Lendas da Paixão / Legends of the Fall

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Nota: ★★☆☆

O IMDb traz uma sinopse curtinha e bem correta de Legends of the Fall, no Brasil Lendas da Paixão, dirigido por Edward Zwick e lançado em 1994: “História épica de três irmãos e seu pai vivendo no meio da natureza remota nos Estados Unidos do início do século XX e como suas vidas são afetadas pela natureza, história, guerra e amor”.

Sim, a intenção clara, óbvia, é fazer um épico, uma coisa grandiosa, um afresco gigantesco, tipo O Nascimento de Uma Nação (1915), Assim Caminha a Humanidade/Giant (1956), A Conquista do Oezte/How the West Was Won (1962).

Outra forma de sintetizar Lendas da Paixão poderia ser: Na distante, remota região de Montana, no Noroeste dos Estados Unidos, no início do século XX, a harmonia entre três irmãos é quebrada quando surge uma mulher belíssima que todos eles vão amar.

Hum… Três homens, muito próximos uns dos outros, apaixonados por uma mesma bela mulher? Prefiro Nós Que Nos Amávamos Tanto/C’eravamo tanto amati (1974), que conta uma história assim e é 300 vezes melhor do que este filme aqui.

Hum… Irmãos e seu pai, na muito distante, remota, belíssima paisagem pouco habitada do Estado de Montana, encostado no Canadá, a ação se passando no início do século XX? Prefiro Nada é para Sempre/A River Runs Through It, lançado dois anos antes, em 1992, que conta uma história bem parecida e é 200 vezes melhor do que este filme aqui.

Há gente absolutamente apaixonada pelo filme

zzlendas2Será que estou sendo injusto com o filme? Será que aconteceu aquele fenômeno tão comum, tão absolutamente usual, de simplesmente não ter havido sintonia entre eu e o filme? Teria eu visto o filme num momento em que estava querendo ver outro tipo de coisa?

Sim, pode ser, pode perfeitamente ser isso.

Vejo no IMDb um comentário de um leitor – que se assina simplesmente epat, escrevendo de Tóquio – que simplesmente adorou o filme, deu a ele a cotação máxima de 10 estrelas. Vale a pena transcrever alguns trechos.

“Vejo muitos filmes & não consigo me lembrar a última vez que um filme me encantou tanto. Não apenas os personagens são atraentes & vividamente retratados por um elenco excelente, a sutil dinâmica de suas interações é mostrada com tom & nuance inspirados. (…) Essa saga complexa de amor, dor & lealdade é narrada com total simplicidade pelo velho índio Stab, amigo desde sempre do coronel Ludlow & seus três filhos: o sério Alfred, o mais velho (‘velho mesmo para seus anos’); o idealista Samuel, o caçula (‘Não havia nada que os irmãos não fizessem por ele’); & o selvagem Tristan (‘Algumas pessoas ficam loucas ou se transformam em lendas’). O conflito entre a postura ferozmente anti-governo e anti-guerra de Ludlow & a determinação de seus filhos de fazer o que eles acham que é seu dever não é mais que uma pequena parte da história; o cerne da narrativa é a fenda que ameaça a devoção mútua desses três leais irmãos e surge pelo fato de que todos amam a mesma mulher. “A culpa não é dela’, nos conta Stab. ‘Ela era como a água que congela no rochedo e acaba quebrando a pedra.’ Uma história trágica, sim; de quebrar o coração em alguns momentos, mas nunca chata. Cada vez que eu achava que sabia o que vinha depois, a trama ia em outra direção inesperada & eu me sentava lá extasiado. Esse filme imediatamente se tornou um dos meus favoritos de todos os tempos; eu assisti umas seis vezes de lá para cá & seu alcance & poder nunca deixaram de me emocionar.”

O comentário apaixonado de epat foi colocado no IMDb em 2004. Pela insistência no uso do sinal &, no lugar da conjunção “e” (and, et, y, und), parece que epat um rapaz bem jovem.

Leonard Maltin diz a história fica tola. Roger Ebert diz que é um filme muito bom

zzlendas3Como existe de fato a possibilidade de eu ter me enganado, e não ter gostado de um filme de qualidade, vou então direto a outras opiniões, deixando as minhas para depois.

Leonard Maltin deu 2 estrelas em 4: “Extensa saga familiar sobre três irmãos criados em Montana por seu iconoclástico pai – um ex-oficial da cavalaria que deixou o serviço em protesto contra o assassinato e a exploração dos índios. A trama à la Edna Ferber é cheia de rivalidades entre os irmãos, olhares significativos, e calorosas frases. Muitos espectadores – especialmente fãs do bonitão (Brad) Pitt – apaixonaram-se por este filme, mas sua história vai ficando mais tola à medida que avança, perdendo credibilidade a cada novo episódio. As atuações são bastante monótonas, exceto por (Henry) Thomas como o irmão mais novo.”

Hum… Às vezes – como é o caso agora – concordo plenamente com o autor do guia de filmes mais vendido do mundo.

Ele cita justamente Edna Ferber, a autor do romance caudaloso que resultou no belíssimo filme Assim Caminha a Humanidade. Eu já havia me lembrado de Giant antes de ler o que Maltin escreveu, porque a referência é bastante óbvia.

Roger Ebert, o crítico que gostava de ver filmes, deu 3 estrelas em 4. Seu texto é bastante extenso, como sempre. Vou trancrever só alguns trechos:

Legends of the Fall é o tipo de filme em que você tem que fazer um sério esforço para evitar a expressão ‘Terra do Grande Céu’ no primeiro parágrafo da resenha, É uma saga épica do Oeste sobre uma bela mulher do Leste, e os três filhos de um fazendeiro de Montana que a amaram e lutaram por ela, contada tendo como pano de fundo a Primeira Guerra Mundial. (…) Não é que o filme seja ruim. É bastanre bom, na verdade, com atuações apaixonadas e melodrama sincero. É que o material é tão alegremente antiquado que deixa Giant parecendo sutil.”

zzlendas4Hum… Tenho adoração por Giant. Mas vamos em frente. A partir daí, Ebert vai descrevendo os personagens – o coronel Ludlow (Anthony Hopkins) e seus três filhos, Alfred (Aidan Quinn), “o mais velho e mais responsável”, Tristan (Brad Pitt), “o filho do meio, cuja idéia de diversão é acordar ursos de sua hibernação e cortar fora o coração ainda batendo deles”, e Samuel (Henry Thomas), o mais jovem.

“Samuel retorna do Leste com Susannah, uma jovem que é sua noiva. Ela é interpretada por Julia Ormond, uma jovem atriz britânica que aqui parece excepcionalmente com Ingrid Bergman. Ela é forte, capaz, bela e alegre, capaz de cavalgar, laçar e atirar, e quando Tristan, o personagem de Brad Pitt, passa coberto de suor, sangue ou pêlos de cavalo, podemos imaginar, pelo jeito com que as narinas dela se abrem, que cavalgar, laçar e atirar não são necessariamente seu melhor esporte.”

Os personagens rebeldes sempre atraem muito mais que os estáveis, responsáveis

Roger Ebert faz um interessante paralelo entre os personagens interpretados aqui por Aidan Quinn e Brad Pitt com aqueles feitos em Assim Caminha a Humanidade por, respectivamente, Rock Hudson e James Dean. Os dois primeiros, o irmão mais velho Alfred e o Bick Benedict, são estáveis, responsáveis; são, de uma certa maneira, o status quo. Enquanto o Tristan de Brad Pitt e o Jett Rink de James Dean são os rebeldes, os passionais, os que deixam as mulheres apaixonadas – afinal, são os belos, os gloriosamente belos, e ainda por cima louros.

zzlendas6Entre a estabilidade de um e a rebeldia do outro balança o coração de Leslie, a mulher do Leste interpretada por uma Liz Taylor que jamais foi tão escandalosamente bela quanto naquele filme. Exatamente como entre a estabilidade de um e a rebeldia do outro balança o coração de Susannah, a mulher do Leste que vem na pele dessa deusa Julia Ormond, que tanto Roger Ebert quanto eu mesmo comparamos com Ingrid Bergman.

É de fato fascinante esse paralelo que Ebert cria entre Giant e este filme aqui. Eu tinha me lembrado de Giant, é claro, citei o filme lá em cima no início desta anotação, mas não me ocorreu essa semelhança tão grande entre os dois.

Fiquei, enquanto via o filme, e depois, mais impressionado com as semelhanças entre este Lendas da Paixão e Nada é para Sempre/A River Runs Through It, o terceiro filme dirigido por Robert Redford, ele mesmo um apaixonado pelas paisagens vastas do Oeste e, em especial, do Noroeste, da região em que está Montana.

A ação dos dois filmes, Nada é para Sempre, de 1992, e Lendas da Paixão, de 1994, se passa em Montana, nas terras amplas, de montanhas gigantescas e rios de águas límpidas. A ação dos dois filmes começa na segunda década do século XX, os anos 1910. Nos dois filmes fala-se da Primeira Guerra Mundial e da Lei Seca. Os dois filmes são sobre o relacionamento do pai com seus filhos, todos homens. Tanto em um quanto em outro um dos filhos é mais rebelde, aventureiro, ligado à natureza – e os dois filhos rebeldes, aventureiros, ligados à natureza são interpretados pelo mesmo Brad Pitt!

É coincidência demais, para filmes lançados com apenas dois anos de diferença.

Enquanto o filme de Edward Zwick tenta por todos os meios ser Giant, ser parecido com a obra-prima de George Stevens e ser gigantesco, amplo, épico, painel, afresco, o de Robert Redford, muito mais intimista, vai fundo na alma dos personagens.

O de Redford de fato dá de 10 a 0 no de Zwick – na minha opinião, é claro.

Dá de 10 a 0 mesmo não tendo a beleza acachapante, maluca, extraordinária de Julia Ormond, que foi o motivo pelo qual fui atrás deste Lendas da Paixão, algumas semanas depois de ter babado oceanos diante da beleza dela em outro filme da mesma época, Lancelot, o Primeiro Cavaleiro.

Susannah,  a personagem de Julia Ormond, vai perdendo o brilho, a força

zzlendas7Será que desgostei do filme porque achei ruim o destino que deram ao personagem de Susannah, a mulher que, como a Luciana de Stefania Sandrelli de Nós que nos Amávamos Tanto, foi amada ao mesmo tempo três amigos-irmãos?

Susannah, como bem escreveu Roger Ebert, é uma mulher forte, capaz, bela e alegre. Me pareceu sem sentido transformá-la, com o passar do tempo, naquele ser fraco, sem ânimo, sem brilho, mostrado mais para o fim da narrativa.

Então pode ser, sim. Também pode ser que eu não tenha sintonizado com o filme porque a trama acaba destruindo a heroína.

Eis como Roger Ebert termina sua crítica:

Legends of the Fall não é um filme sério, apesar dos sentimentos profundos de sua narração e das clássicas ironias da trama. É uma ópera de cavalo de alta classe – com ênfase na ópera, com uma abundância de coincidências operísticas, paixões, amores, perdas, árias exageradas, solilóquios de quebrar o coração. Entendido dessa maneira, ele é um grande entretenimento, uma volta aos dias em que Hollywood não pedia desculpas por histórias apaixonadas envolvendo três irmãos cujos destinos são enlaçados com o de uma mulher legendária, enquanto sua silhueta se projeta contra o Grande Céu”.

Roger Ebert é um apaixonado pelos filmes que vê – e é capaz de ver qualidade mesmo onde ela não está assim tão presente.

Se o eventual leitor tiver por acaso vontade de ver um filme sobre irmãos vivendo nas belíssimas paisagens intocadas de Montana, exatamente um século atrás, tenho uma dica: veja Nada é para Sempre. Aquele, sim, é um belo filme.

Anotação em novembro de 2014

Lendas da Paixão/Legends of the Fall

De Edward Zwick, EUA, 1994

Com Brad Pitt (Tristan Ludlow), Anthony Hopkins (Coronel William Ludlow), Aidan Quinn (Alfred Ludlow), Julia Ormond (Susannah Fincannon), Henry Thomas (Samuel Ludlow), Karina Lombard (Isabel 2 adulta), Tantoo Cardinal (Pet), Gordon Tootoosis (One Stab – Facada), Paul Desmond (Decker), Christina Pickles (Isabel Ludlow), Robert Wisden (John T. O’Banion)

Roteiro Susan Shilliday e William D. Wittliff

Baseado na novela de Jim Harrison

Fotografia John Toll

Música James Horner

Montagem Steven Rosenblum

Produção TriStar Pictures, Bedford Falls Productions, Pangaea. DVD Tri-Star Sony Pictures.

Cor, 133 min

**

11 Comentários para “Lendas da Paixão / Legends of the Fall”

  1. Assisti no cinema quando foi lançado, se minha memória não está me traindo o oba oba sobre esse filme se devia a presença de Brad Pitt que tinha sido içado a ídolo do momento, lembro que muitos se referiam maldosamente a esse filme como 3 funerais e um casamento lembrando de outro filme lançado no mesmo ano.

  2. Eu não se o Brad Pitt consegue ter uma performance melhor do que esta. O roteiro é muito bem conseguido e Zwick mistura vários géneros num único filme. Cada um dos irmão como uma característica diferente, mas o lado selvagem de Tristam centraliza todas as atenções. O período retratado no filme também ajuda. Um dos melhores filmes de todos os tempos, ao nível dos grandes clássicos.

  3. O enredo desse filme me letra a história de um tio trisavô meu de nome Teodoro Castelo Branco, poeta, lendo seus poemas e vendo sua história, a semelhança em tudo.

  4. Dizer que aquele água-com-açúcar do “Nada é Para Sempre” é melhor que este esplêndido épico Legends of The Fall é como dizer que Van Damme é melhor ator que o De Niro. Pisou na jaca dessa vez, meu caro.

  5. Nada a ver dizer que Susannah era um personagem forte. Nunca foi. Não tinha influência sobre Samuel, nem sobre Tristan. Ela se desvia de seus planos o tempo todo, é uma pessoa sem convicção, aceita ser amada como o outro quer e não como precisa. Sua felicidade e infelicidade está sempre nas mãos dos outros, ela nunca define seu destino. Enqto todos buscam por suas vidas (Tristan viaja, Alfred investe na política, Isabel estuda) ela se deixa ao sabor da vontade dos outros. Seu fim é previsível. Não tem como suportar a vida sendo tão covarde.

  6. Susanna, a comentarista acima foi precisa na interpretação da personagem Susannah. Não era uma heroína, mas uma mulher submissa desde sempre. Tanto que quando surge, pela carta de Isabel é descrita como frágil. Isabel sugere que tal fragilidade inclusive deve vir da perda dos pais.
    E Nada é para sempre é um filme belíssimo que não tem a força de Lendas da Paixão. Aliás, não é nada exagerado os desencontros ocorridos com as personagens deste último, afinal parece mesmo com a vida.

  7. O melhor filme de drama e romance de todos os tempos para mim. A atuação de Brad Pitt é impecável. A história surpreende a cada momento com reviravoltas totalmente inesperadas. Esse filme me emociona. Fotografia impecável. Um clássico imortal que viverá para sempre em minha memória e em meu coração ❤️

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