A Caixa / The Box

Nota: ★★★☆

Anotação em 2010: A Caixa cita Sartre duas vezes. Mas a sensação que tive foi que a trama é assim uma mistura do Fausto, de Goethe, ou de O Retrato de Dorian Gray, de Oscar Wilde, com as histórias do muito menos reconhecido Fredric Brown.

Mas vamos por partes.

Parece que o filme foi um fracasso de público e crítica. No entanto, não é ruim, de forma alguma – ao contrário. É uma interessante mistura de ficção/fantasia com ficção científica com thriller de suspense, mas na verdade é uma parábola moral, uma grande metáfora que questiona os códigos de valores das pessoas, da sociedade.

A Caixa abre com um texto que vai sendo escrito como se fosse no antigo, antiqüíssimo telex – à medida em que as palavras vão aparecendo na tela, ouvimos um barulhinho semelhante ao que o telex fazia. É um memorando interno – confidencial – para o vice-diretor da Agência de Segurança Nacional, NSA na sigla em inglês. Diz o seguinte:

– “Ressuscitação do paciente Arlington James Steward confirmada pelo hospital. Paciente recebeu alta da unidade de queimadura na manhã de 24 de julho, indo a local não revelado. Paciente construiu um dispositivo de finalidade não reconhecida. Especificações foram confirmadas pelo Projeto Marte. Paciente está entregando o dispositivo a residências privadas. Mais informações em breve.”

Um letreiro nos avisa que estamos na Virgínia, em 1976, e as primeiras seqüências mostram um início de manhã na casa dos Lewis, um casal na faixa dos 35 anos, com um filho de uns dez. O relógio na cabeceira marca 5h45, e Norma (Cameron Diaz) e Arthur (James Marsden) acordam com o som da campainha. Norma desce as escadas, vai até a porta da frente, vê pelo olho mágico um grande carro preto se afastando; abre a porta e no chão, diante dela, está um embrulho em forma de cubo.

A família – os pais mais o filho Walter (Sam Oz Stone) se reúne em uma mesa em volta do embrulho. Lá dentro está uma caixa, um cubo, com uma luzinha em cima; há uma chave, e um grande cartão com a seguinte frase: “O sr. Steward vai visitá-los às 17h.”

         O salário é apertado, e a família perde a bolsa de estudos do filho

O diretor e roteirista Richard Kelly se dá, assim, um bom espaço de tempo – um dia inteiro – para apresentar os Lewis ao espectador. Arthur Lewis é um cientista, formado em engenharia; trabalha na Nasa, a agência espacial americana; está envolvido no Projeto Marte – o envio de uma sonda ao planeta, que passaria para a Terra fotos e informações –, mas espera obter um dos cobiçados lugares de astronauta. Naquele dia, ficará sabendo que não passou nos testes.

Norma Lewis é professora de literatura de um bom colégio, onde seu filho Walter estuda com bolsa; na aula que o espectador vê, naquele dia inicial, ela está falando de Sartre, Huis Clos, Entre Quatro Paredes (que em inglês se chamou No Exit), aquela frase famosérrima, “o inferno são os outros”. Um aluno surpreende a todos perguntando por que a professora manca; mais surpreendente ainda é que a professora Norma, em vez de ignorar a impertinência ou mandar o aluno para fora da classe, senta-se em cima da mesa, tira a bota, a meia, e expõe à classe o pé deformado, sem quatro dedos.

Pouco depois, Norma é chamada pelo diretor do colégio, que a informa que, infelizmente, a escola não poderá mais dar bolsa de estudo aos filhos dos professores.

Arthur e Norma vivem com conforto, mas o salário dos dois é apertado, dá apenas para pagar as contas – sem a bolsa de estudos para Walter, e sem o aumento que Arthur teria caso obtivesse a vaga como astronauta, a família vai passar um grande aperto.

         O trato com o diabo – a alma por um monte de dólares

Às 17h, conforme prometido, o sr. Steward (Frank Langella) toca a campainha da casa.

Steward não tem boa parte da face esquerda; tem uma imensa queimadura que consumiu parte do rosto. Norma fica assustada com a aparência dele, assim como o espectador. Muito mais assustador é o que ele tem a oferecer:

– “Eu tenho uma oferta a fazer”, informa ele a Norma. “Se você puxar o botão (da caixa entregue pela manhã), duas coisas vão acontecer. Primeiro, alguém, em algum lugar do mundo, que vocês não conhecem, vai morrer. Segundo, vocês receberão um pagamento de US$ 1 milhão. Vocês têm 24 horas para decidir.”

O trato com o diabo – a alma de Fausto em troca da vida eterna. A alma de Dorian Gray em troca da eterna juventude.

A questão que o filme coloca para o espectador é esta: você mataria um desconhecido para ganhar uma fortuna?

Um detalhinho mínimo que me chamou a atenção foi o nome do personagem misterioso interpretado por Frank Langella, o ator que fez o excelente Nixon em Frost/Nixon. Arlington James Steward. Faz lembar, claro, James Stewart, o grande ator. Arlington é o nome do cemitério militar na Virgínia, perto de Washington, onde são enterrados muitos dos militares americanos mortos em combate. E Steward é comissário de bordo, mordomo, administrador – algo que o personagem revelará ser. Um nome sugestivo, muito bem sacado.

         O autor da história é Richard Matheson, homem de obra vasta

Fredric Brown (1906-1972) jamais obteve a respeitabilidade de Isaac Asimov, ou Arthur C. Clarke (aliás, citado algumas vezes ao longo do filme), ou Clifford D. Simak, mas é um brilho de escritor. Escreveu algumas das parábolas morais mais enxutas, mais violentas, mais cortantes da ficção científica de que tenho notícia. Como tantos outros autores de ficção científica – a começar dos três citados no início do parágrafo –, usava suas histórias para fazer belas considerações sobre os grandes valores morais, os descaminhos da humanidade, o talento inesgotável do homem para destruir tudo à sua volta, desde o vizinho até as fontes de vida do planeta.

Fredric Brown seguramente assinaria embaixo dessa história criada por um conterrâneo e praticamente contemporâneo seu, Richard Matheson, nascido em 1926. Matheson é o autor do conto “Button, Button”, em que o filme se baseia. É um escritor prolixo, tem obra vastíssima; foi também roteirista de diversos filmes, vários deles baseados em livros de sua própria autoria.

Confesso (e já confessei aqui coisas muito mais graves): nunca tinha ouvido falar, ou não me lembrava de ter ouvido falar em Richard Matheson. Ignorância minha. Não tenho idéia de se as pessoas ligam o nome às obras dele. Richard Matheson foi o autor, em 1951, da novela The Shrinking Man; concordou em vender os direitos de adaptação do texto para o cinema desde que ele mesmo escrevesse o roteiro, e foi o autor do roteiro de The Incredible Shrinking Man, de 1957, hoje tido como um clássico. Foi o autor do conto “Duel” e também do roteiro do filme do mesmo nome – Encurralado, o filme que revelou o gênio Steven Spielberg.

Foi também  o autor da novela I Am Legend; como até já foi dito aqui neste site, esse livro de Matheson virou o filme The Last Man on Earth, em 1964, dirigido por Ubaldo Ragona e estrelado por Vincent Price;  em 1967 virou um curta-metragem espanhol com o título de Soy Leyenda; aí a Warner comprou os direitos de filmagem do livro, e, em 1971, lançou The Omega Man, dirigido por Boris Segal, com Charlton Heston no papel que tinha sido de Vincent Price e, em 2007, foi refilmado com Will Smith no papel central e Alice Braga com boa participação.

E tem muito mais. Richard Matheson foi autor de diversas das tramas de Histórias Maravilhosas/Amazing Stories e No Limite da Realidade/Twilight Zone, duas séries que marcaram época na TV.

O sujeito tem uma imaginação inesgotável.

         É sempre bem-vindo um filme que discute valores morais

Matheson não participou desta adaptação de seu conto “Button, Button” para o cinema. Aos 83 anos, desfruta de merecidíssima aposentadoria. Sua história foi escrita para o cinema pelo jovem Richard Kelly, garotão nascido em 1975, exatamente no Estado da Virginia, bem pertinho de Washington, D.C, o Estado onde ficam as sedes da CIA e da Agência de Segurança Nacional. Em 2001, Richard Kelly escreveu e dirigiu Donnie Darko, um filme que eu não vi, mas, aparentemente, deixou meio mundo impressionado.

Sabe fazer cinema, o garotão Richard Kelly. Cria clima, deixa o espectador curioso, temeroso, às vezes abertamente apavorado. Dirige bem os atores (até a insossa Cameron Diaz está bem), não tenta criativóis, invenciones – nem seria preciso, com uma trama que envolve o sobrenatural, o além do que conhecemos.

Tem o mérito de discutir valores, num mundo, numa sociedade, que anda precisando desesperadamente fazer isso – redescobrir valores, reencontrar valores.

Não sei se Sartre, Goethe ou Wilde gostariam deste filme. Danem-se eles. Tenho quase absoluta certeza de que Fredric Brown gostaria. E, portanto, é um filme que vale a pena ver.

A Caixa/The Box

De Richard Kelly, EUA, 2009

Com Cameron Diaz (Norma Lewis), James Marsden (Arthur Lewis), Frank Langella (Arlington Steward), James Rebhorn (Norm Cahill), Holmes Osborne (Dick Burns), Sam Oz Stone (Walter Lewis), Gillian Jacobs (Dana)

Roteiro Richard Kelly

Baseado no conto Button, Button, de Richard Matheson

Fotografia Steven Poster

Música Win Butler, Regine Chassagne e Owen Pallett

Produção Darko Entertainment, Media Rights Capital

Cor, 114 min

***

8 Comentários para “A Caixa / The Box”

  1. Os comentários na internet só trazem críticas. Mas eu também gostei… bastante. Um filme de horror, que aguça a curiosidade. Bacana.

  2. Vi hoje e não fiquei entusiasmado, a partir do meio comecei a ficar um tanto saturado com todos aqueles mistérios e fantasias sobrenaturais.
    Tem uma moral,lá isso é verdade, mas nem é uma surpresa.

  3. Só hoje vi que o realizador é o mesmo de Donnie Darko que eu vi e que me deixou completamente KO, zarolho, de rastos.
    Não percebi nada, absolutamente nada.
    Falei com um amigo que deu uma explicação que ainda me deixou pior.
    O meu QI baixou para uns 20 ou 30.
    Se eu sabia tinha evitado este.

  4. Uma crítica apurada e sincera sobre um filme controverso. É um filme mais complexo que Donnie Darko. Uma premissa visceral e estarrecedora que incorpora a filosofia de Jean-Paul Sartre, o gnosticismo maçônico, o esoterismo e os dilemas éticos e morais. O brilhante diretor explora com sutileza e maestria os limites da subjetividade. Abaixo uma interpretação do enredo. CURIOSIDADE Há uma cena que exibe abertamente a carteira de cigarros Marlboro e reza a lenda que existem 5 símbolos maçônicos ocultos na mesma. O filme Agentes do Destino (The Adjustment Bureau) versa sobre partes do mesmo tema (governo oculto). É baseado no conto Adjustment Team de Philip K. Dick cujo autor Richard Kelly demonstra ter influências e utilizado diversos conceitos para seus filmes. ENREDO A história se passa em 1976, onde Arthur e sua esposa Norma acabam de adquirir uma casa nova. Eles são a típica família de classe média suburbana, retratada de forma medíocre. No início, há um informativo de que Arlington Steward foi ressuscitado e liberado da unidade de queimados. Numa manhã, Arlington chega num Lincoln preto, como um “homem de preto” e misteriosamente deixa uma caixa na porta da casa do casal. Arthur dirige-se para a NASA e dedica-se a construir um pé protético para Norma e seu pé mutilado. Norma descobre que a caixa contém um botão vermelho, enquanto isso, Arthur é rejeitado como astronauta, um objetivo pessoal de longa data e o financiamento para a casa nova e as prestações do carro. Norma ensina Inglês numa escola católica privada local e estuda o ensaio “Sem Saída” de Jean-Paul Sartre. Um aluno intrometido tenta constranger Norma, pedindo que mostre a classe o pé e revele porque manca. Norma aceita e mostra. Puxando o fio do novelo filosófico de Sartre, ou seja, à medida que amadurecemos, nos escondemos atrás de “máscaras” ao mesmo tempo que somos livres e os únicos responsáveis por nossos atos. O pé defeituoso de Norma é uma imperfeição a esconder, um lembrete de que a bela aparência mascara a fachada do pé mutilado. Se Norma aceitasse o defeito, ela realmente seria livre dos estigmas que as imperfeições produzem em nossa psique. Norma comenta em sala de aula a famosa citação, “o inferno são os outros”, pois, os outros “conhecem nossos defeitos.” Observa-se que o filho do casal não acredita em Papai Noel quando o assunto vem à tona na cozinha, pois Arthur sendo um cientista, transferiu inconscientemente isto ao menino (na visão de Sartre). O cientificismo é outra máscara para Sartre ao afirmar que os cientistas se escondem atrás da máscara da racionalidade e quando surge um mistério inexplicável pela ciência, evitam uma conclusão temerária. Porém, Arthur e Norma estão prestes a descobrirem algo que nunca poderiam imaginar. Na manhã seguinte, há uma conferência de imprensa na NASA sobre o lançamento da próxima Sonda exploratória em Marte, curiosamente o porta-voz efetua declarações sobre a descoberta de “vida” e “antigas civilizações alienígenas.” No entanto, A Caixa vai dar-nos uma pista velada de como os “alienígenas” realmente são. Durante a conferência, uma repórter pergunta por que a NASA está trabalhando com a NSA e fica sem resposta. Além disso, Norma perde o subsídio para os estudos do filho, percebendo que o nariz do diretor sangra quando a informa. Mais tarde, Arlington chega oferecendo um milhão de dólares se o casal apertar o dispositivo-botão que resultará na morte de alguém que não conhecem. Eles têm 24 horas para tomar uma decisão e, não aceitando a oferta, A Caixa será levada e reprogramada. Steward deixa uma nota de cem dólares com Norma (despertando a dúvida e a tentação na consciência humana). O casal se encontra num dilema ético e moral. Na próxima seqüência, vemos a imagem de uma câmera de vigilância da NASA direcionada aos trabalhadores e um homem estranho de terno olhando pra câmera. Esta figura é uma pista que só aparece no filme um par de vezes (olhando propositalmente do fundo). Ele é outro “homem de preto” que representa o “governo oculto”, o controle da NSA e da NASA. Não se sabe sua identidade, além de que é o “patrão” de Steward e um representante ou o próprio empregador. Norma decide apertar o botão, depois de tentar persuadir Arthur ainda duvidoso sobre a forma de obtenção deste dinheiro. O casal vai assistir a peça “Sem Saída” do mesmo ensaio que Norma abordou em sala de aula. No ensaio de Sartre, três pessoas descobrem que foram escoltados ao inferno por um condutor-demônio, assim como, no filme ocorre algo parecido com o casal e o filho, onde o tormento acaba sendo um ao outro. Começamos a perceber que Arthur, Norma e o filho estão sendo escoltados até o seu “inferno pessoal”. Aprisionados em suas vidas de desejos escondidos e segredos não revelados (o filho do casal é sempre o último a “não” saber). No fim da peça novamente aparece o “homem de preto” passando ao fundo do palco e, a seguir, a câmera foca um homem idoso como se estivesse hipnotizado (agindo de forma robótica como o Papai Noel que “provoca” uma colisão entre o carro em que se encontra Arthur e um caminhão. Assim como, os “empregados” de Steward). Nota-se que ao longo do filme a televisão está sempre ligada na casa do casal, mostrando brevemente o que é relevante num nível esotérico. O casal vai a uma festa de Natal com os colegas de trabalho onde as coisas começam a ficar estranhas. Certas pessoas observam o casal com olhares de reprovação, ao mesmo tempo em que fazem a brincadeira de escolha aleatória dos presentes sob a árvore. Um garçom (que é o aluno intrometido de Norma) faz um sinal de paz (dois dedos formando um V) e Arthur pega uma caixa com uma foto borrada de Arlington como presente. Enquanto isso, a babá que está cuidando do filho do casal, percebe que os dois estão sendo observados por um estranho através da janela. Os dois vão até o porão após uma discussão de histórias em quadrinhos, e numa das capas das revistas de Arthur há um alienígena, um caixão flutuando no espaço e um crânio ultrapassando um portal (o pilar gnóstico-cabalístico e os símbolos ritualísticos de iniciação?). A babá olha uma gravura fixa na parede e pergunta do que se trata. O filho do casal afirma que é a “terceira lei” de Arthur C. Clarke e que seu pai o conhece. A frase é uma pista de um conhecimento esotérico, ou seja, “qualquer tecnologia suficientemente avançada é indistinguível de magia”. E Arthur irá vivenciar eventos que a ciência não explica. De volta a festa de Natal, o garçom e aluno de Norma provoca Arthur, rindo do episódio em que a humilhou devido ao pé defeituoso. Outro garçom avisa Norma que há um telefonema para ela, então esquece o que estava fazendo e seu nariz começa a sangrar. Arlington sabe que Arthur tentou rastreá-lo e adverte Norma de que eles fizeram um acordo que não pode ser quebrado. Arthur esmurra o aluno de Norma que ri e faz o sinal de paz. Os dois abandonam a festa e o cara que estaciona os veículos faz o sinal de paz, enquanto o casal dá a partida no carro. No gelo do pára-brisa do carro está escrito “Sem Saída” (o ensaio de Sartre novamente). Arthur descobre por intermédio do pai de Norma e policial que o carro de Arlington está registrado em nome da NSA. Arthur percebe que sua família está sendo constantemente vigiada. A seguir, uma cena bizarra aparece na televisão da família, ou seja, as Torres Gêmeas estão fora do lugar onde foram construídas. Não estão no terreno em Lower Manhattan e congelando a imagem se percebe pelos prédios vizinhos e pela bacia oceânica. (O que faz um galeão espanhol dos séculos passados cruzando na frente das torres?). Duas torres e dois pilares “em queda” são relevantes para a cabala e para a maçonaria (as duas portas Jaquim e Boaz). Lembrando que em 9/11 três torres caíram, e não apenas duas. No ocultismo, o pilar do meio significa equilíbrio entre os dois pilares laterais de misericórdia e gravidade, bem como, o “pilar de iniciação e integração.” É o equilíbrio entre o yin e o yang, o macho e a fêmea e etc.. . O filho pode ser o pilar do meio, neste caso, o equilíbrio entre Arthur e Norma. O pilar do meio se refere ao cubo de seis lados do espaço (com todas direções), o cubo perfeito. E um cubo perfeito é uma caixa. A destruição das torres gêmeas, intrinsecamente, sugerem uma nova ordem das idades e, grande parte das teorias de iniciação incluem a morte da essência espiritual anterior (velha) e a ressurreição da próxima (nova). Eis o que se aproxima de Arthur. Voltando ao enredo, Arthur leva a babá para casa e ela percebe que há sangue nas mãos do mesmo (sangue em suas mãos como idéia de culpa?). A babá diz para Arthur olhar para a “luz” como solução para os problemas que ele enfrenta e que a “luz” o cegará. Então o nariz da babá começa a sangrar e há uma constante alusão à sangue no filme, e sangue é vermelho. Por sua vez, Arthur está trabalhando numa missão a Marte, o “Planeta Vermelho” e, também considerado o “deus da guerra” e o capeta para quem aprecia sua companhia. Outra pista lançada no enredo. Arthur descobre que a babá usa um falso nome ao pegar sua carteira de identidade (ela deixa cair). Na cena seguinte, é revelado que Arlington está construindo uma espécie de portal nas instalações da NASA e que esta é obrigada a colaborar com a NSA. Uma notícia televisiva informa que “a águia pousou” e a missão a Marte vai revelar definitivamente que há “vida em outros planetas.” (seria um meio de desviar a atenção para o que se passa na Terra?) Então, a NSA está vinculada com a NASA e os “empregados” de Arlington sofrem uma lavagem cerebral para serem usados como “cobaias” em seu portal tecnológico “de luz.” Neste momento é revelado como Arlington morreu, ou seja, atingido por um raio 5 vezes superior a temperatura solar. Quando “ressuscitou” era uma “entidade” diferente com fins de servir a um “empregador”. Superficialmente, o enredo dá a entender que sua consciência foi dominada por uma inteligência alienígena (os empregadores de Arlington). Porém, o raio é “luz”, a “luz” de iniciação do gnosticismo maçônico que afasta a premissa de dominação extraterrena. Na seqüência, Arthur (por meio de uma fotografia de Arlington contendo o endereço da biblioteca) e Norma (por meio do aviso da jornalista que não teve sua pergunta respondida na conferência da NASA) são levados até a biblioteca pública. A biblioteca é uma casa de conhecimento (gnose significa conhecimento) e é lá que Arthur tem seu ritual de iniciação maçônico particular. Arthur é levado numa procissão litúrgica pelos “santos da biblioteca” (na verdade uma igreja ocultista) até uma porta em que aparece a esposa de Steward e lhe é concedido uma “bênção” litúrgica ocultista” (os braços da Sra. Steward estão, claramente posicionados como o sinal-bênção maçônico) Há uma grande pintura exposta acima da entrada da porta mostrando um santo cuja a forma é similar a posição de iniciação de um mago gnóstico. Arthur compreende agora que ciência e magia são indistinguíveis (a terceira lei de Arthur C. Clarke na gravura fixada no porão da casa deles). Ao adentrar a sala, a esposa de Arlington revela-se como Clymene (uma referência à deusa de Klymenos ou Hades?), sendo mostrado a ele três pilares de água. Ele deve escolher apenas um para obter descanso em “danação eterna”. Arthur recorda que vários “empregados” fizeram o sinal de paz, levantando dois dedos. Então, ele escolhe o “pilar do meio” (do equilíbrio e da harmonia). Ele é levado para a “luz”, descrevendo mais tarde como o “céu” e ausência de angústias interiores. No mesmo momento, Norma está sendo iniciada em outra parte da “biblioteca”, numa forma ritualística diferente e, por Arlington Steward. Ela afirma que sentiu “amor” quando viu o Sr. Steward pela primeira vez e Arlington diz para ela pegar sua mão. Percebe-se uma sutil referência ao casamento esotérico e uma conjugação holística. Norma desperta em sua cama. Há um imenso cubo flutuando sobre sua cabeça. Arthur desperta no interior do cubo que se desfaz em torrentes de água e despenca na cama ao lado de Norma. Arthur passou pelo seu batismo, dentro de uma “caixa” aquática e renasceu. Lembrando que caveiras, caixões e morte são, simbolicamente, utilizados em cerimônias de iniciação religiosa. O filme mostra através de Arthur como Steward faz a experiência e a experiência é realizada de forma maciça pelo “governo oculto” que são os empregadores do mesmo. Porém, não se trata de um “governo oculto” local. Há uma referência estarrecedora sobre o domínio do “governo oculto”, no momento em que a câmera foca uma tela enorme e vários quadrados azuis se alternam e formam um mapa do globo terrestre. Trata-se dos primeiros mapas criados pelo Google com a disposição real de domínio do “governo oculto”. Dando seguimento, um subalterno de Stewart na NSA questiona porque está sendo realizada a experiência e Arlington responde que a experiência é para decidir se a humanidade permanecerá viva ou será exterminada. A experiência envolve dinheiro com notas do Federal Reserve e o dilema ético e moral de satisfazer seus desejos pessoais, condenando outro ser humano à morte ou manter o bem maior, o altruísmo humanitário. Arlington não faz o pagamento por meio de imóveis, ações ou barras de ouro. Utiliza-se do papel-moeda que é uma das formas de controle da população pelo “governo oculto”, ou seja, através do controle da emissão de moeda (e, por isso, livre de impostos como afirma). Voltando ao filme, O subalterno pergunta o que ocorrerá quando o teste da caixa terminar, respondendo Steward que passará à próxima experiência. O próximo passo é alinhar grupos de pessoas da população mundial secretamente e enviá-los ao portal que servirá para os testes subsequentes e realiza uma espécie de lavagem cerebral coletiva (uma segunda chance antes do extermínio?). Dando a entender que a proposta com A Caixa e o disposito-botão falharam, pois Steward afirma que a maioria apertou o botão e optou por satisfazer o desejo de ganância. A iniciação de Arthur não está terminada e, tanto ele quanto seu filho são capturados pelos homens de preto. O filho é batizado numa piscina pela esposa de Arlington e seus “empregados” enquanto Arthur deixa um hangar da NASA sob intensa luminosidade. Pelas imagens anteriores, verifica-se que o hangar é o mesmo em que Steward construiu o imenso portal de pretensa lavagem cerebral (a câmera mostra raios sob o hangar antes da saída de Arthur e seu encontro com agentes da NASA e NSA). Seus sentidos são alterados, pois ele estava fora do tempo e do espaço no éter da iniciação, e emergiu na Terra (agora Arthur fora atingido por raios como Steward). Porém, sua purgação não terminou, pois deve sacrificar Norma ou seu filho para manter o planejamento dos empregadores de Steward. Há uma simulação de escolha e de livre arbítrio para Arthur, pois foi Norma que apertou o botão. Mesmo que seu desejo seja condenar o filho à cegueira e à surdez, a depuração mental e espiritual foram pré-determinadas. E a última referência a Sartre é feita por Arthur, quando afirma que a Terra é o purgatório e que Stewart está ali para levá-los ao inferno (o enredo de “Sem Saída” ). Acaba matando Norma para que o filho volte a enxergar e a ouvir. Arthur não é preso pelos policiais e os homens de preto intentam tomar conta do mesmo, pois se trata de um iniciado que sacrificou seus desejos pessoais em benefício da coletividade. Seu filho permanece sob os cuidados do “governo oculto” e, simbolicamente, o valor de um milhão de dólares será empregado nas despesas do garoto até que atinja a maioridade. Vamos abrir a discussão e demais pontos de vista. danielbrasilsm@hotmail.com

  5. OUTRA CURIOSIDADE
    Arlington Steward foi atingido por um raio 5 vezes mais quente que o solar, a estrela de 5 pontas ou pentagrama exotérico é muito importante no ocultismo, além de haver uma cena que exibe abertamente a carteira de cigarros Marlboro e rezar a lenda que existem 5 símbolos maçônicos ocultos na mesma.

  6. Li há dias um livro de Eça de Queiroz com o título “O Mandarim”.
    Trata-se de uma novela fantástica e que é de um género único na obra de Eça.
    Começa assim:
    No fundo da China existe um Mandarim mais rico que todos os reis de que a Fabula ou a Historia contam. D’elle nada conheces, nem o nome, nem o semblante, nem a sêda de que se veste. Para que tu herdes os seus cabedaes infindaveis, basta que toques essa campainha, posta a teu lado, sobre um livro. Elle soltará apenas um suspiro, n’esses confins da Mongolia. Será então um cadaver: e tu verás a teus pés mais ouro do que póde sonhar a ambição d’um avaro. Tu, que me lês e és um homem mortal, tocarás tu a campainha?
    O mesmo ponto de partida o resto é muito diferente.

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