Leste-Oeste / Est-Ouest


Nota: ★★★½

 Anotação em 2007, com complemento em 2008: Vi em algum lugar uma crítica dizendo que Régis Wargnier reduziu tudo a um melodrama, neste Leste-Oeste. Besteira. É um grande filme.

É daquela bela escola de retratar um momento histórico importante através da vida de algumas pessoas comuns. Como o próprio Wargnier fez em Indochina, de 1992, sobre a colonização francesa no Vietnã, como Jean-Paul Rappeneau fez em Viagens do Coração/Bom Voyage, de 2003, sobre a fuga de Paris pouco antes da chegada dos nazistas, ou como Andrei Konchalovsky fez em O Círculo do Poder/The Inner Circle, de 1991, sobre a corte que cercava o imperador comunista Josef Stálin, vista através dos olhos de um inocente e apatetado projecionista de filmes.

Aqui, o grande tema histórico é um episódio ocorrido em 1946, logo após o final da Segunda Guerra, quando o regime stalinista montou uma máquina de propaganda para atrair de volta para a União Soviética russos que haviam se instalado no Ocidente para fugir da revolução comunista e da guerra civil que se seguiu entre os Exércitos Vermelho e Branco; o regime prometia anistia total para os expatriados, e acenava para eles com a chance de participar da reconstrução do país após a vitória sobre o nazismo. 

Os personagens centrais do filme, que fazem a pequena história dentro do painel amplo, são o russo Alexei Golovin, que havia se exilado na França, onde se tornou médico (interpretado por Oleg Menshikov), e sua jovem esposa francesa Marie (o papel de Sandrine Bonnaire). As atuações dos dois são extraordinárias.

O filme acompanha o retorno de um grupo de expatriados, em que está o casal de protagonistas, desde a longa viagem de navio de Marselha até Odessa – um bando de russos e filhos de russos saudosos de sua terra natal e confiantes nas promessas de uma vida digna num país em reconstrução.

Assim que o grupo desembarca em Odessa, alguns são mortos, alguns são presos – e alguns, cuja profissão interessa ao regime, como o médico Alexei, são levados para trabalhar em Kiev.

A francesa Marie não leva muito tempo para se arrepender amargamente de ter trocado a vida confortável na França pela dureza do dia-a-dia em uma residência comunitária, onde há falta de tudo, em especial qualquer tipo de liberdade. Temos, então, um fortíssimo, pesadíssimo retrato da vida sob a ditadura stalinista.

Marie vai enxergar duas possibilidades de fugir de volta para o Ocidente: uma, com a ajuda de uma famosa atriz francesa que vai se apresentar em Kiev (o papel de Catherine Deneuve, que já havia trabalhado com Wargnier como a protagonista de Indochina). A outra, com um rapazinho que conhece e com que terá um envolvimento, um atleta, ás da natação. A relação dos dois tem a face melodramática do filme – mas ele é muito mais que um melodrama banal. É um belo filme, um grande afresco, e uma crua descrição do cotidiano sob uma ditadura brutal. 

Para fazer o roteiro desta saga, Wargnier teve a ajuda de Louis Gardel, com quem já havia trabalhado em Indochina, do cineasta russo Sergei Bodrov e do roteirista do Azerbaijão Rustam Ibragimbekov, autor do roteiro de filmes de Nikita Mickhalkov. E isso em si já é fascinante, uma colaboração Leste-Oeste na prática, apenas oito anos depois do fim do império comunista.      

E Wargnier ainda teve a sorte de ter novamente a companhia do compositor inglês Patrick Doyle (ele também trabalhou em Indochina) para fazer a trilha sonora, uma beleza que se sustenta muito bem  quando ouvida em disco, independentemente do filme.

Leste-Oeste/Est-Ouest

De Régis Wargnier, França-Rússia-Ucrânia-Bulgária-Espanha, 1999

Com Sandrine Bonnaire, Oleg Menshikov, Catherine Deneuve

Roteiro Régis Wargnier, Sergei Bodrov, Louis Gardel e Rustam Ibragimbekov

Música Patrick Doyle

Cor, 121 min.

5 Comentários para “Leste-Oeste / Est-Ouest”

  1. Gostaria desse filme O circulo do poder, com legenda em português.Tem alguma dica para mim?

  2. Venho procurando esse filme nas plataformas, sem sucesso…alguma dica de onde assistir?

  3. Puxa vida, Péricles, não tenho dica, não… Vi nos velhos tempos em que havia locadoras de DVD…
    Sinto muito não poder ajudar…
    Um abraço.
    Sérgio

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