Vidas Amargas / East of Eden

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Nota: ★★★☆

East of Eden, no Brasil Vidas Amargas, está chegando ao fim quando o xerife Sam diz, na voz possante do grande Burl Ives, as palavras da Bíblia: “Caim levantou-se contra seu irmão Abel e o matou. Caim retirou-se e habitou na terra de Node, a Leste de Eden”.

Vidas Amargas é a história bíblica de Caim e Abel, transposta para o Norte da Califórnia em 1917.

É um filme de imensa importância, que deve ser visto com respeito. Por diversos motivos que espero saber enumerar nesta anotação.

O fato de o Caim da história ser interpretado por James Dean, em sua estréia no cinema, é apenas um deles.

O primeiro nome que aparece na tela grande, CinemaScope, é o de John Steinbeck. “John Steinbeck’s” – em letras imensas. E, em seguida, “East of Eden”.

Os créditos iniciais do filme de Elia Kazan ressaltam, realçam, sublinham o fato de que é uma obra de John Steinbeck.

Vidas Amargas foi lançado no início de 1955. O livro havia saído em 1952, e se transformado em um imenso sucesso de público – embora a crítica naquela altura considerasse que o autor estava longe de seus momentos literariamente mais altos.

zzeast0A crítica havia louvado In Dubious Battle (1936), Ratos e Homens (1937) e As Vinhas da Ira (1939), vencedor do Prêmio Pulitzer. O filme baseado neste último romance, dirigido pelo mestre John Ford, com uma interpretação soberba de Henry Fonda, sete indicações ao Oscar, duas vitórias (direção para Ford e atriz coadjuvante para Jane Darwell), foi ele também imenso sucesso.

Embora lançado num período em que os elogios da crítica não eram tão fartos, A Leste de Eden, o livro, é considerado pelo próprio autor o seu melhor trabalho. Steinbeck disse sobre o romance: “Ele tem tudo que consegui aprender sobre meu ofício e profissão em todos estes anos.” E mais: “Penso que tudo o mais que escrevi foi, de alguma maneira, um exercício para chegar a ele”.

Em 1962, dez anos depois do lançamento do livro A Leste de Eden e seis anos antes de sua morte, Steinbeck receberia o Nobel de Literatura.

O ano de 1952 foi um divisor de águas na vida do diretor

Consta que Kazan comprou os direitos de adaptação do romance para o cinema assim que ele foi lançado.

Os dois se conheciam. No mesmo ano do lançamento do romance A Leste de Eden, 1952, haviam assinado juntos Viva Zapata! – argumento e roteiro de Steinbeck, direção de Kazan.

O ano de 1952 foi um brutal, definitivo divisor de águas na vida de Elia Kazan. Divisor de águas – “continental divide”.

Havia estreado no cinema em 1945, com A Tree Grows in Brooklyn, no Brasil Laços Humanos. Já chegou a Hollywood com imensa fama e admiração das pessoas da indústria, por causa de sólida carreira como diretor de teatro na Broadway e um dos fundadores do mais que lendário Actors Studio.

Entre 1945 e 1951, fez sete filmes, que tiveram incríveis, fantásticas 27 indicações ao Oscar.

No início de 1952, foi intimado a depor diante do Comitê de Atividades Anti-Americanas do Congresso. Era a época da louca caça às bruxas empreendida pelo senador Joseph McCarthy, republicano de Wisconsin, em que se enxergavam comunistas em todos os lugares, até mesmo embaixo das camas na Casa Branca.

Em seu documentário Uma Carta para Elia, de 2010, Martin Scorsese lembra que, no primeiro depoimento, Kazan não disse nada. No segundo depoimento, deu o nome de oito pessoas, do tempo de seu grupo de teatro no início dos anos 30, que, como ele, pertenceram ao Partido Comunista.

– “Claro que ele não foi o único a testemunhar”, relata Scorsese. “Mas, ao publicar uma carta no New York Times em que tentava se justificar e explicar, (Kazan) praticamente garantiu que ele seria a única pessoa de quem todos iriam se lembrar.”

A pecha de dedo-duro, traidor, filho da puta, perseguiria Elia Kazan pelo meio século que lhe restou de vida.

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Kazan tem predileção pelos filmes que fez depois do depoimento ao comitê macarthista

Apesar da pecha, continuou fazendo filmes, é claro. E, como mostra o documentário de Scorsese, os filmes feitos depois de seu depoimento ao comitê macarthista são aqueles de que o realizador mais gosta. “Os únicos filmes originais e genuinamente bons que fiz foi depois do meu testemunho. Os filmes que fiz depois de 1º de abril de 1952 são pessoais, saíram de mim.”

Naquele mesmo ano de 1952, como já foi dito, foi lançado Viva Zapata! Em 1954 veio Sindicato de Ladrões, de novo com Marlon Brando – um filme tão poderoso, tão magnífico, que nem mesmo a pecha de dedo-duro, traidor, impediu que fosse reconhecido, aplaudido. Teve nada menos de 12 indicações ao Oscar, oito delas transformadas em estatuetas douradas.

E em 1955 veio Vidas Amargas.

Em apenas um ano, James Dean fez os três filmes que o transformaram em ídolo

Vidas Amargas não tinha astros, nomes conhecidos do grande público frequentador de cinemas. Era uma das características dos filmes de Kazan trazer rostos novos, atores de teatro ainda sem experiência no cinema ou em início de carreira em Hollywood. Marlon Brando havia feito apenas um filme, Espíritos Indômitos/The Men, antes de virar astro da noite para o dia com Uma Rua Chamada Pecado, de Kazan (1951). O primeiro filme para o cinema de Warren Beatty, depois de algumas aparições em produções de TV, foi dirigido por Kazan – Clamor do Sexo/Splendor in the Grass (1961).

zzeast9O primeiro nome de ator que aparece nos créditos iniciais de Vidas Amargas é o de Julie Harris. Foi o primeiro filme dela.

O segundo nome também era de um ator estreante no cinema – James Dean. (Antes, ele havia trabalhado apenas no teatro e em séries para a TV.)

Naquele mesmo ano de 1955, Nicholas Ray fez e lançou Rebel Without a Cause, no Brasil Juventude Transviada, e George Stevens filmou Giant, aqui Assim Caminha a Humanidade, que só seria lançado em 1956, meses após a morte de James Byron Dean em um acidente de carro na Califórnia, em 30 de setembro de 1955, aos 24 anos de idade.

E mais não é necessário falar. Seria chover no encharcado – como se fosse necessário falar sobre Elvis, Marilyn, os Beatles – os únicos nomes capazes de rivalizar com o dele em importância na cultura popular do século XX.

Um jovem de rosto muito belo segue pelas ruas uma senhora de preto

Depois dos créditos iniciais de Vidas Amargas, há um curto letreiro que introduz o espectador ao que ele vai ver nos cerca de 110 minutos seguintes. Vem numa linguagem um tanto empolada, quase com tantos adjetivos quanto os textos deste site – brooding, dark, peaceful, rough, tumble:

“No Norte da Califórnia, as Montanhas Santa Lucia, sombrias e inquietantes, erguem-se como um muro entre a pacífica cidade rural de Salinas e o porto de pesca agitado de Monterey, a 15 milhas de distância.”

E, em seguida, mais um letreiro, informando o quando e o onde: 1917, num ponto em que acabava a cidade de Monterey.

Um jovem de beleza impressionante segue uma senhora vestida de cores escuras dos pés à cabeça. A senhora vai até o banco, faz um depósito em dinheiro tão significativo que o caixa não consegue deixar de exclamar: “Um bom depósito, Kate!” Depois ela volta pelo mesmo caminho, o jovem belo seguindo-a de novo, a uma dezena de metros de distância.

Quando Kate (o papel de Jo Van Fleet, na foto abaixo) chega de volta a seus domínios, uma construção muito ampla, em que ela manda e desmanda, o rapaz fica do lado de fora, a uma distância razoável – sem coragem para bater à porta, sem vontade de ir embora.

Numa casa ao lado, uma senhora de pele negra e modos muito escrachados – uma perna encostada a um umbral, mostrando as canelas e as meias, um riso safado no rosto – fala uma frase provocativa, tipo alô, bonitinho.

zzeast4É a senha para que o espectador daqueles meados dos anos 50 perceba que aquela região da cidade é uma em que moças direitas e senhoras de família não andam jamais.

Kate dá uma bronca em uma empregadinha de rosto bonito, Anne (interpretada por Lois Smith, então com 24 aninhos; hoje, Lois Smith coleciona 118 títulos em sua filmografia). E manda chamar Joe (Timothy Carey), seu leão-de-chácara. Ordena que Joe dê um chega pra lá no moleque insolente que a andou seguindo.

A Joe, o garoto Cal dirá várias vezes variações da frase padrão: Este é um país livre; não há lei que proíba eu estar aqui.

Caleb, com C de Caim. Aron, com A de Abel

Cal é o apelido de Caleb – o papel de James Dean. Cal tem um irmão gêmeo, Aron (Richard Davalos).

Os dois são filhos de Adam Trask (Raymond Massey), dono de um bom rancho na região de Salinas. Adam é um homem de princípios morais extremamente rígidos, de profunda religiosidade. Lê para os filhos trechos da Bíblia – uma gigantesca edição do Livro Sagrado.

Cal e Aron foram criados apenas por Adam; desde que eram criancinhas bem novas, ouviram do pai que a mãe deles havia morrido pouco depois do nascimento dos gêmeos e ido para o Céu.

Se o eventual leitor ainda não tiver prestado atenção aos nomes dos personagens, vou insistir: Caleb, com C de Caim. Aron, ou Arão, com A de Abel. Adam, Adão.

Para quem eventualmente ainda não tivesse prestado atenção a esses signos muito óbvios, o roteiro assinado por Paul Osborn trará reforços ainda mais óbvios.

Aron é o filho perfeito, todo certinho, o filho que o rígido e fiel Adam teria pedido a Deus.

Cal é rebelde, desobediente, inquieto, questionador, nervoso, desassossegado, perturbado, perturbador.

Aron é “bom”, Cal é “mau”.

Abra (o papel de Julie Harris) é a namorada de Aron que sente por Cal um misto de medo e absoluto fascínio.

O filme é uma defesa do livre arbítrio: o ser humano pode escolher

Sou bastante ignorante nas mais diversas áreas, e uma em que sou especialmente ignorante é a Bíblia. O que sei da Bíblia é basicamente o que aprendi lendo e relendo na infância e pré-adolescência um livrinho de História Sagrada recomendado por minha mãe, católica praticante (embora não tão rígida quanto o protestante Adam Trask do filme).

zzeast5Não consigo compreender o que significa a história de Caim e Abel, contada ainda no Gênesis, o primeiro dos livros da Bíblia.

Caim e Abel, filhos e Adão e Eva. Abel tornou-se pastor de ovelhas, Caim, lavrador. Ambos fizeram oferendas ao Senhor; o Senhor demonstrou ter ficado satisfeito com a oferenda de Abel, mas não com a de Caim. Caim, com ciúme, inveja do irmão, sentindo-se rejeitado pelo Senhor, matou Abel – e então, como cita quase ao final do filme o xerife Sam interpretado por Burl Ives, “Caim retirou-se e habitou na terra de Node, a Leste de Éden”.

Se é extremamente difícil compreender o sentido, o significado da história bíblica de Caim e Abel, apreender o que quer dizer essa história de Caim e Abel passada no Norte da Califórnia em 1917, ao contrário, é bem mais simples.

East of Eden defende o oposto do conceito árabe “maktub”, estava escrito – o destino está traçado, não há o que possa mudar.

É, em suma, ao fim e ao cabo, o princípio do livre arbítrio.

Adam diz a frase para o filho rebelde, incontrolável, “mau”: o que diferencia o homem dos animais é que ele pode escolher.

É uma bela moral da história.

É especialmente significativa vindo de um romance de um escritor que fez na América da primeira metade do século XX o que o inglês Charles Dickens fez sobre a sociedade de seu país no século XIX: a denúncia virulenta da injustiça social, da inaceitável distância entre os milionários e os miseráveis.

Mais significativa ainda em um filme realizado por um ex-membro do Partido Comunista que na época era quase unanimemente odiado como um dedo-duro, um traidor, um Judas.

O filme aborda apenas um pequeno trecho do romance gigantesco de Steinbeck

É necessário enfatizar que o filme de Kazan aborda apenas um trecho do romance cartapácio, catatau, tolstoiano de John Steinbeck.

zzeast7O romance imenso volta no tempo até à Guerra Civil Americana (1861-1865). Trata da vida de Adam Trask desde a infância, ainda no Leste, numa fazenda em Connecticut – dele e de seu irmão Charles. (De novo, um nome com A de Abel e outro com C de Caim.) Relata a juventude de Cathy Ames, com quem Adam iria se casar. Relata a vida de Samuel Hamilton, um imigrante irlandês que se estabelece na região de Salinas, Califórnia, para onde mais tarde Adam se mudaria.

E aqui cabe um detalhe fundamental. John Steinbeck é natural de Salinas. Registrou-se que sua intenção, ao escrever A Leste de Éden, era descrever detalhadamente a vida no Vale de Salinas no início do século XX. Aquela coisa mais antiga do que do que andar para a frente: se você quiser escrever algo universal, conte sobre sua aldeia.

Aparentemente, só na Bíblia, na obra inteira de Shakespeare e no conjunto das letras das folk songs há tantos crimes, tantos dramas, quanto em A Leste de Eden, o romance.

Tantos dramas, tantos crimes não caberiam num filme de pouco menos de duas horas. Não caberiam nem num filme do tamanho de … E o Vento Levou (238 minutos), Ben-Hur (212) ou Cleópatra (192).

E então o produtor e diretor Elia Kazan e seu roteirista Paul Osborn, certamente com o beneplácito de Jack Warner, o dono do estúdio, optaram por focalizar apenas parte da segunda metade do romance, quando os irmãos Cal e Aron já estão criados, aí no final da adolescência, início da idade madura.

“James Dean instantaneamente se tornou um símbolo e um ícone para a juventude desiludida”

East of Eden teve apenas quarto indicações ao Oscar – um número pequeno, em se tratando de um filme de Elia Kazan. Jo Van Fleet ganhou a estatueta de melhor atriz coadjuvante. Elia Kazan, indicado para melhor direção, Paul Osborn, indicado para melhor roteiro, e James Dean, indicado para melhor ator, não levaram o prêmio.

Marilyn Monroe, assim como James Dean, jamais levou para casa uma estatueta dourada daquelas. O que demonstra, peremptoriamente, definitivamente, que não é necessário ter saído de uma daquelas cerimônias compridas carregando a estatueta para virar um mito imortal.

Em seu Movie Guide, o guia de filmes mais vendido do mundo, Leonard Maltin dá cotação máxima, 4 estrelas, para o filme: “Emocionalmente irresistível adaptação do romance de John Steinbeck sobre a rivalidade de dois irmãos pelo amor de seu pai; afeta a geração de hoje tanto quanto as que testemunharam a estréia de Dean como estrela.”

Leonard Maltin foi abençoado por Deus com a capacidade de síntese.

zzeast8O CineBooks’ Motion Picture Guide Review dá cotação maxima, 5 estrelas. “James Dean fez sua estonteante estréia em East of Eden, uma assombrosa adaptação do romance de John Steinbeck. Um filme poderoso cuja influência pode ser vista em Hud (1963) e muitas outras produções conhecidas, é magistralmente dirigido por Elia Kazan”. Seguem-se depois alguns outros parágrafos, até que o Cinebook’s resume:

“Todos os atores principais têm performances fascinantes, mas foi Dean que emergiu como uma sensação da noite para o dia, apesar de sua identificação com um estilo naturalista de atuar. Dean instantaneamente se tornou um símbolo e um ícone para a juventude desiludida; seus fãs e imitadores se tornaram milhões, um culto que prosseguiu muito depois da morte do ator.”

Pauline Kael, a prima donna da crítica americana, de texto sempre brilhante, rico, vai fundo:

“Como o jovem herói romântico e alienado, James Dean é embelezado com todo tipo de gaucherie charmosa; sensível, indefeso, ferido. Talvez seu pai (Raymond Massey) não o ame, mas a câmara sim, e supõe-se que nós também; somos impelidos em ângulos inquietantes, colhidos em closes apaixonados e cutucados: ‘Veja todo esse lindo desespero’. Quando esse Caim golpeia o irmão (Richard Davalos), a trilha sonora amplifica o golpe como se fosse uma colisão de mundos; uma dose curta e pesada de expressionismo é seguida por uma travessura pastoral ou por um exemplo elaborado de americanice típica; um ator de repente assume uma atitude psicótica e outro despedaça a janela de um trem com a cabeça. Está longe de ser um filme chato, mas com certeza é muito estranho; uma exaltação ao adolescente pirado. Aqui e em Juventude Transviada, James Dean parece ir até onde qualquer um poderia na interpretação de um ser incompreendido.”

Depois dos anos 50 e 60, inverteram-se os papéis, os jovens tomaram o poder

James Dean é tema para estudos sérios. Seria necessária uma junta de doutos sociólogos, antropólogos, cientistas sociais das diversas espécies, para interpretar o que o jovem ator significou em sua brevíssima passagem pela casca deste planeta e pelo cinema.

Não sou nada disso, não sou douto em coisa alguma, sou apenas um assistidor de filmes, mas ousaria dizer que James Dean, em seus três únicos filmes, junto com o jovem Marlon Brando de O Selvagem/The Wild One, de 1953, junto com o jovem Elvis das primeiras gravações, antes de servir o Exército, foram, em boa parte, responsáveis por uma brutal mudança de costumes na sociedade ocidental. Claro, foram o espelho de uma geração – mas foram também os motores de uma brutal quebra de valores, que seria aprofundada ainda mais, nos anos 60, pelos Beatles, pela Swingin’ London, pelo flower power, pelo hippismo, pelo livro Summerhill de A.S. Neill.

Desde o início do que conhecemos da História da humanidade até aqueles meados dos anos 1950, os mais velhos, os pais, eram os detentores do poder, da autoridade. Eram respeitados, venerados.

zzeast10Isso se quebrou nos anos 1950 e 1960. De uma certa forma, a juventude tomou o poder. A indústria de entretenimento, a tal da mídia, tudo passou a bajular a juventude.

O cinemão comercial, em especial, que até então falava para os adultos, passou a se voltar cada vez mais para os jovens.

Se até então ser velho era sinônimo de ser sábio, mais experiente, a quem se devia por princípio ter respeito, gratidão, de lá para cá quase tudo virou de pernas para o ar. Ter experiência passou quase a ser sinônimo de ser descartável, decadente, desnecessário.

Velho virou careta: youth is beautiful.

As revoluções costumam levar a desfechos muito distantes daquilo que os verdadeiros revolucionários buscavam – como perfeitamente demonstraram Elia Kazan e John Steinbeck em Viva Zapata!

James Dean exagera nas caras e bocas, Kazan exagera ao entortar a tela

Bem, mas parece que aí tergiversei fundo – ou me meti num papo cabeça insuportável.

Voltando especificamente a este East of Eden, gostaria de registrar que, antes de o rever agora para fazer esta anotação, vi o filme em 1962 e em 1967, aos 12 e aos 17 anos. Claro, óbvio: com 12 anos, aquele garoto que já fui eu seguramente não entendeu lhufas do que o filme queria dizer. Mas acho interessante o fato de ter visto East of Eden – ainda que numa encadernação anterior a esta – apenas sete anos depois que ele estreou nos Estados Unidos.

Como milhões e milhões de garotos do mundo todo, inclusive do Afeganistão e da então Pérsia, me apaixonei pela figura de James Dean.

zzeast12Ao rever agora, chegando perto dos 64 anos, achei que James Dean não tem, absolutamente, uma forma “naturalista” de atuação, ao contrário do que disse o Cinebooks’.

James Dean atua à la Actors Studio. É uma forma teatral, afetada, afetadíssima, de atuar. Não tem absolutamente nada a ver com a forma como as pessoas se comportam na vida real.

Ninguém, na vida real, faz tantas caras e bocas quanto James Dean no papel daquele pobre Cal.

E Kazan já deveria ter idade suficiente para não entortar a tela.

Por que, raios, entortar tantas vezes a tela, nas sequências importantes, em que Cal discute com seu pai?

E ainda tem a trilha sonora, assinada por Leonard Rosenman.

É tudo grandioso demais. É tudo over, exagerado – a música de Leonard Rosenman exagera tanto quanto as caretas de James Dean, tanto quanto a câmara fica torta.

East of Eden é um filme de extrema importância, e deve ser visto com respeito, repito.

Mas se eu não dissesse essas coisas que achei agora ao revê-lo, não estaria sendo eu mesmo.

Aí eu poderia estar fazendo como o editor de um site respeitado uma vez me convidou para fazer: escrever de forma objetiva, deixando de lado todo o pessoal.

Aqui neste 50 Anos de Filmes não tem nada objetivo, não. Tudo aqui é a minha visão pessoal e intransferível. Aqui eu posso tudo – posso até expor o que pessoalmente não gostei mesmo em um filme importante, de um dos realizadores que mais admiro.

Anotação em novembro de 2013

Vidas Amargas/East of Eden

De Elia Kazan, EUA, 1955

Com James Dean (Cal Trask), Julie Harris (Abra), Raymond Massey (Adam Trask), Richard Davalos (Aron Trask), Jo Van Fleet (Kate), Burl Ives (Sam), Albert Dekker (Will), Lois Smith (Ann), Harold Gordon (Mr. Albrecht), Timothy Carey (Joe), Mario Siletti (Piscora), Lonny Chapman (Roy), Nick Dennis (Rantani)

Roteiro Paul Osborn

Baseado na novela de John Steinbeck

Fotografia Ted McCord

Música Leonard Rosenman

Montagem Owen Marks

Produção Elia Kazan, Warner Bros, First National Films. DVD Warner.

Cor, 115 min

R, ***

9 Comentários para “Vidas Amargas / East of Eden”

  1. Adoro esse filme! Kazan era um gênio, James Dean é fantástico nesse filme, a Julie Harris também. Sem palavras para definir essa obra prima da 7°arte…….

  2. Por causa de um vídeo sobre um livro de Arthur Miller, e um comentário que li no YouTube, acabei vendo o Oscar honorário dado a Elia Kazan. Vários atores não aplaudiram nem se levantaram. Como ele estava velhinho eu fiquei com dó, e me emocionei, apesar de tudo. Ele agradeceu a todos, principalmente ao Martin Scorsese e Robert de Niro. Não tenho opinião formada sobre o que ele fez. Sei lá, quem é que nunca errou? Enfim, reli seu texto sobre “Uma Carta para Elia”, e lá você diz que não lembra se houve vaias no momento da entrega do Oscar; não houve, ele foi até bem aplaudido.

    Eu não vi “Vidas “Amargas”, vi outros filmes dele, mas li o livro quando tinha uns 16, 17 anos, emprestado e oferecido por uma colega de um cursinho super rápido que fiz. Mas eu nem sabia que era um livro de sucesso nem nada, e acho que ela também não.

    Eu não ‘guento a exaltação em cima de James Dean, por gente de todas as idades (muitas vezes somente pela sua dita beleza, diga-se de passagem); acho suas atuações chatas, e olha que não vi “East of Eden” (como você diz que o achou muito careteiro neste aqui, me senti à vontade para falar). Pode ter tido lá o seu valor para a juventude da época, mas para mim, ele é mais um dos que alcançaram fama maior que importância, por ter morrido cedo, e de forma trágica. #prontodesabafei

  3. Adoro esse filme, a fotografia a música
    e acho a interpretação de James Dean fascinante e intensa. Mas quem se sobressai no filme são Jo Van Fleet e Raymond Massey.

Comentário

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