A Salamandra / La Salamandra


Nota: ★½☆☆

Anotação em 2010: Este filme de 1981, bastante obscuro apesar dos grandes nomes no elenco, de diversas nacionalidades, é ao mesmo tempo muito ruim e fascinante – kitschmente, museologicamente fascinante. Traz uma intrincadíssima, incompreensível trama de conspiração político-militar-policial, com a aparência assim de um Dallas, ou uma novela de terceira categoria, com figurinos e atuações especialmente desajeitados, canhestras.

A ação começa com o assassinato de um general italiano em Roma, que as forças de segurança decidem travestir de morte natural, por ataque cardíaco, para evitar especulações e agitações. A história é narrada pelo personagem principal, Dante Matucci, um coronel do setor de inteligência dos Carabinieri, a polícia militar italiana. Os assassinos do general deixaram, junto do corpo, um cartão com a figura de uma salamandra – que, além de ser um tipo de lagarto, é uma figura mitológica, um ser indestrutível pelo fogo. Bem no início do filme, na cerimônia fúnebre pelo general morto, nosso Dante narrador vai nos apresentando diversas figuras importantes da sociedade italiana que podem estar envolvidas no assassinato.

O coronel Dante é interpretado por Franco Nero – o que, por si só já dá um ar de novela ruim ao filme. Tipo boa pinta, com os olhos claros, o rapaz conseguiu a proeza de conquistar a deusa Vanessa Redgrave, quando se conheceram durante as filmagens de Camelot, em 1967, quando ela estava no auge da beleza, aos 30 anos de idade. Conquistar Vanessa Redgrave foi a maior prova de talento que Franco Nero deu na vida – maior ou talvez única, já que sua capacidade de atuar é equivalente à de um sapo.

Entre as figuras que nos são apresentadas na cerimônia fúnebre pelo general como suspeitos de sua morte estão um grande industrial, o homem mais rico da Itália, Bruno Manzini (Anthony Quinn), a bela amante do falecido, Lili Anders (Sybil Danning), o todo-poderoso general Leporello (Eli Wallach), sua estupendamente bela mulher, Elena (Claudia Cardinale), e ainda o chefe do coronel Dante, o príncipe Baldasar (Christopher Lee).

Num tortuosíssimo emaranhado de personagens, disputas, conflitos, complôs, e diversos diálogos que espezinham a Itália como um país louco, ingovernável, diferente de todos os demais, o espectador ficará sabendo que tanto o falecido general quanto o tal poderoso general Leporello estão envolvidos num plano fascista de derrubar o governo italiano e implantar um regime fascista.

         Filmes datados, escritores datados

Há filmes que ficam datados, e este aqui é um exemplo perfeito. Mas é interessante pensar que há autores que ficam igualmente datados. Este filme se baseia num romance de Morris West, um escritor de quem ninguém mais fala, hoje em dia, mas que foi um tremendo de um sucesso nos anos 60 e 70. Não dá para saber se Dan Brown será conhecido em 2040, mas o fato é que nos anos 60 e 70 o australiano Morris West era o Dan Brown da vez – a cada novo livro, o topo da lista dos mais vendidos no mundo inteiro.

Fui à Wikipedia em português para checar se essa minha sensação está correta – e aparentemente está. Morris West, 1916-1999, merece parquíssimos dois parágrafos da enciclopédia, embora tenha escrito mais de 25 livros, entre eles As Sandálias do Pescador, de 1963, best-seller mundial, em que ele, muito antes de Karol Woytila, antecipava a eleição de um papa vindo de um país comunista – vivido, no cinema, por coincidência, por Anthony Quinn. Tudo bem: na versão em inglês, o verbete sobre o escritor é bem encorpado – mas acho que o tamanho mínimo do verbete em português prova como Morris West é hoje pouco lembrado.

         A protagonista é Sybil Danning, “a rainha dos filmes B cult”

O filme é uma co-produção ítalo-anglo-americana; o diretor Peter Zinner, aprendo com o iMDB, é um austríaco nascido em Viena em 1919 e morto na Califórnia em 2007; assinou a montagem de cerca de 40 filmes, mas dirigiu apenas um – exatamente este aqui. Podia ser bom montador, editor, mas não tinha mesmo talento para a direção. O elenco internacional cheio de nomões está homogeneamente horroroso. Há situações graves em que a direção é tão vagabunda que dá vontade de rir. E os figurinos mereceriam um Prêmio Framboesa especial pelo mau gosto.

Uma das coisas que me pareceram mais fascinantemente estranhas foi a escolha da atriz que faz o principal papel feminino, o de Lili Anders, a espiã polonesa (!!!) amante do general fascista que se bandeará de lado e se tornará o grande amor do legalista coronel Dante Matucci. Numa produção com dinheiro de três países, capaz de juntar Anthony Quinn, Claudia Cardinale, Martin Balsam, Eli Wallach, Christopher Lee, e se dá ao luxo de ter trilha sonora de Jerry Goldsmith, por que escolher Sybil Danning para interpretar a protagonista?

Quem mesmo?

Pois é, Sybil Danning. Nunca tinha ouvido falar. Não me pareceu especialmente bela, nem talentosa – pelo menos neste filme. O iMDB informa que a moça, austríaca nascida em 1947, tem uma filmografia de mais de 75 títulos, entre 1968 e 2010 – continua na ativa -, em diversos países, entre os quais Itália, Alemanha e França. Dei uma olhadinha rápida nos títulos, e o único filme que me chamou a atenção foi Os Quatro Mosqueteiros, uma brincadeira do diretor inglês Richard Lester, o dos filmes dos Beatles; nele, Sybil Danning faz um papel bem pequeno.

Mas ela tem fãs apaixonados. A primeira frase da biografia dela no iMDB, escrita por um admirador babante, é ótima: “Tall, leggy, buxom and statuesque 5′ 7″ blonde beauty Sybil Danning reigns supreme as one of the sexiest, most dynamic and commanding actresses to achieve cult B-movie queen status. (…) Danning did a ten page pictorial for the August 1983 issue of Playboy (na foto).”

Bem, depois de ler isso, fui ao Google – e realmente a moça é muito gostosa. Bastante gostosa. Mas é estranho – no filme ela não está tão bem quanto nas fotos.

De um leitor do iMDB, há outra bela frase, agora sobre o filme: “Como deu tão errado? Como pode um filme com um elenco tão impressionante e com seqüências em belíssimas locações em Roma, Milão, Veneza, ser tão chato?”

O AllMovie também desce a lenha, pegando no ponto: “A maior parte do drama (não todo) acontece fora da tela, e Matucci essencialmente narra a história, fazendo com que este seja um dos dramas de espionagem menos excitantes que há. Até o caso entre Matucci e Anders é vários graus mais frio do que o normal. A inércia do filme continua até a o fim.”

É isso aí: um filme ao mesmo tempo muito ruim e fascinante – kitschmente, museologicamente fascinante.

A Salamandra/La Salamandra

De Peter Zinner, Itália-EUA-Inglaterra, 1981

Com Franco Nero (coronel Dante Matucci), Anthony Quinn (Bruno Manzini), Martin Balsam (Capitão Steffanelli), Sybil Danning (Lili Anders), Christopher Lee (Príncipe Baldasar), Paul L. Smith (O Cirurgião), Claudia Cardinale (Elena Leporello), Eli Wallach (General Leporello)

Roteiro Robert Katz

Baseado no livro de Morris West 

Fotografia Marcello Gatti

Música Jerry Goldsmith 

Produção ITC, Opera Film Produzione

Cor, 103 min

*1/2

8 Comentários para “A Salamandra / La Salamandra”

  1. Seu comentário é infeliz. Franco Nero fez muitos filmes, alguns bons, outros maus, mas é um ator respeitadíssimo, símbolo do cinema italiano, com grandes interpretações, como em “Keoma”. Certamente você julga por produções baratas e não conhece a filmografia de Franco Nero. Vanessa Redgrave nem é lá essas coisas. Seu acerto é só na Sybil Danning.

  2. Não vou comentar sobre o filme, não tive ainda a oportunidade de vê-lo, e tentarei fazer isso hj através da net…

    Enfim, quero falar apenas de Morris West, pelo jeito vc nunca leu um livro dele…já li uns 25 livros e continuo a divulgar os seus escritos…não há nada melhor que estar em uma rede e ler um bom livros de Morris West, um dos escritos mais inteligentes que pude ter o prazer de ler até hoje.

  3. Concordo com Alcides e com Rildo no quanto essa crítica foi injusta tanto com Franco Nero quanto com Morris West, meu escritor favorito.

  4. Franco Nero é um mau ator? Possivelmente, o senhor não deve ter visto os filmes “Tristana” de Luis Buñuel e “Querelle” de Fassbinder, não é mesmo?

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