Tudo o que o Céu Permite / All That Heaven Allows


Nota: ★★★½

Anotação em 2004, com complemento em 2008: Jane Wyman está absolutamente perfeita como Cary Scott, uma  mulher de classe média alta, viúva, com os filhos já criados, que tem sua vida vazia estremecida ao se apaixonar por um homem cerca de 15 anos mais jovem e muito mais pobre, um jardineiro (Rock Hudson). Uma imensa teia de preconceitos vai cercar o romance. Os vizinhos estranham, comentam, infernizam a pobre mulher; os filhos acham que o sujeito só quer o dinheiro da mãe, revoltam-se, são mal educados, grosseiros.

         Esta obra-prima de 1955 de Douglas Sirk, o mestre do bom melodrama, é tão fascinante que o alemão Rainer Wassbinder a refilmou em 1974, como O Medo Devora a Alma; e, em 2002, o diretor Todd Haynes usaria vários elementos da história em seu filme-homenagem a Douglas Sirk, Longe do Paraíso/Far From Heaven.  

Quando eu revi o filme agora (em 2004), estava ainda sob o impacto de Longe do Paraíso, que, como este aqui, é um filme absolutamente extraordinário. Embora eu já tivesse visto este filme, e embora tivesse identificado o tributo a Douglas Sirk de imediato vendo Longe do Paraíso pela primeira vez, não me lembrava que a história deste mais recente é profundamente calcada na do hoje clássico.

Nos dois, o objeto de interesse da dona de casa rica do subúrbio é um jardineiro; nos dois, há as comadres fofoqueiras que vigiam a vida da protagonista; nos dois, há a cena da festa familiar em que explodem os conflitos daquela sociedadezinha de merda, sórdida, apegada aos valores mais mesquinhos que possa haver.

Os dois filmes vão se diferenciar na moral da história. No filme dos anos 50, a protagonista enfim encontra forças para enfrentar o mundinho em que vive e assumir a relação com o homem mais jovem e mais pobre. No filme dos anos 2000, a protagonista não tem forças para isso; não há happy end possível.

Tudo é uma questão de gosto. Eis o que diz Pauline Kael no final da resenha em que desanca o filme e Douglas Sirk: “A mistura do kitsch germânico de Sirk com o kitsch de Hollywood foi uma grande influência sobre o jovem diretor alemão Fasbinder, cujo trabalho é uma formalização ainda maior da sentimentalidade esquemática de Sirk”.

Tudo o que o Céu Permite/All That Heaven Allows

De Douglas Sirk, EUA, 1955.

Com Jane Wyman, Rock Hudson, Agnes Moorehead, Virginia Grey

Roteiro Peg Fenwick

Baseado em história de Edna Lee e Harry Lee

Cor, 89 min

7 Comentários para “Tudo o que o Céu Permite / All That Heaven Allows”

  1. Assisti ontém a noite na minha sessão coruja,
    via online.Nas locadoras daqui, não encontro filmes de 2005, que dirá dos anos 50.
    Gostei muito, filme maravilhoso.Como costumo dizer,nessa época fazia-se o mais puro e verdadeiro cinema, quando não era preciso usar “efeitos especiais”. Esses efeitos,eram o enorme talento dos atores e atrizes dessa época.
    Tu fôste visceral,Sergio,quando dizes”aquela sociedadezinha de merda,sórdida,”.
    O filme tem um colorido muito lindo.
    Já tentei também asistir “longe do paraíso” mas nem via online estou conseguindo.
    Dizes no teu texto,Sergio, que a Julianne Moore, no filme de 2002, não encontrou fôrças
    para lutar contra o preconceito e assumir a relação com o homem que amava,o que aconteceu
    com a Jane neste filme. Interessante, não achas?Não devería ser ao contrário,devido as diferenças de costumes,pensamentos,posturas e atitudes das mulheres dessas duas épocas?
    Veja bem,não que fôsse obrigatório isso acontecer,quantas pessôas viveram e agiram à frente do seu tempo, não é verdade? Mas, não sería mais comum isso acontecer?
    OBS: aquele animal era um veado, não era?
    Gostaría de entender mais a “cumplicidade” dele com o amor do casal, rsrsrs!!!!
    Gostei de ver a Agnes Moorehead fora do papel
    da mãe da Elizabeth “Feiticeira” Montgomery.
    Abraços,Sergio ! !

  2. Estou assistindo no Cult e achando uma pena que tenha sido colorizado artificialmente. A fotografia dos filmes PB era incomparável.

  3. Nani, o filme foi produzido em cores.
    Concordo plenamente com você: colorizar artificialmente filmes feitos em P&B é um crime. Mas não é o caso deste “Tudo o que o Céu Permite”.
    Sérgio

  4. Meu caro Sérgio Vaz, acabo de ler sua crítica sobre este filme e, por curiosidade, explorei um pouco o seu site. Ao me deparar com a aba “Apresentação” fiquei impressionado com a semelhança de nossas histórias com relação ao cinema. Há algumas diferenças, claro. Por exemplo, nunca escrevi para jornal algum (exceto Cartas à Redação, seção de alguns jornais onde tive várias cartas minhas publicadas), não disponho de uma biblioteca de consulta tão vasta quanto a sua, não escrevi tanto assim como você. Mas há muitas semelhanças como, por exemplo, nossas anotações dos filmes a que assistíamos, a quantidade de filmes que vimos, a existência de um site onde publicamos nossas impressões sobre os filmes que vimos. Bem, resolvi te contar isso pois, acredito que poderíamos trocar idéias, falarmos sobre cinema, sermos amigos, até. Acabei de assistir a este filme, O que o céu permite, num Cineclube que descobri aqui em Recife onde vivo. Fiquei, como você, encantado com os recursos utilizados pelo diretor e pelo responsável pela fotografia do filme, sem deixar de mencionar tambem o simbolismo dos objetos e animais utlizados por ambos. Parabens por seu belo texto e um abraço.

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