Enfim Viúva / Enfin Veuve

0.5 out of 5.0 stars

O comecinho até que promete. Uma mulher – Michèle Laroque, bela, ótima atriz – corre na praia com fones de ouvido. O espectador ouve a música que ela está ouvindo, “Et si tu n’existais pas”, com Joe Dassin, e ouve a voz dela, cantando alto junto com ele.

“Et su tu n’existais pas” é daquele tipo de canção-chiclete, que a gente ouve uma vez, gruda na memória e a gente é capaz de assobiá-la em seguida e também daí a uma semana, um mês. É o pop mais pop, mais descartável que pode haver, beirando o brega (ou talvez se enfiando totalmente nele). E se você não existisse, então para que eu existiria? E dá-lhe acordes fortes de cordas, um troço assumidamente meloso, meio grandioso, ou metido a. Pop descartável, roçando o brega, ou desbradamente brega – mas gostoso de ouvir, e de cantar junto, por que não?

E Michèle Laroque cantando alto, com entusiasmo, com paixão, sem qualquer afinação – e sem fôlego, porque, afinal, está correndo na praia –, faz uma bela figura, um personagem crível, parecendo de carne e osso.

Tive esperança de estar diante de uma boa comedinha francesa.

Como diria o jovem Chico, qual o quê.

O encanto do filme dura exatamente essa seqüência inicial. O que vem a seguir é bobo, tolo, bocó.

Resisti uns cinco, talvez oito minutos. Mary, que é sã da cabeça, desistiu – a vida é curta.

Como não sou são da cabeça, vejo filmes como um avestruz, e além de tudo tenho um site de filmes, no dia seguinte me sentei de novo para ver o resto de Enfim Viúva.

É tudo tão ruim que não dá nem para achar graça das piadas

O filme é daqueles que dão vergonha no espectador de estar perdendo tempo vendo uma coisa tão absolutamente idiota.

Sei que o adjetivo é forte. Às vezes uso esse adjetivo e assusto quem me ouve. Mas neste caso aqui ele é exato, preciso. Enfim Viúva é um filme idiota.

Vou tentar, portanto, ser breve. No mínimo conciso.

A trama é assim:

Anne-Marie, burguesa de aí no meio dos 40 anos (o papel de Michèle Laroque), casada com cirurgião plástico extremamente bem sucedido (Wladimir Yordanoff), é, há dois anos, amante de um construtor de barcos na região de Marselha, Léo (Jacques Gamblin). Léo recebe convite para trabalho bem pago em Hong Kong. No momento em que Anne-Marie fica sabendo da possibilidade de viajar para a China, assusta-se, mas depois se dispõe a finalmente abandonar o marido, viver com o amante. Quando estamos com 30 minutos de filme, acontece o fato já antecipado no título: ela se torna viúva do homem que não amava. O problema é que, cercada por toda a família dela, e dele, não consegue se encontrar com o amante para entregar a ele o passaporte para a viagem à China.

Mas não é a trama que é mais idiota: é a forma com que a trama é apresentada ao espectador, e a forma com que atuam os atores.

Por exemplo: o filme tenta, por umas cinco vezes, pelo menos, fazer o espectador rir do fato de que a burguesa se esforça para mentir para a empregada, que está cansada de saber que ela na verdade tem um amante.

A forma com que os atores são postos para atuar, como se estivessem no pior quadro jamais concebido num programa humorístico de TV, é uma ofensa a qualquer tipo de inteligência.

É tudo tão ruim, tão grotesco, tão ridículo, que não dá para achar graça.

O maniqueísmo esquerdóide: quem é rico é babaca, quem é mais pobre é bom

Eu deveria parar por aqui, mas a imbecilidade do filme é tão agressiva que prossigo um pouco mais.

Já disse muitas vezes que o cinema italiano, de uma maneira geral, tem essa idéia fixa de que só os pobres são probos, íntegros, corretos, e todo mundo que tem mais do que o suficiente para sobreviver é mau, sem caráter, filho da puta, doente do pé ou da cabeça, ou ambos.

Boa parte do cinema francês também padece dessa doença infantil do esquerdismo: bom é o trabalhador pobre; quem não é trabalhador pobre é mau, sem caráter, filho da puta, doente do pé ou da cabeça, ou ambos.

Este filme cultiva este maniqueísmo debilóide.

Anne-Marie, a protagonista, a burguesa, é uma completa babaca. Todas as pessoas ligadas a ela, da família dela e da família do marido dela, são completos babacas.

O amante, que não é rico, que é trabalhador manual, é gente boa, assim como seus empregados e amigos.

Muito mais babaca do que os burgueses do filme é quem vê o mundo desta forma preto-e-branca.

É um filme idiota.

E, no entanto, a diretora Isabelle Mergault fez Você é tão Bonito – um filme sensível, inteligente, que fala de machismo, do despertar para o afeto, da vida rural francesa que é atrasada, retrógada, incapaz de viver sem subsídios, sobre a miséria do Leste europeu pós-derrocada do império comunista,

Você é Tão Bonito é o exato inverso deste filme aqui. É humanista, é amplo, é inteligente, é abrangente.

Tudo o que esta porcaria aqui não é.

Como é possível que uma mesma pessoa consiga fazer um filme tão sensível e um filme tão idiota?

Mistério neste mundo de mistérios – embora o maior mistério, como diz o Renato Teixeira, seja haver mistérios.

Anotação em abril de 2012

Enfim Viúva/Enfin Veuve

De Isabelle Mergault, França. 2007

Michèle Laroque (Anne-Marie), Jacques Gamblin (Léo), Wladimir Yordanoff (Gilbert), Tom Morton (Christophe), Valérie Mairesse (Nicole), Claire Nadeau (Viviane), Eva Darlan (Catherine), Caroline Raynaud (Alexia)

Roteiro Isabelle Mergault e Jean-Pierre Hasson

Argumento Isabelle Mergault

Fotografia Philippe Pavans de Ceccatty

Música Laurent Marimbert e Étienne Perruchon

Produção Gaumont, Canal+, CinéCinéma, F Comme Film, TF1 Films Production. DVD Imovision.

Cor, 93 min

1/2

5 Comentários para “Enfim Viúva / Enfin Veuve”

  1. Aaaaaaaah, Sergio!!!! O filme é legalzinho, vai! Adorei o ator que faz o amante dela, ele tbm participa da ótima comédia OS NOMES DO AMOR. Não sei, talvez eu tenha gostado bastnate do filme pq passei por uma situaçao parecida, um namoro meio “proibido”, e vc querendo se livrar daquelas pessoas pra ficar com quem vc quer… é duro, viu!

  2. Peguei pesado demais, né, Claudia? Acontece… Às vezes simplesmente a gente não entra na sintonia do filme…
    Sério que você passou por situação parecida, é?
    Um abraço!
    Sérgio

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