Anotação em 2011: Um policial francês competente, feito com talento. Duro, pesado, violento. Nada extremamente marcante, extraordinário, mas um policial muito bom. Parte de uma denúncia forte de má conduta das autoridades policiais, para agradar a um político importante. É uma dura afirmação de que, na França de hoje, como no Brasil do lulo-petismo e seu aliado Sarney, algumas pessoas têm mais direitos que as outras.
Cécile De France, aquela gracinha de atriz, uma das melhores de sua geração – a mesma de Audrey Tautou, Marion Cotillard, Judith Godrèche, Isabelle Carré – está com a aparência bastante diferente da de seus filmes anteriores. Nada a ver com aquela graciosa garotinha loura de cabelinhos curtos que vai ser garçonete num bar freqüentado por gente de teatro e de música, em Um Lugar na Platéia/Fauteils d’Orchestre, de 2006, e sequer com a jornalista bem sucedida que chega a passar para o outro lado, engolfada pelo tsunami, em Além da Vida/Hereafter, feito no mesmo ano de 2010.
Para fazer o papel de Julie, oficial da Police Nationale, Cécile De France tingiu os cabelos de castanho escuro. Está ainda mais magra, e parece que foi maquiada para parecer um pouco mais velha e um pouco menos bela do que é.
Em diversos de seus papéis anteriores, Cécile De France sorria muito, mostrando seus dentinhos da frente separadinhos. Neste filme aqui, praticamente não há um sorriso dela.
O espectador ficará sabendo muito pouco sobre Julie, sua vida, seu passado. É como se isso não importasse. Nicolas Boukhrief, o diretor e co-autor do roteiro, como que faz questão de ser sucinto na apresentação de fatos do passado de seus personagens. De Julie, só se saberá que está na polícia há oito anos – ela tem uns 32, por aí –, que seu pai e seu avô haviam sido policiais, e que mora sozinha.
Quando a ação começa, Julie está se preparando para mais uma noite de patrulha nas ruas. No carro vão, além dela, Bastien (Emeric Marchand), velho conhecido da moça, e Simon (Fred Testot). Simon é novo ali; acaba de chegar do Sul. Tem mais ou menos o mesmo tempo de polícia que Julie, e carrega fama de ser violento.
Um policial é morto. Mas o assassino é filho de político importante
Naquela noite, os três atendem a uma ocorrência de roubo, e em seguida são chamados pelo rádio para ir a um prédio de apartamentos, numa região rica da cidade, onde um rapaz está fazendo muito barulho, irritando os vizinhos. Ao chegarem ao prédio, são avisados por uma moradora (ou seria a concièrge? não reparei direito) de que o rapaz é boa gente, não costuma fazer aquilo.
Batem à porta. O ruído que vem lá de dentro do apartamento é infernal. Batem novamente. Quando a porta se abre, o rapaz que está lá dentro atira em Bastien. Julie imediatamente atira nele. O rapaz estava inteiramente transtornado, doido – em sua mão há comprimidos de uma droga violentíssima, chamada esfinge.
O policial Bastien está morto. O drogado entra em coma.
O comissário primeiro conversa com Simon, depois com Julie. Oferece ajuda psicológica, determina que Julie, assim como Simon, ficarão por um período fora das rondas na rua, em trabalho burocrático. E apresenta a ela, para que ela assine, um depoimento falso sobre o que aconteceu no apartamento.
O diálogo é seco, como todo o filme:
Comissário: – “Este é seu relatório. Só precisa assinar.”
Julie: – “Como assim, relatório? Eu não fui interrogada.”
Comissário: – “Ouça. O pai do jovem em que você atirou é membro do Parlamento. Não temos escolha. A arma dele disparou por acidente.”
Julie – “Por acidente?”
Silêncio.
Julie: – “É mentira. Suponho que a droga tenha sido achada por acidente também.”
Comissário: – “É claro que não menciopnaremos drogas.”
Julie: – “Mas é a causa da morte de Bastien! O sujeito estava alucinado.”
Comissário: – “É tarde. Pare de fazer confusão. O outro oficial já assinou. Assine.”
A situação é feia – mas vai piorar muito mais
Estamos aí com exatos dez minutos de filme. A coisa vai piorar, e bem rapidamente: o filhote do parlamentar sai do coma, e quer processar os policiais que atiraram nele. Julie e Simon entendem que só há um jeito de escaparem de uma punição, talvez até da demissão: descobrir o fornecedor de droga do rapaz.
O que vem pela frente é barra pesadíssima. Empurrados pela má conduta dos superiores, os dois policiais vão descer ao inferno do submundo do tráfico e do crime, vão meter-se na lama até a raiz dos cabelos.
Tudo sem floreios, direto, seco, como um soco no estômago
Nicolas Boukhrief não é um garotinho; nasceu em 1963, escreveu o roteiro de oito filmes e dirigiu quatro, antes deste Guardiões da Ordem. Não vi nenhum deles. O título do primeiro roteiro escrito por Boukhrief é interessantíssimo: Tout le monde n’a pas eu la chance d’avoir des parents communistes, ou Nem todo mundo teve a chance de ter pais comunistas. É uma comédia de 1993 com Josiane Balasko, boa atriz e também boa diretora.
O estilo de Boukhrief, neste filme aqui pelo menos, é seco, direto como um soco na barriga. Não há floreios, não há momentos de pausa na tensão para que o espectador respire. É tudo seco, direto, reto.
Um bom filme.
Guardiões da Ordem/Gardiens de l’Ordre
De Nicolas Boukhrief, França, 2010
Com Cécile De France (Julie), Fred Testot (Simon), Julien Boisselier (Marc), Nicolas Marié (o comissário chefe), Stéphan Wojtowicz (Gilbert), Nanou Garcia (Sandrine), Emeric Marchand (Bastien)
Argumento e roteiro Nicolas Boukhrief e Dan Sasson
Fotografia Dominique Colin
Música Nicolas Baby
Produção Gaumont, Les Films du Worso, Entre Chien et Loup, Mikros Image. DVD Califórnia Filmes.
Cor, 105 min.
***
Eu gosto bastante de filmes policiais, mas ver este aqui foi meio difícil. Como vc disse, ele é pesado, duro, me deixou tensa, até com um pouco de medo.
Incrível como a gente não conhece nada sobre esses submundos.
Pena que erraram a mão e o fim descambou para um final de filme americano, com um toque de terror a la Sexta-feira 13 – Jason não morreu: os vilões não morrem nunca, mesmo levando vários tiros; já um dos mocinhos (neste caso, nem tão mocinho assim), mesmo tendo levado um tiro na cabeça consegue reagir, levantar e sair atirando. A mocinha, de vestido longo, não sabe se atira ou se levanta o vestido para não tropeçar.
Final decepcionante.
Eu gosto bastante de filmes policiais, mas ver este aqui foi meio difícil. Como vc disse, ele é pesado, duro, me deixou tensa, até com um pouco de medo.
Incrível como a gente não conhece nada sobre esses submundos.
Pena que erraram a mão e o fim descambou para um final de filme americano, com um toque de terror a la Sexta-feira 13 – Jason não morreu: os vilões não morrem nunca, mesmo levando vários tiros; já um dos mocinhos (neste caso, nem tão mocinho assim), mesmo tendo levado um tiro na cabeça consegue reagir, levantar e sair atirando. A mocinha, de vestido longo, não sabe se atira ou se levanta o vestido para não tropeçar.
Final decepcionante.