abertura – fantástica, incrível, que precisaria ser vista e revista várias vezes.
Russell Crowe faz Bud White, o tira honesto, incorruptível, porém brutal: para fazer Justiça, não se envergonha por ir contra todo tipo de lei. Dá porrada nos filhos da puta dos criminosos sem qualquer piedade.
Guy Pearce faz Ed Exley, o tira honesto, incorruptível, que quer fazer tudo direitinho, tudo seguindo o melhor manual. É filho de um policial que fez história, que é respeitado por todos, e morreu em serviço. É inteligente, estudou, entende que há lugar no mundo para uma polícia justa e ao mesmo tempo competente, que investiga e prende sem torturar, sem virar, ela mesma, igual aos bandidos.
E, completando o trio de protagonistas, Kevin Spacey faz Jack Vincennes, um policial competente, mas que adora um brilho, uma ribalta, e um dinheirinho extra, e então faz um jogo de troca e ganha com um sujeito que tem uma revista sobre famosos & crimes, Sid Hudgens (Danny DeVito), chamada Hush Hush. Dá dicas para ele e recebe dele dicas e um subornozinho.
A Los Angeles sem lei e sem alma faz lembrar o Brasil de hoje
Ao rever o filme agora, cuja ação se passa na Los Angeles sem lei e sem alma dos anos 1950, inteiramente tomada pela corrupção, não deu para não pensar no Brasil pilhado, tomado de assalto, saqueado por um partido político.
A trama de L.A. Confidential mostra que o Mal em Si tem perfeitas condições de vencer, de se dar bem, para todo o sempre.
Ao mesmo tempo, mostra que se a gente não for capaz de sonhar com o ideal, com o melhor, então estamos mesmo condenados às trevas mais profundas.
Se admitirmos que uma polícia só pode ser competente se torturar para obter confissões, então estaremos nos condenando para todo o sempre ao negror, ao horror, ao pavor.
Seria semelhante a admitir – como querem nos fazer crer, neste país desgovernado pelo lulo-petismo – que só existe obra se houver sobrepreço, corrupção, ladroagem grossa.
Mas vamos em frente. Isso aí foi en passant. Não quero ficar chafurdando nessa lama.
Nos créditos, uma montanha de informações é despejada
Antes de nos apresentar, um a um, os três protagonistas da história, L.A. Confidential mostra os créditos iniciais – e, neles, vem uma quantidade de informação que parece impossível digerir. É informação demais – uma loucura.
Enquanto vão rolando os créditos propriamente ditos, os nomes dos atores, dos principais membros da equipe, vemos cenas de Los Angeles, um tanto borradas, como se fossem de cinejornais antigos, ou feitas para a TV de algum tempo atrás, alternadas com capas de jornais e revistas informando sobre o que a voz em off de Sid Hudgens-Danny DeVito está narrando:
– “Venha para Los Angeles! O sol brilha, as praias são amplas e convidativas, e os laranjais se estendem até perder de vista. Há empregos de sobra, e a terra é barata. Todo trabalhador pode ter sua casa própria e, dentro de cada casa, uma família feliz, cem por cento americana. Você pode ter tudo isso e, quem sabe… você pode até ser descoberto, virar um astro de cinema… ou pelo menos ver um em pessoa. A vida é boa em Los Angeles… é o paraíso na Terra. Ha ha ha ha. Pelo menos é isso que dizem, porque estão vendendo uma imagem. Eles estão vendendo nos filmes, no rádio, na televisão. No show de sucesso ‘Badge of Honor’ (distintivo de honra), os tiras de L.A. andam sobre a água, enquanto mantêm a cidade livre de bandidos. É, você poderia pensar que este lugar é o Jardim do Éden. Mas há problemas no paraíso.”
A velocidade com que vão aparecendo as mais diferentes imagens, enquanto ouvimos essa narrativa, é estonteante. É uma montagem aceleradíssima, no ritmo do mais frenético videoclipe. Só enquanto a voz de Danny DeVito diz aquela frase sobre astros de cinema, vemos na tela uma imagem de Marilyn Monroe ao lado de Jane Russell, outra de Frank Sinatra, outra ainda de Grace Kelly.
Para quem é conhecedor atento, a imagem de Marilyn e Jane Russell juntas mostra que foi perto das filmagens de Os Homens Preferem as Louras, o único filme que as duas fizeram juntas, e foi lançado em 1953.
Além das diversas imagens, várias delas de jornais e revistas, e portanto com títulos que o espectador atento gostaria de ler, e além da narrativa na voz de Danny DeVito, há, ao fundo, a canção “Ac-cent-tchu-ate the Positive”, de Howard Arlen e Johnny Mercer, numa gravação que me parece rara, do próprio Johnny Mercer.
E vão chovendo mais informações. O chefão do crime organizado na cidade – vai nos narrando a voz em off do proprietário e editor da revista Hush Hush –, Mickey Cohen, acaba de ser preso. Seus principais cúmplices têm aparecido mortos. Quem estaria se preparando para ocupar o vácuo que Mickey Cohen deixou no submundo do crime, do jogo ilegal, da prostituição e do tráfico de drogas?
Conheça Bud White, policial violento, protetor de mulheres agredidas
Terminados os créditos iniciais com essa montanha de informações, veremos as sequências que nos apresentarão os três protagonistas, tudo acontecendo na noite de Natal – pode ser de 1953, ou 1954. Os nomes dos três policiais vão surgir na tela em letras grandes, imitando os tipos de uma máquina de escrever padrão.
O primeiro que vemos é o do “policial Bud White”, escrito dessa forma, “officer Bud White” – o papel do neo-zelandês Russell Crowe. Ele está com seu parceiro, Dick Stensland (Graham Beckel), diante de uma casa em que mora um sujeito que acaba de sair da cadeia em liberdade condicional – e o sujeito está tendo uma discussão brava com a mulher na sala de sua casa, conforme se pode ver pela janela. Tudo indica que poderá partir para a porrada a qualquer momento. Bud derruba uma decoração de Natal da casa do sujeito, na queda o treco faz um barulho altíssimo, o sujeito interrompe a briga com a mulher para ver o que aconteceu e se depara com o policial diante de sua porta.
O sujeito: – “Quem é você?”
Bud: – “O fantasma de Natais passados. Por que você não enfrenta um homem, pra variar?”
O sujeito: – “Quem você é, algum tipo de espertinho?”
E ele tenta atacar Bud, exatamente como Bud queria. Agora ele tem um motivo para prender de novo o sujeito, antes que ele bata na mulher: tentativa de agressão a um agente da lei.
Bud (depois de bater no cara e algemá-lo): – “Você estará livre em um ano e meio. Vou ficar de olho no supervisor da sua condicional. Se você tocar nela de novo, te prendo como estuprador de crianças. Você sabe o que os presos de Quentin fazem com estupradores de crianças, né?”
O parceiro de Bud, Stensland, está impaciente. Já bebeu algumas e quer beber mais. Na verdade, os dois saíram para comprar mais bebidas para a festa de Natal na delegacia central.
Conheça Jack Vincennes, policial chegado a uns trambiques
O segundo letreiro que identifica os personagens diz “sargento Jack Vincennes”, enquanto vemos Kevin Spacey dançando com uma moça atraente. A moça parece muito a fim do tira elegante, bonitão, charmoso.
Ela: – “O que você faz no ‘Distintivo de Honra’?”
Jack: – “Sou o consultor técnico. Eu ensino Brett Chase (e aponta para o ator do seriado de TV) a andar e a falar como um tira.”
Ela: – “Brett Chase não anda e fala como você.”
Jack: – “Bem, é que ele é a versão da televisão. A América não está pronta para o verdadeiro eu.”
O baixotinho e gordinho Sid Hudgens chega para empatar o papo que se encaminhava para uma bem provável cama. Jack apresenta a moça a Sid, mas os dois já se conheciam, pelo menos de nome, e ela sai de perto deles depressa, depois de xingar o jornalista. Sid explica para Jack que aquela moça foi citada numa reportagem da revista Hush Hush sobre “as sapatonas de Hollywood”. E em seguida faz a proposta a Jack:
– “Um amigo meu vendeu maconha para Matt Reynolds. Ele está se divertindo com a Tammy Jordan.”
Jack Vincennes se distraiu por um minuto, não ouviu direito a proposta. Sid explica:
– “São atores da Metro. Prenda-os, e eu boto você na próxima edição. Mais os 50 paus de sempre.”
Conheça Ed Exley, policial inteligente, que quer fazer tudo certinho
O terceiro letreiro diz “Sargento Ed Exley”. Ed (um Guy Pearce com cara de muito novinho e um tanto nerd apesar da farda, com uns óculos que não combinam com o visual de um sargento do Departamento de Polícia de Los Angeles) está sendo entrevistado; o jornalista quer saber por que ele, filho de um homem que é uma lenda na polícia, resolveu ser policial também.
Ed está chefiando o plantão da delegacia nessa véspera de Natal. Apesar de muito novo, ele já é sargento e portanto pode chefiar plantões. Tem uma ficha brilhante, com notas altíssimas em todos os cursos de formação.
O capitão, o homem do cargo de carreira mais alto da Polícia de Los Angeles, aparece quando a entrevista está mesmo terminando. Chama-se Duddley Smith, e é interpretado pelo ótimo James Cromwell.
Os jornalistas vão embora, ficam conversando o capitão e o filho do policial legendário, morto no cumprimento do dever. O veterano pergunta ao jovem em que setor ele gostaria de atuar, e Ed diz que seu desejo é ir para Investigações – a área mais dura de todas.
O diálogo é antológico:
Capitão: – “Edmund, você é um animal político. Você tem o olho para a fraqueza humana, mas não o estômago.
Ed: – “O senhor está errado.”
Capitão: – “Você aceitaria plantar evidências para um suspeito que você sabe que é culpado, a fim de garantir sua condenação?”
Ed: – “Dudley, já conversamos sobre isso.”
Capitão: – “Sim ou não, Edmund?”
Ed: – “Não!”
Capitão: – “Você aceitaria obter na porrada uma confissão de um suspeito que você sabe ser culpado?”
Ed: – “Não.”
Capitão: – “Você toparia atirar num criminoso pelas costas, para evitar a possibilidade de que algum advogado…
Ed: – “Não.”
Capitão: – “Então, pelo amor de Deus, não seja um detetive. Escolha um lugar em que você não tenha que…”
Ed: – “Dudley, eu sei que o senhor está falando pelo bem, mas eu não preciso fazer do que jeito que o senhor fazia. Ou o meu pai.”
Antológico. Antológico. Esse diálogo vale por um curso inteiro a respeito das diferentes formas de se ver a atuação da polícia.
Conheça Lynn Bracken, mulher belíssima, cópia da atriz Veronica Lake
Depois que o espectador já foi apresentado então aos três protagonistas, voltamos ao primeiro deles. Bud e Stensland vão a uma loja de bebidas. Stensland fica no carro, Bud vai à loja e apresenta seu pedido.
Entra na loja uma mulher belíssima, com o cabelo louro idêntico ao de Veronica Lake. Veremos mais tarde que ela se chama Lynn Bracken (e é interpretada por Kim Maravilha Basinger). Lynn parece ser uma freguesa assídua da loja; o comerciante a conhece bem.
Bud – que demonstra claramente que não fica muito à vontade diante das mulheres, em especial das lindíssimas – aproxima-se timidamente dela e deseja feliz Natal.
A câmara mostra pela primeira vez o rosto maravilhoso de Kim Basinger com o cabelo à la Veronica Lake, e ela responde, sorrindo: “Feliz Natal, policial.”
Ele fica um tanto embaraçado: – “É assim tão óbvio?”
Ela: – “Está praticamente escrito no seu rosto, officer.”
Bud sai da loja carregando a caixa com as garrafas de bebida para a festa de Natal dos tiras – e, ao sair, observa um carro parado perto do seu. Lá estão, no banco de trás, um sujeito bem vestidíssimo e uma moça com um grande curativo tapando todo o nariz. Bud White, o policial obcecado em pegar todo sujeito que espanca mulheres ou crianças, naturalmente imagina que a moça levou uma porrada na cara.
O sujeito com aparência de muito rico, Pierce Patchett (David Strathairn, grande ator, sempre muito bem), manda o motorista ver o que o tira quer. O motorista, Buzz Meeks (Darrell Sandeen), sai do carro. É um ex-policial e tem licença para porte de armas, diz, enquanto Bud – que deu um golpe e o imobilizou junto da traseira do carro – examina seus documentos e seu revólver.
A bela Lynn sai da loja carregando o seu pacote de bebidas e se aproxima do carro. Diz a Bud que o curativo da moça, Susan Lefferts (Amber Smith), não é aquilo que ele pode estar pensando.
Um exemplo perfeito, acabado, de roteiro genialmente concebido e escrito
Chequei: o Word contou 167 linhas dessa minha descrição sobre os 10, 15 minutos iniciais de L.A. Confidential. A rigor, não seria necessário relatar tudo isso, transcrever tantos diálogos, mas simplesmente não consegui me conter, porque esse início de L.A. Confidential é um dos exemplos mais bem acabados de um roteiro genialmente escrito.
É um excesso de informação, é verdade. É informação demais, em pouco tempo, e, conforme diz um axioma que aprendi na ECA-USP, acho que a melhor lição dos quase dois anos que passei lá, “o excesso de informação prejudica a comunicação”.
Não me lembro como lidei com esse excesso de informações da abertura do filme da primeira vez que o vi, mas, revendo-o agora, o que fiz foi ver e rever, ver e rever, ver e rever mais uma vez. Dei uma canseira na tecla de rewind. É um brilho. É tudo brilhante, está tudo no lugar, não sobra nada, não falta nada. Tudo se encaixa à perfeição.
Todos os personagens, todos os elementos mostrados nestes primeiros 15 minutos da narrativa irão se envolver como os fios numa cuidadosa tapeçaria. Corrupção, prostituição, drogas, aparências que enganam. Um tira honesto, mas figadal, violento. Um tiro honesto e que quer fazer tudo direito. Um tira competente mas apegado a um dinheirinho por fora e às luzes da ribalta.
Aquele Matt Reynolds, o ator maconheiro citado por Sid Hudgens, terá importância na trama. A moça dentro do carro com curativo no nariz, Susan Lefferts, terá importância na trama. Lynn Bracken, a loura linda parecida com Veronica Lake, interpretada por Kim Fantástica Basinger, terá importância fundamental. Pierce Patchett, o milionário interpretado pelo sempre bom David Strathairn, é um dos elos centrais da trama.
É de fato uma tapeçaria – milhares de fios interligados.
Como nos grandes filmes noir, os detetives no começo não têm idéia da dimensão do problema em que estão se metendo. Começam a investigar o que parece um crime comum, simples, ordinário – e aos poucos vão percebendo que tudo faz parte de uma coisa enorme, imensa, gigantesca, ciclópica.
Uma aula de como montar uma narrativa de suspense
A trama toda de L.A. Confidential me pareceu, na revisão agora, lógica, até mesmo de fácil compreensão.
Não é uma trama simples, de forma alguma – são muitos elementos em jogo, um grande quebra-cabeças é colocado diante do espectador e dos três policiais tão díspares entre si. Simples, propriamente, não é – mas é lógico, e tudo vai fazendo sentido à medida em que os fatos vão sendo revelados.
A quantidade excessiva de informações apresentada de cara pode dar uma sensação de imensa confusão. Mas é isso mesmo: tudo vai fazendo absoluto sentido com cada nova revelação.
Há quem adore as reviravoltas na narrativa, os twists. Twist and shout. Não, não, aqui seria twist and enjoy. Nada era o que parecia, e então vira tudo. Tipo Os Suspeitos/The Usual Suspects, um filme bastante endeusado, por coincidência também com Kevin Spacey, esse ator superlativo. Há filmes que dão tanta reviravolta que deixam o espectador tonto, zonzo.
L.A. Confidential não deixa o espectador tonto, zonzo – deixa o espectador satisfeito por ver tanta inteligência e clareza.
Há roteirista que acha que, se a narrativa for bastante confusa, vai parecer inteligente. Besteira: só é confuso quem não sabe direito o que quer dizer. Ou quem é incompetente, é claro.
Nesta revisão, o roteiro de L.A. Confidential me pareceu uma aula de clareza, de como montar uma narrativa que tem suspense, que tem surpresas, que tem impacto, sem precisar ser confusa, atordoante.
James Ellroy faz livros sombrios e desesperançados
Os autores do roteiro primoroso, excepcional, são o próprio diretor Curtis Hanson, esse sujeito de talento absurdo, e mais Brian Helgeland.
Além desta obra-prima aqui e do já citado A Mão Que Balança o Berço, Curtins Hanson fez, entre outros, Uma Janela Suspeita (1987), Sob a Sombra do Mal (1990), Garotos Incríveis (2000), Bem-vindo ao Jogo (2007), Grande Demais Para Quebrar (2011). O cara é grande.
Brian Helgeland também é dos bons. Escreveu os roteiros de dois filmes de Clint Eastwood, Dívida de Sangue (2002) e Sobre Meninos e Lobos (2003); fez também roteiros para Tony Scott e Richard Donner. Arriscou-se na direção em quatro filmes, um deles, pelo menos, bem bom, 42: A História de uma Lenda, em que também assina o roteiro, baseado em uma história real fascinante sobre esporte e preconceito racial.
O roteiro de L.A. Confidential se baseia no romance de James Ellroy.
E James Ellroy também é dos bons. É dos grandes.
Eu seria capaz de apostar que Dashiell Hammett, Raymond Chandler e James M. Cain, os grandes autores dos romances hard-boiled, que deram origem a vários dos melhores filmes noir de toda a História, leram e aprovaram com louvor os livros de James Ellroy, que nasceu em 1948, quando a maior parte das obras deles já havia sido publicada.
Ellroy segue a trilha desses venerandos autores – mas, se é que isso é possível, ele consegue ser ainda mais triste, ainda mais desesperançado do que os seus mestres. É bem provável que isso se deva à sua triste história de vida: os pais se divorciaram logo, a mãe foi assassinada quando ele estava com 10 anos, ele tornou-se viciado em drogas, foi preso diversas vezes. Recuperou-se, no entanto, e, a partir dos anos 1970, começou a se dedicar à literatura.
Seu estilo é caudaloso. Cada romance seu é um cartapácio, quase um Guerra e Paz.
Só li um de seus livros, Dália Negra, de 1987, em que ele fala de um crime real, acontecido em Los Angeles em 1947: o assassinato de uma bela jovem, aspirante a atriz, na vida real prostituta, cujo corpo foi deixado em pedaços em um terreno baldio, com sinais de crueldade extrema. Dália Negra mistura muito de dados reais sobre as investigações policiais, que Ellroy pesquisou seriamente, com uma ficção tão apavorante quanto os fatos reais relatados.
Demorei meses para atravessar a narrativa densa, pesada, dura, apavorante de Dália Negra. A literatura de James Ellroy é doída, e machuca o leitor.
Dália Negra deu origem a um filme de Brian De Palma de 2006, com belo elenco – Josh Hartnett, Aaron Eckart, Scarlett Johansson, Hilary Swank.
Ler Dália Negra e rever L.A. Confidential deixa a claríssima impressão de que, em vez de ter sido drogadão e preso várias vezes, James Ellroy parece ter trabalhado na Polícia de Los Angeles. A sensação que se tem é de que o cara conheceu profundamente as entranhas daquilo ali. De que, como uma espécie de Truman Capote, entrevistou dezenas de tiras de Los Angeles, e conseguiu captar maravilhosamente como as coisas funcionavam ali, nos anos 1950.
O filme teve nove indicações ao Oscar e levou dois
Dei opiniões demais. Chega. Agora aí vão algumas informações fundamentais e outras opiniões.
O filme amealhou 86 prêmios mundo afora, e outras 60 indicações.
Teve nada menos que nove indicações ao Oscar: filme, direção, roteiro adaptado, atriz coadjuvante para Kim Basinger, fotografia, montagem, trilha sonora, direção de arte, som. Levou dois Oscars, os de roteiro e atriz para Kim Basinger.
Eis o que diz o livro 1001 Filmes Para Ver Antes de Morrer:
“Ambientada na Los Angeles dos anos 50, um pântano imundo de policiais corruptos flertando com criminosos novatos e tablóides inexperientes (ah… perdão, o tablóide não é inexperiente, não; é um tablóide sensacionalista muito bom dentro do que pretende ser), o filme inteligente e vibrante de Curtis Hanson reduz as muitas tramas do best-seller policial de James Ellroy ao seu cerne emocional. O ritmo de Hanson é perfeito, seu elenco travesso e inspirado, enquanto ele desenha a aliança moralmente ambígua entre três policiais radicalmente incompatíveis reunidos na investigação de um assassinato múltiplo.”
E mais adiante:
“Tingido pelo suntuoso tom quente dos filmes noir coloridos, e por vezes lembrando a fotografia do clássico Chinatown (1974), Los Angeles Cidade Proibida é um filme sensual, intrigante e cínico ao mesmo tempo.”
O que vai abaixo não revela nenhum segredo, mas é, sim, um spoiler
É fantástico como neste filme sério, duro, sombrio, há momentos de humor aberto.
É deliciosa, absolutamente deliciosa, a cena em que Ed Exley e Jack Vincennes entram em um restaurante de Hollywood, à procura de suspeitos e/ou pistas, e dão numa mesa em que há uma mulher parecida com Lana Turner e um homem. Ed, jovem, inexperiente, mais seguro de si do que deveria, tendo conhecido um esquema em que putas caríssimas imitavam atrizes de cinema, até com operações plásticas, vira-se para a dama e diz que uma puta que parece uma atriz de cinema não deixa de ser puta.
Jack está do lado de Ed, naquele momento estão trabalhando juntos, apesar de tudo que os distancia. Mas a besteira que o garotão está fazendo é de fato risível, e então Jack, mais descolado, mais velho, mais experiente, ri – antes de dar um toque para o companheiro neófito: “Ela é a Lana Turner”.
Na tomada seguinte, estão os dois, o policial venal e o policial incorruptível, no carro, logo depois de saírem do restaurante em que o segundo fez a besteira incrível. E aí os dois danam a rir da besteira que Ed tinha feito.
Maravilhosa sequência.
A frase pronunciada por Kim Basinger na última sequência do filme é também uma absoluta maravilha:
– “Some men get the world. Others get ex-hookers and a trip to Arizona.”
Grande verdade. Há quem consiga o mundo – ou pelo menos acredite que conseguiu o mundo. E há os outros que conseguem ex-putas e uma viagem para o Arizona.
Bem-aventurados os homens que, como o tira violento e incorruptível Bud White, conseguem encontrar o Céu com ex-putas e uma viagem para o interior bravo. Deles será o reino da felicidade eterna enquanto dura.
Anotação em novembro de 2014
Los Angeles: Cidade Proibida/L.A. Confidential
De Curtis Hanson, EUA, 1997.
Com Kevin Spacey (Jack Vincennes), Russell Crowe (Bud White), Guy Pearce (Ed Exley), James Cromwell (Dudley Smith), Kim Basinger (Lynn Bracken), Danny DeVito (Sid Hudgens), David Strathairn (Pierce Patchett), Ron Rifkin (promotor Ellis Loew), Matt McCoy (Brett Chase, ator do programa de TV Badge of Honor), Paul Guilfoyle (Mickey Cohen, o chefão mafioso), Paolo Seganti (Johnny Stompanato, o guarda-costa de Mickey Cohen), Amber Smith (Susan Lefferts), Darrell Sandeen (Buzz Meeks), Graham Beckel (Dick Stensland), Simon Baker (Matt Reynolds), Brenda Bakke (Lana Turner)
Roteiro Brian Helgeland e Curtis Hanson
Baseado no romance homônimo de James Ellroy
Fotografia Dante Spinotti
Música Jerry Goldsmith
Montagem Peter Honess
Casting Mali Finn
Produção Warner Bros. DVD Warner Bros.
Cor, 138 min
R, ****
Por favor, nunca deixe de postar. Conheci o site por acaso e já virei leitor.
Desculpe, Sergio , mas não achei a Kim Basinger digna de ganhar o Oscar , teve uma atuação correta , mas não chegou a empolgar , tirou injustamente da linda Julianne Moore o oscar que concorria porboogie nights . O filme em si émuito bom , o melhor de Curtis Hanson , mas ficou Sokbra do midiatico Titanic, merecia o Oscar de melhor filme.
muito bom seu site gostei muito do seu conteúdo.Vou passar mais vezes para ver as atualizações.abraço para vcs.
O texto é um tanto quanto fraco e mal escrito, apesar de ser um bom filme, com um roteiro bem estruturado, não passa de um clichê policial neo-noir hollywoodiano. Da pra comparar com pelo menos uns três títulos do Scorsese. A exaltação durante todo o texto, é apenas empolgação de quem o escreveu, lhe falta capacidade crítica na hora de dissertar sobre um filme.