3.0 out of 5.0 stars
Anotação em 2009: Um western de produção classe A, alguns furos na trama, um tom sério, sombrio, um tema básico do gênero – a vingança – e outro bem mais raro: o arrependimento.
Produção classe A: Henry King é um diretor competente, nunca abaixo do correto; prolífico, fez mais de cem filmes, de praticamente todos os gêneros, desde 1915, no período do cinema mudo, até 1962. O elenco tem Gregory Peck, Joan Collins (na sua época áurea), Stephen Boyd, Lee Van Cleef em começo de carreira, o competente coadjuvante Henry Silva, e até Joe De Rita, que depois viraria um dos Três Patetas. A trilha sonora, que me pareceu um tanto óbvia e estridente, é de Lionel Newman, um nome conceituado. A fotografia, em belo CinemaScope, é bem cuidada; as belas paisagens são naturais, não há o recurso fácil da transparência. E o roteiro é de Philip Yordan, um Oscar e duas outras indicações.
Guias, como o de Leonard Maltin, e outros livros, como Great Hollywood Westerns, de Ted Sennett, e The Films of 20th Century Fox, revelam o final da história, o que parece absolutamente injusto para quem não viu o filme e pode querer ver. Não vou fazer isso. Da história, conto o começo: o filme abre com um estranho, Jim Douglass (o papel de Gregory Peck) chegando a uma cidadezinha do Sudoeste americano, não muito distante da fronteira com o México, chamada Rio Ariba, na véspera do dia marcado para o enforcamento de quatro bandidos que assaltaram o banco do lugar e mataram um caixa; foram então perseguidos, presos, julgados e condenados.
Rio Ariba é uma cidade bem pequena, e calma; nunca tinha acontecido nada parecido ali. Tanto que tiveram que pedir a ajuda de um carrasco de uma outra cidade para vir executar as sentenças de morte. Por isso, quando Jim Douglass, o estranho, chega à cidade, meio mundo vem cercá-lo na rua depois que ele teve uma conversa com o xerife.
Como tantos outros personagens de western, Jim Douglass é homem de poucas palavras. Na conversa com o xerife e depois com diversos cidadãos de Rio Ariba, na rua, perguntam a ele o que veio fazer ali; responde que veio ver o enforcamento; perguntam se ele conhece os homens, ele diz que não. Perguntam então se ele veio pelo puro prazer de ver enforcamentos, e ele não responde nada.
Rio Ariba, repito, é uma cidade pequena, num país gigantesco como os Estados Unidos, mas, como em tantos outros westerns, há coincidências fantásticas. Logo depois de ser abordado na rua pelo monte de gente que o questiona, Jim Douglass é procurado por uma bela jovem, Josefa (Joan Collins), que tem uma fazenda ali. Tinham-se conhecido mais de quatro anos antes, em Nova Orleans. (Como viajavam país afora, os personagens dos westerns). Veremos mais tarde que tinham sido apaixonados, mas depois se separaram; Jim Douglass se casou em seguida com outra mulher, e teve uma filhinha.
Ainda uma palavrinha sobre Rio Ariba: ao contrário da imensa maioria das pequenas cidades do Oeste, Rio Ariba é um lugar bonitinho; as edificações são sólidas, bem cuidadas, e – o que é mais estranho ainda – as ruas são arborizadas. A memória pode estar me pregando peças, mas não lembro de outra cidadezinha do Oeste que fosse arborizada.
Bem. O personagem Jim Douglass e o roteirista Philip Yordan demoram um pouco para confessar, mas a verdade é que o estranho que apareceu na cidade para o enforcamento passou os seis meses anteriores caçando aqueles quatro bandidos – dois brancos, um mestiço e um índio, como ele os identifica. Foi lá para conferir que de fato eles iriam ser enforcados, poupando-lhe o trabalho, como ele mesmo diz. O motivo de seu desejo de vingança só será abertamente exposto com a segunda metade do filme já bem avançada.
Com uns 15, 20 minutos de filme, os bandidos conseguem fugir da cadeia, levando com eles a bela filha (Kathleen Gallant) do mais rico comerciante do lugar. O espectador já sabe, a essa altura, que o líder dos bandidos, Zach (o papel de Stephen Boyd), é um total tarado. Naturalmente, Jim Douglass vai comandar a perseguição aos fugitivos.
Falei de furos na trama; são vários, de variadas gravidades; vou descrever pelo menos um para me justificar. Logo no início da perseguição aos fugitivos, três deles se adiantam, e um fica para trás, no alto de uma garganta, de onde poderá matar quem quer que tente passar. O povo da cidade chega, ele atira em dois, todos recuam. Um dia depois, como por milagre, toda a trupe encarregada da caçada consegue passar pela garganta, sem ser importunada pelo bandido.
O tema do arrependimento é a característica mais forte do filme. É o que mais vale a pena nele, é o que faz a diferença.
Depois que fiz a anotação acima, vi a seguinte frase no iMDB: “Gregory Peck afirmou que o filme foi escrito como um ataque ao macarthismo, contra o qual ele se opunha fortemente”. Tem sentido, tem sentido, sim, e isso engrandece o filme.
Aliás, fala-se muito, nos livros e na internet, que Philip Yordan auxiliou muitos roteiristas que a histeria da caça às bruxas do macarthismo colocou na lista negra. Como o seu nome não estava entre os acusados de serem comunistas ou filo-comunistas, Yordan assinou diversos roteiros na verdade escritos pelos colegas proibidos de exercer a profissão. Um desses casos seria o roteiro de um western marcante, Johnny Guitar, que na verdade foi escrito por Ben Maddow, um nome da lista negra, mas foi creditado a Philip Yordan.
Estigma da Crueldade/The Bravados
De Henry King, EUA, 1958
Com Gregory Peck, Stephen Boyd, Joan Collins, Kathleen Gallant, Albert Salmi, Henry Silva, Lee Van Cleef, Joe De Rita
Roteiro Philip Yordan
Baseado em livro de Frank O’Rourke Música Lionel Newman
Produção 20th Century Fox.
Cor, 98 min.
***
Assisti Estigma da crueldade em 1960.
Marcou. Marcou pela sempre presença marcante da figura de Gragory Peck, ator que nunca será visto deslocado, pela lindeza de Joan Collins, poucas mulheres tiveram sua beleza, e pelo teor carregado do filme, uma vingança e um bruto arrependimento depois do depoimento de Henry Silva que era o último bandico que encerraria sua brutal vingança.
Mais uma bom filme de Peck.
Nota ZERO (0), não contou o fim do filme
Sou meio obtuso, e não entendi sua ironia, Mariano. Nunca conto final de filme – e se comento alguma coisa que acontece perto do final, aviso que é spoiler.
…três deles se adiantam, e um fica para trás, no alto de uma garganta, de onde…
foi uma técnica uasada pelos bandidos (previsto pelo personagem Jim Douglass) para atrasar os perseguidores (o povo da cidade) até o cair da noite, pois à noite, rastrea-los seria praticamente impossível, dando aos bandidos uma tremenda vantagem de fuga na noite.
É até um bom filme, mas excessivamente superestimado. O final é absolutamente broxante.
[SPOILER!]
Ao confrontar o último bandido, e ao perceber que caçou os homens “errados”, o personagem de Gregory Peck, mais do que arrependido, fica consternado com a comédia (tragédia?) de erros na qual foi enredado. Mesmo assim, ao fim das contas, o herói livrou o mundo de três monstros – que realmente seriam capaz de cometer o crime pelo qual foram perseguidos por Peck. E ficou barato para o personagem de Henry Silva: afinal, ele foi cúmplice de todas as barbaridades praticadas pelo bando, e foi também particular e indesculpavelmente no mínimo omisso no estupro da bela e pobre refém, Emma, a filha do comerciante (numa sequência realmente angustiante e perturbadora). Só pelo fato dele não ter cometido o crime pelo qual era acusado NÃO o fazia inocente de nada. O índio merecia no mínimo um “balaço” no joelho, para mancar o resto da vida e aprender a socorrer uma moça quando ela grita desesperadamente por socorro. Desgraçado.
Um pouco “atrasado” no comentário – só há poucos dias conheci este blog – rsrs, Sérgio, este é, em minha opinião, um dos melhores filmes que assisti.
Fotografia excepcional, temas-paisagens-desfecho não usuais em faroeste.