2.5 out of 5.0 stars
Anotação em 1997: É um filme estranho, weird como a própria palavra weird. Tem um certo humor amargo que deve ser bem característica dos judeus americanos – e é interessante que, em seu primeiro-longa metragem como diretora, Diane Keaton, depois de anos de convivência com Woody Allen, tenha feito um filme tão profundamente, arraigadamente judeu.
Para começo de conversa: é uma história real. O roteiro se baseia num livro de Franz Lidz (que aparece, nos letreiros finais, também como co-produtor executivo). Franz Lidz é o garoto que no filme tem 12 anos, o protagonista da história. A ação se passa no comecinho dos anos 60; o garoto, portanto, é do início dos anos 50, estará hoje com 47, por aí. É um homem da minha geração.
A apresentação é interessante. Vemos cenas de filmes domésticos, em PB, é claro, feitos pelo pai do garoto, um inventor (John Turturro, ótimo, excelente), testando inventos e usando o filho como cobaia. Logo depois que termina a apresentação há uma seqüência para mostrar que aquela é uma família feliz, de pais apaixonados e apaixonados pelos filhos. Com dez minutos de filme, já temos que o garoto se sente mal por ter um pai como aquele – judeu, e estranho, diferente demais do padrão classe média americana, que fala o tempo todo sobre a importância da ciência e sobre as frases e as descobertas dos cientistas. Ele diz pra mãe (Andie MacDowell, no começo do filme linda como sempre, depois maquiada para mostrar sua lenta derrota para um câncer no ovário) que os garotos na escola dizem que o pai dele não é deste planeta. A mãe, ao contrário, é idolatrada pelo garoto. É seu ponto de contato com o mundo. Por isso o horror do choque que ele sente ao saber que a mãe está doente, e depois – através de uma frase que a empregada solta sem pensar – que está morrendo.
A notícia da doença faz mudar completamente, é claro, o comportamento do pai. Antes alegre, expansivo, transforma-se em sombrio, calado, fechado, tentando maniacamente lutar contra o diagnóstico, depois se entregando à evidência.
O peso da tristeza que paira na casa, e o mau humor constante do pai, ajudam para que o garoto opte por se refugiar na casa dos dois tios, irmãos do pai. Os tios, Danny (Michael Richards) e Arthur (Maury Chaykin), são doidos de pedra. Mas de pedra mesmo. Se os colegas de escola do menino Steven Lidz já consideram o pai dele maluco, imagine-se o que pensariam dos tios. Arthur, em especial, é uma figuraça. Judeu de esquerda, alimenta uma total teoria conspiratória da história; diz que só existem oito pessoas na humanidade em que se pode confiar; todos os demais são suspeitos, ou então são abertamente fascistas. Os dois tios vivem em um imenso apartamento para onde levam todos os jornais, bolas de brinquedo e todo o tipo de quinquilharia que encontram nas ruas. Vivem às turras com o síndico do prédio, que lá pelas tantas consegue fazer vir um fiscal da Prefeitura para constatar a loucura da quantidade de lixo que eles guardam no apartamento.
Esse é o trecho mais estranho do filme. O garoto Steven passa a idolatrar os tios, a absorver os valores malucos deles, a loucura deles, para contrariedade total dos pais e surpresa do espectador. É aí que resolve, por sugestão dos tios, trocar o nome, de Steven para Franz.
O distanciamento entre o garoto e o pai vai aumentando, até o ponto de ruptura.
Unstrung, essa palavra estranha do título original, significa, segundo o Webster: having the strings loosened or detached; nervously relaxed or weakened; unnerved, discomposed. Enervado, debilitado.
Meus Tios Heróis/Unstrung Heroes
De Diane Keaton, EUA, 1995.
Com Nathan Watt, John Turturro, Andie MacDowell, Maury Chaykin, Michael Richards.
Roteiro Richard LaGravenese
Bas no livro de Franz Lidz
Música Thomas Newman
Cor, 93 min.