3.0 out of 5.0 stars
Anotação em 2010: Operação Valquíria é um bom filme. Direção segura, excelente elenco em boas atuações, produção caprichada, requintada, todos os quesitos técnicos, artesanais, bem cuidados. A questão é: era necessário fazer este filme, apenas quatro anos depois que os alemães contaram exatamente a mesma história em um bom filme, Operação Valkiria?
É a história da conspiração para assassinar Adolf Hitler, em 1944, organizada por um grupo de oficiais do exército alemão. Tanto o filme alemão de 2004 quanto o americano de 2008 centram a narrativa no coronel Carl Von Stauffenberg, um dos oficiais que lideraram a conspiração, na esperança de pôr fim mais rapidamente à guerra que já sabiam perdida e que a cada dia deixava mais algumas centenas de mortos.
Nos dois filmes, pinta-se o retrato de um oficial rico, de família nobre, dedicado à pátria, que percebe os gigantescos males que o nazismo está causando e, com coragem, firmeza e determinação, abandona o juramento de fidelidade ao Führer e ao Reich em nome da fidelidade a algo muito maior – milhares de vidas humanas, e o futuro da Alemanha após o fim da guerra.
Nos dois filmes, Stauffenberg é representado por um ator que, além de talentoso, tem estampa – no primeiro caso, o alemão Sebastian Koch, que fez o escritor seguido pela Stasi, a polícia política da Alemanha comunista no extraordinário A Vida dos Outros/Das Leben der Anderen, e fez também um oficial nazista no ótimo A Espiã/Zwartboek. No segundo caso, Tom Cruise.
Ao lado de Cruise, um dos maiores astros do cinema mundial no último meio século, estão alguns atores extraordinários. Cinco deles são magníficos atores da Grã-Bretanha, a maior escola de dramaturgia do mundo, o maior celeiro de bons atores que há. Kenneth Branagh, Bill Nighy, Terence Stamp e Tom Hollander interpretam quatro dos conspiradores anti-Hitler, e Tom Wilkinson faz um general leal ao ditador e ao Reich.
Seria muito difícil imaginar que esse elenco pudesse fazer algo ruim. Aqui, participam todos de um bom filme.
Um bom filme – mas era necessário?
Uma história contada muitas vezes
O AllMovie registra diversos filmes a respeito do tema:
Geheime Reichssache, em inglês The Top Secret Trial of the Third Reich, um documentário alemão de 1979 dirigido por Jochen Bauer;
The Plot to Kill Hitler, longa-metragem americano de 1990, feito para a TV por Lawrence Schiller;
Operation Valkyrie: The Stauffenberg Plot to Kill Hitler, documentário americano dirigido em 2008 por Jean-Pierre Isbouts;
Killing Hitler: The True Story of the Valkyrie Plot, documentário americano de 2008, de média metragem (61 minutos).
E ainda tem o bom filme alemão de 2004, dirigido por Jo Baier, Operação Valkíria, ou Operation Valkyrie em inglês, Stauffenberg no original alemão. Mesmo se não levarmos em consideração os filmes anteriores, de 1979 e 1990, por que refilmar em 2008 a história que os alemães contaram tão bem em 2004?
Diante da existência dos filmes citados acima, fica até meio boba, meio ingenuamente ignorante, a afirmação feita nos especiais do DVD pelo co-roteirista Christopher McQuarrie: “Estive na Alemanha no começo de 2002, fiz uma excursão por Berlim e me levaram ao Bendler Block (o local em que Stauffenberg foi executado, em 1944). Há um monumento lá (na verdade, é uma placa). É o único monumento erguido a soldados alemães que lutaram na Segunda Guerra. Fiquei fascinado com o fato de que esses quatro homens, cujos nomes eu nunca ouvira (um deles é o de Stauffenberg; os demais são de outros participantes da mesma conspiração), serem as únicas pessoas imortalizadas, entre todas as que serviram a Alemanha na guerra.”
E aí o roteirista McQuarrie convocou Nathan Alexander – conforme este conta no especial do DVD – para que juntos levantassem a história, fizessem a pesquisa, e escrevessem o roteiro do filme. Mais tarde o diretor Bryan Singer, que havia trabalhado com McQuarrie no ótimo Os Suspeitos/The Usual Suspects, de 1995, interessou-se pelo projeto, e em seguida chegou Tom Cruise. Quando Tom Cruise entra num projeto, ele decola.
Na minha opinião, decolou um tanto tarde, este Operação Valquíria 2008. Porque o filme não acrescenta nada ao que os alemães já haviam nos mostrado com Operação Valkíria 2004. A rigor, me pareceu que a grande diferença entre os dois filmes é que a versão americana mostra um número muito maior de altos oficiais envolvidos na conspiração do que na versão alemã. A versão americana deixa o espectador com a impressão de que metade do alto oficialato alemão participava da conspiração, e tinha o apoio de políticos, de grupos civis. E a tentativa de tomar o poder – que, na versão alemã, é desbaratada muito rapidamente – durou mais tempo, houve maior adesão após o anúncio feito por Stauffenberg, que se revelaria falso, da morte de Hitler.
Ah, sim – e o Stauffenberg de Tom Cruise é mais heróico e mandão que o de Sebastian Koch.
Parece que, se não foi feito feito nos EUA, o filme não existiu
Não há lei que proíba refilmagem; refilmagem emprega um monte de gente, produz riquezas, no caso específico deste filme aqui produziu até uma boa obra. Mas a mim, particularmente, essa mania do cinemão americano de achar que, se não foram feitos nos Estados Unidos, os filmes não existem, e então precisam ser feitos lá, me irrita um pouco. Por que, por exemplo, refilmar o belo alemão Simplesmente Martha/Bella Martha, de 2001, como Sem Reservas/No Reservations, em 2007? Por que refilmar o ótimo brasileiro Dona Flor e Seus Dois Maridos, de 1977, como Meu Adorável Fantasma/Kiss me Goodbye, com a simpatiquinha Sally Field no lugar da estrondosa Sonia Braga? Por que refilmar o excelente francês Tudo por Amor/Pour Elle, de 2008, como The Next Three Days, em fase de pós-produção em 2010?
Só porque a imensa maior parte do público americano é monoglota que nem o Lula e tem preguiça de ler legendas?
Bem. É isso o que eu acho: é um bom filme, Operação Valquíria. Mas eu sugeriria ao eventual leitor desta anotação aqui que visse antes Operação Valkíria/Stauffenberg, de Jo Baier, com o competente (e boa pinta) Sebastian Koch no papel do coronel alemão. Nem que seja para comparar com o Operação Valquíria/Valkyrie com o competente (e boa pinta) Tom Cruise. Até porque Sebastian Kock fala alemão, a língua que Stauffenberg falava.
Aliás, um detalhinho. Para muita gente, não incomoda essa coisa de, nos filmes americanos, os alemães, os poloneses, os russos, os italianos, os suecos, os romanos do tempo de César, os judeus do tempo de Cristo, os chineses, todos falarem inglês. A mim, sempre me incomodou. Pode ser chatice minha; deve ser. Mas neste filme aqui o diretor Bryan Singer tomou um cuidado interessante – um jeito assim legal de meio pedir perdão pelo artifício de botar os alemães falando inglês. O filme abre com um letreiro avisando que a história que se segue é baseada em fatos reais – e este aviso aparece primeiro em alemão, e aí as letras se transformam para mostrar o mesmo aviso em inglês. E em seguida aparece a palavra Valquíria em alemão, Walküre, para depois as letras se transformarem no inglês Valkyria. E a voz em off de Tom Cruise como o coronel Carl von Stauffenberg dizendo o que está escrevendo em seu diário contra Hitler, em uma tenda armada num deserto do Norte da África, começa em alemão – e a palavras que vemos escritas no diário são em alemão -, para depois mudar para o inglês.
Interessante: é como se o filme começasse dizendo: ó, desculpa aí, hein, pessoal? A gente sabe que o certo seria todo mundo falar alemão, mas sacumé, né? não daria pra passar um filme falado em alemão em Ohio, em Arkansas, em Idaho…
Operação Valquíria/Valkyrie
De Bryan Singer, EUA-Alemanha, 2008
Tom Cruise (coronel Claus von Stauffenberg), Kenneth Branagh (general Henning von Tresckow), Bill Nighy (general Friedrich Olbricht), Tom Wilkinson (general Friedrich Fromm), Carice van Houten (Nina Von Stauffenberg), Thomas Kretschmann (major Otto Ernst Remer), Terence Stamp (general Ludwig Beck), Tom Hollander (coronel Heinz Brandt)
Roteiro Christopher McQuarrie e Nathan Alexander
Fotografia Newton Thomas Sigel
Montagem e música John Ottman
Produção Bad Hat Harry, MGM e United Artists,
Cor, 120 min
***
A mim também incomoda tremedamente todos os seres do universo falarem inglês nos filmes americanos. Não por uma questão de nacionalismo, mas certamente por uma postura anti-imperialista. E, principalmente por uma questão de coerência interna dos filmes. Por que é extremamente incoerente quando os personagens se referem a um idioma como se fosse o deles, mas estando falando outro. Filmes que apresentam problemas de comunição relativos a vernáculos diferentes perdem todo o sentido quando feito nos “States”, com raras excessões. Sobre o Operação Valquíria, é mesmo um bom filme, daqueles que prendem a atenção do início ao fim. Vale a pena!!
Sérgio, mas vc já explicou. Os americanos adoram fazer refilmagens de filmes europeus, japoneses, chineses etc. Vejam só o Millenium, sueco, passado na suécia, com os personagens falando em inglês! Dá p acreditar?Mas o fato de eles serem monoglotas não justifica, na minha opinião, eu tb não sei inglês e só vejo filme na língua original e conheço muita gente q é assim. Os q conheço q vêm DVD dublado ou são pouco letrados ou dizem q estão muito cansados. Mas acabei de chegar da locadora e o filho da dona me deu outra explicação para tanta refilmagem: falta de idéias! Será q está faltando aos americanos criatividade?Help,Help, Help!
Eu não sei se é porque eu tenho uma certa implicância com Tom Cruise (ele nunca me convenceu como ator, galã ou bonitão…kkk), mas eu prefiro mil vezes o filme alemão. É mais convincente, até por ser falado em alemão. E concordo contigo, Sérgio, mas todo e qualquer filme americano falado em inglês é dose!!!