3.5 out of 5.0 stars
Anotação em 2009: Este aqui é, na minha opinião, um dos melhores filmes de suspense que já foram feitos. Melhora a cada nova revisão. Mesmo conhecendo bem toda a história, fiquei, mais uma vez completamente envolvido pelo clima de tensão e medo que o diretor Curtis Hanson consegue criar.
“O filme deixa a gente agoniada”, definiu Mary, e é uma definição perfeita. Não tem jeito – o espectador fica agoniado. Não é apenas suspense: o filme se aproxima do terror. Um terror que não tem absolutamente nada de esotérico, de sobrenatural; ao contrário, é tudo real, é tudo igual ao dia-a-dia. É um terror psicológico – na linha de O Iluminado, de Kubrick, O Inquilino, de Polanski.
É impressionante saber que foi o primeiro roteiro de Amanda Silver, uma mulher que, de resto, só assinaria depois dois outros. Parece obra de pessoa muito experiente, madura. O diretor Curtis Hanson, nascido em 1945, estava em seu sexto filme; não vi os três primeiros, mas o quarto e o quinto já demonstravam talento – respectivamente Uma Janela Suspeita/The Bedroom Window, de 1987, e Sob a Sombra do Mal/Bad Influence, de 1990. Este aqui é de 1992; em 1997 ele faria seu filme mais famoso e importante, Los Angeles Cidade Proibida/L.A. Confidential, que teve nove indicações ao Oscar e levou dois, de atriz coadjuvante para Kim Basinger e roteiro adaptado (da novela de James Ellroy) por Brian Helgeland e pelo próprio diretor.
Tínhamos visto o filme quando ele estreou, em 1992, e de novo em 1993. Na época, não anotei nada sobre ele, a não ser a ficha técnica básica; quis rever agora para escrever um post para o site – tenho revisto por causa do site vários filmes sobre os quais, por qualquer motivo, não anotei nada ao ver pela primeira vez.
E nesta terceira vez ele me impressionou mais ainda do que nas vezes anteriores. Tudo é extremamente bem feito – é daquele tipo de filme em que não falta nada, não sobra nada, tudo se encaixa. E cria de tal maneira um clima forte que envolve totalmente o espectador.
Bem no começo, um grande susto – à toa
Bem, vamos lá. Vou, como tenho procurado fazer, apresentar o início do filme, os primeiros 15 minutos, sem, evidentemente, revelar nada que não possa ser revelado, nenhum spoiler.
O filme abre com tomadas de uma bela, confortável, sólida casa de classe média para alta em um bom bairro de cidade americana – saberemos pouco depois que é Seattle –, entremeadas com tomadas de um homem que anda de biclicleta em ruas daquele bairro de bons sobrados cercados por grama; os créditos iniciais vão rolando enquanto conhecemos a casa e vemos o homem na bicicleta; ao final da apresentação, vemos a dona da casa, que prepara o café da manhã e chama para tomá-lo o marido e a filhinha de uns cinco, seis anos. Vemos que o homem da bicicleta parou diante da casa, bateu na porta duas vezes, mas ninguém ouviu. A dona da casa está com uma jarra de suco de laranja na mão, quando de repente vê pela janela, bem perto de si, um homem negro com um capuz – ela leva um grande susto, deixa cair a jarra com o suco, grita pelo marido. Ele sai para ver quem é o intruso – e ele, sua mulher e o espectador vêem que o susto foi à toa, e o intruso não chega a ser um intruso, estava sendo esperado. É Solomon (Ernie Hudson), um sujeito limítrofe, que havia sido indicado à família por uma organização humanitária; apesar de ter a inteligência bem limitada, é uma pessoa de boa ficha, um bom marcineiro, pintor, faz-tudo, que veio atender a um chamado dos donos da casa, que têm várias tarefas a serem executadas por um faz-tudo.
O susto e o engano se desfazem. Sabemos já então, com menos de cinco minutos de filme, que os Bartel são um jovem casal que está relativamente bem de vida, é gente boa, que se dispõe a ajudar pessoas de necessidades especiais – o termo politicamente correto para o que antes chamavam de deficientes, ou, com muito mais dureza, retardados. (O termo retardado, com relação a Salomon, será usado bem mais para a frente.)
O marido, Michael Bartel (Matt McCoy), saberemos logo, é um cientista, trabalha com engenharia genética, tem um bom emprego e está ascendendo profissionalmente. Ela, Claire (Annabella Sciorra), não trabalha fora; está esperando o segundo filho – a primogênita, Emma (Madeline Zima), como já foi dito, tem uns cinco, seis anos. Ocupa-se com os deveres normais de uma dona de casa, gosta especialmente de jardinagem, colabora com o jardim botânico da cidade.
Depois de nos apresentar a família Bartel nos primeiros cinco, sete minutos de filme, a roteirista Amanda Silver e o diretor Curtis Hanson vão acelerar um pouco a narrativa; Claire vai ao consultório de um novo ginecologista – o que cuidava dela anteriormente havia se aposentado. O dr. Victor Mott (John de Lancie) é um bambambã em ascensão, tido como um dos melhores da cidade. Mas, durante o exame que faz de Claire, passa bastante dos limites éticos. Claire deixa o consultório às pressas, atacada por um crise de asma violenta.
Conversa com Michael, não se sente à vontade para apresentar queixa ao que seria lá o nosso Conselho Regional de Medicina, mas acabará fazendo a reclamação. O ritmo da narrativa se acelera bem mais; em poucos minutos, ficamos sabendo, através de noticiários de TV e títulos de jornal, que, depois que Claire abre o caminho, outras quatro mulheres apresentam queixa idêntica; o médico abusador se mata. Sua viúva (Rebecca De Mornay), grávida de oito meses, é informada de que perderá todo o dinheiro acumulado pelo marido morto, e também a bela casa que haviam mandado construir, para pagamento das indenizações às vítimas. A Sra. Mott passa mal, desmaia, é levada às pressas para um hospital, mas perde o bebê.
A seqüência do hospital é brilhante, porque é mostrada entremeada por rápidas tomadas da feliz família Bartel.
Corta; um letreiro informa que se passaram cinco meses. Vemos de novo – e o ritmo da narrativa volta a ser bem mais lento – a rotina da família Bartel. Já nasceu o bebê de Claire, Joe; Claire quer construir uma estufa no terreno de sua casa, e Michael a convence a procurar uma babá.
Apresenta-se para a vaga a jovem e bela Peyton Flanders. O espectador sabe que Peyton Flanders é a viúva do médico cuja desgraça aconteceu a partir do momento em que Claire denunciou seu abuso – mas Claire, é claro, não sabe disso. Estamos com no máximo 20 minutos de filme.
A babá Peyton Flanders vai parecer, para a família Bartel, um anjo caído do céu, uma pessoa perfeita, melhor do que qualquer encomenda, melhor que a melhor expectativa. O espectador sabe que tudo ruim, todo o mal que se pode conceber, virá em seguida. O espectador, e também Solomon. Pobre Salomon, pobre família Bartel.
É apavorante.
E é brilhante a forma como a narrativa se desenvolve.
Um elenco todo maravilhoso – Anabella, Rebecca, Julianne
Todo o elenco está excelente. Rebecca De Mornay, mulher de grande beleza, tem um talento imenso para representar o mal em si, o diabo escondido sob o rosto angelical, os lindos olhos azuis. Ela nos mostra com competência os dois lados, o falso anjo, o diabo real.
Annabella Sciorra teve aqui muito provavelmente o melhor papel de sua carreira; no ano anterior, 1991, tinha tido um outro grande papel, em Febre da Selva/Jungle Fever, um filme de grande impacto do jovem Spike Lee. Linda, lindíssima, de uma beleza ao mesmo tempo forte e um tanto convencional, ela cria com maestria a dona de casa de vida feliz, tranqüila, mas frágil, temorosa, assustadiça, uma fragilidade tornada muito maior pelos ataques de asma que chegam sempre que há uma notícia ruim, um imprevisto.
Das duas primeiras vezes em que vi o filme, no início dos anos 90, ainda não conhecia Julianne Moore, que logo em seguida faria diversos filmes bons e/ou importantes e viraria uma grande estrela, tanto em obras do cinemão dos grandes estúdios quanto em produções independentes. (O iMDB contabiliza que, até 2009, ela foi indicada quatro vezes ao Oscar, teve 38 prêmios e 45 outras indicações.) Este aqui foi seu segundo filme para o cinema (havia aparecido em alguns episódios para a TV); em A Mão Que Balança o Berço, faz um papel pequeno, mas importante, como Marlene, uma grande amiga de Claire Bartel, que no passado bem distante tinha tido um namorico com Michael Bartel. Aparece sempre com vestidos bem curtos, as coxas magrinhas bem à mostra, como faria em diversos de seus filmes seguintes. Desde sempre, fez papéis de alguma forma ligados à sensualidade – basta lembrar da personagem Sarah Miles de Fim de Caso, a refilmagem de 1999 do livro de Graham Greene, muitíssimo mais sensual do que no livro e na primeira versão, Por Amor do Meu Amor, de 1955, com Deborah Kerr.
A biografia de Julianne Moore na obra Baseline diz que sua atuação como Marlene chamou a atenção do público e rendeu elogios da crítica; e lembra que é dela a bela frase para Claire: “Nunca deixe uma mulher bonita ocupar uma posição de mando em sua casa”. Acrescento que é dela também, na mesma seqüência – o casal Bartel está jantando com Marlene e seu marido – a frase de onde sai o título do filme. Ela demora um pouco para se lembrar do ditado inteiro, mas acaba lembrando: “A mão que balança o berço é a mão que governa o mundo”.
A Mão que Balança o Berço/The Hand that Rocks the Cradle
De Curtis Hanson, EUA, 1992.
Com Annabella Sciorra, Rebecca De Mornay, Matt McCoy, Madeline Zima, Ernie Hudson, Julianne Moore, John de Lancie
Argumento e roteiro Amanda Silver
Fotografia Robert Elswit
Música Graeme Revell
Produção Hollywood Pictures
Cor, 110 min
R, ***1/2
Vi esse filme não me lembro quando, provavelmente na época do lançamento em VHS (abafa o caso), ou terá sido na TV mesmo? Não sei. Mas lembro da história como se tivesse visto ontem. E lendo o seu texto, fui revivendo tudo (que tensão!) Só não me recordava da Julianne Moore, mas lembro da personagem amiga da Claire. O primeiro filme que vi com a Julianne foi um que ela fez com o … Stallone. Na ocasião não levei fé nela; não recordo do filme nem da sua atuação (acho que ela foi uma das inúmeras namoradas dele na vida real).
Fiquei morrendo de vontade de rever “A Mão que Balança o Berço” e já estou baixando! É de roer todas as unhas! Se eu tivesse filhos pequenos ou bebês, não teria coragem de rever. É aterrorizante.
Jussara, de fato, só pelos seus comentários já teria valido a pena fazer este site!
Abração.
Sérgio
Eu assisti o filme em VHS, no século passado!
Adorei! Revi há pouco tempo, com minha filha e ela também adorou!
Comentário dela: Os filmes “antigos” (Ai, meu Deus!) eram muito melhores. A vilã focou sua vingança em quem ela achava que merecia e não saiu matando todo mundo por aí!
Assim como a Jussara e a dininha,já tem um bom tempo que assisti este filme.Viajando pelo site,(prá variar…)encontrei o filme e resolvi falar alguma coisa sôbre ele de que ainda me lembro. Realmente um filmaço.
Lembro que a Rebecca De Mornay deu um show.
A sua Peyton que mulher má,perversa,odiosa. Parece que a Rebecca nasceu para fazer esses personagens. Todo elenco esteve muito bem mas gostei muito do Solomon (Ernie Hudson). A química entre ele a Emma era maravilhosa.
Lembro que a maneira como a Peyton tentou,(porque no final não deu certo)incriminar o Solomon, foi uma coisa nojenta,asquerosa mas também a Claire deixou-se influênciar muito fácil. É,mas tinha de ser assim. Pensei em alguns momentos que a Peyton ficaria impune.
Ao contrário da Jussara,não esqueci da amiga da Claire, a Marlene,personagem da Julianne Moore. Ela linda como sempre, radiante, no esplendor de sua forma física,sensual demais.
Começava aí uma carreira maravilhosa.
Para mim Sergio,as coxas da Julianne estavam bem rolicinhas.Por falar nela lembrei também da cilada nojenta que a Peyton armou para a Marlene quando ela descobriu a verdade.
Será que o filme que a Jussara não lembra da Julianne com o Stalone sería ” Assassinos ” ?
Se fôr, tem também o Antonio Banderas.
Isto é spoiler se ainda não viu não leia
Com todo o respeito,só discordo um pouquinho do comentário da filha da Dininha. A Peyton não focou só a Claire, ela matou a Marlene e tentou fazer o mesmo com o Solomon.
Com certeza nas locadoras por aqui não vou erncontrar o filme mas, se conseguir online vou ver outra vez. É um suspense maravilhoso.
A definição da Mary é perfeitíssima. Este filme, de fato, nos deixa agoniados.
Um abraço, Sergio !!
Há um tempo venho acompanhando seus textos e suas indicações, estou vendo todos os filmes em preto e branco que anda recomendando, estou numa batalha eterna contra o tempo porque eu sou apaixonado por filmes antigos, mas tive o desprazer de nascer tarde demais, salvando O Artista rsrs que é recente. Enfim, eu assisti hoje ” A mão que balança o berço” e logo nos primeiros momentos eu já havia previsto o filme todo, mas o que eu não previa era que seria uma experiencia traumática e sinceramente nauseante. A forma como as coisas foram acontecendo ao decorrer do filme pareciam tão naturais que eu me senti cúmplice de tudo e no pior sentido da palavra, CÚMPLICE. Eu estava amargando aquela normalidade envernizada, eu tive o desprazer e o azar de cruzar com pessoas tão perversas quanto a personagem de Peyton, por isso eu me vi revivendo todo aquele drama e embarcando numa viagem inesperada e indigesta para uma manhã que estava começando! Me senti enjoado parte do filme todo, não consegui mais dormir, era tudo que eu temia naquela sequência: A droga de uma babá que era muito mais que real, não tinha sangue sendo espirrado toda hora e a todo momento e não havia maldade Hollywoodiana que costumamos ver em filmes de cunho apelativo, aquilo era o verdadeiro terror, coisas que podem acontecer naturalmente sem você tomar controle da situação. Enfim, acabei falando demais. Obrigado pela MEGA indicação, sou muito fã do seus textos e você me apresentando viagens que eu não esperava percorrer, obrigado por me fazer encarar os fantasmas mais absurdos da minha vida. É como Medéia encarando o espelho de si mesmo em repulsa a sua Cólquida nos traços.
Só agora, tantos anos depois da estreia (quase 30) é que vi este filme e graças a um dos novos serviços de streaming que chegaram a Portugal.
Eu conhecia o título do filme e mais nada.
Gostei muito. Sou apreciador de filmes de suspense e de terror mas infelizmente deste último a maioria esmagadora é puro lixo.
Não é o caso aqui, o filme está muito elaborado, as interpretações são muito boas e a direcção também.
Também achei as coxas da Julianne Moore normalíssimas…