Amigos Inseparáveis, no original Stand Up Guys, produção de 2012, dirigida por um tal de Fischer Stevens, é um filme sobre velhinhos.
Parece que foi só Lawrence Kasdan dizer, ao comentar sobre seu Querido Companheiro, daquele mesmo ano de 2012, que “Hollywood não faz mais filmes sobre pessoas, em especial pessoas com mais de 60 anos”, para que pipocassem filmes sobre velhinhos.
Não que o grande Lawrence Kasdan tenha se enganado de todo.
De fato, tem havido, nos últimos anos, alguns filmes sobre velhinhos. Há Amour, do austríaco Michael Haneke, também de 2012, 48 prêmios, inclusive o Oscar de melhor filme estrangeiro, e outras 37 indicações.
Mas nem tudo é só doença, tristeza, angústia profunda, nos filmes recentes sobre velhinhos. Bem antes ao contrário, como demonstram belas obras como O Exótico Hotel Marigold, E Se Vivêssemos Todos Juntos?, O Quarteto.
Até mesmo Hollywood, entendido o nome aí como sinônimo da grande indústria de cinema americano, o cinemão comercial americano, fez ao menos dois filme – interessantes, divertidos – sobre velhinhos: Antes de Partir/The Bucket List, de Rob Reiner (2007), e RED – Aposentados e Perigosos, de Robert Schwentke (2010). Este último fez sucesso, e já está aí nas telas a continuação, RED 2: Aposentados e Ainda Mais Perigosos.
Em Antes de Partir, um bilionário em tratamento de doença quase terminal (Jack Nicholson) fica amigo de outro doente (Morgan Freeman) e resolve que os dois vão fazer tudo o que tinham vontade de fazer na vida e nunca tinham feito, por falta de tempo ou dinheiro.
Em RED, um grupo de ultra-hiper-super-treinados ex-agentes dos serviços de segurança saem por aí em nome da Justiça e da Honra matando um bando de gente e fazendo explodir um monte de coisas.
De onde se pode concluir que ao menos a primeira parte da frase de Lawrence Kasdan é a mais absoluta verdade dos fatos: “Hollywood não faz mais filmes sobre pessoas”. Quando faz filmes sobre pessoas de mais de 60 anos, não trata de pessoas, e sim de ultra-hiper-super-heróis, ou de ultra-hiper-super-milinários.
Os três atuam como se estivessem fazendo uma imitação da imitação de um exagero
Pois bem: Amigos Inseparáveis/Stand Up Guys é uma espécie de mistura de Antes de Partir com RED.
É assim: um velhinho sai da cadeia, depois de cumprir 28 anos de pena. Chama-se Val, e é interpretado por um Al Pacino fazendo a pior caricatura que se poderia fazer de um Al Pacino trabalhando com uma preguiça mortal.
Quem o espera à saída da penitenciária é seu velho amigo Doc, interpretado por um Christopher Walken fazendo a pior caricatura que se poderia fazer de um Christopher Walken fazendo o papel mais exagerado de sua vida.
Antes que o filme chegue aos dez minutos, Val não percebe, ou faz que não percebe, mas o espectador vê que Doc vai tentar matar o amigo inseparável que acabou de sair da prisão. O motivo pelo qual Doc vai tentar matar Val vai sendo contado ao espectador em doses homeopáticas. Não há problema algum nisso. O problema é todo o resto.
A história é boba. A trama é boba. Tudo é muito, mas muito bobo – como, por exemplo, a história de Val se entupir de doses paquidérmicas de Viagra e ficar de pau duro até ter que ser levado para o hospital para uma baita injeção no pau para retirada do sangue acumulado.
Mas o mais bobo de tudo é a forma com que Al Pacino, esse ator brilhante, mais Alan Arkin, outro ator brilhante, mais Christopher Walken, que sempre me pareceu mais canastrão do que bom ator, atuam.
Os três atuam como se estivessem gozando, fazendo gozação, fazendo troça, das suas próprias piores atuações da vida.
Eles atuam como se estivessem fazendo a imitação da imitação da imitação da imitação que o taxi driver Travis Brickle faz de si mesmo diante do espelho no filme cultuadíssimo de Martin Scorsese de 1976.
Tipo assim: ei, Al, ei, Chris, ei Alan, vamos ver quem fica mais ridículo fingindo que está imitando um personagem de um bad guy wise guy do Scorsese.
Pior ainda: o filme resolve fazer piadas prontas, piadas que parecem private mas só conseguem ser privadas, no sentido de vaso sanitário. Pacino se mete a dançar num bar, num arremedo grotesco da sequência em que ele dança um tango com a jovem e bela Gabrielle Anwar em Perfume de Mulher, o filme que deu a ele um Oscar após sete outras indicações por atuações melhores. (Isso para não dizer que a refilmagem americana do Perfume de Mulher original de Dino Risi com o grande Vittorio Gassman é uma triste e absoluta desnecessidade.)
Para citar mais uma vez a desnecessária refilmagem americana de Perfume de Mulher, há as sequências no carro esportivo veloz.
Depois disso, dá vontade de pedir a Hollywood que pare de fazer filmes sobre velhinhos
Mary, pessoa sábia, não viu essas sequências do carro correndo feito louco, perseguido pela polícia, fazendo estripulias. Quando o filme estava com uns 20 minutos, Mary desistiu; a vida é curta demais, e então demos stop, e fomos ver um filme.
Numa hora em que Mary não estava em casa, eu, que sou doido, e tenho um site de filmes, peguei a porcaria para ver até o fim.
Pura, absoluta perda de tempo, essa mercadoria tão preciosa. Deveria ter botado o filme para aquelas categoria de Filmes que não aguentei ver até o fim.
É um filme idiota.
E será por que, meu Deus do céu e também da terra, que Julianna Margulies (na foto abaixo), a nossa eterna Good Wife, aceitou fazer um papel chinfrim nesta porcaria? (Ela interpreta a filha de Hirsh, o personagem de Alan Arkin; trabalha como enfermeira. É um papel desnecessário. Bem, mas todo o filme é desnecessário.)
Ao menos aprendi o que significa a expressão “stand up person” – pessoa de princípios. O título original, Stand up Guys, significa homens de princípios.
Já gastei muito tempo com essa bobagem, mas, já que gastei, concluo, imitando o tom da revista Veja, que pretende ensinar Barack Obama como se governa o país mais rico do mundo:
Ei, Hollywood: pare de fazer filmes imbecis sobre velhinhos, tá?
Anotação em setembro de 2013
Um P.S.: Uma das boas coisas da vida é haver opiniões diferentes das nossas.
Manuel S. Fonseca, que me dá a honra de permitir a republicação de seus textos maravilhosos, extraordinariamente bem construídos, escreveu recentemente para o semanário português O Expresso (e republiquei no 50 Anos de Textos) um belíssimo artigo sobre este mesmo filme. Fala, com seu texto tão elegante quanto Cary Grant, de uma cena de Stand Up Guys que considerou sublime.
Amigos Inseparáveis/Stand Up Guys
De Fisher Stevens, EUA, 2012
Com Al Pacino (Val), Christopher Walken (Doc), Alan Arkin (Hirsch)
e Julianna Margulies (Nina Hirsch), Mark Margolis (Claphands), Lucy Punch (Wendy), Addison Timlin (Alex), Vanessa Ferlito (Sylvia), Katheryn Winnick (Oxana), Bill Burr (Larry)
Argumento e roteiro Noah Haidle
Fotografia Michael Grady
Musica Lyle Workman
Montagem Mark Livolsi
Produção Lionsgate, Sidney Kimmel Entertainment, Lakeshore Entertainment. DVD Paris Filmes.
Cor, 95 min
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Não vi mas despertou-me curiosidade por causa deste artigo do Manuel S. Fonseca:
http://ratocine.blogspot.pt/2013/10/com-pena-minha-nao-cheguei-gangster.html
Só agora reparei que você cita esse mesmo artigo aí em cima