Queridinhos da América / America’s Sweethearts


Nota: ★★☆☆

Anotação em 2007, com complemento em 2008: Esta comedinha romântica é uma bobagem, mas tem duas coisas interessante – é uma boa gozação sobre a própria indústria do cinema, e traz um personagem inspirado no diretor Hal Ashby, uma figura sensacional.

O diretor Joe Roth conhece bem a indústria que satiriza neste filme. Produziu dezenas de filmes, criou uma produtora, a Morgan Creek, foi o primeiro diretor de cinema a chefiar grandes estúdios: foi o chefão da 20th Century Fox e depois da Disney. 

Billy Crystal faz o papel de Lee, um marqueteiro de um grande estúdio de cinema encarregado de esconder da imprensa algumas verdades inconvenientes exatamente num gigantesco evento de divulgação do novo filme do estúdio. Uma das verdades que ele quer esconder é o fato de que o casal de astros do filme, os queridinhos da América do título, Gwen (Catherine Zeta-Jones) e Eddie (John Cusak), casados na vida real, acabaram de se separar, num processo tumultuado, depois que ele soube que ela estava tendo um caso com um bonitón latino. Lee tenta fazer os repórteres acreditarem que a reconciliação de Gwen e Eddie é eminente, quando na verdade ela tem ódio mortal dele, e ele descobrirá, durante o tal evento para divulgação do novo filme, que boa mesmo é a irmã da ex-mulher, Kiki (Julia Roberts).

O outro fato que o marqueteiro tenta esconder é pior ainda, em termos de marketing negativo para o filme a ser lançado em breve, e que custou uma fortuna: todos os copiões originais e o filme já editado foram seqüestrados pelo seu excêntrico diretor, Hal Weidmann (interpretado por Christopher Walken), uma figura completamente doidona, um hippão em plenos anos 2000, que quer remontá-lo inteiro, fazer seu director’s cut, transformar a comedinha fajuta em uma obra de arte.

Aí me bateu na cabeça: os caras estão fazendo uma gozação em cima do Hal Ashby!

Assim que o filme terminou, fui conferir e o IMDB confirma: “The character of Hal Weidmann is based on Hal Ashby.”

Essa brincadeira vale o filme. Até a forma sarcástica, gozadora, de se fazer a homenagem ao diretor Ashby foi bem escolhida – porque Ashby, um cineasta que gostava dos temas que incomodavam, segundo boa definição de Jean Tulard, era um rebelde, um louco, um visionário, um iconoclasta, um peixe completamente fora d’água na grande indústria de Hollywood, que, entre muchas otras cositas más, gostava que atores e equipes que trabalhavam com ele puxassem um fuminho pra relaxar e viajar.

Hal Ashby (1929-1988) teve uma vida e uma filmografia extraordinárias. Era filho de fazendeiros mórmons de Utah; seus pais se divorciaram quando ele era criança, e seu pai se matou; antes dos 19 anos, já havia se casado e divorciado. Mudou-se para a Califórnia, arranjou um emprego sem importância nos estúdios da Universal e acabou virando assistente de montagem em vários estúdios e depois montador; em 1967, ganhou o Oscar de montagem por No Calor da Noite/In the Heat of the Night, de Norman Jewison 

Dirigiu seu primeiro filme em 1970, Amor sem Barreiras/The Landlord, sobre as difíceis relações entre brancos e negros. Depois veio Ensina-me a Viver/Harold and Maude, de 1971, aquela história de amor entre uma velhinha e um adolescente problemático. Em 1973 fez com Jack Nicholson, que conhecera vários antes antes na Metro, A Última Missão/The Last Detail. Shampoo, de 1975, fala de sexo e dinheiro na Los Angeles pós-revoluções comportamentais dos anos 60.

Filmou a primeira parte da vida de Woody Guthrie, o ícone da música folk, o grande guru de Bob Dylan, em Esta Terra é Minha Terra/Bound for Glory, de 1976. Amargo Regresso/Coming Home, de 1978, sobre as feridas da guerra do Vietnã, deu os Oscars de melhor ator e atriz a Jon Voight e Jane Fonda. Muito Além do Jardim/Being There, de 1979, com Peter Sellers, em que faz uma sátira violentíssima sobre a política e a mídia dos Estados Unidos, também foi um grande sucesso de crítica.

 A partir daí, sua carreira entrou num desvio; apesar de todos os elogios da crítica e indicações para Oscar dos filmes anteriores, passou a ser visto pelos estúdios como um sujeito incontrolável, um drogado, um maníaco, um chato.

O ator Sean Penn, outro rebelde, dedicou a Hal Ashby e a John Cassavetes seu filme de estréia, Unidos pelo Sangue/The Indian Runner, de 1991.  

Queridinhos da América/America’s Sweethearts

De Joe Roth, EUA, 2001.

Com John Cusak, Julia Roberts, Billy Crystal, Catherine Zeta-Jones, Stanley Tucci, Christopher Walken, Alan Arkin

Roteiro Billy Crystal e Peter Tolan

Cor, 102 min

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