[Rating:3]
Anotação em 1997: Um belo filme, nessa bem-vinda tradição dos filmes de alma feminina e olhar feminino do mundo, tipo Tomara que Seja Mulher, do Monicelli, da Excêntrica Família de Antônia, e, nos Estados Unidos, de Tomates Verdes Fritos, Spitfire Grill e O Clube da Felicidade e da Sorte. No elenco, cheio de grandes atrizes hoje entre os 50 e 60 anos, assim como na história, os homens são coadjuvantes; a diretora, as produtoras, a autora do livro e a roteirista são mulheres.
Finn, a personagem de Winona Ryder, tem 26 anos, um namorado que acaba de pedi-la em casamento e uma tese de mestrado que está escrevendo pela terceira vez; vai passar alguns meses na casa da tia-avó, Glady-Joe, e da avó, Hy, onde viveu quando menina, depois do final do casamento dos pais. A casa, no sul da Califórnia, no meio de plantações de frutas, é o lugar onde se reúne um grupo de seis mulheres pós-50 anos mais a filha madura de uma delas, em torno de colchas de retalho que vão sendo costuradas. Assim como uma colcha de retalhos, Finn vai aprendendo histórias daquelas mulheres, enquanto se pergunta se deve ou não se casar com o namorado Sam. As histórias são bonitas, simples, envolvem amores passados, sonhos, desilusões, decisões maduras de quem já viveu o bastante.
A avó Hy, pouco antes de ficar viúva, teve uma transa com o marido da irmã Glady-Joe. A qual nunca perdoou o marido, no momento da ação também já morto, nem a irmã – embora vivam juntas na mesma casa. Sophia, que sempre inspirou medo na menina Finn, tinha sido uma mulher linda, uma grande nadadora e mergulhadora; mas abriu mão do hobby e de uma possível carreira para se casar com um geólogo, que lhe deu três filhos e depois sumiu pra nunca mais voltar. Em, de quem todas as demais sentem um pouco de pena, se casou cedo com um pintor, Dean, que por 30 anos teve diversas aventuras com outras mulheres, inclusive Constance, que também pertence ao clube das colchas de retalho; Constance tinha sido feliz com o marido, até que ele morreu, e ela tornou-se amante de Dean.
Anna, a única negra entre as mais velhas, tinha trabalhado para Glady-Joe – mas agora, como diz Finn logo no início do filme, todas trabalham para ela, a chefe de costura; o grande amor de sua vida não é um homem, mas a filha Marianna, uma mulher independente, que tinha morado anos na Europa, tido muitos namoros, nenhum casamento e apenas uma grande mas rápida paixão, por um poeta que ao se despedir dela lhe entregou em Paris um texto assim:
“Young lovers seek perfection. Old lovers learn the art of sewing spreads together and of seeing beauty in the multiplicity of patches.”
Ainda na apresentação dos personagens, bem no início do filme, ao juntar suas coisas para ir passar a temporada com a avó, a tia e suas amigas, Finn se pergunta: “I’m 26; this is not an unreasonable age to get married, especially if you’ve found a (…) soul-mate. But how do you merge into this thing called a couple and still keep a little room for yourself? And how do we even know if only we’re supposed to be with one person for the rest of our lives?”
O personagem de Finn é muito interessante. É o exemplo da mulher da geração pós-revolução do comportamento, pós-pílula, pós-liberação sexual, pós-hippie, pós-anos 60, a geração nascida na ressaca do sonho, pós-1970. Ao contrário de antes, elas não receberam de suas mães, e nem mesmo de suas avós, modelos de comportamento, isso é certo, isso é errado. Ao contrário. Cresceram numa época em que, por exemplo, a regra é o divórcio, e a exceção são os casamentos duradouros; em que as infidelidades não são mais cometidas às escondidas e guardadas a sete chaves, mas enfrentadas – seja da forma agressiva de Glady-Joe, que quebrou todos os potes e enfeites da casa, seja da forma passiva de Em, que ao longo de 30 anos fez planos de deixar o marido traidor, mas nunca deixou.
Eventualmente, Finn conhecerá um rapaz na cidade da avó, bonitão, corpo de atleta, fala macia e decisão rápida na hora da transa. E eventualmente, logo depois da transa, receberá a visita da mãe, que vem lhe dizer que ela e seu pai vão se casar de novo – uns 20 anos depois do que Finn gostaria que isso tivesse acontecido.
Se você não viu o filme, não leia a partir de agora
O filme dá uma única escorregadela – Marynha e eu concordamos nisso perfeitamente – quando, no finalzinho, romantiza demais a decisão de Finn de realmente se casar com Sam: como na história da bisavó de Anna, aparece para Finn um corvo que a leva até seu destino. Não precisava dessa escorregadela. Ela não destrói o filme, mas arranha uma narrativa que vinha doçamarga, gostosa, inteligente, sensível. De lições do tipo: não há, mesmo – simplesmente porque não há, mesmo – fórmulas, padrões, modelos; a vida é uma arte de tentativa e erro, com mais ou menos erros, dependendo de nossas capacidades e sorte; ao contrário do que pensavam os hippies, experiência é uma coisa que se transmite, sim, não como fórmula, mas como experiência mesmo, parâmetros, exemplos, sobre os quais podemos apoiar nossas decisões – embora elas devam sempre partir do que quer o coração.
É por aí. Um bonito filme.
Colcha de Retalhos/How to Make an American Quilt
De Jocelyn Moorhouse, EUA, 1995.
Com Winona Ryder (Finn), Anne Bancroft (Glady-Joe), Ellen Burstyn (Hy), Lois Smith (Sophia), Jean Simmons (Em), Maya Angelou (Anna), Alfre Woodward (Marianna), Kate Nelligan (Constance), Kate Capshaw (Sally), Samantha Mathis (jovem Sophia), Dermot Mulroney (Sam), Claire Danes (Glady Joe jovem)
Roteiro Jane Anderson
Baseado no livro de Whitney Otto
Prod Sarah Pillsbury e Midge Sanford, para a Amblin.
Música Thomas Newman
Cor, 109 min.
O filme é lindo e uma lição de vida . minha aluna Marlene fez a colcha iguaz, e os blocos cuja as estórias de cada artísta do filme, no lugar a Marlene retratou a estória dela. desenhei os blocos, e a ajudei a montá-la. ficou linda igual a do filme.