Nota:
Sonata de Outono é uma obra-prima, um filme em tudo por tudo excepcional, extraordinário.
É uma obra da plena maturidade de Ingmar Bergman, um dos melhores, se não o melhor realizador da História do cinema. Ele estava com 60 anos em 1978, quando escreveu e dirigiu o filme, o antepenúltimo de sua carreira majestosa. (Depois, entre os lançados no cinema, viriam apenas Da Vida das Marionetes, 1980, e Fanny e Alexander, 1982.)
Eram maduras, experientes, as duas atrizes maravilhosas, estupendas, que estão na tela na imensa maior parte dos 99 minutos de duração do filme. Liv Ullmann estava com 40 anos, e Ingrid Bergman, com 63.
Em Sonata de Outono, Ingmar Bergman, o cineasta das grandes questões, coloca uma mãe e uma filha em um embate cruel, um levantamento, um esquadrinhamento, uma investigação dos problemas de vida inteira nunca antes enfrentados.
É um cara-a-cara doloroso demais, pesadíssimo, denso, duro, angustiante.
Quase todas as tomadas são de interiores: a imensa maior parte da ação se passa dentro da casa, verdade que ampla, bela, da filha.
É uma atmosfera asfixiante, claustrofóbica.
O espectador poderá ficar – e muito certamente ficará – tocado, mexido, chocado, aflito, angustiado. Mas jamais entediado, enfastiado, enfadado. Não há tempo nem espaço para isso, porque tudo – a história, o texto, os diálogos, o trabalho de câmara, as interpretações – é genial demais, é absurdamente brilhante.
O marido de Eva olha para o espectador e fala da mulher
Ninguém coloca tão bem um personagem conversando com o espectador quanto Ingmar Bergman.
O personagem se virar de frente para o respeitável público e falar com ele naturalmente não é uma invenção do cineasta sueco. É algo quase tão velho quanto andar para a frente. O coro grego já falava com a audiência nos anfiteatros cinco séculos antes de Cristo.
É um recurso bastante comum no cinema das últimas muitas décadas. Woody Allen, admirador do cinema de Bergman, que jamais escondeu a influência do mestre – muito ao contrário –, valeu-se dele muito bem em diversos de seus filmes.
Mas Bergman é inigualável.
O fiolme começa com Viktor (Halvar Björk), o marido de Eva (o papel de Liv Ullmann), dirigindo-se diretamente ao espectador. Ele está em primeiro plano, na ampla sala de sua casa – a casa do pároco daquela cidadezinha no interior da Noruega –, e começa a conversar com a maior naturalidade, com os olhos na câmara do diretor de fotografia Sven Nykvist, e portanto com os olhos nos olhos do espectador. Atrás dele, lá um pouco distante, no fundo da sala, sentada a uma mesa, está Eva.
E Viktor fala exatamente sobre ela. Eva é o centro da história que está se iniciando. Eva é o epicentro do terremoto que vai começar dali a pouco, com a chegada da mãe dela.
– “De vez em quando fico olhando para minha mulher sem ela saber. A primeira vez que entrou nesta sala, ela disse: ‘Como é gostoso aqui. Me sinto à vontade.’ Nós tínhamos nos conhecido alguns dias antes, numa conferência de bispos, em Trondhelm, a que ela assistiu como jornalista de uma folha eclesiástica. Nos encontramos durante um almoço e contei a ela sobre a residência do pastor e os jardins. Ficou tão interessada que resolvi propor que ela viesse fazer uma visita. Viajaríamos logo que a conferência terminasse. No caminho, perguntei se ela queria casar comigo. Não respondeu, mas quando entramos nesta sala, ela me disse: ‘Está tudo bem, é aqui mesmo que eu quero ficar’. Desde então, temos levado uma vida tranquila aqui. Eva, naturalmente, já me contou seu passado. Fez o vestibular e entrou para a faculdade, ficou noiva de um médico e viveu com ele durante vários anos. Escreveu dois pequenos livros, ficou tuberculosa, rompeu o noivado e mudou-se de Oslo para uma pequena cidade no Sul da Noruega, onde começou a trabalhar como jornalista.”
Viktor então pega na estante um dos livros que Eva escreveu, e lê um trecho:
– “Todos precisam aprender a viver. A cada dia, me esforço um pouco. A dificuldade principal está em saber quem eu sou e onde estou. É como procurar na escuridão. Se alguém me amasse como sou, talvez finalmente eu pudesse me encontrar.”
Quem sou, onde estou, para onde vou. As grandes questões, as maiores, a metafísica. As que todos nós fazemos sem parar – ou tentamos desesperadamente não fazer.
Na abertura de seu antepenúltimo filme a ser exibido nos cinemas, Ingmar Bergman, ele mesmo filho de um pastor, põe na boca da bela mulher de um pastor de uma pequenina cidade rural da Noruega as perguntas básicas, fundamentais, que fez ao longo de toda a sua prodigiosa obra.
Quem sou, onde estou, para onde vou.
Viktor termina a leitura do trecho do livro escrito por Eva, e diz:
– “Se ao menos uma vez, uma única vez, eu conseguisse dizer a ela que a amo de todo o coração, fazê-la sentir como é amada, sem restrições de qualquer espécie… Mas eu não consigo dizer, nem fazê-la acreditar. Me faltam as palavras certas.”
Mãe e filha não se viam fazia sete anos
Pouco depois desse intróito em que Viktor nos apresenta sua mulher, Eva vem ter com ele, diz que escreveu uma carta para a mãe e gostaria que ele desse sua opinião.
É um tanto estranho, porque, nesse primeiro diálogo entre marido e mulher, fica a impressão de que Eva trata Viktor com tanto respeito e formalidade que até parece que eles são distantes um do outro, frios.
Na carta, Eva pede, com extrema gentileza, quase com um tom de súplica, que a mãe venha visitá-la. A casa é grande, confortável, ela terá um bom quarto para ficar, descansar.
Fazia sete anos que não se viam, filha e mãe.
Havia acontecido uma tragédia na vida de Eva e Viktor: Erik, o filhinho do casal, de 4 anos de idade, havia morrido afogado. E nem nessa ocasião a mãe tinha ido visitar a filha.
Charlotte, a mãe (o papel de Ingrid Bergman, claro), chega de carro – tinha vindo dirigindo desde Paris, e as costas, que sempre foram um problema grande para ela, estavam doendo muito.
Eva, a filha, tinha trabalhado em um pequeno jornal religioso, e depois havia se casado com o pároco de uma pequenina cidade rural. Uma vida simples, nada de grandioso.
Charlotte, a mãe, era uma grande pianista clássica, famosa, renomada, concertos nas grandes salas das metrópoles mundo afora, discos gravados com grandes orquestras.
São alegres os primeiros diálogos entre as duas – a primeira vez que se falavam em sete anos.
Em seguida, Charlotte começa a falar da doença e da morte de Leonardo – o marido com quem vivera nos últimos anos, seu terceiro marido, como veremos.
O espectador percebe rapidamente que Charlotte é daquele tipo de pessoa absolutamente umbigocêntrica, para quem todo o mundo gira ao redor dela própria. Ela é o Sol, o centro de tudo – o resto é periferia.
A mãe fica incomodada com Helena, a filha doente
Não demora muito para Eva contar à mãe que Helena está vivendo ali com ela, na casa paroquial. Charlotte fica absolutamente crispada com a notícia. Diz achar estranho, pois Helena estava bem no local em que vivia – e reclama que deveria ter sido avisada antes.
Eva diz que contou, em várias cartas, que Helena estava agora vivendo com ela – provavelmente a mãe não leu, tão ocupada que é.
Helena (interpretada por Lena Nyman) é a segunda filha de Charlotte, a irmã mais nova de Eva. Tem uma doença degenerativa que vai tolhendo seus movimentos das pernas e sua fala.
Fica absolutamente claro para o espectador que Eva tem cuidado da irmã doente com a maior dedicação, com imenso amor. E que Charlotte, a mãe, fica tremendamente perturbada diante da filha doente, incapaz de falar de forma compreensível.
Um horror.
Mas o horror está apenas começando.
Eva, pela primeira vez na vida, vai lavar toda a roupa suja acumulada a vida inteira. Vai tirar todos os esqueletos do armário. Vai jogar na cara da mãe toda a frustração, a tristeza, a angústia que juntou ao longo da vida inteira com a mãe sempre distante, sempre aparentemente alegre, disponível, mas a rigor absolutamente ausente, sem qualquer sinal de carinho, afeto, respeito, consideração pela filha.
A vontade que dá é transcrever todos os diálogos – brutais, horríveis, apavorantes – entre mãe e filha.
Fico com algumas frases ditas por Eva para a mãe que o IMDb traz:
– “Você se fechou dentro de você mesma e sempre se viu dentro de sua própria luz.”
– “Tudo que era sensível e delicado (em mim), você atacava. Tudo que era vivo, você tentava sufocar.”
– “Uma coisa eu entendia: nem um pedaço verdadeiro de mim poderia ser amado ou aceitado. Eu não ousava ser eu mesma até quando estava sozinha, porque eu odiava o que era meu mesmo.”
– “Você dizia que meu cabelo era comprido e que eu tinha que cortar – era um horror. Aí você me disse que eu tinha dentes tortos, e você me fez usar aparelho, e eu fiquei grotesca. Você me comprava livros e eu os lia e não entendia, e você me obrigava a falar sobre eles, e eu sempre ficava com medo de que você fosse me mostrar minha burrice.”
Entre as diversas frases cortantes como peixeira, violentíssimas, que Eva finalmente diz para a mãe, esta aqui, creio, é a pior de todas:
– “Pessoas como você são um perigo. Você deveria ser presa para não fazer mais mal a ninguém.”
Bergman usa sua experiência de diretor de teatro
Me ocorreu, enquanto revia este filme absolutamemnte genial, que Ingmar Bergman usou não apenas seus conhecimentos de cinema, ao filmar em close-up os rostos de Liv Ullmann e Ingrid Bergman durante esses enfrentamentos terríveis, mas também sua experiência como diretor de teatro.
Ao longo de boa parte de sua vida, Bergman fazia um filme a cada ano, ou a cada dois anos, e, entre um filme e outro, encenava uma peça de teatro em Estocolmo ou em alguma outra cidade sueca.
Aqui em Sonata de Outono, como também em seus outros filmes todos – em especial Persona, em que como aqui temos duas mulheres na tela o tempo todo –, Bergman fez uso das marcações das atrizes no tablado.
Às vezes a câmara se movimenta, perseguindo a personagem que está falando. Na maior parte das vezes, no entanto, são as personagens que se movimentam diante da câmara.
Os movimentos delas são naturais, fluem com naturalidade – mas a rigor são marcações perfeitas, como no teatro.
Os rostos de Liv Ullmann e Ingrid Bergman, muitas vezes em close-up, se movimentando, a câmara de Sven Nykvist se movendo em torno delas, enquanto as duas falam diálogos escritos por Ingmar Bergman.
Meu Deus, é a coisa mais superlativa que pode haver.
Muita gente culpa os pais por problemas que eles não criaram
Me permito considerações personalíssimas.
Acho que são pequenas as pessoas que acusam pais e mães como os grandes, os únicos responsáveis por sua incapacidade de viver bem, aprender, melhorar. A não ser, é claro, nos casos em que há evidentes, claros, violentos abusos dos pais contra os filhos – o que é absoluta minoria.
Traumas de infância são terríveis, sem dúvida alguma, e por isso mesmo são capazes de ter repercussões ao longo de toda a vida de quem foi vitima deles.
Mas entre os casos violentos, absurdos, criminosos, e os outros, os das queixas de gente que a rigor não teve mal trato tão grande, há imensa diferença.
Há gente que tem todo o direito de culpar os pais, ou um dos pais, por boa parte de seus problemas – e creio que este é o caso de Eva. Mas também há pessoas fracas, tíbias, que passam a vida se queixando dos pais, ou um dos pais, como desculpa para sua própria fraqueza, tibieza, sua incapacidade de viver de forma mais ou menos digna, correta, ou “normal”.
Tenho, na minha família, exemplos de todos esses tipos.
O que é a coisa mais comum do mundo. Eu tenho – assim como toda a torcida do Corinthians, mais a do Flamengo e de todos os demais times do mundo.
Ver Sonata de Outono deixa mais claro quem é quem.
Quem é de fato vítima, quem tem razão para se queixar – e quem é na verdade fraco, e faz de tudo para esconder sua fraqueza atrás de eventuais culpas dos outros.
Foi o único filme que Bergman fez com Ingrid
Sonata de Outono foi o único filme que o maior realizador sueco e uma das maiores atrizes suecas de todos os tempos fizeram juntos. (Os dois participaram de Stimulantia, lançado em 1967, mas aquele é um filme de episódios, e Ingrid não está no dirigido por Ingmar,) E é bom lembrar que as semelhanças dos nomes é mera coincidência; não há parentesco algum, ainda que remoto. Assim como é uma tremenda coincidência que Ingmar tenha ficado casado, entre 1971 e 1995, com outra Ingrid, nascida Ingrid Karlebo, mas que passou a se assinar Ingrid Bergman em participações em alguns filmes do marido.
Essa outra Ingrid Bergman foi a quinta das esposas de Ingmar. Foram cinco de papel passado, e Liv Ullmann – com que ele teve uma filha, uma longa relação amorosa e uma profícua colaboração artística – não é uma delas.
Bergman e Liv Ullmann fizeram dez filmes juntos, nove dos quais entre 1966 e 1978. Eis a relação: Persona (1966), Vergonha (1968), A Hora do Lobo (1968), A Paixão de Ana (1969), Gritos e Sussurros (1972), Cenas de um Casamento (1973), Face a Face (1976), O Ovo da Serpente (1977), Sonata de Outono (1978) e Sarabanda (2003).
A filha dos dois, Linn Ullman (na foto mais abaixo), nasceu em 1966. Ela trabalha em Sonata de Outono – faz o papel de Eva criança, nos flashbacks lindissimamente fotografados, em que os personagens aparecem bem ao fundo, bem distantes da câmara.
O realizador conta que teve problemas com Ingrid nas filmagens
Bergman não ficou contente com o resultado final de Sonata de Outono. Em seu livro Imagens, de 1990 (que teve bela edição no Brasil em 2001 pela Martins Fontes), ele diz que o filme acabou ficando muito distante do que ele inicialmente havia projetado:
“O primeiro esboço do filme Sonata de Outono escrevi-o a 26 de março de 1976. Este filme está ligado ao caso da sonegação de impostos de que fui acusado no início de janeiro, e que originou meu internamento na clínica de psiquiatria do hospital Karolinska, depois do que fui para a clínica Sophia, até poder voltar para minha casa de Farö.
“Em minha agenda de trabalho, escrevi isto:
“Noite seguida a ter sido absolvido. Não consigo dormir, apesar dos soníferos que tomo. Entretando, nasce em mim o desejo de fazer um filme sobre o tema relações entre mãe e filha e vice-versa, papéis para os quais tenho impreterivelmente de ter Ingrid Bergman e Liv Ullmann.”
Mais adiante:
“A idéia de trabalhar com Ingrid Bergman datava de há muito tempo. Encontrara a atriz num Festival de Cannes, quando Gritos e Sussurros foi ali apresentado e ela meteu uma carta num bolso de meu paletó, na qual me recordava minha promessa de que um dia faríamos os dois um filme.”
Mais adiante:
“As filmagens, em si, foram cansativas por outras razões. Com Ingrid Bergman não tinha o que se costuma chamar ‘dificuldades em colaborar’. Mas o que surgiu entre nós foi, no verdadeiro sentido do termo, um problema de diferença na linguagem de trabalho. Logo no primeiro dia, durante os ensaios, verifiquei que Ingrid ensaiara seu papel diante do espelho, com entoações e gestos. Era pois evidente que estava fazendo uso de um método de trabalhar diferente do nosso. Ela se mantinha no que era habitual nos anos 40.”
E mais adiante:
“A verdade é que, sob o ponto de vista profissional, foi difícil trabalhar com estas duas atrizes: Liv Ullmann e Ingrid Bergman. Quando voltei a ver o filme notei como não orientei Liv em partes que deviam ter tido apoio meu, mas ela é um tipo de atriz que dá sempre o máximo que pode. De quando em quando, se desvia do caminho, é certo, mas isso foi devido a eu ter concentrado toda a minha atenção em Ingrid, que tinha também problemas de memória.”
“Ausência de comunicação, rancores, ódios, terrores obscuros”
Sonata de Outono teve duas indicações ao Oscar, de melhor atriz para Ingrid e de melhor roteiro original para Bergman. Ganhou o Globo de Ouro de melhor filme estrangeiro e teve indicações ao César francês e ao David di Donatello italiano; neste, levou o prêmio de melhor atriz estrangeira, dividido entre Ingrid e Liv Ullmann.
O Guide des Films de Jean Tulard dá 3 estrelas ao filme – e é sempre necessário dizer que a obra fenomenal, que analisa 15 mil filmes, só dá estrelas para poucos deles, apenas os melhores. “Antagonismo mãe-filha entre quatro paredes de um presbitério rural com o outono e suas cores, do vermelho ao ocre, ao fundo. Uma obra contida em que Ingmar Bergman filme pela primeira vez sua compatriota ilustre Ingrid Bergman.”
O Petit Larousse des Films diz: “Confluência das obsessões do mestre sueco, Sonate d’Automne é de um pessimismo absoluto: ambiguidade dos seres, ambivalência das relações entre pais e filhos, ausência de comunicação, rancores, ódios, terrores obscuros – o inverso do cenário tão harmonioso.”
Ingrid – diz Rober Ebert – tem nada menos que a performance de sua vida
Roger Ebert dá a cotação máxima de 4 estrelas para Autumn Sonata – e, como sempre, escreve uma beleza de texto:
“Ingrid Bergman foi certamente uma das mais belas mulheres que jamais apareceram no cinema, mas essa não é a fonte de seu misterioso apelo. Há alguma coisa ali, naquela voz e naqueles olhos e na forma com que sua boca pensa nas palavras antes de dizê-las que é, simplesmente, incomparável no cinema. Passaram-se 35 anos até que Ingmar Bergman finalmente a colocasse em um de seus filmes, e então, em seu quadragésimo ano como atriz, Ingrid Bergman teve em Autumn Sonata seu último filme. Os dois artistas suecos mais importantes do cinema finalmente trabalharam juntos.
“O filme é um evento histórico, que nos leva a várias áreas diferentes de nossas memórias. Lembramos de Ingrid Bergman de alguns dos mais básicos artefatos do cinema, filmes como Casablanca e Notorious (no Brasil, Interlúdio). Mas nunca a vimos realmente pressionada, realmente testada por um diretor cujo compromisso com a honestidade está acima de tudo.
“Ingmar Bergman não a escalou por nostalgia ou sentimentalismo. Ele a escollheu porque tinha uma idéia para um papel que ela poderia abranger e que poderia abrangê-la, e em Autumn Sonata ela tem nada menos que a performance de sua vida. Só podemos ficar agradecidos pelo fato de que ela trabalha ao lado de Liv Ullman, que é boa o suficiente para encontrar-se com ela no mesmo alto nível.”
E Roger Ebert termina assim:
“É um material excruciantemente difícil. Ingrid Bergman e Liv Ullmann o enfrentam com uma coragem e uma habilidade que são impressionantes. Sempre soubemos que Liv Ullmann é uma grande atriz (este é um dos dados básicos do cinema nas duas últimas décadas), e soubemos, também, que Ingrid Bergman era uma grande estrela. Mas que coisa importante que, aos 60 e tantos anos, atuando em sua própria língua pela primeira vez em quatro décadas, trabalhando com um dos diretores supremos do cinema, Bergman tenha conseguido usar não apenas suas qualidades de estrela mas também cada medida de sua arte e de sua humanidade. Não é só que Autumn Sonata seja o último filme de Ingrid Bergman. É que ela sabia que tinha que fazê-lo antes de morrer.”
Depois de Roger Ebert, não há o que dizer.
Anotação em abril de 2018
Sonata de Outono / Höstsonaten
De Ingmar Bergman, Suécia-França-Inglaterra-Alemanha Ocidental, 1978
Com Ingrid Bergman (Charlotte Andergast), Liv Ullmann (Eva)
e Halvar Björk (Viktor, o marido de Helena), Lena Nyman (Helena), Marianne Aminoff (a secretária de Charlotte), Arne Bang-Hansen (tio Otto), Gunnar Björnstrand (Paul), Erland Josephson (Josef), Georg Løkkeberg (Leonardo, o terceiro marido de Charlotte), Mimi Pollak (o professor de piano), Linn Ullmann (Eva criança)
Argumento e roteiro Ingmar Bergman
Fotografia Sven Nykvist
Montagem Sylvia Ingemarsson
Produção Personafilm, Filmédis, Incorporated Television Company (ITC), Suede Film. DVD
Cor, 99 min (1h39)
R, ****
Como é enriquecedor, vê dois atores em cenas, em duelos de titãs mais sem deslumbre por parte dos atores, é raro mais é precioso assim como aqui entre Ingrid Bergman (que deveria ter levado o Oscar este ano) e Liv Ullmann. Me fez lembrar de Sophia Loren e Marcello Mastroianni, em Um Dia Muito Especial; Anne Bancroft e Patty Duke, em O Milagre de Annie Sullivan, Liv Ullmann e Bibi Andersson, em Persona. Só para citar algumas.
Depois de algumas décadas, acabo de rever SONATA de OUTONO. Que obra-prima! Chocante, profunda, perturbadora. Grandes performances. Ingrid Bergman merecia finalizar sua extraordinária carreira de forma tão digna e iluminada.