Apenas uma Noite, no original Last Night, é uma história sobre infidelidade conjugal. Lançado em 2010, passa-se nas modernas, ricas, cosmopolitas Nova York e Filadélfia de hoje em dia. Os personagens são jovens aí na faixa dos 35 anos, profissionais bem sucedidos, bem de vida quanto às coisas materiais.
Dão tanta importância a uma trepada fora do casamento quanto seria de se esperar se fossem velhos sicilianos pobres no início do século passado.
Quando a ação começa – sem qualquer crédito inicial, como agora é a moda –, o jovem casal Michael e Joanna Reed (Sam Worthington e Keira Knightley) está indo para uma festa no casa do patrão de Michael. Joanna repara que, ao longo da festa, o marido algumas vezes conversa com uma mulher bastante atraente. Andy (Daniel Eric Gold), colega de trabalho e grande amigo de Michael, amigo também de Joanna, conta para ela que a mulher é Laura (Eva Mendes), a nova decoradora que trabalha com eles na firma – uma empresa da área imobiliária.
Joanna pergunta ao amigo se Laura estava com Michael naquela viagem a trabalho a Los Angeles, um mês antes, e Andy confirma. E ela vai com você e Michael amanhã para Filadélfia?, pergunta Joanna. Sim, vai, Andy confirma.
Assim que chegam de volta à casa, após a festa, Joanna interroga o marido sobre Laura. Michael garante que não há nada. Joanna continua o interrogatório, pergunta se ele sente atração pela mulher, e Michael diz que sim, que é uma mulher atraente.
Joanna resolve dormir no sofá.
No meio da noite, Michael vai lá, acorda a mulher, diz que vai preparar algo para ela comer. Depois de algum tempo, Joanna dá uma pequena suavizada – mas ainda pergunta se houve alguma coisa em Los Angeles, e ele garante que não, que não houve nada.
Vão para a cama, mas Joanna não dorme. E ainda tenta discutir a relação, perguntando se Michael acha que eles se casaram cedo demais – namoraram por quatro anos, durante a faculdade, e estão casados há três, como veremos depois.
Michael demonstra ter uma paciência de Jó, além de verdadeiro afeto pela mulher.
De manhãzinha, pouco antes de Michael sair para pegar o trem para a Filadélfia, Joanna coloca um bilhetinho para ele dentro de uma camisa social que ele deverá usar na reunião de trabalho do dia seguinte.
Estamos aí com 20 minutos de filme.
No trem para a Filadélfia, Laura vai se levantar para pôr uma maleta no compartimento no alto, exibindo para Michael e Andy aquela bunda toda de Eva Mendes.
E, ao sair da cafeteria vizinha a seu prédio, Joanna será surpreendida pela chegada absolutamente inesperada de Alex (Guillaume Canet). Alex diz que veio de Paris para uma reunião de trabalho, e retornará no dia seguinte. Combinam de se ver à noite. Alex – percebe-se claramente – foi um grande amor de Joanna.
A noite de que falam os títulos, tanto o brasileiro quanto o original, será a daquele dia. Na Filadélfia, Michael estará com Laura, aquele mulherão. Em Nova York, Joanna estará com Alex, seu amor francês.
Um joguinho com a ordem cronológica mostra que a diretora é jovem
Ao longo dos primeiros 10, 15 minutos do filme, ao mostrar a ida do casal à festa do patrão de Michael, o roteiro faz um joguinho com a ordem cronológica. Um joguinho, uma experienciazinha, algo que o cinema francês do início dos anos 60 gostava de fazer. Godard usava joguinhos assim. Anotei a ordem em que aparecem as sequências:
1 – Os dois, Michael e Joanna, no táxi – ela no banco de trás, da direita.
2 – Os dois em casa, se preparando para sair. Ela sugere que ele leve uma garrafa de vinho.
3 – Os dois no táxi – ela no banco de trás, da esquerda. O táxi chega, Michael esquece a garrafa de vinho no táxi.
4 – Eles chegam à casa do patrão de Michael para a festa.
5 – O rosto dela no táxi, no banco de trás, da direita.
6 – Eles na festa. Joanna vê Michael com Laura, pergunta a Andy sobre ela.
Os fatos mostrados nas sequências 1 e 5, portanto, aconteceram depois das mostradas nas de números 2, 3, 4 e 6. Nas sequências 1 e 5, eles estão voltando para casa, depois da festa. Não se falam. Joanna está se remoendo de ciúme, mas vai esperar chegar em casa para fazer a cena.
Essa pequena desconstrução da ordem cronológica é só um detalhe, um joguinho, um brinquedinho, à la Godard ou Resnais do início dos anos 60. Relato aqui porque gosto demais desses detalhinhos, que afinal indicam como o roteirista e o diretor optam por contar sua história.
Em geral, esses joguinhos indicam que o diretor é bastante jovem. Quer ser diferente, quer ser notado.
Argumento, roteiro e direção de Last Night são de uma pessoa só, uma mulher, Massy Tadjedin. Muito jovem, sim, pelo que vi assim que o filme acabou. Nasceu em 1978, em Teerã. Massy Tadjedin é iraniana de nascimento, mas está radicada nos Estados Unidos desde a infância, passada na Califórnia. Estudou literatura em Harvard, o que não é pouco. É autora de cinco roteiros, a partir de Um Motivo para Viver/Leo, de 2002, mas Last Night é seu primeiro filme como diretora.
Massy Tadjedin estréia como realizadora mostrando que sabe dirigir seus bons atores
Uma estréia em co-produção EUA-França (a Gaumont é uma das produtoras), com atores respeitáveis, de nacionalidades diferentes.
E a moça demonstra ter talento para dirigir atores. O elenco está todo muito bem. Há quem não goste de Keira Knightley, essa inglesinha nascida em 1985 que já fez mais de meia dúzia de filmes de época; não sou desse time; gosto da atriz, e ela está muito bem no papel de Joanna, uma moça bela, autora de um elogiado mas não publicado primeiro livro, muito mais insegura do que deveria, com mais ciúme do que seria admissível, dividida entre o comprometimento com o marido e a paixão pelo jovem francês.
Eva Mendes se encaixa com perfeição ao papel de Laura, a profissional bem sucedida que se sente atraída pelo colega de trabalho e tem a absoluta tranquilidade de que ninguém seria capaz de resistir à sua beleza latina, esfuziante, bastantosa.
E estão esplendorosamente belas, as duas, tanto a inglesinha magricela, quanto roliça descendente de cubanos.
O inglês Sam Worthington, o astro de Avatar, está bem como o jovem que passa mais tempo com a colega de trabalho gostosa e oferecida do que com a própria mulher – e seu esforço para resistir à tentação de Eva e seu serpentário deveria lhe assegurar um lugar entre os santos dos santos
Guillaume Canet está perfeito como Alex, o escritor francês charmoso, comedor inveterado, que aconteceu de se apaixonar por uma de suas presas e por ela atravessa oceano. Canet, é bom lembrar, está com tudo: como ator, tem mais de 50 títulos no currículo. É um diretor de talento, como mostrou em Não Conte a Ninguém (2006) e Até a Eternidade (2010). Como se isso não bastasse, ainda é casado com Marion Cotillard, aquela maravilha.
E ainda há a presença de Griffin Dunne (de quem sempre vamos nos lembrar como o burocrata quieto que passa uma noite de loucuras no Village em Depois de Horas/After Hours de Martin Scorsese) como o amigo de Alex que se diverte ao vê-lo ao lado da bela moça casada por quem está obviamente apaixonado.
Um jovem e belo casal que faz um tremendo esforço para não ser feliz
A autora e diretora Massy Tadjedin optou por não concluir sua história. Com uma maestria digna de veteranos, cortou no meio de um gesto, um olhar, a última tomada de seu filme.
Propositadissimamente, entregou ao espectador as conclusões.
Antes que eu concluísse qualquer coisa, Mary, sempre mais esperta, mais rápida, concluiu que, afinal de contas, o que o filme nos deixa é a sensação de volta a um passado que já parecia distante. Depois de tudo o que já se viveu – argumentou ela –, parece retrógado ver um casal jovem, belo, bem sucedido, dar tamanha importância a uma eventual infidelidade, uma trepadinha casual. Fazer tamanha tempestade em um copo d’água.
Vá lá, penso eu: há, sim, muitos casais jovens que fazem tempestade por causa de uma pulada de cerca, ainda que fortuita, eventual, a rigor pouco importante, em termos afetivos. Para muita gente, infidelidade não chega a ser propriamente um copo d’água – parece mais um oceano.
Há muitos casais que fazem a opção preferencial pela amargura, pelo apego a questiúnculas, pela eterna busca da discussão do relacionamento.
O mundo está cheio deles – seja na retrógrada Sicília, seja na gloriosa Manhattan umbigo do mundo, do capitalismo, da modernidade.
Na minha opinião, não é um filme ruim, de forma alguma, este Apenas uma Noite. É só que Massy Tadjedin optou por focalizar a história – necessariamente inacabada – de um casal que faz um tremendo esforço para não ser feliz.
Anotação em novembro de 2012
Apenas uma Noite/Last Night
De Massy Tadjedin, EUA-França, 2010
Com Keira Knightley (Joanna Reed), Sam Worthington (Michael Reed), Guillaume Canet (Alex), Eva Mendes (Laura),
e Griffin Dunne (Truman), Daniel Eric Gold (Andy), Stephanie Romanov (Sandra)
Argumento e roteiro Massy Tadjedin
Fotografia Peter Deming
Música Clint Mansell
Montagem Susan E. Morse
Produção Gaumont, Star Entertainment, Miramax. DVD Vinny Filmes.
Cor, 93 min.
**1/2
Vou tentar comentar sem parecer uma velha siciliana pobre do século passado, mas não sei se vou conseguir, pois não consigo encarar uma traição com naturalidade. No caso do filme, se a Joanna tivesse ido pra cama com o Alex eu até teria achado compreensível, pois eles tinham tido uma história, ela inclusive disse que o amava. E nada como uma história de amor mal resolvida pra balançar a pessoa. Já o marido dela sentiu-se apenas atraído fisicamente pela colega de trabalho sonsa. Mas já pensou se as pessoas ficarem sempre cedendo às suas atrações e desejos? E olha que eles estavam bem, ele disse que estava feliz no casamento. E estavam casados há apenas 3 anos, teoricamente ainda viviam a paixão.
Não acho que a Joanna fez tempestade em copo d’água. Pelo o que a história mostra, eles tinham uma relação monogâmica. Em tese, pois o Michael resistiu só até a página 2 (mas era ele quem dizia que não perdoaria uma traição; é sempre assim). Já a Joanna disse e afirmou com todas as letras que gostava de fidelidade, de lealdade, era algo dela.
Acho que a Joanna não sentiu mais ciúme “do que seria admissível”, ela viu a mulher se atirando em cima do marido dela, e ele dando corda. É muito ruim e desagradável ver alguém dando em cima de um companheiro (e olha que nunca fui casada, mas dava vontade de estapear a pessoa quando acontecia comigo) e pior ainda ver o cara não fazer nada pra cortar (ou dizer que não percebeu, afinal, os homens nunca notam esse tipo de coisa). Precisava dar bandeira em frente dela e ainda admitir que se sentia atraído pela outra? Isso é falta de respeito. Que eu saiba a regra quando se trai é fazer de tudo para não ser pego; dar mole na presença da mulher não é o esperado, a não ser em casos onde o homem é notadamente um canalha, coisa que ele parecia não ser.
Perderam muito tempo mostrando a Eva se oferecendo pro Michael, numa conversinha mole sem fim (os dois atores são fracos, com as mesmíssimas expressões o tempo todo) pra no final ele fazer o que todo mundo sabia que faria desde o início, que era apenas mais um que não podia ver um rabo-de-saia. A diretora devia ter poupado o espectador disso. Em compensação, as cenas entre o francês e a Joanna foram ótimas, bons diálogos e atuações, alguns momentos emocionantes (não gosto da Keira, mas neste filme ela atuou um pouquinho melhor que nos outros, embora continue fazendo o mesmo bico irritante em todas as aparições). Como 10 em 10 atrizes de Hollywood, está anoréxica, com um corpo de menina de 15 anos. O Guillaume Canet é o clone mais novo e mais baixo do Patrick Dempsey, fiquei chocada com a semelhança. É igualmente charmoso e fofo.
O final deixou a desejar, não gosto de finais abertos. A diretora fez o corte num olhar que não diz nada.
Também gosto e muito da Keira Knigtley. como voce disse, ela está muito bem neste filme e,como também disseste, já fez vários filmes de época e, é aí que gosto mais de suas atuações. Não quero soar antiquado mas,o que pesa mais, dizer infidelidade ou traição? A mesma palavra e, tem dois pesos.
Algumas pessôas dizem ser capazes de perdoar uma infidelidade ou traição, que seja, mas, será mesmo? Para tal, é preciso que se apague essa “sombra” da mente. Na verdade muitos não conseguem. Não é fácil lidar com isso. É o que penso. Creio que uma “eventual infidelidade” em alguns casos é deixar a porta entreaberta para outras tais. Ainda mais no caso de alguns “bichos homens” que se valem da desculpa imunda que deram que eles fazem isso,porque é instinto,o homem é caçador. Digo isto com todo respeito,Sergio.
É apenas minha opinião. A Laura era bem ordinária, sabia que o cara era casado e o provocou de todas as maneiras ao ponto de ir para a piscina semi-nua e convidando-o para acompanhá-la.
Também acharía normal se a Joanna tivesse transado com o Alex,pelo mesmo motivo citado pela Jussara, é bingo sem dúvida. Contudo, o Michael a traiu por pura atração física. Pela “bendita” caçada.Nem tanto o ato físico.
Alguns homens estupram uma mulher só com o olhar. Agora, admito que a Joanna embora não tenha transado com o Alex , também não agiu certo (ou agiu muito menos de forma errada?).
Ela flertou com ele mas, da maneira como o filme coloca a questão trair, ela não o fez.
“Quem ama de verdade e respeita esse amor e sua mulher,não sai fazendo caçadas,não trai.
Alguém disse uma vez que trair é uma questão de caráter.
Faço dos comentários da Jussara ocomplemento do meu; deve ter dado prá notar pelo que falei até aqui, tudo mais que eu diria,sería exatamente o que ela disse e, aí ficaría mais longo do que já está. Já fui criticado por amigos por ter este pensamento, esta opinião sôbre alguns (muitos) homens.
Mas, esse sou eu. Estou com minha mulher desde o comêço, há 30 anos e, nunca caçei.Eu a amo.
Também não gosto de finais “abertos” mas aqui, acho que foi ” o final “.
Sergio, desculpe por ter sido tão longo.
discordo da colega Jussara. Achei a joana muito mais “sonsa” que a personagem da Eva Mendes, que foi mal explorada, mas mesmo dentro do esteriótipo manjadíssimo da mulher -latina gostosa que só serve de amante- conseguiu passar uma melancolia no olhar, uma tristeza, um vazio, por trás da postura segura…
sou do time que não gosta da keira, acho que é uma atriz com o Physique du Rôle adequado, cara de europeia, é bela, mas nao belissima, se enquadra em filmes de epoca, em filmes cult, filmes pseudo cult. diferente de uma eva mendes, que é tão bonita e gostosona, que hollywood adora colocar em papeis esteriotipados como este, da latina amante, latina gostosa. ou alguem imagina a industria colocando uma latina gostosona pra fazer a anna karenina? acho que keira tem a aparencia que lhe deu bons filmes, mas nao adianta, é sempre a cara blase, de tedio, o biquinho, em todos os filmes. ela acabou com a belíssima pesonagem de sabina spielren em um método perigoso. essa doeu rsrs
achei esse filme todo esteriotipado. a mocinha frágil, até na aparencia, magrinha, alva, delicada, insegura (sim, pq mulher tem que ser insegura, um furacao de segurança, como eva, causa incomodo em outras mulheres, tem que ser amante, tem que ser vagaba), romantica, só pode ter desejos por outro homem se tiver amor por trás… é justificável. esteriótipo número 1.
enquanto o homem, essa máquina de sexo sem sentimentos, nao pode ver um rabo de saia que vai sucumbir. e mete o pé na amante depois, sem nenhum remorso. Homem cafajeste sem coração, esteriótipo número 2.
o esteriotipo do frances romantico, apaixonado e sensível…. nímero 3.
o esteriotipo da mulher latina, gostosa, bem sucedida, SEGURA… que pecado uma mulher ser assim, segura, bem sucedida, exuberante , saber oq quer, não se fazer de díficil… tem que ser amante mesmo… e abandonada no final… que mensagem moralista para as mulheres…esteriótipo atrás de esteriótipo.
enquanto a boa moça frágil, insegura e bonitinha, que nao traiu, bancou a difícil, essa realmente merece o amor de dois homens…
é tanto esteriotipo que não dá pra acreditar.
Mas gostei do trabalho da Eva Mendes, que mesmo em um papel tao ingrato, conseguiu imprimir uma doçura, fiquei me perguntando o que mais queria aquela mulher, me questionei sobre ela… enquanto os outros, nao me dispertaram nenhuma curisidade.
o trabalho do ator frances tb me agradou.
Já a keira e o sam… nao me convenceram um minuto.
mas apesar de ter detestado o filme rsrs, gostei da sua crítica Sergio, e sobre sua visão sobre os casais.
Abços
Ivan,
Acho que a diretora colocou essas questões propositalmente: a Joanna cometeu uma traição ou não?, agiu certo ou não? Penso que o filme abre espaço para essa discussão: trair é somente transar com outro (a) ou é também fazer o que ela fez?
Concordo com você que não é fácil lidar com a traição, já vi casamentos desmoronarem, pessoas ficarem possessas, transtornadas e por aí vai. Há outros que conseguem fazer vistas grossas, perdoar e etc. Depende de cada um, de cada casal.
Também concordo com tudo o que a Dan falou sobre a Keira no segundo parágrafo.