A Condessa Branca / The White Countess


Nota: ★★★☆

Pode até não ser dos melhores filmes de James Ivory, o-mais-inglês-dos-cineastas-americanos – mas é um filme muito bom. A direção de arte é esplendorosa, a reconstituição de Xangai nos anos 30 é uma maravilha, o visual é belíssimo.

Todo o tom do filme é outonal, de fim de era, fim de ciclo, fim de um tipo de vida. O clima é triste e desalentado, numa Xangai às vésperas da invasão japonesa, onde se mistura gente de todas as origens, ex-aristocratas, diplomatas, políticos, espiões.

O filme tem a fascinante atração de reunir três mulheres do clã Redgrave, um dos mais nobres do cinema mundial. Natasha Richardson, a filha de Vanessa Redgrave e do diretor Tony Richardson, faz o papel de Sofia, a condessa branca do título – uma bela e triste mulher, expatriada da sua Rússia natal com toda a família para a China depois da revolução comunista de 1917. Viúva, ela se submete a trabalhos deprimentes, ultrajantes, como dançarina de cabaré e às vezes como prostituta, para alimentar a família aristocrática que perdeu tudo, até o respeito.

A mãe e a tia de Natasha Richardson fazem aqui papéis invertidos. Vanessa Redgrave faz o papel de uma tia de Sofia. E sua irmã Lynn Redgrave interpreta Olga, mãe da condessa.

A trama se concentra em Sofia e sobretudo em Todd Jackson, um americano tão expatriado como a condessa russa; Jackson havia chegado anos antes a Xangai como um diploma cheio de otimismo. Na época da ação, 1936, ele já havia perdido o emprego, todas as esperanças – e a visão. O grande Ralph Fiennes dá um show de interpretação nesse papel.

Eventualmente, a condessa russa prostituída e o ex-diplomata americano agora cético, cego e beberrão vão desenvolver uma relação forte, estranha, profunda,

A Condessa Branca foi o último filme do grande, extraordinário indiano Ismail Merchant (1936-2005), que teve uma brilhante parceria de décadas com James Ivory. Formado em administração pela Universidade de Nova York, Merchant foi o produtor de quase todos os filmes de James Ivory, a garantia de dinheiro em caixa para o amigo fazer seus belos filmes de reconstituição de época, de histórias de famílias aristocráticas em geral com imensa dificuldade de relacionamento e comunicação com todos os demais seres humanos.

Para este filme aqui, Merchant amealhou capital em quatro países – Inglaterra, Estados Unidos, Alemanha e a China do regime comunista mais selvagemente capitalista da história. Dirigiu pouco – apenas sete filmes. Um deles, pelo menos – O Regresso/The Proprietor, de 1996 – é brilhante.

Foi um roteiro original do grande Kazuo Ishiguro

Quando vi A Condessa Branca, em 2006, o nome Kazuo Ishiguro – o autor do roteiro original do filme – não me dizia nada. Ignorância é uma terrível doença, mas felizmente ela tem cura. Kazuo Ishiguro, aprendi, nasceu em Nagasaki, em 1954, nove anos, portanto, depois que os Estados Unidos lançaram uma bomba atômica sobre a cidade. Sua família mudou-se para a Inglaterra quando ele estava com apenas cinco anos de idade; seu pai, o oceanógrafo Shizuo Ishiguro, havia sido convidado para trabalhar como pesquisador no então National Institute of Oceanography, hoje National Oceanography Centre, em Guildford, no Surrey.,

A Wikipedia o define assim: “Kazuo Ishiguro é um romancista, roteirista, músico e autor de contos japonês-britânico. (…) É um dos mais aclamados e elogiados autores contemporâneos de ficção da língua inglesa, tendo recebido o Prêmio Nobel de Literatura de 2017. A Academia Sueca o descreveu como um escritor que, ‘em romances de grande força emocional, tem revelado o abismo sob nosso senso ilusório de conexão com o mundo’.”

Em 1989, Ishiguro lançou Remains of the Day, seu terceiro romance. A roteirista Ruth Prawer Jhabvala, que fez um maravilhoso trio com o diretor James Ivory e o produtor Ismail Merchant em vários belos filmes, escreveu o roteiro de Vestígios do Dia (1993), aquela maravilha com Anthony Hopkins e Emma Thompson.

Em 2010, foi lançado Não me Abandone Jamais/Never Let Me Go, também com um elenco extraordinário (Carey Mulligan, Andrew Garfield, Keira Knightley, Charlotte Rampling, Sally Hawkins) e direção de Mark Romanek, baseado no romance de 2005 de Kazuo Ishiguro.

Em 2022, foi lançado Living, com roteiro de Ishiguro – uma adaptação de Viver/Ikiru, o grande clássico do mestre Akira Kurosawa de 1952. Na refilmagem da história original de Kurosawa, Shinobu Hashimoto e Hideo Oguni, a ação se passa na Londres dos anos 1950. Ishiguro foi indicado ao Oscar de melhor roteiro adaptado. Não levou – mas de que serve um Oscar para quem tem um Nobel?

Anotação em 2006, com complementos em 2008 e 2023.

A Condessa Branca/The White Countess

De James Ivory, Inglaterra-EUA-Alemanha-China, 2005.

Com Ralph Fiennes, Natasha Richardson, Lynn Redgrave, Vanessa Redgrave

Argumento e roteiro Kazuo Ishiguro

Fotografia Christopher Doyle

Produção Ismail Merchant, Merchant Ivory Productions, Sony Pictures Classics, Shanghai Film Group, VIP 3 Medienfonds, Global Cinema Group.

Cor, 138 min.

***

6 Comentários para “A Condessa Branca / The White Countess”

  1. Esperava mais desse filme, é bom, mas achei desesperançado demais. Às vezes uma ou outra cena soava um pouco fake e o filme se arrastava. Mas o Ralph Fiennes sempre vale a pena ser visto :).
    Só uma pequena correção: na fichinha quando cita os nomes dos atores, em vez de Ralph vc colocou o nome do irmão dele, Joseph.

  2. Ops! Obrigado por avisar do erro, Jussara. Já corrigi. Obrigado, e um abraço.

  3. De nada ;). Eu queria falar mais sobre esse filme, mas ia ficar cheio de spoilers.

  4. Jussara, caríssima, você pode comentar à vontade com informações que só quem já viu o filme deva ler. Fique tranqüila porque aí eu coloco o meu aviso de spoilers, que é
    Se você não viu o filme, não leia a partir de agora

  5. Achei um grande filme. Gostei muito.Deve ser muito bacana, mãe, filha e tia trabalhando juntas, ainda mais sendo elas quem são.Falar do Ralph Fiennes como a Jussara diz com outras letras, é chover no molhado.
    Fotografia, cenário, figurino, tudo é lindo neste filme.Desalento,falta de esperança assim como voce e Jussara disseram e, muita nostalgia.
    Tem gente com uma arrogância tão grande que mesmo estando empobrecida,na merda melhor dizendo, como diz o ditado, morre tesa mas, não perde a pôse.
    Será que havería uma semelhança entre Tod Ralph Jackson Fiennes e o personagem de Humphrey Bogart(esqueci o nome)em Casablanca?
    A Natasha morreu tão nova, 45 anos . . .
    Era uma mulher muito bonita,como sua mãe,a Vanessa,sim,porque pelos seus traços com certeza ela (Vanessa)foi uma mulher muito bonita quando jóvem.
    Li em curiosidades que a Natasha era casada com o Liam Neeson desde 1994 e, quando ela sofreu o acidente, ele estava em Toronto filmando ” Chloe – o preço da traição “.
    Obs:esse filme ” O prêço da traição ” além do Liam atuam também Amanda Seyfried e a Julianne Moore,eu já assisti há algum tempo.
    Gostei muito.
    Bem, é isso aí. Um abraço Sergio ! !

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