Sem Limites / Limitless

Nota: ★★☆☆

Sem Limites é assim: parte de uma idéia bem interessante, depois a trama se enrola. A impressão que dá é que não souberam o que fazer a partir da idéia inicial. Mas o forte do filme é sem dúvida o visual. Tem um visual agitado, moderninho, extremamente competente.

Uma ficção/fantasia gostosinha de se ver, ótima para esquecer assim que termina.

E pronto. Basicamente é isso aí.

Eu deveria de fato começar a fazer anotações micro para filmes de micro importância.

Mas vamos lá.

A idéia interessante a partir da qual o filme se constrói é que um laboratório conseguiu fazer uma droga sintética que potencializa a capacidade mental. Uma espécie assim de super hiper LSD, de deixar o Timothy Leary, que os deuses psicodélicos o tenham, babando de inveja.

Ou ainda uma mistura de super hiper LSD com o que deve ser a parte boa da cocaína com o que houver de bom (se é que há) no Ecstasy com o que há de melhor no primeiro trago de uísque do dia com a primeira tragada de um cigarro depois de horas dentro de aeroportos e um longo vôo.

Uma droga para jogar todas as outras drogas no vaso.

Uma droga que faz lembrar a canção de Raul Seixas-Paulo Coelho:

“É você olhar no espelho, se sentir um grandessíssimo idiota,

saber que é humano, ridículo, limitado,

que só usa dez por cento da sua cabeça animal”.

O camarada que oferece uma pílula dessa droga doida diz exatamente isso para o nosso herói, Eddie Morra (Bradley Cooper), só que ele usa percentagem diferente. Diz algo assim: “Sabe aquela coisa de que a gente só usa 20% do cérebro? Com isso aqui você usa o cérebro todo”. (Na primeira foto, Eddie Morra antes de tomar a droga; na segunda, Eddie Morra depois de tomar a droga.)

O protagonista toma a droga e – vupt, pláct, zum, tóinc, bóing, xpto, shazam: vira um gênio absoluto

E então o nosso herói, Eddie Morra, sujeito que se considera imprestável (até porque é mesmo imprestável, bebe muito mais do que deveria, é preguiçoso, transformou seu apartamento num depósito de lixo, e não consegue escrever sequer uma palavra do livro pelo qual já até recebeu adiantamento da editora), e tem a aparência de um hippie sujo, desleixado, que não toma banho há semanas, em plena Nova York do pós-yuppismo, manda ver a pílula milagrosa e aí – vupt, pláct, zum, tóinc, bóing, xpto, shazam: vira um gênio absoluto, ao mesmo tempo que um atleta perfeito. Uma cabeça de Einstein num corpo que mistura as melhores qualidades de Pelé, Usain Bolt, Mark Spitz, Muhammad Ali e Bruce Lee.

E esse diretor Neil Burger, com esse nome McDonald’s e tudo, sabe fazer o visual de filmes moderninhos. Quando Eddie Morra faz vupt, pláct, zum, tóinc, bóing, xpto, shazam, o diretor Neil Burger arrasa. É como se ele tivesse resolvido mostrar que consegue fazer um visu mais acachapante do que Matrix, A Criação, Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças, Quero Ser John Malkovich, Mais Estranho que a Ficção e… Quem quiser que junte aí mais uns dez filmes de visual moderninho de primeiríssima qualidade.

Pois é: é como o cara quisesse mostrar que consegue fazer algo melhor do que todos esses filmes.

Lá pelas tantas, Sem Limites começa a ficar violento. Algum dos produtores deve ter cobrado: tem que ter cenas de violência para atrair adolescentes e outros tarados por violência. Aí a coisa vai piorando, piorando. Aquela cena do sangue no chão… Argh, trem mais vomitativo.

O desenho de produção, soberbo, é da maga Patrizia von Brandenstein

Levei um susto ao ver que o desenho de produção do filme é de Patrizia von Brandenstein. Vi o filme apenas dois dias depois de ver um dos mais belos trabalhos dessa maga, desse gênio do desenho de produção, Albert Nobbs. Ao escrever sobre Albert Nobbs – um filme muito bom, e, ao contrário deste Sem Limites, sério, adulto –, disse que a qualidade que mais me impressionou no filme foi a suntuosa recriação de época, segunda metade do século XIX, em Dublin –, um trabalho dirigido por Patrizia von Brandenstein. Essa senhora, nascida em 1943, no Arizona, filha de imigrantes russos, é uma espécie de Midas: tudo em que toca vira ouro. Recria o visual de qualquer época, de qualquer civilização, com uma categoria impressionante. Milos Forman, realizador genial, sempre que pode chama Patrizia Von Brandenstein para ser a designer de produção de seus filmes. É dela a recriação da corte vienense do final do século XVIII em Amadeus, trabalho que lhe deu o Oscar e a glória de ser a primeira mulher a ganhar o prêmio de production design. Teve duas outras indicações ao Oscar de direção de arte, por Na Época do Ragtime, também de Forman, e por Os Intocáveis, de Brian De Palma.

Faltou dizer que Patrizia von Brandenstein é genial também quando trabalha com o tempo atual. É o que ela prova, mais uma vez, neste fic/fan de visual estupendo. 

 

Triste mundo este, em que um terno caro é um dos valores mais sublimes

E que mais, para uma anotação curta?

Uma bela sacada: os olhos azuis de Bradley Cooper ficam com azul mais faiscante quando seu personagem está sob o efeito da droga sensacional. Não importa como o diretor de fotografia Jo Willems conseguiu isso – se com filtro, se com CGE (boa parte do filme foi feito com as CGE, as imagens criadas por computador). Mas é uma bela sacada.

É engraçado (ou triste, ou as duas coisas) ver que, para os autores do filme, uma das melhores coisas da vida, um símbolo de progresso, de melhoria, é vestir-se com ternos carésimos. Triste mundo este, em que um terno é um dos valores mais sublimes.

By the way, os ternos vestidos por Bradley Cooper são Tom Ford, o designer de moda que dirigiu Direito de Amar/A Single Man. Quanto aos ternos que Tom Ford cria, não sei dizer nada. Já seu filme é muito bom. Um filme sério.

Anotação em junho de 2012

Sem Limites/Limitless

De Neil Burger, EUA, 2011

Bradley Cooper (Eddie Morra), Robert De Niro (Carl Van Loon), Abbie Cornish (Lindy), Andrew Howard (Gennady), Anna Friel (Melissa), Johnny Whitworth (Vernon)

Roteiro Leslie Dixon

Baseado na novela The Dark Fields, de Alan Glynn

Fotografia Jo Willems

Música Paul Leonard-Morgan

Produção Relativity Media, Virgin Produced, Rogue, Many Rivers Productions. DVD Imagem Filmes.

Cor, 105 min

**

 

7 Comentários para “Sem Limites / Limitless”

  1. Só vi trechinhos desse filme o telecine, achei bem suspeito de ser uma bomba, entao nao dei cabo a história. Mas que texto ótimo, Sergio!!! R muito! “Timothy Leary, que os deuses psicodélicos o tenham” hahahah, uma das melhores frases do ano! E sobre o terno, é isso aí mesmo, em qualquer lugar do mundo, infelizmente…

  2. Com este filme aqui,vou ser bem mais curto do que normalmente sou.
    Já não sou muito fã de aventuras e ou ação e,neste aqui,não foi diferente.Agitado demais
    mentiras “ingolíveis”,não gosto do ator e, não estava digerindo e não terminei de ver.
    E, pelo que escreveste,Sergio,não perdi nada.
    Abraço !!

  3. Sérgio, vc tem razão, é o tipo de filme q quando a gente acaba de ver, esquece rapidinho do enredo. Olha q vi anteontem e já não estou lembrando de quase nada hehehe. Só o q marca no filme é como os olhos do personagem principal ficam lindos, de um azul cintilante, quando ele toma a tal droga q aumenta a capacidade intelectual. E realmente o início do seu post é muito engraçado, quando vc diz q “deveria fazer anotações micro para filmes de micro importância”.
    E pq não o faz? Porque dedicar três páginas e mais um pedacinho a um filme tão esquecível?E comparando com Procura-se Amy, que vi anteriormente e que é tudo de bom, vc mesmo disse q virou cult nos anos 90, o comentário me pareceu maior ainda! Estou na verdade indignada, o filme referido mereceu meia página. Por que?
    Beijão
    Guenia
    http://www.sospesquisaerorschach.com.br
    Obs: Vc pelo jeito não esvaziou a sua caixa de mensagens, pelo menos as minhas continuam voltando, vou desistit de falar com vc

  4. Guenia, querida,
    Aí vai uma explicação, que de fato é necessária.
    Algumas anotações antigas, que fazia apenas para mim mesmo, antes de ter a idéia de fazer um site, são de fato bem pequenas. De qualquer forma, quando fiz o site, achei que era o caso de postar aquelas anotações assim mesmo, ainda que pequenas.
    Depois da existência do site, passei a fazer anotações maiores, mais detalhadas – até porque passei a ter mais tempo, e anotar sobre os filmes virou um dos meus hobbies preferidos.
    Isso explica por que um filme bom como “Procura-se Amy” tem anotação curtinha, e filmes bobos como este “Sem Limites”, ao contrário, merecem textos maiores.
    Mas de fato eu preciso botar em prática essa idéia de fazer textos micros para filmes micro-importantes…
    Um abraço!
    Sérgio

  5. Verdade Sergio. Reparei que seus textos novos sao sempre maiores que os antigos quando o filme tem a mesma quantidade de estrelas, agora entendi porque. Sem Limites e dirversao enquanto se assiste e depois bola pra frente, esquecendo dele no ato, mais rapido que o efeito da super droga do Bradley pode agir. Valeu.

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