[rating:3]
Anotação em 2004, com complemento em 2008: A versão de 1932 de O Médico e o Monstro é surpreendentemente moderna para a época em que foi feito e para o fato de ser hollywoodiano, apenas cinco após o cinema aprender a falar.
Claro, já havia grandes filmes, e com linguagem desenvolvidíssima, na jovem União Soviética, na Alemanha, na Suécia, e também nos Estados Unidos – mas mesmo assim este filme é surpreendentemente moderno. Tem câmara com o olhar subjetivo, tem cenas de grande sensualidade; tem cenas com montagem avançada de junção de visões internas. É muito impressionante. O monstro de Fredric March é muito grotesco, é macaco e monstro demais, mas isso até se perdoa.
O filme deixa muito claro que o que leva o médico a adotar sua parte monstro é a repressão da sociedade vitoriana – o que me parece extremamente corajoso e avançado.
As cenas da transformação do médico, o dr. Jekyll, em monstro, o Mr. Hyde, são impressionantes até hoje, nesta nossa era das imagens geradas por computador. E estávamos em 1932, Cacilda! O iMDB traz esta explicação: “As extraordinárias cenas de transição de Jekyll para Hyde neste filme foram obtidas pela manipulação de uma série de filtros diante das lentes da câmara, filtros que alternadamente revelavam e obscureciam porções da maquilagem do Hyde de Fredric March. Durante a primeira cena de transformação, os ruídos na trilha sonora incluíam trechos de Bach, com um gongo sendo tocado de trás para diante, e, dizem, uma gravação da batida do coração do próprio diretor Rouben Mamoulian.”
A história do médico e do monstro, escrita pelo escocês Robert Louis Stevenson e publicada em 1886, com o título O Estranho Caso do Dr. Jekyll e Sr. Hyde, foi levada diversas, mas diversas vezes ao cinema. Antes desta versão de Rouben Mamoulian de 1932, já tinha havido uma, de 1920, com John Barrymore no papel duplo do título. E em 1941 viria uma nova versão, dirigida por Victor Fleming (que fez O Mágico de Oz e … E o Vento Levou), com Spencer Tracy no papel principal.
As duas versões, a de 1932 e a de 1941, foram lançadas também no Brasil em um único DVD, e é fascinante fazer a comparação entre as duas. A de 1932 é sem dúvida alguma melhor. Muito mais do que pela história em si, já muito bem conhecida, muito mais que pela transformação de Spencer Tracy de médico em um monstro medonho (embora menos macaco que o que de Fredric March), a versão de 1941 impressiona sobretudo pelas duas atrizes reunidas pela Metro – Lana Turner, com uma carinha linda, perfeita, uma Barbie melhorada, e Ingrid Bergman, a coisa mais bela que já passou diante de uma câmara de cinema.
O AllMovie traz boas informações: “Desde a versão com John Barrymore de 1920 para esta história, tornou-se obrigatório simbolizar o cisma entre Jekyll e Hyde dando a ele uma moça “boa” e uma moça “má”. Originalmente, a MGM planejou dar a moça boa para Ingrid Bergman e a ruim para Lana Turner. Mas Bergman implorou ao estúdio que lhe desse a chance de interpretar a mais malvada das duas mulheres; e resultou que a performance dela é de longe a melhor do filme.”
A verdade é que, depois que Ingrid Bergman aparece, os olhos brilhantes, o sorriso maravilhoso, toda safada, se oferecendo ao médico que a salva de um sujeito que a atacou na rua à noite, e depois, em seu pequeno apartamento, tira a blusa para que ele examine se ela não ficou ferida, e depois tira a meia preta para que ele veja seu tornozelo dolorido, e entrega a ele a liga que prendia a meia à coxa, o pobre espectador não quer mais saber de coisa nenhum, nem de médico, nem de monstro, e muito menos da moça boa – tudo fica pouco importante diante da beleza de Ingrid.
O Médico e o Monstro/Dr. Jekyll and Mr. Hyde
De Rouben Mamoulian, EUA, 1932.
Com Fredric March, Miriam Hopkins, Rose Hobart
Roteiro Samuel Hoffenstein e Percy Heath
Baseado no livro de Robert Louis Stevenson
P&B, 98 min
e
O Médico e o Monstro/Dr. Jekyll and Mr. Hyde
De Victor Fleming, EUA, 1941
Com Spencer Tracy, Ingrid Bergman, Lana Turner
Roteiro John Lee Mahin
Baseado no livro de Robert Louis Stevenson
P&B, 113 min
Apenas vi a versão de 1941 e gostei. Não é um filme excelente mas está bom. Achei interessante ver Ingrid, com a sua aparência inocente, no papel de bad girl e Lana Turner, com o seu sex appeal, no papel de good girl. Duas performances óptimas. Ingrid consegue ser sexy (nunca pensei que ela o conseguisse ser até ver o filme) e Lana consegue ser angelical. Spencer Tracy está muito bem e consegue fazer um Hyde assustador sem cair nu brutesco. A fotografia é muito boa. Nunca vi a versão de 1931 mas dizem que é melhor. Há uma coisa que falha no filme: Spencer está tão apaixonado por Ingrid mas, até ela ir ter com ele pedir ajuda, não parece sentir remorsos do que lhe está a fazer enquanto Hyde.