A Menina que Roubava Livros / The Book Thief

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1.0 out of 5.0 stars

Um sincero pedido aos jovens com menos de uns 25 anos que adoraram este filme e chegaram até aqui através de pesquisa no Google: melhor vocês não lerem o texto abaixo. Ler meu comentário sobre o filme só vai deixá-los irritados. Muito irritados.

Ao contrário do livro que deu origem ao filme, esta anotação não foi escrita para jovens. É a opinião de um velho que já leu dezenas e dezenas de livros, viu milhares e milhares de filmes, e então pensa de maneira bastante diferente da dos jovens.

O pedido é sincero e bem intencionado.

Um amontado de clichês, ou de histórias já contadas e recontadas antes

 A Menina Que Roubava Livros me pareceu um grande amontoado de clichês.

Claro que qualquer filme contra o nazismo, que mostre para as novas gerações um pouco do horror do nazismo é bem-vindo. Mas, para gente mais velha, que já viu muito filme, é uma bobagem.

zzthief3Um amontado de clichês, ou de histórias já contadas e recontadas antes. Tem coisas, por exemplo, de O Leitor (o analfabetismo da protagonista no início da ação), O Diário de Anne Frank (o judeu escondido numa casa), Fahrenheit 451 (o amor pelos livros em um tempo de ódio aos livros).

A perseguição aos judeus, a tragédia do Holocausto, bem, esta já foi mostrada em milhares de filmes. Não que não se deva mostrá-la de novo, de forma alguma – mas o que se vê no filme não acrescenta uma gota ao que já foi feito antes com muito mais talento.

Clichês: a mãe adotiva bravíssima, dura (que vai se revelar mais tarde boa como uma santa) versus o pai adotivo que é meigo, carinhoso. O garoto vizinho bonzinho versus o garoto vizinho nazista mal feito a peste. A vida dura da pobreza enfrentada com estoicismo, firmeza.

Simplificação: a personagem aprende a ler numa rapidez e com uma facilidade estonteantes.

Há um grande esforço para realçar a importância, a sacralidade dos livros – na contraposição ao regime totalitário que os queima. Uma causa justa, uma boa intenção – mas boa intenção sem talento jamais resulta em filme que preste.

Um dos problemas mais desagradáveis do filme é que, sendo uma co-produção EUA-Alemanha voltada para o mercado mundial, todos os alemães conversam entre si em inglês. Esse problema é tão antigo quanto o cinema americano: fenícios, romanos, judeus dos tempos bíblicos, egípcios, franceses, chineses, italianos, russos, todos eles sempre falaram inglês na imensa maioria dos filmes feitos nos Estados Unidos.

zzthief6É algo profundamente falso – mas fazer o quê? Os EUA são o maior mercado mundial, e os americanos, de uma maneira geral, não gostam de ler legendas nos filmes. São raríssimos os casos como o corajoso Dança com Lobos (1990), de Kevin Costner, em que os índios falam entre si na língua deles, e o espectador tem que ler legenda.

Mas este A Menina Que Roubava Livros tem o ridículo que é fazer os personagens alemães falarem em inglês tentando dar um pouco de sotaque alemão! Então, entre as frases em inglês de vez em quando há uma ya, um nein. Não foi este filme que inventou isso – há um monte de filmes americanos em que franceses conversam entre si em inglês tentando fazer um sotaque francês, só para dar um exemplo. Mas que é ridículo, é.

Os magníficos Geoffrey Rush e Emily Watson não estão lá muito bem

Esse Brian Percival, realizador de séries de TV, dirigiu cinco episódios de Downton Abbey, mas aqui, estranhissimamente, se mostra inepto até para dirigir os atores. Os excelentes Geoffrey Rush e Emily Watson nunca me pareceram tão mal quanto o casal que adota a garotinha filha de comunistas na Alemanha de 1938.

A garotinha canadense Sophie Nélisse, criada em Montreal e escolhida para o papel central, é bastante bonita, tem boa presença. Não me pareceu um talento especial, mas pode aprender, é claro.

zzthief4O livro que deu origem ao filme, lançado em 2005, foi um sucesso extraordinário em boa parte do mundo. O autor, Markus Frank Zusak, é um australiano nascido em 1975. Seu público alvo é o infanto-juvenil.

Aqui vai o perfeito exemplo de apreciação feita por alguém que se deleitou com o filme e com o livro. É de autoria de um leitor americano do IMDb:

“9.5. Adoraria dar 10, mas, tendo lido o livro, sei que havia algumas coisas que eles poderiam ter feito para torná-lo ainda melhor. Apesar disso, o filme é deslumbrante. Eu tinha expectativa muito elevada e, honestamente, pelo trailer, estava preparado para uma decepção. Nada disso. O cenário era de tirar o fôlego e cativante, e me sentido transportado, isolado das realidades de uma guerra terrível em uma época terrível pelas cativantes atuações dos atores e pela profundidade que eles emprestaram a seus personagens. As únicas queixas que eu teria seriam pequenos spoilers para tanto o filme quanto o livro, e já que eu recomendo fortemente os dois, não vou apresentá-las. Um presente poderosamente emocional que não vai deixar você arrependido. Vá ver!”

Perry Seibert escreveu o seguinte no AllMovie:

“A adaptação do diretor Brian Percival do best-seller internacional The Book Thief é o tipo de drama histórico sincero, bem produzido, bem intencionado, feito para derramar lágrimas que traz à mente o lamento expressado pelo personagem Clarence no roteiro de Quentin Tarantino para True Romance – há muitos filmes inassistíveis feitos a partir de livros ilegíveis. Embora a sentença seja certamente muito dura para este filme, o sentimento atrás dela é real.”

zzthief7E conclui: “Quando o filme finalmente chega a um final que maximiza tanto as lágrimas de tristeza quanto um revigorante ânimo, alguns espectadores estarão numa confusão emocional. Mas muitos outros sentirão que se sentaram diante de uma transposição de livro bem intencionada mas a rigor vazia.”

É isso aí. Esta anotação poderá provocar um furor de ódio entre muitos adolescentes. Ainda bem que não serei xingado sozinho – tem aí o Perry Seibert para me fazer companhia.

E eu bem que avisei.

Anotação em setembro de 2014

A Menina que Roubava Livros/The Book Thief

De Brian Percival, EUA-Alemanha, 2013

Com Sophie Nélisse (Liesel), Geoffrey Rush (Hans), Emily Watson (Rosa), Ben Schnetzer (Max), Nico Liersch (Rudy), Roger Allam (o narrator – a Morte)

Roteiro Michael Petroni

Baseado no livro de Markus Zusak

Fotografia Florian Ballhaus

Música John Williams

Montagem John Wilson

Produção Fox 2000 Pictures, Studio Babelsberg, Sunswept Entertainment, The Blair Partnership, TSG Entertainment. DVD Fox.

Cor, 125 min

*

6 Comentários para “A Menina que Roubava Livros / The Book Thief”

  1. Oi Sérgio, dei boas risadas com seu aviso! E você tem razão, foram as jovens com menos de 18 que deram as melhores notas para o filme, assim como as mulheres com mais de 45 e eu, com mais de 60! 😉 O sentimentalismo das mulheres não tem idade…

    Concordo com você na crítica ao hábito abominável do cinema americano, fazendo com que estrangeiros de todo o mundo falem inglês mesmo em sua própria terra natal.

  2. Também não gostei do filme, pelas mesmas razões. Confesso que não li o livro e o filme não me inspirou a lê-lo. Uma dica: a jovem atriz Sophie Nélisse trabalhou no filme canadense “O Que Traz Boas Novas”. Ela está adorável. É um filme sobre professores (eu adoro filme sobre esta tão menosprezada profissão). Trata-se de um filme onde o professor e seus alunos precisam lidar com o luto.

  3. Esse eu passo! Tinha visto o trailer em algum lugar, e não me animei; depois de ler seu texto tive certeza de que é uma fria.
    Tomara que a menininha cresça como atriz, ela é mesmo uma graça.

  4. Olha eu aqui outra vez haha
    Não amei o filme, mas confesso que chorei um bocado.
    Sobre o livro: a leitura mais demorada da minha vida. Desisti várias vezes, me sentia perdida a cada volta (acho que o próprio autor se perdeu na criação de tantas histórias) e a falta de desfecho foi me deixando impaciente: um porre. Do meio, ou mais, (aliás, muito mais) para o final compensou, acabei gostando e criando simpatia pela história.
    Não esperava que o filme fosse me prender desde o começo, porque o livro não o tinha sido, mas eu gostei muito de algumas cenas. Algumas. Teve muita coisa desnecessária, cenas óbvias e um roteiro meio preguiçoso na maior parte, mas o final compensou hahahaha
    Concordo com a confusão emocional, porque enquanto subia os créditos, eu (com lágrimas no rosto) não sabia se tinha amado ou odiado. Gostei, nem muito, nem pouco. Gostei e preciso ver de novo pra me atentar a esses detalhes que você citou no seu texto. Sem dúvida, não é dos melhores filmes sobre nazismo, mas criei simpatia. O livro complementa o filme e talvez por isso eu tenha avaliado assim. Num todo: não me marcou!

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