O título original do filme é o mesmo da canção famosérrima, “Tea for Two”. No Brasil e em outros países, ganhou o título de No, No, Nanette. A Nanette da história é interpretada por Doris Day, em seu primeiro papel como a principal figura do elenco, o primeiro nome a aparecer nos créditos iniciais.
Foi também o primeiro filme em que a então jovem atriz e cantora aparece dançando. Ela estava, em 1950, ano de lançamento do filme, com 28 anos. Havia estreado no cinema dois anos antes, em 1948, e este foi seu quinto filme. Mas já chegou a Hollywood famosa como cantora – aos 17 anos, em 1939, era a crooner da orquestra de Les Brown.
Antes dos 17, parecia destinada a ser dançarina. Tinha formado uma dupla com Jerry Doherty, um rapaz em Cincinnati, Ohio, sua cidade natal, e vencido um concurso local de dança. A dupla preparava-se para ir para Hollywood em busca de um lugar ao sol quando ela foi ferida num acidente envolvendo um trem e o carro em que estava.
Carreira de dançarina tornada impossível, tomou lições de canto, virou cantora, e de cantora virou atriz. Em Tea for Two, o segundo dos seus seis filmes na Warner Bros sob a direção de David Butler, então, pôde mostrar que, ferimentos curados, também sabia dançar.
Nanette aposta com o tio: passaria 2 dias sem dizer a palavra “sim”
A história que o roteirista Harry Clork escreveu para este Tea for Two, com base em um famoso e querido musical da Broadway chamado No, No, Nanette, é assim:
Estamos em 1929. Nanette Carter é uma jovem herdeira apaixonada por música e dança, cuja fortuna deixada pelos pais é administrada por um tio, J. Maxwell Bloomhaus (o papel do ótimo S.Z. Sakall, que fala com um sotaque alemão fortíssimo).
Em vez de procurar a segurança firme, tranquila, mas de baixa rentabilidade, dos títulos do governo, Maxwell, um investidor ousado, tinha botado todo o dinheiro da sobrinha em ações na Bolsa. E, em 1929, a Bolsa quebrou. Ações que valiam, como mostra um exemplo no filme, US$ 20,00, foram perdendo valor, perdendo valor, até chegar a menos de US$ 1,00.
Como tantas outras, a fortuna de Nanette praticamente virou pó.
Sem saber disso, confiando em que o titio tinha investido o dinheiro em opções seguras, Nanette continuava sua vida de herdeira rica. Tomava aulas de canto e de dança. Tinha bons amigos na área do teatro musical de Nova York – o dançarino Tommy Trainor (Gene Nelson) e, especialmente, o cantor e compositor e bonitinho Jimmy Smith (Gordon MacRae).
Tinha tido também um namoro com um produtor e diretor de teatro, Larry Blair (Billy De Wolfe, um sujeito que, para ser chamado de mau ator, precisaria melhorar muito). Tipinho safado, esse Larry. Tenta de todas as maneiras convencer Nanette a investir US$ 25 mil em seu novo musical; caso Nanette, milionária conhecida, entrasse com esse dinheiro, outros investidores apoiariam o projeto.
Nanette resolve apoiar a produção do musical – não tanto por Larry, o ex-namorado que ela sabe que é safado, mas por causa das outras pessoas envolvidas, inclusive seus amigos Tommy dançarino e Jimmy compositor e bonitinho, por quem a garota arrasta as asinhas.
Para conseguir que o tio entregue a ela a fortuna de US$ 25 mil, faz uma aposta com ele: ficaria dois dias inteiros, 48 horas, sem dizer a palavra “sim”. Responderia a tudo, absolutamente tudo, com um não!
Mesmo se o bonitinho Jimmy perguntasse a ela se havia gostado de sua nova composição, “Tea for Two”. Mesmo se o bonitinho Jimmy perguntasse se ela tinha simpatia por ele.
Melhor que a trama é a história da peça que deu origem a ele
Essa é a trama. Haverá situações engraçadas, gostosas. A piada de não poder dizer sim, e ter sempre que dizer não, se repete algumas vezes, mas não chega a cansar. Não é um grande filme, de forma alguma – mas é uma boa diversão.
E ver e ouvir Doris Day é uma maravilha.
Mais fascinante do que a trama bolada pelo roteirista Harry Clork é, com certeza, a história do musical No, No, Nanette.
Conta a Wikipedia que No, No, Nanette é uma comédia musical de meados dos anos 20, com letras de Irving Caesar e Otto Harbach, música de Vincent Youmans, e libretto de Otto Harbach e Frank Mandel. Esse time de cinco pessoas, por sua vez, se baseou, para criar seu musical, numa peça de Frank Mandel, que estreou na Broadway em 1919, My Lady Friends.
A história envolvia três casais que acabavam se reunindo numa pequena casa em Atlantic City – a cidade da jogatina não muito distante de Nova York –, em meio a um esquema de chantagem contra uma jovem e alegre herdeira de Manhattan que abandona seu triste noivo para passar um fim de semana fora. Entre as músicas compostas para o espetáculo estavam “Tea for Two” e “I Want to Be Happy”.
No, No, Nanette foi um tremendo sucesso em Chicago, em Nova York e em Londres – teve 321 apresentações na Broadway e 665 no West End. Em 1971, voltou ao sucesso na Broadway, numa nova adaptação feita por Burt Shevelove.
Este aqui foi o terceiro filme baseado na peça da Broadway
Claro que um sucesso desses no teatro seria aproveitado por Hollywood, e então em 1930 foi lançado No, No, Nanette, dirigido por Clarence G. Badger, com Bernice Claire no papel principal. Nessa versão, a trama envolve um editor da Bíblia que se apaixona por uma chorus girl e acaba financiando um show da Broadway.
Em 1940, foi lançado um segundo No, No, Nanette, dirigido por Herbert Wilcox, com Anna Neagle no papel título e Victor Mature em um dos papéis principais.
Até parece que Hollywood se comprometeu a filmar No, No, Nanette a cada dez anos, porque em 1950 veio esta versão aqui.
Algumas curiosidades sobre ela:
* Eve Arden (1908-1990), uma bela atriz, aqui interpreta Pauline, a secretária pessoal e faz tudo que trabalha para Nanette. Na versão de 1940, Eve Arden havia interpretado um outro papel, o de Kitty – que, na versão de 1950, tem importância mínima.
* Antes deste filme, Doris Day havia sido dirigida por David Butler em Mademoiselle Fifi (1949). Depois de Tea for Two viriam Rouxinol da Broadway (1951), Paris em Abril (1952), Lua Prateada (1953) e Ardida como Pimenta (1953).
*Este aqui foi o primeiro filme da dupla Doris Day e Gordon MacRae. Voltariam a trabalhar juntos em mais quatro filmes: Conquistando West Point (1950), Meus Braços Te Esperam (1951), Estrelas em Desfile (1951) e Lua Prateada (1953).
Leonard Maltin dá 2.5 estrelas em 4 para o filme: “Um dos melhores musicais de Day na Warner Bros, vagamente baseado em No, No, Nanette; Doris deve responder ‘não’ a cada pergunta durante 24 horas a fim de ganhar dinheiro para financiar um musical da Broadway no qual ela quer trabalhar.”
Há aí dois equívocos. São 48 horas, e não 24. E não é propriamente Nanette que quer, que faz questão de trabalhar no musical que está sendo montado. O que acontece é que o produtor Larry e em especial seus amigos Jimmy e Tommy insistem para que ela participe do show.
O Guide des Films de Jean Tulard é ainda mais curto e grosso em sua avaliação sobre No, No, Nanette – esse foi o título do filme na França, exatamente igual ao brasileiro. Diz simplesmente que a peça e o filme foram imortalizados pela canção “Tea for Two”.
Anotação em janeiro de 2017
No, No, Nanette/Tea for Two
De David Butler, EUA, 1950
Com Doris Day (Nanette Carter)
e Gordon MacRae (Jimmy Smith), Gene Nelson (Tommy Trainor), Eve Arden (Pauline Hastings), Billy De Wolfe (Larry Blair), S.Z. Sakall (J. Maxwell Bloomhaus), Bill Goodwin (William ‘Moe’ Early), Patrice Wymore (Beatrice Darcy), Virginia Gibson (Mabel Wiley)
Roteiro Harry Clork
Baseado em peça de Frank Mandel & Otto A. Harbach & Vincent Youmans & Emil Nyitray
Fotografia Wilfred M. Cline
Música Howard Jackson
Montagem Irene Morra
Produção Warner Bros. DVD M.D.V.R.
Cor, 98 min
**
filme muito agradável. Claro, é com a Doris Day.
E onde estão os filmes??
Excelente seu texto.
Tantos filmes que Doris deixou e onde assisti´-los?
Nem pra alugar encontro. Aliás , dois.
Vocês podem ver o filme legendado em português aqui:
https://youtu.be/_vdophAzQHE
É bom, engraçado e divertido, as coreografias são ótimas, as músicas melhores ainda, o sarcasmo de Pauline, o sotaque forte alemão de Tio Max e a raiva que dá de Larry deixam o filme melhor ainda, ainda mais a reviravolta amorosa que Pauline tem no final…
Ainda de 1950, Doris Day fez um albúm cantando músicas do filme, com participação de m Axel Stordahl regendo a orquestra em algumas canções, Page Cavanaugh Trio como músico backup. As músicas ainda contam com alguns shows sonoros de sapateado e um coro agradável masculino.
Você pode ouvir o albúm em:
https://youtube.com/playlist?list=OLAK5uy_l1w6N8-iQOKYHXQkEDLuWff7F1qiZ8ZYA
https://open.spotify.com/album/4CUEOvIXCBO4r4OZFTPhCv?si=MFwJ5_W4Ssq-eoS0-LDW-A
As interpretações das músicas são lindas, e “Tea for Two” está em uma versão explêndida.
Vale a pena ver o filme e ouvir o albúm!
Pô… Que beleza… Quanta informação…
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Um abraço.
Sérgio