Armadilha do Destino / Cul-de-Sac

Nota: ½☆☆☆

Anotação em 2010 (postada em janeiro de 2011): O problema, com toda certeza, é meu, não é do filme. Mas achei Armadilha do Destino/Cul-de-Sac um horror. Uma idiotice total e assombrosa, uma brincadeira de péssimo gosto, intragável, interminável.

Sou fã de Polanski desde criancinha. Acho que ele é um dos maiores cineastas de todos os tempos. Vejo e revejo seus filmes com imenso prazer. Por alguma razão, não vi Cul-de-Sac na época – o filme é de 1966 –, embora tenha visto ainda nos anos 60 os anteriores A Faca na Água, seu primeiro longa, feito ainda na Polônia, em 1962, Repulsa ao Sexo, de 1965, e os posteriores A Dança dos Vampiros, de 1967, e O Bebê de Rosemary, de 1968.

Dos primeiros filmes de Polanski, portanto, só não tinha visto exatamente Cul-de-Sac. E dele só sabia que é com Françoise Dorléac, a belíssima irmã de Catherine Deneuve que passou pela vida como um cometa e morreu jovem demais, aos 25 anos de idade, num acidente de carro perto de Nice.

Estava com a maior das boas vontades quando sentei para ver o filme.

Achei tudo ruim. Ruim, não – péssimo, horroroso.

Bem. Antes de prosseguir, vou transcrever a resenhinha de Leonard Maltin – que dá 3 estrelas em 4 para:

“Comédia macabra sobre dois gângsteres feridos que terrorizam um fracalhão de meia-idade e sua jovem e bela mulher. Não um sucesso total, mas o bom elenco e a direção estilosa tornam o filme um vencedor.”

         A única coisa que presta no filme é a beleza de Françoise Dorléac

O casal que é aterrorizado pelos gângsteres feridos mora num pequeno castelo medieval – que mais parece um forte militar – numa ilhota junto da costa em Northumberland, na Inglaterra. Na maré baixa, dá para se chegar ao castelo-forte de carro, ou a pé; na maré alta, a pequena elevação em que se situa a construção do século XI transforma-se numa ilhota.

Os gângsteres chegam ali na maré baixa. Vêm num carro roubado, depois de terem participado de algum golpe – provavelmente um assalto – que não deu certo. Um deles, Albert (Jack MacGowran), pequenino, franzino, levou tiros na altura da barriga. O outro, Richard (Lionel Stander), grandalhão, falastrão, está com a mão direita ferida. O grandalhão vem empurrando o carro, que o franzino dirige completamente sem forças. Quando o carro bate num pequeno poste, Richard resolve avançar a pé; primeiro vê um casal deitado na areia, a moça só de jeans, pelada da cintura para cima. Depois descobre o castelo, e se instala nele.

A moça que brincava com um lourinho na areia é a mulher do dono do castelo. Ele se chama George, e é interpretado por um Donald Pleasance tornado careca com máquina zero que interpreta como se o personagem fosse meio débil mental, meio louco varrido. Ela, Teresa, é a personagem de Françoise Dorléac, a única coisa, na minha opinião, que presta, em todo o filme – e, mesmo assim, presta só em termos.

         Teoricamente, é um filme para fazer rir

Não consegui entender os personagens de George e Teresa. Não entendi o que os dois fazem juntos, já que George parece não se interessar nem um pouco pelo monumento de mulher que dorme em sua cama, e Teresa é uma tremenda galinha, que se engraça com qualquer homem que passar pela frente – até mesmo com o gângster grandalhão.

Como são personagens criados por Polanski, não tenho coragem de dizer que são mal construídos: o problema deve ser meu, certamente.

E eu tenho, de fato, problema com humor negro. Não consigo achar a menor graça. Teoricamente, Cul-de-Sac é para se rir. Não dei nem meio sorriso, ao longo do filme inteiro.

Na minha opinião, os atores, usando um tom farsesco, estão perdidos, fazendo gestos absurdos, incoerentes, incompreensíveis. Françoise, aquela maravilha, é um colírio para os olhos – mas sua interpretação é fraca, como a de todos os atores. Parece mais um programa especialmente ruim dos Trapalhões ou da Escolinha do Professor Raimundo que um filme de Polanski.

E o gângster grandalhão, que teoricamente deveria estar aterrorizando o casal, tornando sua vida um horror, um inferno, na verdade não chega propriamente a aterrorizar ninguém. É estúpido demais, bronco demais; nem chega propriamente a ser violento.

         A crítica faz loas ao filme

Bem. Vou atrás de outras opiniões, então.

O Guide des Films de Jean Tulard dá 2 estrelas em 4. Na sinopse, diz que a ação se passa na Irlanda – não é, é na Inglaterra –, e na análise crítica diz o seguinte:

“Esta obra original, que levou o grande prêmio do Festival de Berlim em 1966, surpreende por seu caráter insólito, a maneira como os personagens são caricaturizados, uma certa loucura e uma comicidade devastadora. Descobria-se o estilo tão particular de Polanski.”

O Film Guide da Time Out, em geral mal humoradíssimo, desancando com tudo, fala que o filme tem a mesma inteligência surreal e absurda dos curta-metragens que Polanksi fez na Polônia, e trata dos temas caros ao diretor: perversões sexuais, insegurança e humilhação, a erupção de um caos que parece pesadelo em um mundo aparentemente organizado, traição, corrupção e auto-destruição. “Se o tema é sombria e amargamente sério, o tom é negramente cômico, enquanto as imagens precisas exibem a tensão, a claustrofobia e a loucura da situação.”

“Um mundo aparentemente organizado” – isso aí eu contesto. A vida do casal George-Teresa não é aparentemente organizada. Os dois não se falam direito, ficam apenas se provocando em brincadeiras infantis, ele não demonstra apetite sexual por ela e ela o trai o quanto pode.

E também não consegui sentir sensação alguma de claustrofobia – isso de que Polanksi é mestre, e que ele exibe de sobra em A Faca na Água, Repulsa ao Sexo e O Bebê de Rosemary, só para citar alguns exemplos.

Mas tudo bem. O problema sou eu, e não o filme.

Um detalhinho: cul-de-sac é beco sem saída.

Outro detalhinho: a esplendorosa Jacqueline Bisset faz um papel bem pequeno, quase uma ponta: ela faz parte de um grupo de cinco pessoas que vai visitar o casal que está sendo mantido sob ameaça da arma do gângster grandalhão. Mal dá para notar que é Jacqueline Bisset, que sete anos mais tarde seria a heroína de A Noite Americana, de Truffaut. Truffaut, o cineasta que filmou com Françoise Dorléac (Um Só Pecado/La Peau Douce, de 1964) e depois com a irmã mais nova dela, La Deneuve (A Sereia do Mississipi, de 1969, O Último Metrô, de 1980).

 Também Polanksi trabalhou com as duas irmãs – com Catherine em Repulsa ao Sexo, com Françoise nesta besteira, perdão, neste grande filme aqui.

Mas foi Jacques Demy que pôs as duas irmãs contracenando, no maravilhoso Duas Garotas Românticas/Les Demoiselles de Rochefort, de 1967.

Taí: dá vontade de rever Um Só Pecado e Duas Garotas Românticas. Pra alguma coisa tinha que servir esse Cul-de-Sac

Armadilha do Destino/Cul-de-Sac

De Roman Polanski, Inglaterra, 1966

Com Donald Pleasence (George), Françoise Dorléac (Teresa), Lionel Stander (Richard), Jack MacGowran (Albert), Iain Quarrier (Christopher), William Franklyn (Cecil), Trevor Delaney (Nicholas), Marie Kean (Mrs. Fairweather), Robert Dorning (Mr. Fairweather), Jacqueline Bisset (Jacqueline)

Argumento e roteiro Gérard Brach e Roman Polanski

Fotografia Gilbert Taylor

Música Krzysztof Komeda

Montagem Alastair McIntyre

P&B, 111 min

Produção Gene Gutowski, Compton Films

1/2

9 Comentários para “Armadilha do Destino / Cul-de-Sac”

  1. O problema acho que,realmente, é seu. Gosto
    muito de Cul-de-Sac, que tenho em minha filmoteca. Mas, também não gargalho com seu
    dito humor negro. Encaro-o como um drama de personagens autodestrutivas. E filme reunindo
    as esplendorosa Françoise Dorleac e Jacqueline Bisset já vale de regular pra cima.
    Ainda, gostei muito de Lionel Stander como o
    gangster truculento. Veja como são as coisas:
    não gosto de Repulsa ao Sexo…

  2. É isso aí, caro Mário. No fundo, é aquela velha e boa coisa: gosto é gosto, cada um tem o seu.
    Um abraço.
    Sérgio

  3. Fatores positivos: Roman Polanski, Françoise Dorleac, Jacqueline Bisset, Lionel Stander, a música, o castelo e as galinhas. Fator negativo: O filme. O resto é blá blá blá. É querer insinuar que… é o rato que engole a cobra.

  4. O filme é uma bosta mesmo.Sou fã de polanki e não consegui assistir todo.Não foi só tu que não riu,eu também não achei graça.Não vi nada no filme.Completamente vazio.incrivél como a crítica adora.Tem vários filmes do Polanki bem melhores.”Faca na água” é bem melhor.

Comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *