Chuva de Verão / Rain


2.5 out of 5.0 stars

Anotação em 2009: Uma família passa férias de verão em sua casa na praia; a casa é confortável, e é pé na areia – tem a casa, tem o gramado e começa a areia. E no entanto são todos tremendamente infelizes.

A história dessa triste família da Nova Zelândia é contada ao espectador pela filha mais velha do casal, Janey, uma garota de uns 14, 15 anos. Ao contrário de muitas adolescentes, que não toleram os irmãos garotos, Janey até que se dá bem com o irmão mais novo, Jim, de uns seis anos. Como quase todo adolescente, ela não se dá muito bem é com a vida, de uma maneira geral. É inteligente, tem personalidade forte, nada muito bem – está tentando ensinar Jim a nadar – e é observadora, percebe as coisas em volta. Mas está sempre com cara de infeliz.

Janey percebe, por exemplo, que as coisas entre seus pais não estão muito bem – as coisas, na verdade, não estão nada bem para Ed (Alistair Browning) e Kate (Sarah Peirse), um casal que está aí entre os 35 e os 40 anos. Não se diz claramente a época em que o filme se passa, mas, pelos costumes, dá para perceber que estamos no início dos anos 70. Não saberemos nunca o que o casal faz na vida; sabemos que tem algum sucesso na profissão, já que pôde construir aquela casa na praia e tem um bom nível de vida; são pessoas que tiveram alguma educação – Ed está lendo (conforme o espectador mais atento poderá notar) Este Lado do Paraíso, o romance de estréia de F. Scott Fitzgerald. Também não saberemos por que, onde e quando o casamento começou a desandar, mas o fato é que o casamento está indo pro brejo.

E vai ajudar a piorar as coisas o fato de o casal ficar conhecendo, naquelas férias, Cady (Marton Csokas), um tipo bonitão, da faixa etária de Ed e Kate. Cady tem um barco, um pequeno iate, e leva a família para passear. Janey percebe de cara que haverá alguma coisa entre sua mãe e Cady.

         Quanta cachaça na dor deles

Tanto Ed quanto Kate bebem bastante. Bebem demais, eu diria – logo eu, que não chego propriamente a ser um abstêmio. Se Kate e Ed fossem americanos, e não neo-zelandeses, diriam que eles tem um drinking problem, o eufemismo muito usado nos Estados Unidos para quem se enfia na booze, a cachaça – no caso do casal, doses cavalares da boa cachaça escocesa. Promovem festas em sua casa, chamam diversos conhecidos, Cady inclusive, claro. Mas, mesmo quando não há festa, mesmo em plena luz do dia, os dois estão sempre com um copo cheio na mão, que se esvazia rapidamente. Não é nada à toa que o livro que o espectador vê no criado-mudo ao lado da cama é um romance de Fitzgerald, que o alcoolismo matou aos parcos 44 anos de idade.

Entre as muitas coisas que o filme não explicita está a idade exata de Janey, mas deve ser entre 14 e 15. Está no auge do despertar da sensualidade. É bonita – não daquela beleza Barbie, certinha, caretinha, padronizada, mas de uma beleza forte, e tem um corpo lindo, conforme observa a própria mãe, um determinado dia. A diretora Christine Jeffs não usa muita sutileza; ao contrário, a câmara dela até exacerba ao mostrar, e muito, o corpo de Janey – na pele de Alicia Fulford-Wierzbicki (foto abaixo), uma jovem atriz que demonstra extraordinário talento. Ela compõe uma Janey que é aquela coisa típica da lolitinha de 14, 15 anos – em alguns momentos, uma menininha; em outros, uma jovem mulher que expõe o corpo e faz de tudo para ser olhada e desejada.

Assim como o pai e a mãe, que parecem flertar com a infelicidade, perseguir a tristeza, o fundo do poço, Janey também vai optar sempre por fazer o que não deveria.

         Um filme de muitas qualidades

Todos os atores estão muito bem – a diretora Christine Jeffs, que vinha do cinema publicitário e estreou com este longa-metragem, tem grande talento para a direção de atores.

Fez um filme triste, angustiado, angustiante, sobre personagens que parecem escolher sempre o pior caminho a tomar. O roteiro é dela mesma, baseado em um livro de outra mulher, Kirsty Gunn. Se fosse para generalizar a partir dessas duas, daria para dizer que as neo-zelandesas são bastante chegadas a uma tristeza, um desencanto com a vida.

Não chega a ser um grande filme, uma obra marcante, mas tem muitas qualidades, como o ótimo desempenho do elenco, um perfeito desenho psicológico dos personagens, uma fotografia esplendorosa, e uma boa trilha sonora, que acentua a tristeza dos personagens e das situações. A música é de Neil Finn, que fez parte das bandas de rock Split Enz e Crowded House. Não que eu conheça essas bandas – vi a informação no AllMovie.

O filme foi apresentado no Festival de Toronto, em 2001, e em outros festivais. Ganhou cinco prêmios e teve quatro outras indicações. A diretora Christine Jeffs faria, em 2003, na Inglaterra, o filme Sylvia, sobre a poeta americana Sylvia Plath, interpretada por Gwyneth Paltrow. Em 2008, faria um filme nos Estados Unidos, com Amy Adams e Emily Blunt, duas jovens atrizes promiossoras, Sunshine Cleaning.

Quando fiz a anotação, não sabia se o filme chegou a ser lançado no Brasil. Segundo Priscila Viana informa em mensagem aí abaixo, foi, sim, lançado aqui.

Chuva de Verão/Rain

De Christine Jeffs, Nova Zelândia, 2001

Com Alicia Fulford-Wierzbicki (Janey), Sarah Peirse (Kate), Marton Csokas (Cady), Alistair Browning (Ed), Aaron Murphy (Jim)

Roteiro Christine Jeffs

Baseado no livro Rain, de Kirsty Gunn

Fotografia John Toon

Música Neil Finn

Produção Communicado Productions, New Zealand Film Comission

Cor, 92 min

**1/2

8 Comentários para “Chuva de Verão / Rain”

  1. Não sei se entendi errado, mas não acho que a beleza “barbie” seja linda, é apenas um padrão que foi imposto como sendo o “perfeito” e o “mais bonito”, e diga-se de passagem , a grande maioria das mulheres, incluindo meninas em tenra idade, corre atrás disso nos dias de hoje. Não conheço a atriz em questão, mas ela pode ser linda sem ser barbie, não? Mas talvez vc tenha querido dizer que ela não é linda e nem barbie. Mas barbie pra mim não é sinônimo de linda. Como eu já disse aqui, segundo o grande Rubem Alves, a barbie é uma bruxa, rs.

    Não vi esse filme, mas vi o Sylvia, que é deprê até não poder mais, e revoltante em algumas partes (por causa das atitudes da personagem).

  2. Jussara, mexi no meu texto, para tentar deixar mais claro o que quero dizer com a beleza à la Barbie. Espero que tenha ficado melhor. A beleza Barbie é a padrão, convencional, certinha, caretinha – nada a favor dela, não.
    De resto, parece que a diretora Christine Jeffs realmente é chegada a personagens deprê, não é? Abração.

  3. Lindissimas fotografias,filme delicado,principalmente na relacao dos dois irmaos …sublime

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