Um Rapaz Adequado / A Suitable Boy

Nota: ★★★☆

Um Rapaz Adequado/A Suitable Boy, minissérie de seis episódios de cerca de 60 minutos cada, foi uma das mais caras produções da BBC em todos os tempos: consta que custou £16 milhões, equivalente a cerca de US$ 22,2 milhões. A direção de cinco dos seis episódios é da grande Mira Nair, cineasta experiente, respeitada, que trafega com facilidade entre os cinemas indiano, americano e inglês.

Produção da BBC é sinônimo de absoluta qualidade – e a série esbanja qualidade em todos os quesitos. Fotografia, direção de arte, figurinos, desenho de interiores, reconstituição de época – é tudo deslumbrante. A trilha sonora, de autoria do experiente Alex Heffes. autor, entre mais de 60, das trilhas de O Último Rei da Escócia (2006) e Intrigas de Estado (2009), e da jovem, porém abençoada desde o berço Anoushka Shankar, é estupenda.

Baseia-se em um dos romances mais caudalosos que já foram escritos na língua inglesa: A Suitable Boy, do indiano Vikram Seth, lançado em 1993, é um catatau de mais de 1.500 páginas, que faz um amplo painel de parte da sociedade indiana do início dos anos 1950 ao focalizar quatro famílias ricas da região Norte/Nordeste do país-continente.

A maior parte das filmagens foi em Lucknow, mas há também sequências filmadas em Maheshwar e Kanpur.

Boa parte da equipe técnica é indiana, assim como todos os atores.

O roteiro é de Andrew Davies, o galês que criou a série original inglesa House of Cards, de 1990, mais tarde adaptada para a realidade dos Estados Unidos, com Kevin Spacey e Robin Wright. Davis é o autor dos roteiros de O Diário de Bridget Jones (2001) e Bridget Jones, No Limite da Razão (2004). E também das adaptações para a TV inglesa de obras de William Shakespeare, Liev Tolstói, John Le Carré, Boris Pasternak, E. M. Forster, Jane Austen, Victor Hugo, Alexandre Dumas.

É, portanto, uma produção com diversas grifes absolutamente respeitáveis. Elaborada com orçamento confortabilíssimo – o que resultou numa obra tecnicamente impecável.

É um grande painel, um afresco, um épico sobre um dos maiores países do mundo (em população, em tamanho, em qualquer quesito possível) num momento crucial de sua história, 1951, logo após o fim do secular domínio britânico e da partição – a divisão do que antes era um único país em dois, a Índia ao Sul e o Paquistão ao Norte, teoricamente para que cada um dos dois grandes grupos étnicos e religiosos, os hindus e os muçulmanos, tivessem o seu próprio Estado.

É uma beleza de série.

No entanto, poucas vezes vi tanto pau, tanta crítica furibunda contra uma obra quanto aqui – seja dos críticos profissionais, seja de gente comum, igual ao eventual leitor e a mim.

No IMDb, a minissérie foi avaliada, até agora, início de maio de 2021, por 4.285 leitores; a nota média é 5,9 – mas é impressionante o número de leitores que metem o pau furiosamente na série e, de 1 a 10, botam nota 1.

No Rotten Tomatoes, a série tem 69% de aprovação dos críticos e 60% do apoio dos leitores.

Há aí, creio, um fenômeno. Meu Deus do céu e também da Terra, por que raios tanta gente fala tão mal de uma série tão bem realizada?

Famílias de hindus e muçulmanos que se dão bem

Os realizadores tiveram grande preocupação em deixar claro, de cara, com todas as letras, que a minissérie não fala mal de qualquer grupo étnico ou religioso. No princípio de cada um dos seis episódios, há o seguinte cuidadoso aviso:

“Os personagens, lugares, nomes e evento nesta série são ficcionais e foram conceitualizado de forma criativa com fins de dramatização. Semelhança com quaisquer eventos, entidades, lugares ou pessoas reais é pura coincidência. Respeitamos todas as fés, religiões e comunidades, e de maneira alguma pretendemos desrespeitar, insultar, prejudicar ou depreciar as crenças, sensações, sentimentos de qualquer pessoa, comunidade, religião, sociedade e sua cultura, usos, práticas e tradição.”

Não faço a menor idéia dos motivos que levaram o escritor Vikram Seth a criar uma cidade fictícia, Brahmpur, como o lugar em que se passa a maior parte da ação, enquanto há diversos eventos que acontecem em cidades reais – Calcutá, Lucknow e Banares. A minissérie manteve tudo como o autor escreveu – na abertura do primeiro episódio, uma legenda diz “Bramhpur, 1951”.

As relações entre os hindus e os muçulmanos em 1951, apenas quatro anos após a partição são o pano de fundo de boa parte da trama de A Suitable Boy.

E essas relações hindus-muçulmanos não se dão de uma única forma, de uma forma monolítica, segundo mostra a série. Há um conflito subjacente, que em alguns momentos explode – lá pelo meio da série, há um enfrentamento aberto entre grupos de hindus e de muçulmanos que comemoravam respectivas festividades religiosas.

Mas, na maior parte do tempo, a convivência é pacífica, tranquila, civilizada. Os chefes de duas das quatro famílias focalizadas na história – um hindu, um muçulmano – se dão muitíssimo bem, são grandes e fiéis amigos da vida toda. Boa parte da família do muçulmano, Nawab Sahib (o papel de Aamir Bashir), se mudou para o Paquistão, quando houve a partição, mas ele ficou, não quis deixar sua terra.

E o filho dele, Firoz (Shubham Saraf), é o maior amigo do filho daquele hindu. Veremos que o filho do hindu, Maan Kapoor (o papel de Ishaan Khattar), será o segundo personagem mais importante da saga. O pai, Mahesh Kapoor (Ram Kapoor), é o ministro da Fazenda daquele Estado. (Não se fala o nome do Estado.)

Mahesh Kapoor é bastante rico – mas seu amigo Nawab Sahib é mais ainda; é um milionário, possivelmente o homem mais rico da região. São, os dois – o espectador perceberá bem rapidamente, e a percepção vai se mostrando acertadíssima, ao longo dos seis episódios – dois bons homens, de bom caráter.

Em pleno século XX, casamentos arranjados!

Hindus e muçulmanos, como acabei de dizer, têm convivência pacífica na maior parte do tempo, e há grandes amizades entre uns e outros, como demonstram Mahesh Kapoor e Nawab Sahib e também seus filhos.

Quando, no entanto, se trata de casamento, aí a história é outra. Lata Mehra (Tanya Maniktala, na foto acima e ao centro na foto abaixo), a linda, simpática, inteligente, sensível estudante de Literatura Inglesa na Universidade de Brahmpur se apaixona por um rapaz também bonito, simpático, filho de um professor de Matemática, que estuda História na mesma universidade, ela sabe, desde o início, que é um romance proibido, que sua família jamais aceitaria o casamento: Kabir Durrani (Danesh Razvi) é muçulmano.

Lata Mehra é a principal personagem de Um Rapaz Adequado – e casamento é um tema sempre presente na trama.

Um rapaz adequado, a suitable boy – isso é o que a mãe de Lata passará o tempo todo procurando para que se case com a mais nova de suas filhas mulheres. A filha mais velha, Savita (Rasika Dugal), essa está se casando na sequência de abertura da minissérie. O noivo é Pran Kapoor (Gagandev Riar), o filho mais velho de Mahesh.

A mãe da noiva e de Lata, a senhora Rupa Mehra, uma viúva (o papel de Mahira Kakkar), diz para a filha solteira numa das primeiras cenas de Um Rapaz Adequado que em breve será a vez dela.

Lata pede para a mãe não chorar na festa de casamento, e a mãe, enxugando as lágrimas, diz: – “Seu pai teria ficado radiante de vê-la tão feliz.” E aí, olhando seria para a filha linda, sentencia: – “Também vou escolher seu marido.”

Lata responde com um “Hum…” E a mãe: – “Sei o que seu ‘hum’ significa, jovenzinha, e você não vai se safar.”

Um momentinho antes, Lata havia ficado ao lado do jovem Maan Kapoor – os dois que serão os personagens principais dessa saga que tem uns 15 ou 20 personagens importantes. O diálogo é bom para ajudar o espectador a entender quem é quem naquele início de narrativa em que estamos diante de um montão de pessoas ainda desconhecidas. Mas é também importante porque já dá boas indicações de como são arranjados pela família os casamentos naquela sociedade.

Maan, indicando o casal de noivos: – “Sua irmã, meu irmão.”

Lata: = “Como ela pode estar tão feliz? Conheço seu irmão melhor do que Savita. É meu professor de Literatura Inglesa, e ela só o viu uma vez, por uma hora, e acompanhada.”

Maan faz uma expressão de espanto, de quem não sabia que seu irmão Pran só havia visto a noiva uma única vez. E em seguida diz para sua amiga e agora concunhada Lata: – “Veja meu pai me encarando. Sou o próximo. Estou noivo de uma garota de Banares. Mas tento não pensar nisso.   “

Um país agora livre. Gente rica. Uma moça que estuda Literatura Inglesa na universidade. E os casamentos são arranjados pelos pais!

A senhora Rupa Mehra vai passar boa parte das cerca de 6 horas de duração da minissérie procurando um rapaz adequado para a sua filha. A suitable boy.

Fiquei pensando que essas famílias da série baseada no romance mastodôntico de Vikram Seth têm semelhanças com as famílias do campo inglês do século XVII dos livros de Jane Austen. Como no campo inglês de Razão e Sensibilidade, Orgulho e Preconceito, o casamento é a coisa mais importante na vida das moças. A vida gira em torno da procura de um suitable boy.

Afe!

Acompanhamos Lata e os três homens que a cercam

Mas há uma diferença grande que precisa ser registrada: o casamento, a necessidade de ser um casamento com um rapaz adequado – isso é a coisa mais importante na cabeça de Rupa Mehra, a mãe. Não na cabeça da garota Lata.

Ao longo dos seis episódios da minissérie, que narram fatos acontecidos ao longo de 1951 e 1952, Lata, apaixonada pelo rapaz muçulmano Kabir, será paquerada também por dois hindus. Um é poeta, o outro é um fabricante de calçados, como alguns personagens se referem a ele – um shoemaker.

Haresh Khanna (Namit Das), o shoemaker, é um batalhador, um sujeito esforçado. Conseguiu estudar na Inglaterra – não em Oxford ou Cambridge, onde iam estudar os filhos dos marajás, mas numa universidade de tecnologia industrial. Na volta, foi galgando posições em uma grande fábrica de calçados. É um bom homem, um bom c caráter.

O poeta não teve que batalhar nem se esforçar por nada. Nasceu em berço de ouro, como diria minha mãe: Amit Chatterji (Mikhail Sen) é filho de um homem muito rico, um magistrado que ocupa alta posição (o papel de Barun Chanda); é jovem, bonito, charmoso e tem amplo reconhecimento como um bom poeta. Não tem que se preocupar com trabalho formal: escreve versos, e pronto.

Um dos fios condutores da trama é a vida amorosa de Lata e seus três pretendentes – o que ela ama mas com quem jamais poderia casar por ser de outra etnia, outra religião, o poeta e o fabricante de sapato.

Eu já havia mencionado aqui três famílias – a de Lata, os Mehra, a do rapaz Maan, os Kapoor, e a do riquíssimo Nawab Sahib.

A quarta família que o caudaloso romance de Vikram Seth e a minissérie de Mira Nair acompanham é a do poeta Amit Chatterji. Amit é o filho do meio do juiz Chatterji. A filha mais nova, Kakoli (Ananya Sem), é uma bobagem ambulante; sabe viver, diverte-se na vida – e é incrivelmente bobinha e sem substância.

A irmã mais velha, Meenakshi, é casada com Arun Mehra, o irmão mais velho de Lata. (Meenakshi é interpretada por Shahana Goswami; Arun, por Vivek Gomber).

Numa história que tem tantas pessoas do bem, de bom caráter, corretas, o casal Arun e Meenakshi se destaca como gente chata, ruim, desprezível.

Arun parece ter sido criado para ser o protótipo do sujeito imbecil de país colonizado que faz tudo para ser igual ao colonizador. Tenta adotar um estilo de vida absolutamente ocidentalizado, em cada pequeno detalhe. Copia dos colonizadores britânicos o que eles têm de pior – o horroroso classismo, a distinção entre as classes sociais. Demonstra soberbo nojo de quem não é rico fino chique e ocidentalizado.

Um postema, um horror.

A mulher dele, Meenakshi, é uma perfeita dondoca idiota, para quem a aparência é tudo. A bela moça tem um amante, um sujeito grandalhão que é amigo do casal.

A série usa e abusa de ações paralelas

Falta falar de uma personagem importante nessa grande galeria de personagens. Chama-se Saeeda Bai (o papel de Tabu, nas fotos acima e abaixo), é uma mulher belíssima, magneticamente sedutora. O espectador a vê já no primeiro episódio: conhecida como excelente cantora (e também como cortesã de luxo para os homens mais endinheirados de Brahmpur), ela é contratada para dar um recital na casa dos Kapoor.

O jovem Maan, o filho de Mahesh Kapoor que dá dor de cabeça ao pai, porque se recusa a decidir o que fazer na vida, e, ali pelos 20 e poucos anos, leva uma vida folgada, sem responsabilidade algum, apaixona-se no ato por Saeeda Bai. Daquelas paixões violentas, definitivas, dramáticas – amor de perdição, como cunhou, com brilhantismo, o escritor Camilo Castelo Branco.

Em torno da fascinante Saeeda Bai e da bela garota que ela apresenta ao mundo como irmã, Tasneem (Joyeeta Dutta), formam-se histórias dignas de novelão mexicano, de tango argentino, de guarânia paraguaia, de samba-canção dor de cotovelo brasileiro.

É um grande painel, um imenso afresco, e então haverá lugar para um crime, um julgamento, e para questões políticas, sessões na Assembléia Estadual. Como a ação, iniciada em 1951, alcança 1952, o ano em que a Índia realizou eleições gerais, tidas então como as maiores eleições democráticas já realizadas no mundo, Mira Nair se deu ao luxo de misturar tomadas filmadas por ela hoje com cenas reais da época, trechos de cine e telejornalismo em preto-e-branco. Vemos imensas multidões nas ruas, gente votando – e vemos Jawaharlal Nehru, o longevo primeiro-ministro, no dia da eleição.

São magníficas essas sequências que misturam cenas reais de 1952 com tomadas de ficção filmadas em 2019.

Experientes, maduros, a diretora Mira Nair e o roteirista Andrew Davies apresentam uma narrativa sóbria, sem grandes fogos de artifício, sem criativóis desnecessários. É tudo estupidamente colorido – eta povo para gostar de cores fortes nas roupas, meu Deus do céu e também da Terra.

Há, no entanto, uma característica interessante em praticamente todos os episódios da minissérie: A Suitable Boy usa e abusa das narrativas paralelas, das sequências que mostram diversos eventos ao mesmo tempo – e usa e abusa disso com imenso talento. Há momentos em que se alternam na tela tomadas de quatro e até cinco eventos diferentes. Uma maravilha.

A protagonista é uma atriz novata

No país que mais filmes produz, a cada ano, um país de 1 bilhão e 400 mil habitantes, imagine-se como deve ser competitivo o mundo do cinema e da TV. Fiquei pensando nisso ao imaginar a sorte que teve essa jovem atriz Tanya Maniktala por ter sido escolhida para o principal papel desta minissérie. Claro: é linda, tem presença diante das câmaras, tem carisma, tem talento. Mas, diabo, quantas atrizes indianas entre, digamos, 20 e 24 anos não estariam disputando o papel de Lata Mehra?

Tanya Maniktala (de novo na foto abaixo), nascida em Nova Délhi em 1997, havia feito uma série de TV, Flames, em 2018. Este aqui foi seu segundo trabalho, apenas. Incrível!

Pelo jeito, é a única novata. Os demais atores são experientes, e provavelmente são bem conhecidos na Índia. Ram Kapoor, por exemplo, que faz Mahesh Kapoor, o ministro da Fazenda e pai de Maan, tem 49 títulos no currículo.

A jovem Rasika Dugal, que faz Savita, a irmã de Lata que se casa na primeira sequência da minissérie, já tem 41 títulos – inclusive Crimes em Délhi, uma bela série de 2019 em que interpreta uma policial iniciante que ganha grande importância na trama.

A maior estrela do elenco parece sem dúvida ser Tabu, que interpreta a bela e sedutora Saeeda Bai, a cortesã – e, uau, que nome artístico a moça escolheu! Tabu é o primeiro nome que aparece nos créditos iniciais, antes mesmo de Tanya Maniktala, que faz a protagonista da história.

Embora faça o papel de uma mulher vivida, e muito, muito mais velha do que Mann, Tabu tinha apenas 50 anos quando a minissérie foi lançada, e tem a aparência de uma mulher de 40. Tabu, nascida Tabassum Fatima Hashmi, tem mais de 90 filmes no currículo, muitos deles, segundo informa o IMDb,        “de baixo orçamento e pouco sucesso comercial, mas muito apreciados pela crítica” – uma maneira de dizer filmes sérios. Há uma característica impressionante na filmografia da atriz: ela fez filmes falados nas línguas telugu, tamil, malayalam, marathi e bengali.

Em A Suitable Boy ela fala em inglês e canta em urdu.

“Distorcido e feito de maneira pobre.”

E aqui vai um ponto me pareceu fora da curva nesta minissérie tão absolutamente bem realizada em todos os quesitos: na imensa maior parte do tempo, todos os personagens falam em inglês. Em alguns momentos, em especial quando aparecem personagens mais pobres, fala-se em hindi – e também, segundo vejo na internet, em bengali e urdu.

Não sou, de forma alguma, um conhecedor da Índia, de fatos relacionados à Índia, mas me parece bastante claro que o inglês, a língua do colonizador que acabaria se transformando no Esperanto natural do mundo globalizado, pode no máximo ser a segunda língua de parte da população daquele país-continente, para não dizer país-planeta. Mas não é, de forma alguma, a primeira língua, naquele país que tem 400 idiomas e dialetos.

O cinema mostra isso à exaustão – desde os grandes clássicos do mestre Satyajit Ray até filmes e séries recentes, como a já citada Crimes em Délhi (2019) e também O Motim / Mangal Pandey: The Rising (2004) O Violinista / The Violin Player (2016), Garota Estranha/Pagglait (2021), para citar só alguns.

Tudo bem: a maior parte daquele grande número de personagens é gente rica, estudada, que seguramente domina o inglês. Mas é estranho ver aquelas pessoas falando em inglês mesmo em casa, mesmo com as pessoas mais íntimas.

Claro, isso é um facilitador para que a série atinja um público maior em um grande número de países, em especial a própria Grã-Bretanha, os Estados Unidos e o Canadá, alguns dos maiores mercados do mundo. Mas me pareceu uma falha, um erro bobo, que poderia perfeitamente ter sido evitado.

Uma falha, um erro. Uma concessão por razões mercadológicas, comerciais. Nada que comprometa a qualidade da minissérie.

Por isso é que fiquei chocado com a quantidade de críticas virulentas feitas por leitores no IMDb. Eis alguns títulos, algumas frases:

* “Não conectado com a realidade. Como pode um sujeito beijar uma garota dentro de um templo nos anos 80 enquanto os outros caminham sem sequer piscar?” (Bem, o cara acha que a ação se passa nos anos 80, em vez de nos 50…)

* “Um olhar sobre a Índia através de lentes antigas, estigmatizadas e ocidentais.”

* “Desapontado. Essa série lança vergonha sobre o livro. Os realizadores fizeram o que a sua audiência principal, isto é, os britânicos, queriam ver. Pegue o livro e você sentirá a diferença.”

* “Distorcido e feito de maneira pobre.”

Só consigo imaginar, como explicação para tanto ódio, que vai aí nessas críticas o peso, o ódio, o ressentimento de indianos pelos séculos de dominação pelos britânicos. Uma produção que tenha pessoal e dinheiro britânico, mesmo que a diretora, todo o elenco e boa parte dos técnicos sejam indianos, não pode ser bem recebida – vai levar sempre a pecha de colonialista.

Na minha opinião, é uma bela série.

Ainda bem que não estamos sozinhos, Mary e eu.

“As qualidades de Mira Nair como realizadora estão à mostra de maneira total e deslumbrante na sua adaptação do épico romance de 1993 A Suitable Boy, o rival escrito por Vikram Seth a Guerra e Paz e Orgulho e Preconceito”, escreve Roxana Hadadi no site RogerEbert.com, que procura manter viva a memória do grande crítico. As ponderadas considerações de Nair sobre a complicada história e a vibrante cultura da Índia, evidenciada em clássicos como Moonson Wedding (Um Casamento à Indiana, 2001) e The Namesake (Nome de Família, 2006), são tão importantes aqui quanto seu olhar satírico sobre as maquinações românticas, como em Vanity Fair (Feira das Vaidades, 2004). Juntamente com o roteiro de Andrew Davies, a direção de Nair guia esse extenso elenco que brilha na peça de época que levanta questões sobre amor, religião e identidade nacional em uma Índia tentando achar seu próprio caminho após a libertação do domínio britânico. Embora A Suitable Boy demore um pouquinho para engrenar, o tempo que a minissérie de seis episódios investe em seus personagens vale a pena, com arcos cativantes, artifícios que agarram nossa atenção, e uma conclusão que é inegavelmente conservadora, mas ainda assim esperançosa em sua sugestão sobre o poder do livre arbítrio.”

É. Roger Ebert gostaria do texto dessa moça Roxana Hadadi. Assim como gostaria deste A Suitable Boy.

Anotação em maio de 2021

Um Rapaz Adequado/A Suitable Boy

De Mira Nair, Shmit Amin, Inglaterra-Índia, 2020

Com Tanya Maniktala (Lata Mehra),

(e, na família Mehra e em seu entorno) Mahira Kakkar (Mrs. Rupa Mehra, a mãe, viúva), Rasika Dugal (Savita, irmã de Lata e mulher de Pran Kapoor), Vivek Gomber (Arun Mehra, o irmão mais velho de Lata), Vivaan Shah (Varun Mehra, o irmão mais novo de Lata), Danesh Razvi (Kabir Durrani, o namorado de Lata), Namit Das (Haresh Khanna, o gerente da fábrica de sapatos), Sharvari Deshpande (Malati, a grande amiga de Lata), Bugs Bhargava Krishna (professor Mishra),

(na família Kapoor e em seu entorno) Ishaan Khattar (Maan Kapoor), Ram Kapoor (Mahesh Kapoor, o pai de Maan e ministro das Finanças), Geeta Agrawal Sharma (Mrs. Mahesh Kapoor, a mãe de Maan), Gagandev Riar (Pran Kapoor, o marido de Savita e irmão mais velho de Maan), Yusuf Akhtar (Bhaskar Tandon, o garotinho neto de Mahesh), Vinay Pathak (L.N. Agarwal, o ministro do interior),

(na família Chatterji) Shahana Goswami (Meenakshi, a mulher de Arun Mehra), Mikhail Sem (Amit Chatterji, o poeta, irmão de Meenakshi), Ananya Sen     (Kakoli Chatterji, a irmã mais nova de Meenakshi e Amit), Barun Chanda (juiz Chatterji, o pai dos três), Adity Chakravarti (Mrs. Chatterji, a mãe), Thomas Weinhappel (Hans, o alemão namorado de Kakoli),

(na família Nawab Sahib) Aamir Bashir (Nawab Sahib, milionário, o grande amigo de Mahesh Kapoor), Shubham Saraf (Firoz Ali Khan, filho de Nawab Sahib e o grande amigo de Maan Kapoor),

(e também) Tabu (Saeeda Bai, a cantora e cortesã), Joyeeta Dutta (Tasneem, a filha de Saeeda Bai), Vijay Varma (Rasheed, o professor de Tasneem), Ranvir Shorey (Waris, o capataz de Nawab Sahib), Vijay Raaz (o pai de Rasheed)

Roteiro Andrew Davies

Baseado no romance homônimo de Vikram Seth

Fotografia Declan Quinn

Montagem Nick Fenton, Tanupriya Sharma

Casting Karan Mally, Dilip Shankar, Nandini Shrikent

Direção de arte Stephanie Carroll      .

Produção Lookout Point Ltd., BBC, Production Scope.

Cor, cerca de 360 min (6h)

Disponível na Netflix em maio de 2021.

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