3.0 out of 5.0 stars
Anotação em 2009: Um competente, muito bem feito thriller de espionagem, contra-espionagem e guerras internas nos serviços secretos soviético e inglês, baseado em um dos muitos best-sellers de um dos mestres do gênero, o inglês Frederick Forsyth, autor, entre tantos outros, de O Dia do Chacal e O Dossiê Odessa.
O próprio Forsyth assina o roteiro do filme, embora haja crédito também a George Axelrod e Richard Burridge, este último autor, segundo se diz na apresentação, de material adicional ao escrito pelo romancista.
As tramas de Forsyth em geral se baseiam em fatos e personalidades reais, históricos; é a partir deles que o escritor tece suas teias intrincadas, complexas. Esta aqui não é diferente. O filme abre com a seguinte explicação, dada em um letreiro:
“1963 – O agente britânico Kim Philby deserta para Moscou
“1968 – Estados Unidos, Grã-Bretanha e Rússia assinam acordo suspendendo a disseminação de armas nucleares.
“Este acordo tinha quatro protocolos secretos.
“Atualmente, resta apenas um.”
O “atualmente” a que o letreiro se refere são os anos 80; o livro foi publicado em 1984, e o filme é de 1987 – a União Soviética, portanto, ainda existia, e é até estranho que o letreiro diga Rússia, em vez de URSS.
Segundo a ficção criada por Forsyth a partir de fatos e personagens históricos, esse tal quarto protocolo acordado por Estados Unidos, URSS e Grã-Bretanha proibia que armas atômicas fossem acionadas por outras formas que não as convencionais, ou seja, o lançamento por aviões, navios ou mísseis. Isso era permitido – só não podia haver detonação de bomba atômica enviada por correio, ou montada secretamente perto dos eventuais alvos.
Isso parece, para qualquer mente humana sensata, uma arrematada loucura, um non-sense completo – lançar bomba atômica pode, só não pode ser mandada pelo correio -, mas é assim que de fato funcionam as coisas acertadas entre os governos. É tão absolutamente non-sense como a Convenção de Genebra, por exemplo, que estabelece o que pode e o que não pode ser feito numa guerra.
Então vamos em frente. Temos, logo no início do filme, que há duas linhas diferentes, antagônicas, dentro do serviço secreto inglês; são dois grupos que se digladiam pelo poder, um querendo sempre ferrar o outro, é claro. No meio desse tiroteio interno está um dos protagonistas da história, John Preston, o personagem do grande Michael Caine, um agente correto, competente, dedicado, que é odiado por um dos lados da guerra interna.
Depois veremos que o mesmo acontece no front soviético – há uma dura luta pelo poder dentro das próprias agências de informação da URSS. Isso é bem típico de Forsyth.
Um dos líderes da inteligência soviética – que se opõe aos métodos de um dos chefes da KGB – encarrega um oficial bem treinado e bem preparado de uma missão ultra-secreta na Inglaterra. O oficial se chama Valeri Petrofsky; ele já viveu na Inglaterra, tem um inglês perfeito, e por isso poderá se estabelecer lá, sob o nome de James Edward Ross. A missão dele é exatamente fazer o que o tal quarto protocolo proíbe: a montagem e posterior detonação, junto de uma base aérea americana na Inglaterra, de uma bomba atômica.
Petrofsky-Ross é interpretado por um Pierce Brosnan extremamente jovem, de início de carreira, muito antes de virar James Bond e um grande astro. Na época, 1987, ele já havia participado de vários episódios feitos para a TV, mas este aqui foi um de seus primeiros filmes.
Há uma seqüência fascinante, já com a filme bem avançado, que não tem absolutamente nada a ver com a trama de espionagem que está sendo contada. É extremamente interessante, porque parece ter sido colocada lá por dois motivos básicos: para ilustrar quem é o personagem John Preston, o que ele pensa da vida, e também para indicar a posição ideológica dos próprios autores – o escritor Forsyth e o diretor John Mackenzie. É uma seqüência em que John Preston está no metrô, e dois fascistóides, neonazistas, agridem uma mulher negra. Preston dá uma surra nos imbecis. Bela cena. Michael Caine deve ter ficado feliz por fazê-la.
Há ainda outra cena especialmente interessante, quando a especialista soviética em armamentos, Irina Vassilievna, está fazendo seu trabalho, um trabalho perigosíssimo; ela é bem treinada, competente, mas a tarefa é duríssima, e a câmara focaliza o rosto da atriz Joanna Cassidy e vai descendo e mostrando o suor que empapa o pescoço e o peito dela. É uma cena forte, bela, sensual.
O iMDB traz uma informação gostosa: a voz de um locutor da Rádio de Moscou, na sua programação em inglês, que é ouvida numa seqüência de muita ação e tensão, quase no final do filme, é do próprio Frederick Forsyth.
E, sim, uma característica importante. A trilha sonora – ótima – é do veterano argentino há muitas décadas radicado nos Estados Unidos Lalo Schiffrin, o autor de um disco extraordinário, que tem um dos títulos mais estranhos da história, The dissection and reconstruction of music from the past as performed by the inmates of Lalo Schifrin’s demented ensemble as a tribute to the memory of the Marquis de Sade; Schifrin compôs as trilhas sonoras de dezenas de filmes, entre eles Bullitt e Dirty Harry; fez jazz e cortejou o erudito, mas seu trabalho mais conhecido é o tema de Missão Impossível, composto para a série de TV e que foi usado também nos filmes estrelados por Tom Cruise.
De fato, é um filme bem competente.
O Quarto Protocolo/The Fourth Protocol
De John Mackenzie, Inglaterra, 1987
Com Michael Caine, Pierce Brosnan, Joanna Cassidy, Ned Beatty, Ian Richardson
Roteiro Frederick Forsyth, George Axelrod, Richard Burridge
Baseado no romance de Frederick Forsyth
Música Lalo Schifrin
Produção Rank
Cor, 119 min
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