0.5 out of 5.0 stars
Anotação em 2008: Este aqui é um daqueles seriíssimos candidatos ao título de pior filme do mundo. Com menos de dez minutos de filme, já está muito mais que claro que é tudo um horror. Qualquer pessoa sã sairia do cinema, ou desligaria o DVD, nessa altura.
Como sou doido de pedra, e fiquei curioso para saber onde iria dar tanta asneira e incompetência juntas, quis continuar. Mary teria desligado logo, mas eu quis insistir; depois de mais algum tempo ela também ficou curiosa com o tamanho da idiotice.
Como parte da minha doidice de pedra é anotar sobre filmes ruins, em vez de simplesmente deixá-los de lado, vou tentar registrar o que acontece nos primeiros dez minutos dessa estultice.
Tomadas de Paris em Panavison – um dos nomes que o atual widescreen tinha nos anos 60. Tomadas de Paris, com a câmara no nível da água do Sena – às vezes a câmara até submerge um pouquinho. Ah, diz o espectador, com 30 segundos de ação: temos então um ferido, ou um cadáver, no Sena! Com um minuto de filme, vemos o cadáver, o corpse!, que vai parar junto de um pescador na extremidadezinha extrema da Île de la Cité.
Zoom em direção a um sujeito que, numa ponte, observa o cadáver sendo recolhido. Começa a apresentação, com cartas de tarô aparecendo atrás dos letreiros.
Fim dos créditos iniciais, corta, e estamos num ringue de boxe, onde um sujeito – George Peppard, o ator de Bonequinha de Luxo/Breakfast at Tiffany’s – está levando uma surra sem tamanho. Derrubado, o sujeito perguntará para o seu treinador em que round estamos; estamos no primeiro. Ele então joga a toalha. Corta, e o sujeito, o americano Reno Davis, está no carro com o treinador, os dois indo para Paris.
No meio do Bois de Boulogne, um tiro acerta o pára-brisa do carro. Reno Davis sai correndo atrás de quem atirou; foi um garoto de uns sete anos, que corre para dentro de sua casa, uma mansão biliardária. Reno Davis adentra a mansão fulo da vida, e lá conhece a mãe do garoto, uma louríssima tentando fazer uma femme fatale (Inger Stevens, sem graça como uma bala chupada sem se tirar o papel), e o tio dele, um rico-nobre francês da melhor estirpe, ele e a cunhada falsa femme fatale falando num inglês americanérrimo. Reno Davis dá uma bronca nos dois, diz que eles deveriam cuidar melhor do garoto.
Corta, e Reno Davis está numa bela alameda parisiense à espera de uma carona não se sabe para onde. Chega perto dele um Rolls-Royce; nossa loura pergunta a ele se ele não quer ser o tutor de seu filho. Ele aceita, é claro.
Bem, que mais devo dizer, para aliviar meu fígado? Orson Welles aparece em umas três seqüências, com aquela cara de Orson Welles enfadado, morrendo de tédio por estar desperdiçando seu monumental talento num filme de merda pra ganhar algum. A trama inverossímil, ridícula, falsa como uma nota de três francos australianos, envolverá uma organização de ultradireita que pretende liberar a França e os Estados Unidos dos governos absurdos que permitem o avanço de negros, dos amarelos e da pornografia.
E depois dizem que Ed Wood fez os piores filmes do mundo.
John Guillermin usará diversos pontos turísticos de Paris e depois Roma em suas cenas, e abusará dos zooms. É tudo grotesco.
Na verdade, nem tudo. Tem uma coisa no filme que presta: a trilha sonora de Francis Lai. O compositor de tantos filmes de Lelouch trabalhou a sério, criou diversos temas, alguns marcantes. Foi seguramente o único sujeito envolvido na produção que levou o filme a sério.
Esta porcaria foi lançada no Brasil com o título de Não Importa que Morram. No DVD com o selo da Universal, inventaram esse título O Último Romano, que não tem qualquer sentido – assim como o filme.
Não Importa que Morram ou O Último Romano/House of Cards
De John Guillermin, EUA, 1968
Com George Peppard, Inger Stevens, Orson Welles
Roteiro Harriet Frank Jr. e Irving Ravetch
Baseado em livro de Stanley Ellin
Música Francis Lai
Produção Universal.
Cor, 105 min.
Bola preta.
O filme não é tão ruim assim…
Por partes, como diria Jack, o estripador (eita pau!!!):
1) Welles está canastrão porque era canastrão. Sempre foi mau ator. Não há, nunca houve, qualquer trabalho de cinema seu, como ator, digno de nota. Sua canastrice era algo digno de Alberto Roberto (ou mesmo Hélio Souto, seu modelo).
2) A trilha sonora é bonita, mas completamente descasada do filme. Não lhe firma o suspense necessário e nem lhe confere dramaticidade. Um erro do diretor, diga-se.
3) A trama é inverossímel, mas o fato dos atores que personificaram franceses falarem ingles naturalmente é típico do cinema americano da época. Na verdade, de até recentemente.
4) Ainda sobre a trama, é bom lembrar que, nessa época (década de 60), a questão dos franceses “pés descalços”, expulsos da Argélia, era “quente” e grupos de extrema direita, de fato, queriam derrubar o governo frances e instalar uma sexta república ou sei lá o quê. Então a idéia geral do filme tem sim seu charme, até porque fica claro que a ação se passava no fim dos anos 50 (Reno fala de Adlai Stevenson como candidato a presidente).
5) Por fim: Welles estraga o filme (seu personagem faz rir, ao invés de fazer medo) e alguns atores estão abaixo do que se espera num filme assim. O final não é bom. Mas definitivamente não é um mau entretenimento.
Abs
Manoel
Manoel, agradeço pelo seu comentário, por suas opiniões bem expostas e seus argumentos. Não pretendo ser dono da verdade, de forma alguma, e minhas opiniões são extremamente pessoais. Mensagens como a sua, realçando o contraditório, dão algum valor a este meu sitezinho despretensioso. Muito obrigado!
Concordo apenas no tocante às interpretações. A música é maravilhosa, espetacular. O enredo não é assim tão grotesco, pois há filmes com roteiros inverossímeis na atualidade. O cinema não precisa ser veraz, nada tem a ver com a realidade, senão vira documentário. Em suma, o filme prende a atenção, ao contrário do que você falou, tanto que nós a ele assistimos. Há filmes muito piores.
Caro Alcides, muito obrigado pela mensagem, e por expor sua opinião diferente da minha. Não sou dono da verdade, de forma alguma – apenas apresento as minhas opiniões, que, necessariamente, são diferentes daquelas de outras pessoas.
Espero que você volte aqui para contestar outros pontos de vista.
Um abraço.
Sérgio