Grand Canyon – Ansiedade de uma Geração / Grand Canyon

4.0 out of 5.0 stars

Não era para ser assim. Não era para ter tanta violência, tanta insegurança, tanto medo. Não era, de jeito nenhum, para ter tanta miséria no mundo, esse fosso entre os ricos e os pobres – esse abismo gigantesco, colossal, um Grand Canyon separando os que têm tudo sobrando e os que não têm coisa alguma.

Não era de jeito algum para o mundo ser assim como é. Não era para ser desse jeito.

Quanto mais para nós, a geração que nasceu depois do final da Segunda Guerra e foi jovem nos anos 60. Nós, que nos amávamos tanto, e achávamos que iríamos mudar os homens e o mundo, e torná-los melhores, mais justos, mais suaves, mais amorosos.

É mais ou menos isso o que quer dizer Grand Canyon, o filmaço, a obra-prima lançada em 1991 pelo grande Lawrence Kasdan, com base em roteiro original escrito por ele e sua mulher Meg.

– “Cara, não era para o mundo ser assim”, diz Simon, um dos seis personagens centrais da história criada pelo casal Lawrence e Meg Kasdan. A frase vem bem no começo do filme. Simon (o papel de Danny Glover) é o motorista do caminhão de reboque que atende ao chamado de Mack (o papel de Kevin Kline), quando o carro importado dele quebra numa rua de um bairro de negros em Los Angeles.

“Era pra tudo ser diferente do que é.”

Mack, um advogado rico, bem de vida, tinha ido a um grande jogo de basquete, um clássico da liga principal, com seu grande amigo Davis (Steve Martin) e a namoradinha bem jovem dele, Vanessa (Sarah Trigger). Ao final do jogo, para fugir de um congestionamento, Mack havia saído das grandes vias principais e se aventurado por bairros que não conhecia bem. Numa rua sem grande movimento, o carro pifara. Não demorou muito para que um carro com uns cinco ou seis jovens negros parasse perto do dele, e os membros da gangue, chefiada por um tal de Rocstar (Shaun Baker), o cercassem.

Não dava para saber o que fariam com ele – se o espancariam, se o matariam. Mas no mínimo, no mínimo, na melhor das hipóteses – isso dava para perceber claramente –, Mack ficaria sem seu carrão japonês.

E aí surgiu o guincho que Mack tinha chamado pouco antes de ser abordado pela gangue de Rocstar. E do guincho desceu Simon, um sujeito alto, grande, forte – e negro, como os rapazes da gangue que cercavam o branquelo.

Como um anjo da guarda, montado em uma carruagem celeste. Como o 7º de Cavalaria, com o corneteiro à frente, chegando no momento exato em que os apaches cercavam a caravana de brancos, doidinhos para tirar-lhes o escalpo.

O anjo da guarda, o capitão do regimento, o motorista do caminhão de reboque tem um diálogo com o chefe dos apaches:

Simon: – “Tenho que te pedir um favor. Deixe eu ir em frente. Esse caminhão está na minha responsabilidade, e agora esse carro aí também é da minha responsabilidade.”

Rocstar: – “Você acha que eu sou estúpido? Me responda àquela pergunta primeiro.”

Ele havia perguntado se Simon o respeitava por ser ele mesmo, ou se pelo fato de ele estar armado.

Simon: – “Olha, eu não sei nada sobre você; você não sabe nada sobre mim. Não sei se você é estúpido, ou algum tipo de gênio. Só sei que eu preciso sair daqui, e você tem a arma. Então estou pedindo a você, pela segunda vez, que me deixe seguir meu caminho.”

Rocstar: – “Eu vou te fazer um favor, e vou esperar que você se lembre disso se a gente se encontrar de novo. Mas me diga: você está me pedindo como um sinal de respeito, ou está me pedindo porque eu tenho a arma?”

E aí que Simon diz as frases maravilhosas, sensacionais, marcantes, que o espectador dificilmente conseguirá esquecer:

– “Cara, não era para o mundo ser assim.”

Man, the world ain’t supposed to work like this.

– “Cara, não era para o mundo ser assim. Quer dizer, talvez você não saiba disso ainda. Era para eu ser capaz de fazer meu trabalho sem ter que pedir sua permissão. Era pra esse sujeito aí esperar no carro dele sem você ferrar com ele. Era pra tudo ser diferente do que é.”

É bem provável que Rocstar, o chefe da gangue, não fosse um gênio, porque ele parece não ter compreendido o que o sujeito grande e forte acabou de dizer. E ele diz: – “E então qual é sua resposta?”

Simon: – “Se você não tivesse a arma, não estaria rolando essa conversa.”

Rocstar: – “É o que eu achava: sem arma não tem respeito. É por isso que eu tô sempre armado.”

“Uma história de amizade e outras maravilhas naturais.”

Se o espectador ainda não sabia, nesse momento já dava para ficar sabendo: Lawrence Kasdan é um dos grandes roteiristas, um dos mais talentosos escritores de diálogos do cinema americano. Um escritor à altura de um Joseph L. Mankiewicz, o de A Malvada e A Condessa Descalça, para citar só um dos mais brilhantes de todos.

Lawrence Kasdan foi o autor do roteiro de Caçadores da Arca Perdida (1981), o co-autor, junto com Leigh Brackett, de O Império Contra-Ataca (1980), o segundo episódio da primeira trilogia de Star Wars. Roteirista talentoso de dois dos maiores sucessos de bilheteria, marcos do cinema de aventura de Hollywood, foi o autor do roteiro original de Corpos Ardentes (1981), um dos melhores filmes noir da História. Eclético, versátil, fez uma série de grandes dramas sérios, pesados, densos, dirigidos ao público adulto, maduro. Antes desta obra-prima que é Grand Canyon, já havia feito O Reencontro/The Big Chill (1983), seguramente o filme americano definitivo sobre a geração que foi jovem nos anos 60 ao chegar à faixa dos 30, nos anos 80.

O Reencontro reuniu alguns dos grandes atores dessa geração, a que nasceu entre 1945 e os primeiros anos 1950 – a geração que é a dele, Kasdan, e é a minha. (Ele é de 1949, um ano antes que eu.) Estão lá Kevin Kline, Glenn Close, William Hurt, Jeff Goldblum, Meg Tilly, JoBeth Williams, Tom Berenger – todos interpretando amigos que não se viam fazia tempo e se reúnem para o enterro de um outro colega. O morto era outro grande ator da geração, Kevin Costner – mas na versão final as cenas em que o morto aparecia foram cortadas…

Quando Grand Canyon foi lançado, os cartazes usaram duas taglines – as frases promocionais, as escolhidas pelo marketing do estúdio para vender o filme – que remetiam são filme de 1983:

“Nos anos 80, o diretor Lawrence Kasdan trouxe para você The Big Chill. Bem-vindo aos anos 90.”

Brilho de frase promocional. Mas a outra é ainda melhor:

“Do diretor de The Big Chill. Uma história de amizade e outras maravilhas naturais.”

“A story of friendship and other natural wonders.”

Uau! Isso é que é frase promocional!

Ouso imaginar que não foi nenhum geninho publicitário do departamento de marketing da 20th Century Fox que bolou essa frase – ela deve ser dos próprios Kasdan, do marido ou da mulher.

Mack é um homem bem família – assim como o diretor

É exatamente isso que é a trama de Grand Canyon: uma história de amizade e outras maravilhas naturais.

Mack, o personagem de Kevin Kline, e Davis, o de Steve Martin, são velhos amigos, desde sempre – o filme não se preocupa em especificar quando os dois se conheceram, mas é claríssimo que são conhecidos desde a juventude. Mack, como já foi dito, é advogado, e muito bem sucedido; veremos que é um dos sócios de um grande escritório, e ele trabalha na área de imigração. É uma boa pessoa, um bom caráter. Vive bem com a mulher, Claire (Mary McDonnell, na foto abaixo, um ano depois da indicação ao Oscar por Dança com Lobos, 1990, de Kevin Costner). Os dois se gostam, se respeitam, são carinhosos um com o outro. O único filho, Roberto (Jeremy Sisto), está aí com 15 anos, o auge da adolescência, mas a convivência com os pais não é ruim, de forma alguma.

Mack é um homem bem família – bastante parecido, aliás, com seu criador. Lawrence e Meg Kasdan estão casados desde 1971. (Eu, um ano mais novo que Lawrence, tive três casamentos.) Tudo indica que se dá bem com os dois filhos, Jonathan e Jake – os dois têm suas carreiras no cinema, Jonathan como ator, roteirista e diretor, Jake como produtor, ator e diretor.

Já Davis, o grande amigo de Mack, não é, de forma alguma, um homem bem família. É um galinha, um comedor – durante os meses em que se passa a ação do filme, está namorando, como já foi mencionado, uma garota muitíssimo mais jovem, Vanessa. E não quer saber de casamento.

Davis é um homem da indústria de cinema, de Hollywood: é um produtor, especializado em filmes de extrema violência.

É uma boa forma de Lawrence Kasdan falar da indústria em que ele mesmo trabalha – e uma forma de o filme discutir sobre violência, e a violência no cinema. Vemos Davis no estúdio, trabalhando; Davis é um sujeito que fala muito, fala demais, com aquele jeitão de quem entende de tudo, conhece tudo, um defeito típico das pessoas que se deram bem no seu campo profissional. Os jornalistas americanos identificaram rapidamente que Davis é um personagem inspirado no produtor Joel Silver, conhecido por filmes extremamente violentos.

Seis personagens, seis adultos na cidade imensa

Mack, um bom caráter, bem família. Claire, sua mulher, boa pessoa, mas que tem àquela altura uma vida um tanto vazia, sem muito propósito – e que, por um absoluto acaso, topará com um bebê abandonado entre os arbustos de uma praça, e por quem, é clarto, se afeiçoará terrivelmente.

Davis, o velho amigo, famoso e bem sucedido produtor de Hollywood.

Simon, o anjo da guarda, o capitão do 7° de Cavalaria que salva a vida de Mack numa noite que poderia ter sido sua última.

Completam o grupo de seis principais personagens da trama duas jovens mulheres solteiras, duas amigas, que trabalham no grande escritório de advocacia de Mack: Dee e Jane.

Dee é o papel da ótima Mary-Louise Parker, na foto abaixo, no mesmo ano em que fez também um dos papéis centrais em Tomates Verdes Fritos (1991), e longos 14 anos antes de estrelar a série Weeds. Bonita, simpática, talentosa, Mary-Louise Parker tem o physique du rôle perfeito para interpretar personagens instáveis, inseguras, um tanto neuróticas – meio doidinhas, em suma.

E Dee é exatamente assim. Dee trabalha como secretária de Mack, e se apaixona pelo patrão. Mack é um sujeito família, e ama a mulher, como já foi dito e repetido – mas, diabo, como resistir a uma moça bonita, atraente, como aquela? E então Mack uma vez comeu Dee. Isso não aparece no filme – é apenas mencionado. Ele se arrepende disso – e ela fica ainda mais apaixonada.

Jane é o papel de outra bela atriz, Alfre Woodard, cuja carreira havia começado em 1978, e era, naquele início dos anos 90, uma das mais experientes atrizes negras do cinema americano.

Mack não sabia nada a respeito de Jane, uma das muitas empregadas no grande escritório. Mas, tendo ficado amigo de Simon, querendo agradar o amigo, resolve sugerir que ele saia com a bela moça.

Ao final da noite em que saem juntos para jantar – uma noite que terminará sem sexo, mas com os dois muito satisfeitos com a companhia do outro –, Simon e Jane conversam sobre por que raios Mack teria tido a idéia de juntar os dois num encontro. E, bem humorados, chegam à conclusão de que provavelmente eles dois são os únicos negros que Mack conhece.

Um pedacinho de poeira do cocô do cavalo do bandido

A amizade – e outras maravilhas naturais.

O Grand Canyon que dá nome a este filme belíssimo aparece como a maravilha natural que ele é, uma das maiores maravilhas naturais do planeta, e também como uma metáfora.

A primeira vez em que o Grand Canyon é citado é num diálogo entre Mack e Simon na noite em que este salva a vida daquele: o guincho de Simon leva o carrão importado de Mack para uma oficina, e, enquanto os mecânicos cuidam do carro, os dois homens que haviam acabado de se conhecer conversam – o branco rico e o negro trabalhador classe média média. O que estava para ser atacado, talvez surrado, talvez até assassinado, e o que o salvou.

É uma bela sequência, belíssima, sensibilíssima – e aí o espectador poderá ver também outro dos talentos de Lawrence Kasdan, o do exímio diretor de atores. Embora Kevin Kline e Danny Glover sejam ótimos atores, até mesmo trabalhando com diretores bem menos talentosos.

É uma bela sequência – e um longo, maravilhoso diálogo.

Simon começa a falar do Grand Canyon, que ele havia visitado – Mack ainda não tinha ido lá. Simon diz que o outro precisava conhecer. – “Bonito, é?”, diz o branquelo que o negro havia acabado de salvar.

E Simon responde: – “É, é bonito, mas não é isso.”

E começa a falar de como é se sentar à beira do canyon. E vai falando, falando. E lá pelas tantas diz, depois de um suspiro: – “Quando você senta na beirada daquilo, você percebe que piada nós somos. O que nossas grandes cabeças pensam que o que a gente vai fazer vai ser muito importante. Pensando que nosso tempo aqui não significa coisa alguma para aquelas pedras. É um pedaço de um segundo que nós estamos aqui, nós todos.”

Mack brinca com ele: – “Você está tentando me animar?”

Simon não parece ter ouvido, e continua, como se estivesse pensando alto, falando para si mesmo: – “Aquelas pedras ficavam rindo de mim. De mim e de minhas preocupações – elas são uma piada para aquele Grand Canyon. Sabe como eu me senti? Eu me senti como um mosquito que pousa no rabo de uma vaca que está ruminando a comida perto de uma estrada na qual você está passando a 120 quilômetros por hora.”

Mack entende o sentido da coisa. Dá uma risadinha e diz: – “Sei. Pequeno.”

Pequeno.

O astrônomo Carl Sagan mostrou para nós que o planeta Terra – o nosso lar, o único, porque não existe um planeta B – não passa de um pale blue dot, um pequenino ponto azul claro no meio do infinito.

Para resumir: uma bostinha.

“A Terra é um cenário muito pequeno numa vasta arena cósmica. (…) As nossas posturas, a nossa suposta auto-importância, a ilusão de termos qualquer posição de privilégio no Universo, são desafiadas por este pontinho de luz pálida. O nosso planeta é um grão solitário na imensa escuridão cósmica que nos cerca.”

Grand Canyon diz mais ou menos o que Carl Sagan diz.

Cada um de nós é um pedacinho de poeira do cocô do cavalo do bandido no planeta Terra. O qual, por sua vez, já é uma bostinha.

“Do buraco sai uma erupção de ódio”

O Grand Canyon como uma metáfora do abismo que separa os ricos dos pobres aparece numa fala de Davis, o produtor de filmes violentos que de repente leva um tiro de um assaltante porque não compreendeu o que ele falou e não entregou o relógio que ele pedia.

Ao sair do hospital, começando a se recuperar do tiro à queima-roupa que levou na coxa e arrancou um bom pedaço dela, Davis discursa para o amigo Mack:

– “A questão é há um golfo neste país, um abismo que não pára de crescer entre as pessoas que têm coisas e as pessoas que não têm merda nenhuma. É como um grande buraco no chão, grande quanto a porra do Grand Canyon, e o que sai dele é uma erupção de ódio, e o ódio cria a violência, e a violência é real, Mack.”

No refeitório do prédio do escritório de advocacia, as amigas Dee e Jane conversam. Dee pergunta: – “Jane, você alguma vez já sentiu que está perto de ficar completamente histérica 24 horas por dia?”

E Jane responde: – “Metade das pessoas que eu conheço se sentem exatamente assim. As outras pessoas estão histéricas 24 horas por dia.”

Depois que a casa de sua irmã é atacada por uma gangue, Simon diz para Mack: – “Este bairro virou uma merda”.

Ao que Mack responde: – “Este país virou uma merda”.

E isso foi um quarto de século antes de Donald Trump virar presidente daquele país.

É… Não era para ser assim. Não era para ser desse jeito, de forma alguma. Não era nada disso quando a gente sonhou que poderia mudar o mundo.

Não era para ser assim – mas ainda há uma saída

São demais os perigos desta vida, dizia o poeta Vinicius de Moraes.

Grand Canyon, de uma certa forma, é isto: 134 minutos de grande cinema que demonstram como o poeta estava certo.

Tudo, absolutamente tudo é perigoso – não apenas entrar num bairro absolutamente negro para fugir de um congestionamento nas vias principais e acabar como vítima de uma gangue de bandidinhos.

Davis não entende o que o assaltante quer e leva um tiro na perna.

Claire, em seu jogging diário, dá de cara com mendigo barbudo, cabeludo, assustador – e morre de medo.

(Nessa sequência há uma piada interna, uma inside joke. O mendigo barbudo, que aparece em duas ou três sequências rápidas, é interpretado por Randle Mell – o ator que, desde 1984, e até hoje, 2018, é casado com Mary McDonnell, a atriz que interpreta Claire.)

Mas talvez a sequência que demonstre mais claramente como tudo na vida é perigoso seja aquela, já bem para o fim do filme, em que Mack está tentando ensinar o filho Roberto a dirigir.

Nos filmes americanos de uma maneira absolutamente geral, as pessoas parece que nascem sabendo dirigir carros. É como se fossem todos uma espécie de centauros da mitologia grega: em vez de cabeça e tronco de homem em uma base de cavalo, cabeça e tronco de homem em uma base de Ford, ou Chevrolet, ou o que for.

Em Grand Canyon, não.

Roberto está dirigindo o carro da família, o pai sentado ao lado. Estão em uma via de tráfego pesado. Numa esquina, Roberto vai tentar fazer a curva à esquerda – mas quase bate o carro, ou leva uma batida séria.

O garoto se assusta – e eu seria capaz de jurar que Roberto, o filho de 15 anos de Mack e Claire, é o único personagem do cinema americano que levou um susto ao aprender a dirigir.

E então Mack, boa pessoa, bom pai, tenta tranquilizar o filho: – “É difícil mesmo. Fazer uma curva à esquerda em L.A. é uma das coisas mais difíceis que você vai aprender na vida.”

E aí é que está. Aí é exatamente onde está a maior grandeza deste filme maior. Grand Canyon demonstra maravilhosamente que não era para ser assim como é, que o mundo não era para ser esta merda que é, que está tudo muito ruim – mas, ao mesmo tempo, não é um filme desesperançado, desesperado.

Não. É, na verdade, na verdade, a rigor, um filme believer. No meio desta merda toda que é a vida na sociedade que criamos, ou que permitimos que fosse criada, há saídas.

Sim, sim, há saídas.

E não há como não lembrar a frase maravilhosa de Graciliano Ramos nas Memórias do Cárcere: “Começamos oprimidos pela sintaxe e acabamos às voltas com a Delegacia de Ordem Política e Social, mas, nos estreitos limites a que nos coagem a gramática e a lei, ainda nos podemos mexer”.

A saída, mostra esta obra-prima, é a amizade. A capacidade que temos de abrir nossas mentes e corações às pessoas que estão próximas de nós – mesmo aquelas que, como Simon para Mack, e vice-versa, não parecem absolutamente próximas umas das outras.

Ele ainda faria mais um filme sobre nossa geração

Uau!

Este é um dos filmes de que mais gosto na vida. Revimos para que eu pudesse escrever sobre ele, mas foi no penúltimo dia do ano, e aí vieram as festas, e mais festas, e uma semana na praia – e temi muito não ser capaz de fazer a anotação sobre ele. Respiro aliviadíssimo agora que consegui fazer, e gostaria de terminar – mas acho que tenho ainda que fazer alguns registros básicos.

Lawrence Kasdan ganhou o Urso de Ouro do Festival de Berlim de 1992 pelo filme. Há 300 festivais de cinema mundo afora, mas é sempre bom lembrar que os que de fato importam são os de Cannes, Berlim e Veneza.

Ao Oscar, o prêmio mais badalado do mundo, Grand Canyon teve apenas uma indicação, na categoria roteiro original, ou seja, escrito diretamente para o filme. Perdeu para o de Thelma e Louise.

Considera-se que Grand Canyon foi a segunda parte da trilogia de gerações criada por Lawrence Kasdan. A geração, claro, é a mesma – a dele, a nossa, a dos nascidos entre 1946 e 1952. Ela foi retratada aos 30 anos em O Reencontro, aos 40 anos aqui, e, já na velhice, em Querido Companheiro (2012) – um filme escrito novamente pelo casal Lawrence e Meg Kasdan.

Nos três filmes sobre as gerações, o extraordinário ator Kevin Kline está presente. Ao todo, Lawrence Kasdan dirigiu Kevin Kline (até 2018…) em seis filmes. Além dos três das gerações – O Reencontro, este Grand Canyon e Querido Companheiro –, os dois trabalharam juntos em Silverado (1985), Te Amarei Até Te Matar (1990) e Surpresas do Coração (1995).

Silverado é um bom western. Surpresas do Coração é uma deliciosa comedinha romântica. Já Te Amarei Até Te Matar é uma imensa bobagem. É aquela exceção que confirma a regra. É o único filme ruim que Lawrence Kasdan fez na vida.

Anotação em janeiro de 2019 

Grand Canyon – Ansiedade de uma Geração/Grand Canyon

De Lawrence Kasdan, EUA, 1991

Com Kevin Kline (Mack), Mary McDonnell (Claire), Danny Glover (Simon), Steve Martin (Davis), Mary-Louise Parker (Dee), Alfre Woodard (Jane)

e Jeremy Sisto (Roberto, o filho de Mack e Claire), Tina Lifford        (Deborah, a irmã de Simon), Patrick Malone (Otis, o sobrinho de Simon), Randle Mell     (The Alley Baron), Sarah Trigger (Vanessa, a namorada de Davis), Destinee DeWalt (Kelley), Shaun Baker (Rocstar, o líder da gangue)

Argumento e roteiro Lawrence Kasdan & Meg Kasdan

Fotografia Owen Roizman

Música James Newton Howard

Montagem Carol Littleton

Casting Jennifer Shull

No DVD. Produção 20th Century Fox. DVD Fox.

Cor, 134 min (2h14)

R, ****

6 Comentários para “Grand Canyon – Ansiedade de uma Geração / Grand Canyon”

  1. A Senhorita faça-me o favor de ver “Grand Canyon”!

    Se for preciso, vou até sua casa para emprestar o DVD!

    Um abraço, caríssima!

    Sérgio

  2. De fato, esse filme é espetacular. Eu procurei por ele em todas as lojas on-line, mas não encontrei. Deve estar fora de catálogo. Então, acgeu um site de um colecionador que tinha o filme [não original, claro, mas uma gravação que ele mesmo fez a partir do DVD original]. Arrisquei comprar, e, para minha surpresa, a imagem e o som estavam ótimos. Concordo com você que esse é um filme obrigatório.

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