Do Mundo Nada se Leva é possivelmente o filme mais sonhador, mais idealista, do mais sonhador e idealista dos realizadores, Frank Capra. Lançado em 1938, é também uma espécie de antecipação do sonho do hippismo, da contracultura, que explodiria nos anos 60.
A casa maluca, divertida, doidona do senhor Martin Vanderhof (o papel de Lionel Barrymore), é seguramente a primeira comunidade hippie mostrada no cinema.
Há uma boa definição da casa-comunidade num diálogo entre Alice, neta do Vanderhof (interpretada por Jean Arthur), e seu namorado, Tony Kirby (um muito jovem James Stewart). Tony tinha acabado de ir pela primeira vez até a casa da namorada pegá-la para um programa noturno, um balé e jantar, e tinha ficado estupefato com o que vira.
Tony: – “Viver com eles é como viver num mundo de Walt Disney. Todos fazem o que querem, não é?”
Alice: – “Sim. Vovô começou isso. Um dia, ele desistiu dos negócios. Subiu no elevador, desceu e nunca mais voltou. Ele poderia ter sido rico, mas disse que aquilo não tinha graça nenhuma.”
Tony: – “Que maravilha!”
Fazer apenas o que se quer, o que dá vontade. Isso era tudo que Tony (assim como milhões e milhões de pessoas) gostaria na vida. Se pudesse, se fosse como os malucos habitantes da casa de Vanderhof, se fosse dado a ele o direito de fazer apenas aquilo de gosta, Tony gostaria de continuar estudando, junto com um grande amigo da faculdade, uma forma de retirar e conservar a energia solar. Mas quis o amargo destino que ele, Tony, filho do bilionário e poderoso banqueiro Anthony P. Kirby (o papel de Edward Arnold), fosse um aprendiz de banqueiro. Na verdade, ele já era, apesar de tão jovem, vice-presidente do grande banco do pai em Wall Street.
Vice-presidente e herdeiro de grande banco, porque foi isso o que lhe reservou o destino, mas tristíssimo, de saco profundamente cheio. Não queria, achava tudo aquilo uma chatice atroz – e por isso ficou morrendo de inveja daquele bando de malucos beleza que viu na casa da namorada.
Um a um, quem são os proto-hippies que vivem na grande comunidade
Eis os malucos beleza que habitam a casa feliz:
. De Martin Vanderhof (Lionel Barrymore), o patriarca, já se falou um pouco. Um belo dia ficou de saco cheio da vida que levava, e que o estava levando à riqueza; pegou o elevador, desceu e nunca mais trabalhou na vida. Coleciona selos, virou um expert no assunto, e de vez em quando até ganha algum fazendo consultoria para colecionadores endinheirados. Gosta também de tocar músicas folk na gaita de boca, harmônica, como seu contemporâneo Woody Guthrie, não citado no filme, e nas horas vagas curte um passeio ao zoológico. É viúvo.
. Penny (Spring Byington), uma senhora aí de seus 40 e muitos anos, é a filha única de Vanderhof e mãe de Alice, a moça que agora namora Tony. Dedica-se de forma quase obsessiva a hobbies. Já pintou, no passado. Uns sete anos antes da época em que se passa a ação, alguém esqueceu ali na casa uma máquina de escrever, e desde então Penny dedica-se loucamente a escrever peças de teatro.
. Paul Sycamore (Samuel S. Hinds) é o marido de Penny. Também se dedica a hobbies. No momento, está fabricando fogos de artifício no grande porão da casa, juntamente com DePinna.
. Este DePinna (Halliwell Hobbes) tinha ido, vários anos atrás, entregar alguma coisa na casa – e ficou. Nunca mais voltou ao emprego, ficou por lá, um aderente à família.
. Essie (Ann Miller, a grande atriz e dançarina de tantos musicais, bela e de pernas tão maravilhosas quanto as de Cyd Charisse, sua contemporânea e colega) é filha de Penny e Paul Sycamore, e portanto neta de Vanderhof e irmã de Alice. Faz doces, e passa o tempo todo dançando pela casa; estuda balé com Kolenkhov.
. Kolenkhov (Mischa Auer) é, obviamente, como o nome indica, um russo, nascido em Omsk. Este não mora na casa-comunidade, mas fila todas as bóias. Sempre dá um jeito de chegar para as aulas de Essie na hora do jantar. Industrializa seu mau humor, acha tudo péssimo, horroroso – inclusive a forma de sua aluna dançar.
. Ed Carmichael (Dub Taylor) é o marido de Essie. Faz várias coisas, desde entregar os doces feitos pela mulher a eventuais compradores, vizinhos, até ajudar o sogro e DePinna na fabricação de fogos de artifício.
. Rheba (Lillian Yarbo) é a doméstica da casa, eternamente bem humorada, eternamente feliz.
. Donald (Eddie Anderson) é o namorado de Rheba, que passa a maior parte do tempo na casa-comunidade. É um tanto faz-tudo lá, fila a bóia, entra nas brincadeiras que pintarem.
. Poppins (Donald Meek, excelente como em mais de 120 outros filmes em que aparece sempre como coadjuvante) é a mais nova aquisição da casa. Era contador da grande imobiliária de Blakely (Clarence Wilson), de quem se falará em seguida. Passava os dias checando e rechecando contas com uma então moderníssima (estávamos em 1938, certo?) máquina de somar. Um dia Vanderhof, que estava em visita à imobiliária, puxou papo com ele, quis saber se ele gostava de ficar diante daquela máquina conferindo números o dia inteiro. Poppins confessou que na verdade não gostava daquele serviço, não – tinha um hobby, criava brinquedos, inventava coisas. Vanderhof perguntou por que então Poppins não vinha com ele para sua casa, onde poderia se dedicar o tempo todo a seu hobby, e é claro que Poppins foi.
Apenas um proprietário ameaça a ganância infindável do milionário
Faltou falar de Alice, a personagem de Jean Arthur, atriz que Capra adorava – fez o principal papel feminino também em O Galante Mr. Deeds/Mr. Deeds Goes to Town (1936) e A Mulher Faz o Homem/Mr. Smith Goes to Washington (1939).
Alice, a rigor, é assim a mais “normalzinha”, “quadradinha” daquele bando todo. Tipo ovelha negra, ou branca – ma non troppo. É a única que trabalha fora, num emprego formal. Tinha trabalhado numa livraria, e agora está empregada num banco – o banco dos bilionários Kirby, é claro. Foi lá que conheceu Tony – ela era secretária dele, e se apaixonaram.
E agora é preciso falar da trama.
O grande banco de Anthony P. Kirby é apenas uma das empresas de seu conglomerado. Ele está, naquele momento – 1938, o mundo enlouquecendo, às vésperas de um conflito mundial que já parece inevitável – querendo aumentar seus tentáculos na área de armamentos. Para asfixiar o maior concorrente nesse setor, Ramsey (H.B. Warner), Kirby vem, com a ajuda da imobiliária daquele Blakely já citado, preparando-se para comprar todos os imóveis de diversas quadras da cidade, em torno da sede da empresa rival, para ali instalar sua própria fábrica. Todos os proprietários já aceitaram as ofertas generosas – até porque nenhum deles vive ou trabalha ali; todos alugam seus imóveis para os moradores ou comerciantes da região. Todos já aceitaram as ofertas – menos um. Exatamente Martin Vanderhof, o maluco beleza dono da casa-comunidade, o único proprietário que de fato vivia num daqueles imóveis visados pela ganância infindável de Kirby.
Se um único proprietário se recusasse a vender, o negócio de Kirby iria pelos ares. Seria necessário comprar todos – ou então seu ataque ao concorrente não seria suficientemente forte.
Uma série de sequências maravilhosas, antológicas
Do Mundo Nada se Leva tem diversas seqüências marcantes, belíssimas, inesquecíveis, antológicas. Há a do namoro de Tony-James Stewart e Alice-Jean Arthur à noite, no Central Park, interrompido por um bando de garotinhos que aparece tocando música para o casal – e aí a gente se pega pensando como o mundo piorou, de 1938 para cá. Verdade que tudo em Frank Capra é fantasia pura, mas ver aquele bando de garotinhos cantando e dançando à noite no Central Park dá imensa saudade de um mundo que já foi melhor. “Central Park, where they say you cannot walk after dark”, diz a canção que Art Garfunkel cantou lá mesmo, no Central Park, no concerto que reuniu meio milhão de pessoas em 1982.
Há a sequência que vem logo após essa do Central Park: o jovem casal apaixonado entra num restaurante chiquetérrimo, em que os pais de Tony, A. P. Kirby e senhora, estão jantando com um grande grupo que inclui um nobre inglês. Os garotos do Central Park haviam grudado na capa que Alice usa um cartazete em que um dos lados diz Nuts – doidões, malucos. O casal entra no restaurante e todos danam a rir deles.
E depois há a sequência em que Tony leva os pais para jantar na casa da noiva – os empertigados, esnobes, biliardários Kirby caem no meio da comunidade dos malucos beleza em um dia em que todos estão especialmente muito soltos, muito doidões.
E aqui é bom assinalar que a senhora Kirby é interpretada por Mary Forbes, uma atriz que, como Edward Arnold, que faz o marido, é dotada de um physique perfeito para a personagem. Os dois são grandes, empertigados, têm cara de milionários. Fizeram papel de milionários em diversas comédias de Hollywood nos anos 30 e 40. Com Capra, Edward Arnold trabalhou também – sempre como ricaço, poderoso, sem alma – em A Mulher Faz o Homem (1939) e Adorável Vagabundo/Meet John Doe (1941). Mary Forbes fez quase 140 filmes, entre 1919 e 1958, e em boa parte deles interpretou matronas riquérrimas.
À seqüência memorável, antológica, da visita dos bilionários Kirbys aos maluco beleza chefiados pelo senhor Martin Vanderhof, que termina com a chegada da polícia prendendo todo mundo, seguem-se imediatamente duas outras seqüências esplendorosas, magníficas, extraordinárias: a de todos eles na cadeia, ao lado de pobres, deserdados, ladrões e putas (uma delas vira-se para a sra. Kirby e pergunta: “Chique, hein? Em que área você trabalha, meu bem?”), e a de todos eles no tribunal, diante do juiz.
Capra é um diretor que sabe como ninguém mexer com as emoções do espectador
Frank Capra é foda.
Não tenho idéia de quantas vezes já vi Do Mundo Nada Se Leva, mas posso garantir que foram muitas, antes desta agora. (Nas minhas anotações, ele está presente três vezes antes desta, em 1965, 1993 e 2003, mas devo ter visto outras vezes sem anotar.) Pois não é que, na sequência da visita dos Kirbys à casa dos doidões eu me peguei envergonhado, sem graça, sem jeito, em profundo mal estar, exatamente como Alice? Como se não conhecesse bem a história, como se estivesse vendo pela primeira vez.
Mas o mais surpreendente veio na sequência no tribunal.
Sou um velhinho bastante vivido. Já vi muita coisa, no cinema e na vida real. Pois não é que me surpreendi, na sequência do tribunal, vendo o filme no mínimo pela quarta vez, com a garganta travando, a respiração alterada, e os olhos marejando de pura emoção?
Não é algo que aconteça com freqüência. De forma alguma.
Frank Capra é foda.
O sonhador Capra visita, na União Soviética, um Eisenstein caído em desgraça
Em 1937, um ano antes de fazer Do Mundo Nada Se Leva, Capra, o imigrante que “fez do sonho americano uma nova utopia ocidental”, como diz o estudioso de sua obra Michel Cieutat, havia viajado à União Soviética. Não havia nada inédito, estranho, nisso. Não chegava a ser incomum artistas e intelectuais americanos visitarem a União Soviética. Para não falar do jornalista John Reed, que estava lá na Rússia czarista de 1917 no momento em que explodiu a Revolução, basta lembrar a viagem da jovem Lillian Hellman a Moscou, às vésperas da Segunda Guerra, que ela relatou num dos capítulos de seu livro Pentimento, e que se transformaria no belo filme Julia, de Fred Zinnemann, de 1977, com Jane Fonda no papel de Lillian Hellman e Vanessa Redgrave no de Julia. Ou a de John Steinbeck, junto com o fotógrafo Robert Cappa, em 1947, que resultaria no livro Um Diário Russo, lançado no Brasil em edição bem cuidadíssima da Cosac & Naify.
Na sua viagem à União Soviética, em 1937, Capra, o humanista ítalo-americano, se encontrou com Serguei Mikhailovich Eisenstein, o cineasta genial que havia sido o maior propagandista da Revolução de 1917. O problema das revoluções é que em geral elas envelhecem, os ideais libertários que as originaram se perdem e elas dão lugar a novos déspotas, às vezes semelhantes, às vezes muito piores que os déspotas que elas haviam derrubado. Eisenstein havia glorificado a Revolução que derrubou o czarismo e implantou o sonho da igualdade social, mas na União Soviética de 1937, governada pelo novo czar Stálin, não havia mais espaço para sonhadores.
Diz Michel Cieutat no seu livro Frank Capra:
“Capra está na União Soviética, onde se encontra com Serguei Mikhailovich Eisenstein em desgraça oficial, ‘sentado a uma mesa deteriorada de um café deteriorado de um bairro deteriorado de Moscou’ (página 270 da autobiografia de Capra). ‘Deixei a Rússia cheio de simpatia por seu povo e rezando pela melhoria de suas condições de vida (página 275)’.”
“Vem aí a Revolução”, dizia a propaganda dos fogos de artifício dos doidões
Os alfarrábios dizem que o roteirista Robert Riskin, fiel parceiro e colaborador de Capra em diversos de seus filmes, reescreveu muito a peça original de George S. Kaufman e Moss Hart. Dá para apostar que foi de Capra a idéia de botar no roteiro que os doidões, os malucos beleza totalmente apolíticos da casa do senhor Martin Vanderhof resolveram imprimir folhetinhos vermelhos para acompanhar os doces criados por Essie, fazendo propaganda dos fogos de artifício usando frases como “Vem aí a Revolução”.
Era 1938, governo Roosevelt. O democrata Franklin D. Roosevelt enfrentava a Grande Depressão com uma presença forte do governo em todas as áreas, para o pavor dos milionários e da direita republicana que enxergava no presidente um bolchevique incrustrado na Casa Branca.
Capra era o realizador mais rooseveltiano que poderia haver, mas era ambíguo quanto ao que dizia respeito à relação das pessoas com o governo. Na sequência da visita do representante da Receita Federal à casa dos doidões felizes (e que coincide com a primeira visita de Tony à casa da nova), o senhor Martin Vanderhof questiona por que raios ele deveria pagar imposto. O que o governo me dá de volta?, ele pergunta ao funcionário da Receita.
Nos anos 60, no auge da glória, Joan Baez resolveu retirar do montante a ser pago à Receita americana o percentual de gastos do governo com a Defesa, o Pentágono, a segurança, a guerra do Vietnã. Atitude politizada, pensada, inteligente. Mas a determinação de não pagar qualquer imposto de Vanderhof, ao contrário, é apolítica. Beira até – que Frank Capra não me ouça – o irracionalismo do Tea Party, a direita raivosa que defende o Estado mínimo dos mínimos, e, sobretudo, a não taxação dos biliardários.
Do Mundo… deu a Capra um de seus três Oscars de melhor direção e o segundo de melhor filme
Esta anotação está ficando meio viajandão demais, e então seria bom baixar com os pés para a terra com algumas informações objetivas básicas. Do Mundo Nada se Leva teve sete indicações ao Oscar. Ganhou os dois prêmios principais, os de melhor filme e melhor direção. Não levou os de atriz coadjuvante para Spring Byington, roteiro para Robert Riskin, fotografia para Joseph Walker, montagem para Gene Havlick e som para John Livadary.
Foi o terceiro Oscar de melhor direção de Capra. Ele já havia levado o prêmio por Aconteceu Naquela Noite (1934) e O Galante Mr. Deeds (1936). (Além dos três Oscars que ganhou, ele foi indicado para o prêmio de melhor direção por outros três filmes: Dama por um Dia (1933), A Mulher faz o Homem (1939) e A Felicidade Não Se Compra (1946).
E foi seu segundo Oscar de melhor filme, depois do de Aconteceu Naquela Noite.
Foi a primeira vez que Capra dirigiu James Stewart. Voltariam a trabalhar juntos em A Mulher Faz o Homem e A Felicidade Não Se Compra.
E uma curiosidade sobre Ann Miller, sobre quem falei um pouquinho lá atrás: nascida em 1923, ela estava com apenas 15 anos quando fez o filme. Não era uma estreante: havia começado a atuar dois anos antes, em 1936. Segundo o IMDb, algumas posições de balé – como a de ficar na ponta dos pés – eram ainda muito difíceis para ela, e a garota chorava de dor, escondida, no estúdio. James Stewart, diz ainda o IMDb, costumava levar caixas de bombons para alegrá-la.
Os idiotas do politicamente correto enxergariam racismo no filme
Se se dessem ao trabalho de algum dia ver esta maravilha de filme que é Do Mundo Nada Se Leva, os idiotas do politicamente correto, ou simplesmente idiotas, certamente iriam enxergar racismo. Ah, os únicos negros do filme são a empregada Rheba e seu namorado Donald!, diriam eles. Todos os moradores daquela casa só fazem o que querem, o que lhes dá na telha, menos os dois únicos negros, que trabalham para eles.
Os idiotas que vêm racismo nos livros infantis de Monteiro Lobato certamente veriam racismo aqui.
Os idiotas são incapazes de ver o contexto. Em 1938, não era anormal que a empregada da casa dos malucos beleza fosse negra, meu Deus do Céu e também da terra! Se o filme fosse feito hoje, a empregada seria latino-americana, porque essa é a realidade dos fatos.
Um filme ingênuo, naïf, esperançoso, sonhador
Os cínicos (e essa é uma turma mais bem preparada do que os simplesmente idiotas) diriam que o filme é uma imensa bobagem porque ora, onde já se viu tanta bondade assim, tanto happy ending assim? Onde já se viu tanta avareza, tanta cobiça, se desvanecer como névoa matinal? Onde já se viu coração duro de pedra de capitalista empedernido se derreter?
Verdade: Do Mundo Nada Se Leva é um filme ingênuo que nem pintura naïf.
É ingênuo, naïf, porque é esperançoso. Crente. Believer.
O filme mais sonhador e idealista do mais sonhador e idealista dos realizadores é exatamente como a utopia comunista, ou a utopia hippista. Ingênua, naïf, esperançosa, crente, believer.
Euzinho, quieto aqui no meu cantinho, estou cansando de saber que a utopia comunista é apenas isso, uma utopia. Não deu certo, não funcionou.
O sonho hippie continua por aí.
Ainda bem. Já imaginou se a gente não tiver mais utopia com que sonhar?
Anotação em agosto de 2012
Do Mundo Nada se Leva/You Can’t Take it With You
De Frank Capra, EUA, 1938.
Com Jean Arthur (Alice Sycamore), Lionel Barrymore (Martin Vanderhof),
James Stewart (Tony Kirby), Edward Arnold (Anthony P. Kirby), Mischa Auer (Kolenkhov), Ann Miller (Essie Carmichael), Spring Byington (Penny Sycamore), Samuel S. Hinds (Paul Sycamore), Donald Meek (Poppins), H.B. Warner (Ramsey), Halliwell Hobbes (DePinna),
Dub Taylor (Ed Carmichael), Mary Forbes (Mrs. Anthony Kirby),
Lillian Yarbo (Rheba), Eddie “Rochester” Anderson (Donald), Clarence Wilson (John Blakely), Harry Davenport (o juiz)
Roteiro Robert Riskin
Baseado na peça de George S. Kaufman and Moss Hart
Fotografia Joseph Walker
Música Dimitri Tiomkin
Montagem Gene Havlick
Produção Columbia Pictures. DVD Columbia.
P&B, 127 min
R, ****
Essa família é maravilhosa, e todo mundo ali é gente boa. O filme todo é maravilhoso. Seu texto sobre o filme é maravilhoso.
(Dimitri Tiomkin era maravilhoso, também. 🙂
Sergio, essa história me inspirou a vida toda! Amei aquela família amorosa e criativa e “Do Mundo Nada se Leva” tornou-se um dos meus filmes NOTA DEZ. Bela escolha, vou ler a crítica quando voltar da hidro… Um abraço, S.
Sergio, acho que arte tem que inspirar. Mesmo o drama pesado, que conta uma história sofrida, pode e deve terminar com alguma leveza. Filmes como “Do Mundo Nada se Leva” e “Polyanna”, podem até ser considerados ingênuos, vindos de uma outra época, mas espelham os melhores valores, que nos levam a melhorar como ser humano. A crítica ficou ótima, fiel à essência do filme.
Esse filme é simplesmente, fantástico. Eu o assisti pela primeira vez quando a TV ainda era preto e branco e (no Brasil) e todos os filmes eram legendados. Demorei para revê-lo. Agora, sempre que posso, assisto para lembrar de um tempo puro e mágico, que infelizmente acabou.
Citando suas palavras: “Em 1938, não era anormal que a empregada da casa dos malucos beleza fosse negra”. E logo adiante: “Se o filme fosse feito hoje, a empregada seria latino-americana, porque essa é a realidade dos fatos.”
Mas “Do mundo nada se leva” pretende exatamente contrariar a “realidade dos fatos” pois na casa dos “malucos beleza” se visava, sobretudo, à felicidade das pessoas, à autenticidade, incentivando-as a fazerem o que mais gostavam. A não ser que o trabalho que os empregados negros considerassem mais satisfatório fosse ser empregados.
Não digo que o filme seja pretensamente racista, apenas não teve coragem de ir mais além em sua proposta. Provavelmente não quiseram mexer em um nervo exposto da sociedade norte-americana, afinal a história pretendia agradar a muita gente, fazê-las sonhar e não se autocriticarem.
A não ser que a intenção do filme, ao mostrar empregados negros numa residência de mentalidade libertária, fosse exatamente exibir ao público americano esta contradição que, na época, era bem mais dolorosa: a autoproclamada “terra da liberdade” mal escondia seus desajustes. Em um filme pode-se inserir o que se quiser e em muitos deles podemos realizar mais de uma leitura.
De um modo ou de outro, “Do mundo nada se leva” é um filme que supera – e muito – tantas bobagens pretensiosas que já foram feitas.
Se não me falha a memória, só vi este filme na íntegra uma vez, na adolescência. Foi paixão às primeiras cenas, ao ir “conhecendo” a família de Vanderhof. Lembro-me que fiquei com os olhos cheios de lágrimas. É realmente difícil ver uma obra de arte – qualquer obra de arte, literatura, cinema, o que for – conseguir capturar e expressar isto: a felicidade. As personagens sendo felizes.
Claro, para haver uma história a contar, terá de haver conflito; mas, em vários momentos, o que vemos no filme é isto: mostrar o que é ser feliz. O ‘estado’ da felicidade.
É pura magia. Capra era demais. Ainda quero rever este filme, como pude rever outros dele.
Concordo integralmente com tudo o que foi dito. Acabo de vê-lo novamente. Não sei exatamente quantas vezes já vi, mas de vez em quando eu sinto que preciso e vejo. E só me faz bem: por ser ingênuo, sonhador, positivo e me suprir de esperança. Continua um filme absolutamente magnífico e sempre necessário. Que mais podemos querer de uma obra prima?
Curiosidade: Os protagonistas dos filmes de Frank Capra (diretor) – Robert Riskin (roteirista) foram descritos como “Heróis de Capra”, quando, na verdade, eram mais um produto da ideologia e da consciência social de Riskin. Capra era um republicano conservador.
Olá, Maurício!
Rapaz, por tudo o que Frank Capra mostra em seus maravilhosos filmes, ele era então o republicano conservador mais humanista, mais mente aberta, mais progressista que já passou por este planeta!
Um abraço.
Sérgio