4.0 out of 5.0 stars
Anotação em 2006, com complemento em 2008: Um filme extraordinário em tudo por tudo – até mesmo pelo fato de não ter se tornado um cult, ao contrário do seu contemporâneo e primo-irmão Dr. Fantástico/Dr. Strangelove.
Incrível: os dois filmes foram feitos no mesmo ano, 1964, no auge da guerra fria; a crise dos mísseis soviéticos em Cuba tinha acontecido pouco antes, em 1962 – o momento mais próximo que a humanidade chegou do holocausto nuclear, o fim do mundo, o dia do juízo final. Bob Dylan tinha escrito sua epopéia do medo da bomba, A Hard Rain’s a-Gonna Fall, em 1963, o mesmo ano em que Joan Baez cantava What Have They Done to the Rain, outra canção inspirada no pavor da guerra atômica.
E então foram feitos os dois filmes, o de Stanley Kubrick e este de Sidney Lumet, os dois tratando exatamente do mesmo tema – um cochilo, um vacilo, e começa a guerra nuclear.
Não poderia haver dois filmes mais diferentes sobre exatamente o mesmo assunto. Enquanto Kubrick optou pela farsa, pela comédia, pela ironia, pela gozação, o muitíssimo mais politizado, engajado Lumet fez seu filme de forma séria, pesada, densa, quase como um documentário. No filme de Kubrick, a guerra começa por causa da estupidez dos homens. No de Lumet, por causa do mal funcionamento da máquina de guerra: um problema técnico do quartel-general do Comando Aéreo Estratégico em Ohama faz com que a ordem de bombardear seja passada para um avião.
Dr. Fantástico virou cult, um filme obrigatório; todo mundo já viu Dr. Fantástico. Este Limite de Segurança, ao contrário, não é tão conhecido, badalado, endeusado. É até obscuro.
O livro The Columbia Story diz que, por causa da imensa semelhança com Dr. Fantástico, e do fato de que o filme de Kubrick foi lançado alguns meses antes, este Limite de Segurança, “apesar da seriedade com que trata o tema (ou por causa dela?)”, não encontrou a audiência que merecia.
Pauline Kael não fala dele em seu livro sobre 2.848 filmes. Roger Ebert fala do Dr. Fantástico, mas não de Limite de Segurança, em seu livro A Magia do Cinema. A mesma coisa acontece no livro 1.000 Best Movies on DVD, de Peter Travers.
Leonard Maltin deu para ele 3.5 estrelas (em 4): “Bombardeiro americano acidentalmente recebe ordem de lançar mísseis nucleares sobre a União Soviética; os líderes dos governos dos EUA e da URSS, em crise, têm que tomar decisões enquanto o tempo se esgota. Um drama de alta-tensão feito com bom gosto e inteligência, baseado no best-seller de Eugene Burdick e Harvey Wheeler”.
Steven H. Scheuer deu exatamente a mesa nota, 3.5 em 4; diz que é um drama que funciona como um pesadelo, e mostra que um erro fatal poderia perfeitamente ter acontecido.
O grande Henry Fonda está excelente como o presidente americano que conversa diversas vezes por telefone com o chefe de estado soviético, ao lado de um intérprete. Ele e Lumet já haviam trabalhado juntos sete anos antes, em Doze Homens e Uma Sentença/Twelve Angry Men, a estréia de Lumet na direção.
Em 2000, a história seria refilmada (ver os comentários abaixo).
O original é um brilho de filme. Para ver e rever, respeitar e reverenciar.
Limite de Segurança/Fail Safe
De Sidney Lumet, EUA, 1964.
Com Henry Fonda, Walter Matthau, Larry Hagman
Roteiro Walter Bernstein
Basedo em novela de Eugene Burdick e Harvey Wheeler
Montagem Ralph Rosenblum
Fotografia Gerald Hirschfeld
Produção Max E. Youngstein, Columbia.
P&B, 111 min
Adorei a crítica, eu assisti o filme Fail Safe remake, nao é TAO bom, mas vou pegar esses filmes que vc colocou aí
Sara, vale a pena você ver o original, que é realmente extraordinário.
Agradeço pela sua mensagem. Confesso que não sabia (ou, se já soube algum dia, tinha esquecido) que a história havia sido refilmada. Vejo então que a refilmagem que você viu foi feita para a TV, dirigida pelo ótimo diretor inglês Stephen Frears, com Richard Dreyfuss no papel que havia sido de Henry Fonda.
Um abraço.
Sérgio
Fail Safe é excelente.
Todo o elenco está maravilhoso e conseguem passar o clima.
Uma pena que não tenhamos tantos filmes bons sobre assuntos sérios.
Super oportuna e justíssima observação! sou admirador dos trabalhos de Kubrick e Dr Fantástico é sem duvida muito bom, mas a profundidade e impacto de Limite de Segurança são desconcertantes! eu o assisti há uns 30 ou 35 anos e sempre me vejo pensando e refletindo sobre e ele em algum momento que me faça reportar…Enquanto Dr Fantástico foi…divertido. Feliz senso de justiça!
George Guerra.
Esse filme é um daqueles “injustiçados”. Acho memorável o enredo (na época, super criticado nos EUA, tendo o governo se apressado em esclarecer que era impossível um erro semelhante acontecer de verdade no Comando Aéreo Estratégico…), a atuação cínica de Walther Matthau e um titubeante Larry Hagman, anos antes de “Jeannie é um Gênio”. Assisti quando menino numa dessas reprises tarde da noite na TV (quando isso ainda existia) e ficou gravado na minha memória.