O Amor nos Tempos do Cólera / Love in the Time of Cholera


Nota: ★☆☆☆

Anotação em 2008: É um milagre. Desafia qualquer tentativa de explicação lógica. Não parece possível, nem com um imenso esforço – mas aconteceu.

Pegaram um romance belíssimo, um dos grandes textos literários do século XX; escolheram para dirigir o filme o inglês Mike Newell, que fez, entre outros, aquela deliciosa gracinha que é Quatro Casamentos e Um Funeral. Juntaram um grande elenco – um dos melhores atores em atuação no mundo, o espanhol Javier Bardem, uma lindíssima e talentosa atriz italiana, Giovanna Mezzogiorno, uma jovem colombiana indicada ao Oscar, Catalina Sandino Moreno, uma das maiores divas do teatro e do cinema brasileiros, Fernanda Montenegro, entre muitos outros, vindos da Argentina, dos Estados Unidos. Tinham dinheiro sobrando para uma produção esplendorosa. E conseguiram fazer um filme de merda.

Mas como?

Como pode uma Fernanda Montenegro trabalhando mal? Uma Giovanna Mezzogiorno parecendo uma modelo de um BBB em sua primeira participação na novela das 6 da Rede Globo, não conseguindo construir nada que se pareça com um personagem? Um Javier Bardem transformando o personagem de Florentino Ariza num débil mental?

Pois é. É um mistério tão grande que, insisto, desafia qualquer tentativa de explicação lógica.

Quase tudo, mas quase tudo no filme é falso como uma nota de três reais – ou dólares, ou guaranis. Há momentos de um ridículo tão atroz que o pobre espectador sente pena, sente vergonha, embaraço – como, para dar apenas alguns poucos exemplos, as grotescas brigas entre Fermina Urbino (Giovanna Mezzogiorno) e seu pai, ou o momento em que Fermina Urbino conhece o médico com quem iria depois se casar, ou o pai dela puxando o saco do médico desbragadamente, ou o banho de Fermina e a prima Hildebranda (o papel de Catalina Sandino Moreno) numa imensa tina, as duas fumando, ou a festa no bordel em que Florentino Ariza jura que ficará virgem para esperar por Fermina.

Credo. É de dar vergonha no espectador.

Como é que conseguiram?

Não sei – mas o fato é que conseguiram.

Será que tem a ver com o fato de que o roteirista é um sul-africano e o diretor um inglês, que não entendem absolutamente nada de América Latina, muito menos do clima mágico, fantástico, dos textos de Gabriel García Márquez? Será que tem a ver com o fato de que estão ali, o espanhol, a italiana, a brasileira, o argentino, todos falando em inglês?

Mas não pode ser isso. Ainda no dia anterior, por grande coincidência, revi a beleza que é A Fera no Coração, em que Giovanna Mezzogiorno está soberba – inclusive nas sequências em que fala inglês, durante a viagem do seu trágico personagem aos Estados Unidos.

Não consigo entender. Deve ter sido mesmo um milagre – o inverso da multiplicação dos pães, a transformação de vinho em mijo.

Bom. A bem da verdade, dito tudo isso aí em cima, é preciso reconhecer algumas coisas:

A música do brasileiro Antonio Pinto é muito competente. Mais ainda: as canções feitas especialmente para o filme pela colombiana estrela mundial Shakira são belas, delicadas – talvez sejam a melhor coisa do filme.

O departamento de maquilagem fez um grande trabalho; o envelhecimento dos dois atores principais, Giovanna e Bardem, é um brilho.

As seqüências finais do filme são muito bonitas, sensíveis, delicadas. Mary comentou no ato: parece que mudou de diretor. É exatamente isso: no finalzinho, no finalzinho, Mike Newell coseguiu acertar a mão.

Pena que, para chegar ali, o pobre do espectador tenha que se sujeitar a duas horas de um filme pavoroso.

O Amor nos Tempos do Cólera/Love in the Time of Cholera

De Mike Newell, EUA, 2007

Com Javier Bardem, Giovanna Mezzogiorno, Liev Schreiber, Benjamin Bratt, John Leguizamo, Fernanda Montenegro, Catalina Sandino Moreno, Angie Cepeda

Roteiro Ronald Harwood

Baseado no romance de Gabriel García Márquez

Fotografia Affonso Beato

Produção New Line Cinema. Estreou em São Paulo 25/12/2007

Cor, 139 min.

*

6 Comentários para “O Amor nos Tempos do Cólera / Love in the Time of Cholera”

  1. Vc já disse tudo (altas tiradas nesse texto, ri muito, e só rindo mesmo de um filme ruim desses)…
    Não entendo como o GGM demorou , sei lá, vinte anos pra ceder os direitos pra fazerem o filme, e os caras pegam e fazem essa porcaria?
    E o Javier Bardem ficou tãão estranho, fez o personagem ficar meio psicótico… ele me causava repulsa.
    Sério que no final o diretor acertou a mão? não lembro de nada, pq foi logo no final que dei uma pescada dentro do cinema, rs. Eu sou meio fácil pra dormir, e com um filme chato desses, então, é fatal.
    Eu daria nota menos 1, hahaha, não valeu nem o dinheiro do meu ingresso.
    Vergonha alheia total.

  2. De fato tem hora que até os atores parecem que estão com vergonha do que estão fazendo ali. O personagem do Javier Bardem quando justifica que escreve os bilhetes comerciais em rimas porque “precisa do amor” dá até dó.

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