0.5 out of 5.0 stars
Anotação em 2009: Em O Casamento (no original, “o diretor dos casamentos”), o filme de Marco Bellocchio de 2006, há um personagem secundário, um diretor de cinema, que afirma que “na Itália, é a morte que comanda”. Ele está convencido de que, se for divulgada a notícia de sua morte, seu filme mais recente ganhará naquele ano os prêmios David di Donatello, o Oscar italiano.
O personagem se chama Orazio Smamma (Gianni Cavina). O protagonista do filme, Franco Elica (interpretado por Sergio Castellito), ele próprio um respeitado diretor do cinema italiano, ouve a notícia da morte de Smamma – assim como o espectador. Depois, lá pela metade do filme, no entanto, Elica está à noite numa praia da Sicília e vê um homem que entra no mar, todo vestido, fumando um cigarro. Elica vai lá, pega o homem pelo braço e o conduz de novo até a praia. É Smamma. Ele havia sido dado por morto, mas, não, está ali, vivinho da silva. E então Elica o questiona, pergunta o que aconteceu, que história era aquela de ele ter sido dado como morto.
E aí o espectador, assim como o protagonista Elica, ouve Smamma pronunciar o seguinte discurso, que tive a pachorra de degravar:
“Franco Elica. Seu nome não será lembrado. Assim como o meu. Falhamos por não saber como viver. Então não podemos usar os filmes para descrever o mundo de hoje. E ninguém liga patra o nosso mundo. Quando crianças, fomos mandados para escolas de padres, e os padres nos faziam ver filmes. Todas aquelas imagens em minha infância me traumatizaram por crer que aquilo tudo era verdade. Aquele mundo deixou de existir. O público hoje não dá a mínima se está vendo Os Noivos ou a maldita Divina Comédia. Devemos desaparecer – valemos mais mortos. Não, você, não. Você ainda está vivo, então não vale nada. (…) Meus produtores me prometeram que depois de todas as injustiças, depois de todos os maus tratos, eu ganharia este ano. Que este ano o cinema italiano me reconheceria. Mas… (…) As panelinhas no mundo do cinema italiano, os da esquerda, do centro… Os da direita, não, eles não valem nada para o cinema. Todos eles começam a telefonar uns para os outros. E percebi que não ganharia este ano. Mas é tudo dentro das regras da premiação. Eles seguem as regras, as panelinhas se comunicam, fazem acordos, trocam votos. Não há crime nisso, é a democracia. Um amigo, um ex-monge que mora aqui, me fez a proposta, porque ele temia que eu poderia me matar, ou algo assim. Ele me disse que havia uma forma garantida de ganhar: morrendo. Na Itália, é a morte que comanda.”
Um grande embuste, um filme babaca, fingido, com ares pomposos, e chato, chato, chato
Na minha opinião, essa situação, essa seqüência, e esse texto que o personagem Orazio Smamma diz, são um bom exemplo do que é este filme de Bellocchio. São emblemáticos, exprimem muito bem o espírito do filme. É um grande embuste. Um filme chato, insuportavelmente chato. Pretensioso, metido a besta, babaca, intelectualóide, fingido, com ares pomposos de coisa inteligente e profunda – e nada mais que chato, insuportavelmente chato. Refugia-se em uma pretensa linguagem empolada, surreal, para tentar esconder que não tem nada a dizer. Bellocchio fala para uma panelinha (para usar a expressão utilizada na tradução da fala de Smamma), no mais autêntico panelinhês. É um filme para agradar aos críticos de nariz empoado e às platéias de festival, não um filme para seres humanos.
Naturalmente, o filme foi exibido em Cannes. E teve três indicações exatamente para o David di Donatello – direção, atriz para Donatella Finocchiaro e montagem para Francesca Calvelli.
Para que esta anotação não fique apenas como um desabafo, como um jus sperneandi, transcrevo o que diz sobre o filme o AllMovie:
“Depois de ir dar numa linda pequena cidade da Sicília, tentando fugir do casamento de sua filha com um católico devoto, um famoso diretor de cinema fica inexoravelmente envolvido nas núpcias de outra bela noiva no drama semi-surreal do diretor Marco Bellocchio. Embora ele tente se manter anônimo ao chegar à Sicília, o diretor Franco Elica (Sergio Castellitto) logo chama a atenção do empobrecido príncipe de Gravina (Samy Frey) – que cordialmente convida o cineasta a assistir ao casamento de sua filha Bona (Donatella Finocchiaro). Bona tentou aparecer no último filme do diretor, uma adaptação cinematográfica do clássico literário italiano Os Noivos. Nos dias que precedem o casamento, o cineasta desenvolve um profundo afeto pela bela Bona e começa a fazer tudo o que está em seu poder para sabotar o casamento dela com um advogado rico.”
“Casamento de sua filha com um católico devoto.” Dei uma olhadinha no Google, e vi em diversos sites uma sinopse sobre este filme que começa assim: “Franco Elica é um cineasta preocupado com o casamento de sua filha com um católico extremista”. Alguém deve ter distribuído um release sobre o filme usando uma expressão parecida com essa, e até mesmo o AllMovie entrou nela, usando “católico devoto”. Fico imaginando: de onde será que tiraram isso? O filme abre numa cerimônia de casamento, o casamento da filha do protagonista Franco Elica. Vi, revi, e não consegui enxergar nada que me dissesse que o noivo da moça é um católico devoto, muito menos extremista – aliás, o que é um católico extremista?
O AllMovie cita Os Noivos. As legendas do DVD usam A Noiva. O livro que o diretor Franco Elica está para filmar é Os Noivos, I Promessi Sposi, de Alessandro Manzoni (1785-1873). Parafraseando o Millor, ah, literatura, quantos crimes se cometem em teu nome.
Agora, numa coisa Bellocchio tem toda a razão: neguinho que faz esse tipo de filme deveria mesmo desaparecer.
O Casamento/Il Regista di Matrimoni
De Marco Bellocchio, Itália-França, 2006
Com Sergio Castellito, Donatella Finocchiaro, Samy Frei, Gianni Cavina, Bruno Cariello, Simona Nobili, Claudia Zanella
Argumento e roteiro Marco Bellocchio
Montagem Francesca Calvelli
Produção Dania Film, Eurimages, Rai Cinema, Surf Film
Cor, 97 min
1/2
AMEI ESTE FILME!!!! O sergio Catellitto é demais!!!!! filme sulreal!!!!!
Mas Sérgio, vc não existe, se o filme era tão ruim, pq vc o viu até o fim?Tem vezes q leio as suas críticas, mesmo sabendo q não vou ver o filme, já q vc já começa falando mal dele, mas faço questão de ir até o fim, de sofrer junto com vc, não vendo o filme, é claro, aí já é pedir demais de uma amiga, só a Mary poderia, talvez, veja bem, talvez, fazer esse sacrifício. Mas compartilhando do seu sofrimento, creio q estou dando provas de solidariedade humana, certo?Mas tem um lado sádico meu q, incentivado pelo seu humor negro, acaba se estabacando de rir da sua maneira de se expressar. Isso é lá maneira de finalizar uma crítica a um pobre de um cineasta q suou tanto p fazer o seu filme:
“neguinho que faz esse tipo de filme deveria mesmo desaparecer”rsrsrs.
Guenia Bunchaft
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