4.0 out of 5.0 stars
Anotação em 2009: Cinzas e Diamantes é um filme genial, no sentido mais literal possível, no sentido de coisa de gênio. Merece um monte de adjetivos, um monte de superlativos: é brilhante, excessivo, exagerado, teatral, operístico, circense, surreal. É um tour-de-force, uma explosão, um espetáculo de fogos de artifício.
O filme demonstra o tempo todo que é obra de um cineasta incomum, extraordinário, mas ainda muito jovem, cheio de uma força incontrolável, doido para mostrar que tem talento de sobra. Há tanta coisa nele – todos os recursos possíveis e imagináveis que o cinema havia acumulado até então – que às vezes faz lembrar o expressionismo alemão, às vezes o foguetório exaustivo que Gláuber Rocha faria pouco depois, às vezes a atração de Bergman por símbolos, simbologias, às vezes o universo insano de Buñuel, às vezes até o realismo socialista.
Um gigantesco caldeirão.
Feito em 1958, foi o terceiro longa-metragem de Andrzej Wajda, o último de sua Trilogia da Guerra, depois de Geração, de 1955, e Kanal, de 1957. Com Kanal, Wajda tinha deixado a crítica mundial pasma, boquiaberta; logo se estabeleceu que o cinema que se fazia então na Polônia era o melhor dos países comunistas, e um dos melhores do mundo. Fico imaginando que Wajda, então com 32 anos, deve ter se soltado muito, em termos formais, tão incensado que havia sido pela obra anterior; abriu o vidrinho de criativol e tomou várias bolinhas; o vidrinho de simancol, acho que deixaria para mais tarde, quando fosse mais maduro.
O filme é uma continuação de Kanal (e, por isso, vou forçosamente repetir nesta anotação algumas coisas que anotei sobre Kanal; pensei em juntar as duas anotações numa só, mas ficaria maior que Guerra e Paz). Não uma continuação da mesma história, com os mesmos personagens; isso não. Não há um único personagem de Kanal presente em Cinzas e Diamantes, e Wajda também não repete os atores principais. Mas é o prosseguimento natural da História que Wajda queria contar, daquele período da Grande História vista pelos poloneses.
Novos donos do poder
Kanal se passa no segundo semestre de 1944, durante o levante de Varsóvia, as tropas do Exército soviético já chegando à capital polonesa, já praticamente ali do outro lado do Rio Vístula – aliás, o rio é mostrado numa cena impressionante, belíssima, tristíssima, de Kanal, talvez a cena mais emblemática do filme.
Cinzas e Diamantes se passa só um pouquinho depois, em maio de 1945. A ação se concentra, como nas grandes tragédias, em um período de 24 horas. Começa na manhã do dia 8 de maio – o dia em que o Alto Comando da Alemanha nazista concordou em Berlim com uma rendição incondicional –, para terminar na manhã do dia 9.
Embora tivessem se passado apenas uns poucos meses entre o que acontece em Kanal e o que acontece neste Cinzas e Diamantes, a situação da Polônia havia mudado bastante. Assim que terminou o levante de Varsóvia, com a derrota total da resistência polonesa diante dos nazistas, no dia 2 de outubro de 1944, os nazistas foram vencidos pelo avanço do Exército soviético. Ao contrário do que os insurgentes nacionalistas poloneses queriam – expulsar eles mesmos os invasores nazistas da capital e estabelecer um governo polonês na Polônia, antes da chegada dos soviéticos –, havia se estabelecido um governo títere, subjugado à União Soviética, dependente dela.
Temos então que o terceiro ato da Trilogia da Guerra não tem propriamente guerra, já que a Segunda Guerra acabava de acabar. Tem só a guerra política, e tem muita guerra política. É o retrato do momento em que, invasor nazista expulso do solo polonês, estabelece-se ali o invasor comunista. As pequenas autoridades – o prefeito da cidade em que se passa a ação, os assistentes do prefeito, o dono do hotel, o porteiro do hotel, os responsáveis pela ordem – estão todas procurando estabelecer as formas de puxar o saco dos novos donos do poder. Depois de seis anos de sujeição aos nazistas, estão todos, ou quase todos, querendo virar comunistas de carteirinha, desde criancinha.
Assassinato diante do altar
O filme abre no momento em que dois homens, com o auxílio de um terceiro, estão para matar, numa emboscada, o secretário do Partido Operário Regional, Szczuka (Waclaw Zastrzezynski). A câmara do jovem Wajda é brilhante. Pega primeiro a abóboda de uma capelinha de zona rural, depois a capelinha, depois os dois homens em primeiro plano, enquanto, lá ao fundo, uma garotinha de uns seis anos chega à capela para levar flores para Nossa Senhora. Ela bate na porta fechada da capela, e isso chama a atenção de um dos homens, que se vira para trás para ver o que está acontecendo. A garota vem na direção dele, e portanto na direção da câmara; pede a ajuda dele para entrar na capela.
Enquanto esse homem – Andrzej (Adam Pawlikowski) – procura fazer a garota entender que a pequena igreja está fechada, a câmara mostra seu companheiro, que, depois saberemos, se chama Maciek (Zbigniew Cybulski). Está deitadão na grama, à vontade, sorridente, metralhadora ao lado. É um sujeito jovem, boa pinta, de óculos escuros, um topete meio grande, jeans.
O terceiro homem, Drewnovski (Bogumil Kobiela), dá o aviso: estão chegando. Andrzej manda a garota ir embora – o que faz aquela garotinha na linha de tiro? Andrzej e Maciek se preparam; quando surge o jipe na estrada, abrem fogo. Um dos homens morre na hora; o outro escapa, corre, tenta entrar na capela, a porta se abre, vemos o altar, a imagem do Cristo, Maciek descarrega a metralhadora nele.
(A violência do assassinato diante de símbolos religiosos – Coppola voltaria ao assunto várias vezes, décadas mais tarde, como todos sabemos. Wajda fez primeiro, décadas antes.)
Os três homens da emboscada fogem correndo, desaparecem; logo depois, passa pelo mesmo trecho da estrada outro jipe, e nele está o secretário do Partido, Szczuka. Andrzej e Maciek mataram os homens errados – era Szczuka que eles deveriam ter matado.
Szczuka – saberemos mais tarde – havia passado os últimos anos, os anos da Segunda Guerra, em Moscou; enquanto o povo polonês sofria tudo o que se pode sofrer neste mundo, Szczuka, o líder operário, estava recebendo o treinamento para ser um dirigente sindical e político comunista na Polônia quando chegasse o tempo certo, e o tempo certo havia chegado.
Andrzej e Maciek, os dois homens da emboscada, eram portanto nacionalistas, anticomunistas; tinham lutado no levante de Varsóvia, e respondiam a ordens do mesmo exército polonês rebelde que havia combatido os nazistas.
A emboscada, como já disse, é a abertura do filme. Nos cem minutos seguintes, vamos acompanhar os passos de Maciek e seu superior hierárquico Andrzej, após perceberem que haviam errado o alvo, e que ainda tinham que executar a ordem de matar o dirigente treinado em Moscou; vamos ver também o que acontecerá com o próprio Szczuka, com Drewnovski, o que apoiou os dois primeiros na emboscada e é secretário do prefeito; haverá um baile e um banquete em que o prefeito receberá oficiais soviéticos e os novos donos do poder; haverá demonstrações explícitas, obscenas, de puxa-saquismo, sabujice, ausência de coluna vertebral, por parte de várias das pessoas daquela comunidade, evidentemente um microcosmo que espelha a Polônia pós 1944, segundo a visão de Wajda.
O jovem rebelde, um James Dean polonês
Mas a ação vai se concentrar, basicamente, na figura do jovem Maciek, interpretado pelo galã Zbigniew Cybulski.
Cybulski havia estado em Geração, o primeiro longa de Wajda e o primeiro da Trilogia da Guerra; não desceu aos esgotos infernais, dantescos, de Kanal, mas aqui a câmara fica fascinada por ele. A câmara e a belíssima garçonete do bar do hotel em que se passa a imensa maioria da ação. Maciek-Zbiniew Cybulski e a garçonete Krystyna-Ewa Krzyzewska se conhecem ali mesmo, naquele mesmo único dia mostrado no filme, e têm uma paixão fulminante, avassaladora, romeu-e-juliêtica, como só na ficção. A beleza de Ewa Krzyzewska é absolutamente luminosa, como havia sido em Kanal a beleza igualmente loura e luminosa de Teresa Izewska.
“Não é surpreendente que Cybulski tenha sido descrito como o James Dean polonês (para ir de encontro a todos os outros atores que usaram, com as variáveis de cada nação, a face da rebeldia)”, escreveu no livro The Contemporary Cinema, de 1963, a crítica Penelope Houston, que foi a editora chefe da revista Sight and Sound, a concorrente londrina da parisiense Cahiers du Cinema nos anos 60. Segundo Penelope, Cybulski, com seus óculos escuros (ela não menciona o topete à la Elvis Presley, mas ele está lá), é um símbolo dos jovens poloneses dos anos 50, e “o sentido de desorientação e incerteza se espalha desde os tempos da guerra até o presente”.
No especial feito pelos editores da Criterion que acompanha o filme no DVD lançado no Brasil pela Aurora DVD, Wajda, seu assistente Janusz Morgenstern e o professor e crítico Jerzy Plazewski falam bastante do personagem Maciek e do ator Zbiniew Cybulski. A princípio, Wajda queria que o papel fosse de Tadeusz Janczar, um dos principais atores de Kanal; Morgenstern, que, mais do que assistente, foi um grande colaborador de Wajda nos dois últimos filmes da trilogia, levou um tempo para convencer o diretor a escolher Cybulski.
Wajda conta que queria o personagem Maciek vestido como os rebeldes nacionalistas de fato se vestiam na época da guerra, 13 anos antes da realização do filme, mas Cybulski insistia em que deveria aparecer com as roupas que ele próprio usava na vida real – jeans, jaqueta de couro, óculos escuros. Wajda acabou permitindo que o ator fizesse isso – e, no seu depoimento, quase 40 anos depois que o filme foi feito, admite que foi em grande parte por isso, pelo tipo de visual que o ator principal teve, que o filme acabou conquistando tanto as platéias polonesas. Porque ele se parecia com os jovens poloneses de 1958.
O próprio Wajda admite as semelhanças entre Cybulski no filme com James Dean. Conta até que Cybulski, numa viagem a Paris, havia visto Juventude Transviada/Rebel Without a Cause, de 1955. Mais ainda: diz que foi ali, naquele momento, que ele, Wajda, se sentiu um cineasta maduro, porque aceitou o conselho dos outros, a opinião, a colaboração dos outros, em vez de fincar o pé para fazer tudo do jeito que ele próprio queria.
E o fato é que a imagem de Cybulski como Maciek, com aquele jeitão James Dean, entrou para a história do cinema – e do mundo. Fez história. Tragicamente, como o próprio James Dean, o ator morreria cedo, em 1967. Não tão cedo quanto o ídolo americano, mas cedo – tinha apenas 40 anos.
Da esperança à desilusão, com todo exagero possível
A Trilogia da Guerra de Wajda, diz Penelope Houston em seu livro de 1963, pode ser vista como um círculo fechado, movendo-se da esperança à desilusão, da convicção à incerteza. É o que Wajda tem a dizer sobre sua própria geração, “e ficamos bem conscientes de como o jovem artista está buscando nervosamente colocar tudo aquilo na tela”.
Penelope Houston fala bonito o que eu falei canhestramente lá em cima: o bicho quis dizer e mostrar tudo ao mesmo tempo, o que ele acha da história recente de seu país e tudo o que ele aprendeu que o cinema pode fazer.
Há exageros formais na luz, na iluminação, que evocam o expressionismo alemão. Nas seqüências finais, o dia raiando (o que faz lembrar as seqüências finais de Kanal), a luz berrante inunda o quadro com uma força brutal, num momento em que vemos a bela Krystyna-Ewa Krzyzewska lá no fundo; e ele repete o efeito em nova tomada, no hall de entrada do hotel.
No depoimento feito para a Criterion já nos anos 2000, Wajda resume assim o estilo da fotografia: em Kanal, o diretor de fotografia Jerzy Lipman se inspirava no neo-realismo italiano; em Cinzas e Diamantes, o fotógrafo Jerzy Wójcik buscou a luz, a intensidade da luz dos filmes noir americanos, como O Segredo das Jóias/The Asphalt Jungle, de John Huston, de 1950. Assim, Wajda se inspirou no expressionismo alemão dos anos 20 de maneira indireta, através do noir americano, que havia bebido na fonte lá de trás.
Bem no início, na seqüência em que os operários confrontam o secretário do Partido, Szczuka, querendo saber dele por que as pessoas continuam sendo mortas, agora que os alemães haviam sido expulsos, Wajda usa um recurso típico do realismo socialista: coloca a câmara levemente abaixo daqueles grupos de pessoas, vistas em plano americano, da cintura para cima, de forma que elas fiquem altas, imponentes, apenas o céu atrás de suas silhuetas.
Gláuber Rocha, um dos mais exagerados cineastas da história, seguramente viu e reviu as seqüências do banquete do prefeito às novas autoridades, em que Wajda exagera no exagero do exagero para mostrar os salamaleques dos puxa-sacos, assim como as seqüências da louca dança final ao som de uma desafinadíssima Polonaise de Chopin.
Ingmar Bergman – que em 1959 seria fotografado no Festival de Veneza ao lado da atriz Ewa Krzyzewska, a representante do filme na mostra, já que o diretor não tinha sido autorizado a sair do país – certamente terá aprovado toda a simbologia de que Wajda abusa, como na cena em que, do nada, surge um cavalo branco junto do hotel em que se passa a ação.
E o louco varrido Luis Buñuel seguramente terá aplaudido a escolha do lixão para a última seqüência, ou a seqüência em que os dois rostos mais bonitos do filme, Maciek-Zbiniew Cybulski e Krystyna-Ewa Krzyzewska, passeiam por uma cripta semi-arrasada pelos bombardeios, citam o poema em que aparecem as cinzas e o diamante e falam sobre a vida e o amor tendo em primeiro plano uma imagem de Cristo de cabeça para baixo.
Alguma coisa estava profundamente fora da ordem, nos diz o jovem Wajda. Um gênio.
Um funcionário do regime deixou o filme escapar
Este texto já está insuportavelmente longo, mas não dá para não falar da censura. Como foi que a censura do regime comunista permitiu que este filme fosse feito – e exibido?
Nos depoimentos para a edição do filme no DVD da Criterion, aproveitados na edição brasileira, Wajda e Janusz Morgenstern dizem que produzir Kanal foi difícil; a decisão encontrou resistências, porque o tema não era do agrado do regime comunista. O projeto de filmar Cinzas e Diamantes, ao contrário, não teve dificuldades de ser aprovado. Isso porque ele se baseava em um livro de Jerzy Andrzejewiski, que havia sido aprovado pelo regime comunista; no livro, o principal personagem é o dirigente comunista Szczuka; só que o próprio escritor Andrzejewiski, ao fazer o roteiro do filme, com a interferência também de Wajda, subverteu a história, passou o dirigente comunista para o segundo plano e colocou no primeiro o jovem Maciek, o nacionalista encarregado de matar o comunista.
Mas então, como o filme foi feito fora dos moldes aceitáveis, por que não impediram a exibição?
Wajda dá alguns argumentos para explicar isso. “O descongelamento político que se iniciou em outubro de 1956 ainda estava vigorando”, diz ele – Stálin havia morrido em 1953, e a Polônia estava na época sendo governada por Wladyslaw Gomulka, que permitiu uma certa liberação, uma suave e rápida espécie assim de Primavera de Varsóvia.
“E não foi insignificante”, acrescenta Wajda, “o fato de que Andrzejewiski, o autor do livro e do roteiro, tinha a carteirinha do Partido.” Andrzejewiski convidou para uma primeira exibição do filme, para uma platéia fechada, seus colegas escritores que ou também tinham a carteirinha ou eram aceitos pelo regime comunista; os escritores aprovaram o filme, abrindo caminho para que ele estreasse nos cinemas poloneses. Pouco antes da estréia, um censor ordenou que Wajda cortasse a última seqüência, o do lixão, mas o cineasta, segundo conta no depoimento, resolveu não obedecer à decisão, uma vez que, com a aprovação dos escritores, o filme já tinha sido oficialmente liberado.
O regime – ainda segundo Wajda – permitiu então a exibição dentro da Polônia, mas pretendia não permitir que o filme fosse para o estrangeiro. (Lembrando: Kanal havia sido premiado em Cannes e aplaudido em todo o decadente e capitalista Ocidente em 1957.) Apesar disso, segundo o depoimento do crítico Plazewski, um funcionário de cargo elevado na estrutura do regime autorizou que o filme fosse exibido no Festival de Veneza de 1959 – é verdade que fora de concurso, na amostra paralela, para não atrair atenções demais. O filme foi visto por Arthur Rubinstein, o pianista polonês de nascimento conhecido no mundo todo; Rubinstein chamou René Clair para ver, René Clair fez um manifesto a favor do filme, que levou o Prêmio da Federação Internacional dos Críticos de Cinema.
Dez anos depois, conta Wajda, o filme seria até mesmo exibido em alguns cinemas da União Soviética. Nunca, no entanto, pôde ser exibido em Cuba, o satélite soviético geograficamente desgarrado.
O funcionário que havia autorizado a exibição em Veneza chamava-se Lewinski, lembra o crítico Plazewski (seu prenome não passou para a história). Ele seria em seguida demitido, mas e daí? A besteira estava feita, mais um filme polonês anti-comunista ganhava o mundo.
Mas, afinal, algum cineasta do Leste defendeu o comunismo?
Depois de ver Cinzas e Diamantes, fui conferir o verbete do filme no livro 1001 Filmes Para Ver Antes de Morrer. Está lá:
“Durante alguns anos, no final da década de 50, depois de o neo-realismo italiano perder força e antes de a nouvelle vague francesa entrar em cena, o cinema polonês era o cinema de arte. Com suas histórias complexas, geralmente ambíguas, sobre solidariedade em tempos de guerra, sacrifício e compromisso, os poloneses ofereceram o exemplo mais convincente até então do socialismo com um rosto humano. (…) Talvez o melhor dos filmes poloneses dessa era, o que veio a representar uma geração emergente de artistas e intelectuais do Leste europeu, tenha sido Cinzas e Diamantes, de Andrzej Wajda.”
Fico pensando.
Nos anos 50 e 60, todo mundo que gostava de bom cinema neste Ocidente capitalista decadente era socialista. Nos anos 60, quando comecei a ver bons filmes, eu, como toda minha geração, tentava ver todos os filmes feitos nos países comunistas. Olhávamos embasbacados para a arte feita nos países não decadentes, os países que invejávamos, os países que já haviam chegado lá ao paraíso onde todos queríamos chegar.
Tentávamos ver, embasbacados, como seria o cinema feito dentro do socialismo de face humana.
Nos últimos dez, 15 anos, sempre que vejo um filme dos grandes checos (Milos Forman, Jan Kadar, Elmar Klos), dos grandes poloneses (o próprio Wajda, Kieslowski), dos grandes húngaros (István Szabó), dos grandes cubanos (Tomás Gutiérrez Alea e Juan Carlos Tabío), percebo cada vez mais claramente: mas eles eram todos contra o comunismo. Ou, no mínimo, contra o regime comunista. Ou, no mínimo, no mínimo, contra a censura onipresente do regime comunista.
Percebo, cada vez mais claramente, que os únicos grandes cineastas que defendem o comunismo, ou o socialismo – Ken Loach, Gláuber Rocha, Leon Hirzman, Chaplin, Godard, Bertolucci, Scola –, são aqueles que fizeram seus filmes vivendo nos decadentes países capitalistas.
Com algumas nada honrosas exceções, como Chico Buarque e Silvio Rodriguez, não há grande artista que defenda ditaduras.
Cinzas e Diamantes/Popiól i Diament
De Andrzej Wajda, Polônia, 1958
Com Zbigniew Cybulski, Ewa Krzyzewska, Waclaw Zastrzezynski, Adam Pawlikowski
Roteiro Jerzy Andrzejewiski e Andrzej Wajda
Baseado no livro de Jerzy Andrzejewiski
Fotografia Jerzy Wójcik
Música Filip Novak
No DVD. Produção Kadr
P&B, 103 min
23/6/2009.
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A grande dama Marlene Dietrich, em sua autobiografia, se derrete ao falar do ator Zbigniew Cybulski, dizendo inclusive que Cybulski, foi o único ator capaz de interpretar sem utilizar os olhos, quem recordar dele, não poderá compará-lo aos demais atores. Tanto melhor.