A Chave Mestra / The Skelton Key

Nota: ★½☆☆

Uma casa grande, bonita, rica, atraente, impressionante. De preferência (mas não necessariamente) um tanto isolada do resto deste insensato mundo. Uma pessoa ou um grupo de pessoas jovens, alegres, cheias de vida, que chegam àquela casa. E aí, depois de algum tempo… tcham-tcham-tcham-tcham… Perigo!

Dizer que há mais filmes sobre casarões assombrados, amaldiçoados, sombrios, condenados do que grãos de areia numa praia, mesmo uma praia pequena como a Vermelha, no Rio de Janeiro, ou Guaiúba, no Guarujá, talvez seja um pouquinho exagerado. Mas só um pouquinho.

A Chave Mestra/The Skeleton Key, co-produção EUA-Alemanha de 2005, dirigida pelo inglês Iain Softley, autor do interessante K-Pax – O Caminho da Luz (2001) e do ótimo Asas do Amor/The Wings of Dove, é, digamos assim, um dos 2.345.328 filmes desse tipo. Mas tem Kate Hudson, aquela moça de beleza perfeita, de rosto que parece ter sido esculpido pela própria Divindade, e Gena Rowlands,  mulher fascinante que, mais que atriz, transformou-se num mito, numa lenda. E então me dispus a ver a coisa.

Um casarão isolado no meio de mata e pântanos – mas perto de Nova Orleans

O casarão da vez é grande, impressionante – e seguramente já foi bonito, rico e atraente no passado, mas agora, na época em que a história se passa, os nossos dias, parece decrépito, corroído pelo tempo. Quase acabado, quase caindo aos pedaços.

É uma daquelas mansões imponentes do Sul Profundo dos Estados Unidos, aquelas propriedades gigantescas construídas antes da Guerra da Secessão, antes que os ianques arrogantes tivessem aquela idéia maluca de acabar com a escravidão. Mansões dos barões da agricultura do majestoso Sul Profundo, diante das quais as mansões dos barões de café que sobraram na Avenida Paulista, em Higienópolis e nos Campos Elíseos, em São Paulo, só para dar uma comparação com algo um pouco mais próximo de nós, parecem minúsculas, coisas de somenos importância.

A mansão majestosa fica no meio dos terrenos pantanosos do Great State of Louisiana, na região do Delta do Mississipi. Não longe demais da vida agitada de New Orleans – mas, ao mesmo tempo, de fato distante deste insensato mundo. Bem no final do filme, há uma esplêndida tomada aérea da mansão, num suave zoom – a casa vai ficando mais distante, a câmara vai se afastando cada vez mais, e o espectador constata mais uma vez que toda aquela propriedade é cercada por mata verdejante e cursos d’água, pântano, mangue. Não há vizinho algum próximo à grande casa.

Tão longe, tão perto: embora isolada ali naquele lugar ao mesmo tempo belíssimo e um tanto assustador, fantasmagórico – pântano não remete sempre a algo estranho, misterioso, sombrio? –, a propriedade não está tão distante assim de uma boa estrada asfaltada. É Sul Profundo, mas são os Estados Unidos da América, o país mais rico que já houve no planeta, e há boas estradas asfaltadas em absolutamente qualquer lugar.

Caroline Ellis, a lindérrima jovem que é a protagonista da história, poderá vencer a distância entre o casarão isolado e o centrinho de Nova Orleans em cerca de uma hora – não muito mais que isso.

E ela fará a viagem entre a propriedade e o centrinho de Nova Orleans várias vezes, ao longo dos 104 minutos do filme.

A jovem Caroline se candidata a cuidadora de um velho que teve um AVC

Caroline Ellis – o papel de Kate Bela Barbie Hudson – é uma jovem de 25 anos de idade, de Hoboken, Nova Jersey (Hobeken, vejam só, a cidade de Frank Sinatra!), que, jamais saberemos por que, resolveu se mudar para o Sul Profundo, para a cidade que é o berço do jazz, a metrópole do Estado que foi primeiro ocupado pelos franceses, um estranho pedaço dos US of A em que muita gente ainda fala francês, ou algo que parece francês.

Linda feito uma Primavera de Boticelli, Caroline é uma jovem séria, trabalhadora. Quer estudar para se tornar enfermeira, e trabalha em uma instituição que abriga idosos. Com carinho e abnegação, cuida de um senhor que está à morte, lê para ele A Ilha do Tesouro de Robert Louis Stevenson. Quando o senhorzinho morre, Caroline percebe que aquele lugar não cuida bem dos pacientes, é um lugar insensível cheio de profissionais insensíveis. Então, quando o filme está aí só com uns 5 minutos, ela se encontra com sua amiga Jill (Joy Bryant), com quem divide um apartamento, vão as duas a uma boate dançar, e daí a pouco Caroline está decidida a pegar o emprego – anunciado num jornal – de cuidadora de um senhor que mora no lugar tal e tal, um tanto afastado da cidade, mas não demais.

Caroline viaja no seu Fusca vermelho até a mansão imensa mas decadente e decaindo do casal Devereaux. De-ve-rou, como dizem os da língua que se impôs após a saída dos franceses.

A dona da casa, Violet Devereaux (o papel de Gena Rowlands), não faz questão alguma de ser simpática com a candidata a cuidadora de seu marido. É preciso que Luke Marshall (o papel de Peter Sarsgaard) intervenha, e use sua lábia para convencer Caroline a aceitar o emprego, apesar do jeito de maus bofes de Violet.

Luke se apresenta como o advogado dos Devereaux, e está escrevendo o testamento deles.

Ben Devereaux (o papel de John Hurt, na foto abaixo) tinha tido um AVC. Não conseguia mais andar, nem falar. Caroline, uma jovem de fato dedicada, de bom coração, passa a ter afeto por ele.

A dona da casa diz que dois fantasmas habitam o lugar

Violet apresenta a casa para Caroline. Dá a ela uma chave mestra, capaz de abrir todas as dezenas e dezenas de portas da mansão de dois andares e mais um terceiro, o do sótão. O sótão, explica a dona da casa, está entupido de velharias – Caroline não precisa entrar lá.

Claro que isso despertará em Caroline uma imensa curiosidade em  saber o que há no sótão.

A garota repara que não há espelhos na casa. Os espelhos dos banheiros haviam sido todos retirados. Violet diz que os velhos não precisam de espelhos.

Casarão imenso velho, com um sótão abarrotado de coisas onde a cuidadora do enfermo não deve ir. Chove muito ali, grandes tempestades, raios, trovões. Há ruídos estranhos na casa.

Tcham-tcham-tcham-tcham… Perigo!

Sim, há fantasmas na casa – pelo menos Violet dirá a Caroline, quando o filme já está quase na metade, que há fantasmas na casa. Os fantasmas de um casal de empregados negros de um banqueiro malvado que foi o dono daquela mansão no começo do século XX – Papa Justify (Ronald McCall) e Mama Cecile (Jeryl Prescott).

Caroline perguntará a sua amiga Jill sobre vudu. Jill apresentará à amiga e ao público uma coisa chamada hoodoo – algo de que eu jamais tinha ouvido falar. A Wikipedia explica que o hoodoo é uma forma tradicional de magia que se desenvolveu a partir do sincretismo de diversas culturas e tradições, usa os conhecimentos dos índios da América do Norte sobre ervas medicinais e tem alguma influência do vudu haitiano.

Jill simplifica para Caroline que o hoodoo é uma espécie assim de vudu do bem.

Papa Justify e Mama Cecile, os dois negros que trabalharam na mansão no início do século e sofreram o diabo nas mãos do cruel banqueiro, eram praticantes do hoodoo.

E Caroline vai se convencer de que Ben Deveraux quer que ela o tire daquela casa.

Tem alguma coisa interessante. Mais a beleza de Kate e o talento de Gena

Há alguma coisa interessante na história – criada diretamente para o filme pelo roteirista Ehren Kruger – porque durante um bom tempo tudo tem lógica: Caroline fica convencida de que, para quem crê no hoodoo, aquelas coisas todas de fantasmas são verdadeiras. Auto-sugestão é assim, e funciona – ela crê. E faz sentido.

Mas, depois que passa um pouco da metade, o filme vira aquela coisa de sempre: perseguição, perseguição, a heroína apavorada, correrias, barulheira, violência.

Toda aquela coisa previsível, aquela forçação de barra para aterrorizar o pobre espectador.

E, no finalzinho, bem no finalzinho, há uma grande virada, o twist definitivo. Achei bem esperto.

Em suma: para mim, é um suspense-terror não mais que mediano. Bem medianinho. As únicas coisas de fato boas são a beleza de Kate Hudson e o talento de Gena Rowlands.

Leonard Maltin deu 2 estrelas: “Bem produzido e com algum suspense ocasional, mas povoado por personagens desagradáveis e com uma história que se desenvolve muito lentamente. Mais um de uma longa linhagem de thrillers de horror voltada para o público feminino.”

Diacho: de onde foi que o Maltin tirou que há uma longa linhagem de thrillers de horror voltada para o público feminino? Eu nunca soube disso…

Anotação em junho de 2017

A Chave Mestra/The Skelton Key

De Iain Softley, EUA-Alemanha, 2005

Com Kate Hudson (Caroline Ellis), Gena Rowlands (Violet Devereaux), John Hurt (Ben Devereaux), Peter Sarsgaard (Luke Marshall), Joy Bryant (Jill), Maxine Barnett (Mama Cynthia), Fahnlohnee R. Harris (Hallie), Marion Zinser (mulher da bayou), Ronald McCall (Papa Justify), Jeryl Prescott (Mama Cecile), Deneen Tyler (enfermeira),

Argumento e roteiro Ehren Kruger

Fotografia Dan Mindel

Música Edward Shearmur

Montagem Joe Hutshing

Casting Ronna Kress

Produção Universal Pictures, ShadowCatcher Entertainment, Double Feature Films, Daniel Bobker Productions, Brick Dust Productions LLC, MFPV Film.

Cor, 104 min (1h44)

*1/2

Título na França: La Porte des Secrets. Em Portugal: A Chave.

6 Comentários para “A Chave Mestra / The Skelton Key”

  1. O twist é a melhor coisa do filme, quanto a mim, o resto é corriqueiro.
    Pena é ter actores tão bons para fazer uma vulgaridade.

  2. Assisti para ver a Divina Maravilhosa Cassavetiana Virginia Cathryn Rowlands, e, talvez por ter grande apreço pelos “plot twists”, gostei do filme (ou talvez por eu fazer parte do público alvo dessa longa linhagem de thrillers de horror voltada para o público feminino, HAHAHA).

  3. Eu gostei muito do filme, sinceramente não gostaria que a Netflix o tirasse do catálogo. E sim, gosto de longa linhagem de thrillers de horror voltada para o público feminino.

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