[Rating:2.5]
Anotação em 1997: Um filme feito com inegável talento. O diretor deve ser novo; não consta do Cinemania 95. (O diretor Gary Fleder nasceu em 1965; estava, portanto, com 30 anos quando fez este filme, seu primeiro longa-metragem.) Lá pelo meio, achei que poderia ser um grande filme. Não chega a tanto; enrola-se um pouco na história e no excesso de violência. Também lá pelo meio, faz lembrar Fargo, que os irmãos Coen fariam um ano depois deste filme: assim como Fargo, ele trata de um plano criminoso mas a princípio sem vítima fatal que desanda em tragédia; assim como Fargo, mostra como se dá pouco valor à vida, na sociedade mais rica do planeta; como se mata gente como se fossem baratas.
Na história vão se sucedendo assassinatos e vai-se falando de mortes lentas, torturantemente lentas. Como, por exemplo, a morte com um tiro no cu, quando a vítima leva 15, 20 minutos para morrer. E Jack Warden, no papel de um frequentador do bar que funciona como o coro da tragédia grega, salienta: “É como cagar giletes incandescentes”. Em meio a essa seqüência de mortes, velhinhos prestes a morrer dão depoimentos sobre a vida, sobre como a vida é breve. Um texto brilhante é dito por um dos marginais, depois de condenado à morte lenta: “Lembra quando a gente era criança e passava o ano esperando as férias de verão? E aí chegavam as férias de verão e passavam voando. Sabe o quê? A vida é mais curta que as férias de verão”.
Há uma história de amor que começa muito bem mas, na minha opinião, desanda, lá pelo final. Depois da primeira trepada – que não é mostrada -, aparece, sobreposta à imagem do casal acordando na manhã seguinte, uma frase brilhante, dita por uma velhinha prestes a morrer. A voz que diz a frase é ótima, de treinada atriz de teatro; ela é dita como se fosse um poema bem recitado. E a frase é tão brilhante que copiei:
“Os começos são sempre o melhor. Quando você começa a explorar um ao outro, a aprender. Quando você observa o telefone como se ele fosse a TV, esperando que ele toque. Que insanidade, então. Insanidade de coração doente. Sempre desaparece depois, mas, Deus, quando está acontecendo, não há nada igual no mundo.”
Esses depoimentos dos morituri, dos que estão para morrer, são o meio de vida do personagem central, Jimmy, o Santo, interpretado pelo Andy Garcia. Jimmy, o Santo, já foi um gângster, e um grande gângester; todos os que um dia passaram pro lado de lá da lei o respeitam, o admiram. Jimmy, o Santo, é um daqueles tantos bandidos com um código de moral maravilhoso, rígido, perfeito. Mas agora Jimmy, o Santo, mudou de vida; abriu uma empresa que grava tapes de gente que está à beira da morte, para vendê-los às famílias, de maneira que os filhos, netos, possam ouvir os “Afterlife advices” – como aparece escrito na tela dos vídeos.
A própria idéia, a própria concepção desse jeito de um ex-gângster ganhar a vida de forma “honesta” é de uma ironia aguda, violenta.
Bem, aí vem aquele tema eterno de que é difícil um ex-fora da lei ficar do lado certo da lei. Um chefão poderoso, para quem Jimmy, o Santo, trabalhou no passado o chama para fazer um servicinho. Ele não pode recusar; deve dinheiro ao chefão. E então aceita – que jeito? Chama quatro velhos conhecidos, tudo gente que já esteve na prisão e agora está fora. Mas comete um erro: confia em um louco. E dá merda, uma grande merda. Por isso todos os cinco são condenados pelo chefão à morte lenta.
A belíssima Gabrielle Anwar, que dançou o tango com Al Pacino no remake americano de Perfume de Mulher, faz Dagby, uma jovem instrutora de esqui nas estações do Colorado, diáfana, sensualíssima, por quem Jimmy, o Santo, se apaixona.
Um bom filme. Quase um filme extraordinário.
Coisas para você fazer em Denver quando está morto/Things to do in Denver when you’re dead
De Gary Fleder, EUA, 1995.
Com Andy Garcia, Christopher Walken, Christopher Llloyd, Steve Buscemi, Gabrielle Anwar, William Forsythe, Treat Williams
Roteiro Scott Rosenberg
Fotografia Elliot Davis
Cor, 115 min.
Puxa, muito legal esse site! Encontrei procurando sobre “Denver”. Aproveito para convidá-los para ver o que escrevi sobre esse filme no meu blog (que não é especializado em filmes, mas eu adoro esse filme): http://rodolfo.typepad.com/no_posso_evitar/2008/12/coisas-para-fazer-em-denver-quando-voc%C3%AA-est%C3%A1-morto.html
Espero que gostem,
Rodolfo.
“A vida é como um arroto de mostarda. Inebriante por uns momentos pra depois se perder no ar”. Vaz, definir a vida usando uma analogia desse naipe – e não se dar mal – não é pra qualquer um. Eu nunca vi a escatologia ser usada com tanta elegância. Boat drinks!