Não pode haver dois filmes mais díspares do que Entre Mulheres/|Women Talking (2023) e Uma Parede Entre Nós/Pared con Pared (2024). Não há qualquer semelhança entre eles – a não ser o fato de que eu não consegui vê-los até o fim.
Foi por isso que resolvi reunir os aqui, em uma única anotação – a sexta em que falo de filmes que não consegui ver até o fim.
Claro que caberia perfeitamente o questionamento: péra lá, mas se não viu até o fim, como tem a coragem de escrever sobre eles?
Bem, por dois motivos básicos, um bastante justo, o outro – admito – um tanto maroto. Primeiro, porque estarão aqui informações básicas sobre os filmes, que poderão ser úteis para o eventual leitor. Minhas opiniões pessoais não ocuparão muito espaço – importa mesmo são as informações, os dados. E segundo porque, diabo, eu vi parte deles, eles me tomaram tempo e eu tenho um site sobre filmes, uai…
Um drama premiado e bem recebido por crítica e público
Entre Mulheres/Women Talking é um filme em tudo por tudo respeitável. A diretora é Sarah Polley, essa atriz de imenso talento, pessoa de opiniões e postura admiráveis, e o elenco, meu Deus do céu, tem Frances McDormand, Claire Foy, Rooney Mara.
Eis a sinopse que o IMDb traz, com o aviso de que é “oficial” – de autoria, portanto, dos próprios realizadores do filme:
“As mulheres de uma comunidade religiosa isolada lutam para reconciliar sua realidade com a sua fé. Vemos uma comunidade de mulheres que se reúne para descobrir como elas poderão seguir adiante para construir um mundo melhor para elas próprias e seus filhos. Ficar e lutar, ou ir embora. Elas não ficarão inativas.”
Pode parecer um tanto vago, e então transcrevo a sinopse do livro Women Talking, da escritora Mirian Toews, lançado em 2018, em que se baseou o roteiro escrito pela própria Sarah Polley. A sinopse é do site da Amazon:
“Entre 2005 e 2009, em uma remota colônia menonita, mais de cem garotas e mulheres foram estupradas pelo que muitas pensavam ser fantasmas ou demônios. Quando as mulheres ficam sabendo da verdade, encontram-se secretamente para discutir como proteger a si próprias e a suas filhas contra danos futuros.”
Com roteiro e direção de uma canadense, baseado em um romance de uma canadense, Entre Mulheres é uma produção americana. Foi extremamente bem recebida pela crítica e pelos júris de festivais mundo afora; amealhou 65 prêmios, com 163 indicações no total. Foi indicado aos Oscars de melhor filme e melhor roteiro, e Sarah Polley levou o prêmio por este último.
No site agregador de opiniões Rotten Tomatoes, Women Talking tem nada menos de 90% de aprovação no Tomatometer, a média da opinião dos críticos, e 81% entre os leitores do site. Eis o “consenso da crítica”, segundo o site:
“Embora Women Talking às vezes se esqueça de drama como entretenimento, a fim de simplesmente apresentar seus pontos de vista, sua mensagem é valorosa – e entregue efetivamente.”
Não tenho o que falar mal do filme – até porque só suportei ver os primeiros dez minutos. Questão de incompatibilidade de gênios – isso às vezes acontece: você não entra em sintonia com o filme, simplesmente. Achei chato, só isso.
Antes, quando isso acontecia com filmes que merecem respeito – como uma obra dessa admirável Sarah Polley – eu insistia, ia em frente. Fui mudando com o tempo. Agora, quando meu anjo da guarda não fala com o filme, simplesmente paro de ver.
Entre Mulheres/Women Talking
De Sarah Polley, EUA, 2023
Com Rooney Mara (Ona Friesen), Claire Foy (Salome Friesen), Jessie Buckley (Mariche Loewen), Ben Whishaw (August Epp), Frances McDormand (Scarface Janz), Judith Ivey (Agata), Sheila McCarthy (Greta), Michelle McLeod (Mejal)
Roteiro Sarah Polley
Baseado no romance homônimo de Miriam Toews
Fotografia Luc Montpellier
Música Hildur Guðnadóttir
Montagem Christopher Donaldson, Roslyn Kalloo
Casting John Buchan, Jason Knight
Desenho de produção Peter Cosco
Figurinos Quita Alfred
Produção Dede Gardner, Jeremy Kleiner, Frances McDormand, Orion Pictures, Hear/Say Productions, Plan B Entertainment.
Cor, 104 min (1h44)
Disponível no No Amazon Prime Video.
Uma comedinha para agradar ao gosto popular
Se Women Talking é sério, pesado, denso, feito para agradar a platéias mais sensíveis, mais exigentes, o espanholito Pared con Pared é o contrário, o oposto, o antípoda. É uma comedinha romântica, sem qualquer pretensão artística, voltada para agradar ao gosto popular, popularesco.
A trama é simples como a receita de um prato absolutamente básico: mocinha pianista se muda para apartamento que tem parede fina separando de apartamento de mocinho inventor, criador de jogos, que não tolera ruído algum. Os dois vão brigar feito gato e rato, até que, ao final, vão ficar juntos e felizes feito pintinhos no lixo. Bem, eu não cheguei até o final – paramos com uns 20 e pouquinhos minutos de filme, mas que o mocinho e a mocinha vão ficar juntos ao final é a obviedade mais óbvia que pode haver.
A mocinha é o papel de Aitana, cantora, compositora e atriz nascida em Barcelona em 1999 – estava, portanto, com 25 anos quando este Pared con Pared foi lançado. As indicações são de que tem feito um extraordinário sucesso como cantora, embora, até meados de 2024, tenha lançado apenas três álbuns. Três álbuns – mas mais de 40 vídeos, lançados desde sua estréia em 2018, depois de ficar em segundo lugar no show de talentos Operación Triunfo, em 2017.
A experiência como atriz é limitadíssima. Em 2018, ano em que participou do festival da canção Eurovisión, teve uma participação especial, fazendo o papel dela mesma, na série Skam España. Em 2022, apareceu em cinco episódios de outra série da TV espanhola, La Última, produzida para a Disney+. Este Pared con Pared aqui é seu primeiro filme.
Pelo que pude ver ao longo dos primeiros 20 minutos do filme, o talento interpretativo da moça não chega a ser comparável assim ao de uma Meryl Streep. Na verdade, sequer ao de uma Sarita Montiel.
Pared con Pared é um filme feminino. É mulher a diretora, Patricia Font, jovem da classe de 1978, 10 títulos como realizadora, entre eles Gente Que Vai e Volta (2019). Dele escrevi o seguinte, em janeiro de 2021: “Gente que Viene y Bah é uma comedinha romântica gostosa, divertida, bem-humorada, que qualquer pessoa de bem com a vida e sem narizinho empinado de quem diz que só gosta de ‘filme de arte’ pode curtir.”
É mulher também a autora do roteiro, Marta Sánchez, 17 títulos como roteirista na filmografia, inclusive Thi Mai, Rumbo a Vietnam (2017), que, por coincidência, Mary e eu vimos pouco antes de nos aventurarmos por este Pared com Pared. Thi Mai também é uma comédia, um filme leve, despreocupado, gostoso; Marta Sánchez era também a autora do argumento, da trama, sobre uma mulher na faixa dos 50 anos que sai de sua cidade, Pamplona, com duas grandes amigas, e vai até o Vietnã para ficar com a garotinha que sua filha – morta em acidente de carro – queria adotar.
Aqui ela escreveu apenas o roteiro, a adaptação de um filme francês de 2015, Un Peu, Beaucoup, Aveuglément, no Brasil Um Amor Inesperado, baseado em uma história de Lilou Fogli, que interpreta a mocinha.
Houve um longo hiato entre as filmagens e o lançamento de Pared con Pared, segundo informa a Wikipedia em espanhol. Anunciou-se em maio de 2022 que o filme seria produzido, e as filmagens terminaram no final de julho daquele ano. Mas a estréia, na Netflix, só aconteceu em abril de 2024. Não foi informado o motivo da demora de quase dois anos até o lançamento.
Anotação em agosto de 2024
Uma Parede Entre Nós/Pared Con Parede
De Patricia Font, Espanha, 2024.
Com Aitana (Valentina),
Fernando Guallar (David),
Natalia Rodríguez (Carmen), Paco Tous (Sebas), Adam Jezierski (Nacho), Miguel Ángel Muñoz (Óscar), Àlex Maruny (Sergio)
Roteiro Marta Sánchez
Baseado no filme “Um Amor Inesperado/ Un Peu, Beaucoup, Aveuglément!, roteiro de Lilou Fogli & Clovis Cornillac &
Tristan Schulmann , de uma idéia original de Lilou Fogli
Fotografia Bernat Bosch
Música Arnau Bataller
Montagem Dani Arregui
Casting Ana Sainz-Trápaga, Patricia Álvarez de Miranda
Deenho de produção Ana Alvargonzález
Produção Poto Balbontin, Netflix, Second Gen Pictures, TriPictures.
Cor, 98 min (1h38)
Título nos EUA: “Love, Divided”
Disponível na Netflix.