A melhor coisa deste Namorados para Sempre/Blue Valentine é a interpretação dos dois jovens atores, Ryan Gosling e Michelle Williams. Estão muitíssimo bem; devem ter se envolvido profundamente com o projeto, e são também dois dos produtores executivos.
A pior coisa do filme não dependeu dos realizadores: é o título inventado pelos distribuidores brasileiros. Namorados para Sempre é um título grotesco, completamente desapropriado, sem sentido: o filme conta a história de um casal que, no presente, não vive nada bem. Muito ao contrário: é um casamento que está em crise, uma crise bastante grave.
As pessoas nascem, crescem e morrem. Os relacionamentos começam, passam por mudanças e acabam, até mesmo quando não acabam – mas são interrompidos pela morte de um dos dois. É a verdade dos fatos, dado da realidade, axioma. Sequer precisa ser demonstrado – é verdade que se demonstra por si própria. Os filmes já contaram tantas vezes histórias de amor que aqui e ali resolvem mexer na narrativa, para tentar ficar diferente.
Em Amor em Cinco Tempos/5×2, por exemplo, François Ozon contou a história de Marion e Giles (interpretados por Valeria Bruno-Tedeschi e Stéphane Freiss) através de cinco episódios – na ordem inversa da cronológica. O filme abre com o casal assinando o divórcio; no quinto dos episódios mostrados, Marion e Giles ficam se conhecendo.
Os roteiristas deste Blue Valentine – Derek Cianfrance, Cami Delavigne, Joey Curtis, o primeiro deles também o diretor do filme – optaram por narrar a história da relação de Dean e Cindy mostrando paralelamente os dois períodos, o início e o momento atual, em que a crise está instalada. Entre um período e outro, passaram-se uns cinco anos, a idade de Frankie, a filhinha.
Um ama mais que o outro. Simples assim
Primeiro vemos o presente – e é óbvio que as coisas não vão bem entre Dean e Cindy. Dean mostra-se um pai afetuosíssimo, a relação entre ele e Frankie (Faith Wladyka) é harmoniosa, carinhosa, animada, brincalhona. Cindy, ao contrário do marido, é uma mulher que parece estar sempre de mau humor, angustiada, preocupada, ou, no mínimo, enfastiada, cansada – e a princípio o espectador não fica sabendo por quê. Aí começam a se intercalar com as seqüências do dia-a-dia do casal hoje cenas do passado, de cinco, seis anos antes. Veremos o cotidiano de Dean e de Cindy antes de eles se conhecerem, e depois os primeiros encontros.
Por algum tempo, tive a impressão de que os autores queriam fazer um contraponto entre o início de uma paixão, quando tudo são flores, o mundo é cor-de-rosa, e a relação já com o desgaste dos anos, com a rotina, com os problemas do cotidiano interferindo, quando as flores já murcharam e as nuvens escuras toldam o céu – aquela história mais velha do que andar pra frente, de que o casamento é o túmulo da paixão.
Depois se percebe que não é bem isso. A rigor, a rigor, a sensação que o filme é que na verdade Dean sempre foi muito mais apaixonado por Cindy do que ela por ele. Que ela, na verdade, mais do que amor, teve por ele gratidão. E gratidão é pouco para manter uma relação.
Um caso comum de história de amor em que um ama mais que o outro. Acontece toda hora.
Os atores souberam mostrar no rosto a passagem dos anos
Não sei nada sobre esse diretor Derek Cianfrance – ainda não olhei nada sobre ele –, mas a sensação que se tem é de que é jovem, ou iniciante no ofício. Insiste demais nos close-ups, na câmara de mão – deixa o espectador meio zonzo, meio cansado. Mas parece ter talento para dirigir atores. Michelle Williams e Ryan Gosling, repito, estão excelentes. Os dois souberam muito bem mostrar a diferença da passagem daqueles cinco seis anos; o trabalho de maquiagem ajuda, é verdade – mas o fato é que eles vivem os bem jovens Dean e Cindy com expressões bem diferentes daquelas que os ainda jovens mas já bem mais desiludidos Dean e Cindy do tempo presente.
Michelle Williams teve uma indicação para o Oscar. A concorrência era dura: Annette Bening por Minhas Mães e Meu Pai/The Kids Are All Right, Nicole Kidman por Reencontrando a Felicidade/Rabbit Hole, Jennifer Lawrence por Inverno da Alma/Winter’s Bone e Natalie Portman por Cisne Negro – esta última foi a vencedora.
Tanto Michelle Williams quanto Ryan Gosling foram indicados também para o Globo de Ouro. O filme teve 19 indicações ao total, em diversos festivais.
Não é um filme ruim, de forma alguma. É mediano, e, se não fosse pelas interpretações dos dois atores – sinceras, sensíveis -, seria um filme facilmente esquecível, descartável.
Um título brasileiro que diz o contrário do original
Já dei minha opinião; agora vamos à verdade dos fatos.
Errei – em parte. Derek Cianfrance não é jovenzinho, pela foto dele no IMDb. Parece ser meio bobo, porque aparentemente esconde a idade: nem o IMDb nem a Wikipedia trazem o ano do nascimento.
Não chega a ser inexperiente: tem 13 títulos como diretor na sua filmografia. Este Blue Valentine, no entanto, é apenas seu segundo longa-metragem de ficção, e o primeiro com atores já consagrados – vários dos filmes que fez são curtas ou documentários.
Está explicada a sofreguidão da câmara.
Segundo a Wikipedia, não houve ensaios, e Cianfrance raramente filmou mais de uma vez a mesma tomada. Se isso for verdade, aumenta ainda mais o valor da interpretação dos dois protagonistas.
Bem. Faltou lembrar o que os imbecis dos distribuidores brasileiros fizeram questão de não perceber. Blue Valentine, o título original, significa triste dia dos namorados.
Anotação em novembro de 2011
Namorados para Sempre/Blue Valentine
De Derek Cianfrance, EUA, 2010
Com Ryan Gosling (Dean), Michelle Williams (Cindy), Faith Wladyka (Frankie), John Doman (Jerry), Mike Vogel (Bobby)
Argumento e roteiro Derek Cianfrance & Cami Delavigne e Joey Curtis
Fotografia Andrij Parekh
Música Grizzly Bear
Produção Hunting Lane Films, Silverwood Films. Blu-ray e DVD Paris Filmes.
Cor, 112 min
**1/2
Pois é, Sérgio, eu vi o filme qdo passou ainda no cinema e me marcou muito, tanto é q até hoje me lembro dele como um dos melhores filmes q vi nas telonas no ano passado, pau a pau com Incêndios e Meia-noite em Paris, 2 filmes tb incríveis!Mas é interessante q a minha interpretação da razão do rompimento entre eles diverge completamente da sua. Talvez pq eu dê muita importância à afinidade intelectual entre o casal, eu prestei muita atenção a esse aspecto durante o filme. Não me pareceu q os 2 personagens principais se amassem com menos intensidade no início da relação, lembra do encantamento dela com ele na cena em q ele fica tocando violão, já à noitinha e ela sapateando e dançando, o dois na maior alegria, curtindo esse momento mágico?Naquele momento, dou a minha cara a tapa se ela não estava de quatro, totalmente apaixonada por ele, como ele por ela, ao ponto de assumir uma filha q não era dele.
Mas, assim como vc disse q é “vieux jeu”casais em q um ama mais q o outro, o q aconteceu entre eles tb não é tão incomum assim, eu mesma já vi ocorrer em meu círculo de relações. Ocorre q eles tomaram caminhos de vida diferentes, enquanto ela, cuja ambição era ser médica, teve q se contentar, certamente por conta das dificuldades financeiras, em fazer Enfermagem, ele, q sequer tinha o segundo grau, ficou limitado a sub-empregos, como fazer mudanças, numa disparidade de realização profissional com a mulher gritante, é claro. E, qdo ela começou a ficar insatisfeita com o desenrolar do casamento, questionando ele repetitivamente se não tinha vontade de crescer, de desenvolver o seu potencial musical e artístico, percebeu a sua acomodação,ele mesmo diz q, para ele, a felicidade é ter ela e a filha. Então, o q eu creio, é q apenas a paixão não segura um relacionamento, é preciso, indispensável mesmo, q o casal tenha objetivos em comum, q o levem a crescer junto e na mesma direção senão, tornam-se 2 pessoas muito diferentes uma da outra, sem nada em comum.
Guenia Bunchaft
http://www.sospesquisaerorschach.com.br
Eu vi no cinema e lembro que gostei. Não cheguei a adorar, mas gostei, sim. Alguma coisa me incomodou, e agora que você falou acho que foi a câmara nervosa. No começo também fiquei meio confusa com o vai-e-vem na passagem de tempo.
Eu concordo com a Guenia e acho que o que os distanciou foram os objetivos diferentes. E isso foi esfriando a relação pro lado da Cindy, enquanto pra ele estava tudo bem e a paixão continuava igual a antes. Mas também concordo com você: parece que ele gostava mais dela. E isso eu notei desde o começo: ele todo apaixonado e tal, mas meio bobo e infantil; e eu ficava me perguntando o que ela tinha visto nele.
Muito triste o rumo que a história tomou, a humilhação por parte dele, o ciúme doentio. Aquele ponto onde um dos dois tenta arrastar a relação a qualquer custo (no fundo, o filme é meio deprê).
A boa interpretação dos atores acho que também foi devido ao fato de terem morado junto antes das filmagens (o tal laboratório); li alguma coisa sobre isso na época do lançamento nos cinemas.
Queridas Guenia e Jussara, os comentários de vocês estão melhores que o meu. De fato, a coisa dos objetivos diferentes é um fator de extrema importância, sobre o qual não falei no meu texto, e que certamente explica, em parte, ou completamente, a distância que foi surgindo entre eles.
Muitíssimo obrigado pelos comentários.
Sérgio
Olá, Sérgio,
concordo com os três, por isso mesmo corro o risco de chover no molhado:). Uma das coisas de que mais gosto no filme é justamente a desmistificação do amor eterno, do “e foram felizes para sempre”, e daí, o título em português torna-se além de ruim, bastante irônico, enganador mesmo. Imaginem a decepção dos espectadores que se deparam com um filme cujo tema é contrário ao próprio título!
Outra coisa, fiquei muito comovida com a dor do cara, com seu desespero, sua solidão, seu desamparo. Mas também reparei na dor de outra ordem da moça. Digo de outra ordem porque nasce da falta de admiração que ela sente cada vez mais por ele, e já sabemos, eis aí um ingrediente fundamental em qualquer relação humana. Sem ela, simplesmente nos desanimamos cada vez mais. A cena em que ele apanha a aliança depois de jogá-la é icônica do seu amor que, embora esteja repleto, arrodeado de monotonia, tédio, cansaço, consegue manter-se firme, ainda sobrevive. Enfim, um filme extremamente doloroso, mas o que seria de nós sem a dor, ao menos na arte?
Grande abraço,
Glória
Gostei muito do filme e, de fato o título não tem nada a ver,chega a ser ridículo.
Gosto muito da Michelle Willians e o Ryan Gosling é muito bom também e junto com o Edward Norton, considero os dois melhores atores da atualidade e, com certeza, ainda vão fazer outros filmes maravilhosos.
Quanto ao filme,não tenho o que falar; a Guenia a Jussara e a Gloria já disseram tudo. A verdade é essa, a Cindy não amava o Dean,ele sim, a amava aos borbotões, tudo bem. Só discordo da Guenia e da Jussara porque tenho a certeza que quando se ama de VERDADE MAS DE VERDADE MESMO outra pessôa, nada,nem mesmo objetivos diferentes,separa ou distancia essas pessôas. Quando se conheceram e começaram a se amar, não havia objetivos,isso se acontecer, vem ao longo da vida desse casal, mas o que vai decidir mesmo
é o amor.A Guenia está certíssima, paixão não segura casamento algum, AMOR sim, amor segura tudo.
Ele não merecía o desprezo dela. Ele a amava tanto, que – como diz a Jussara – chegava a ser bobo, ela não mereceu o amor dele,quando caiu na rotina, para ela, que não o amava,foi a gota que faltava. É como em certa parte do filme, quando ele diz para ela,”voce disso isso no altar”,- voces se lembram dessa parte?
Isso tem a ver com “JURA AMÁ-LO (A) NA RIQUEZA E NA POBREZA,NA ALEGRIA E NA TRISTEZA
NA SAÚDE E NA DOENÇA? Dizer sim,no altar nesse momento, é muito bonito mas para muitos casais, na prática, se não houver o amor verdadeiro,isso não vai acontecer.
Parabéns para a Guenia , Jussara e a Glória.
Um abraço , Sergio.